sexta-feira, 6 de março de 2015

Angola. TOLERÂNCIA E IDADE DA PEDRA



Jornal de Angola, editorial

Em democracia, a Oposição tem um papel inestimável porque garante o princípio da alternância e a pluralidade de soluções para os problemas sociais e económicos.

As maiorias governam e as minorias trabalham para um dia governar. O trabalho dos partidos e coligações junto dos eleitores, quando é bem sucedido, resulta em votos. E só com a maioria dos votos é possível governar.
A Assembleia Nacional é um órgão de soberania. Todos os eleitos têm a legitimidade do voto e não há deputados de primeira ou de segunda. Todos são importantes para a democracia e o seu trabalho deve ser valorizado pela sociedade. O pior que pode acontecer a uma democracia é o desprestígio e a desvalorização das suas instituições fundadoras. O Parlamento é a sede do Poder Legislativo. Cerne do regime democrático.

Os partidos e coligações prestam um mau serviço à democracia quando confundem Oposição com guerrilha institucional. Colocam-se fora da ordem constitucional quando põem em causa os Símbolos Nacionais: Hino, Bandeira e Chefe de Estado. Ferem de morte o regime democrático quando subvertem as regras, num claro abuso do poder que lhes foi emprestado pelo voto popular.

Deputados e dirigentes partidários da Oposição prestam um péssimo serviço à democracia quando trocam o debate de ideias e opiniões pelo insulto, a chicana política, as acusações infundadas e as calúnias. É intolerável que dirigentes partidários se comportem como se a maioria parlamentar que suporta o Executivo tivesse assaltado o Poder. A nenhum político é admitido que desvalorize o apoio popular manifestado aos seus adversários em eleições livres e justas. Da mesma forma que é inadmissível que partidos e coligações ponham em causa a legitimidade das eleições, quando os resultados lhes são desfavoráveis. Os concorrentes às eleições são apenas isso e não têm o direito de querer mais. Quem decide se o acto eleitoral é livre, justo e democrático, não são os concorrentes ao pleito. São as autoridades legitimadas pela Constituição da República. Quem ganha e quem perde limita-se a aceitar os resultados finais. Sendo certo que em democracia, nas eleições todos ganham. Mas só pode governar quem tem maioria.

As primeiras eleições multipartidárias em Angola foram realizadas num clima de euforia e esperança. Resultaram de negociações que conduziram a um acordo, blindado pela ONU e pela Troika de Observadores: EUA, Rússia e Portugal. Nunca antes se tinha realizado no mundo uma consulta popular tão vigiada e escrutinada em todas as suas fases, desde o registo eleitoral à contagem dos votos. Quando um dos concorrentes decidiu que era ao mesmo tempo árbitro, viciou de tal forma o jogo democrático que ainda hoje a sociedade angolana se ressente desse crime grave contra a democracia.

Em 1992, a UNITA de Jonas Savimbi deu um tal sinal de intolerância política que arrasou a autoridade do Estado. Na sequência da proclamação do vencedor do pleito, o MPLA, os derrotados retiraram de bases secretas do Cuando Cubango milhares de soldados, os seus “melhores comandantes”, armamento sofisticado e numa acção relâmpago ocuparam quase todas as províncias. Luanda foi então o porto de abrigo e a tábua de salvação para milhões de angolanos em fuga da brutalidade da soldadesca que uns meses antes, ainda agredia Angola ao lado das tropas do regime de Pretória.

Isso só é passado na aparência. Porque hoje a UNITA, na qualidade de maior partido da Oposição, continua a atentar, por actos e discursos, contra a autoridade do Estado e o Poder que resultou da vontade popular em eleições democráticas, livres e justas.

Arrasar a proposta de Lei do Registo Eleitoral antes de ser aprovada, é intolerância política extrema e pior do que isso: falta de respeito absoluta pelo jogo democrático. Instigar à ocupação de reservas fundiárias do Estado é subverter os mais elementares princípios democráticos. Quem assim procede está a fazer passar uma mensagem perigosa: O Estado é meu! Não há pior intolerância. Os dirigentes partidários da Oposição não têm o direito de fomentar o caos e dirigir as suas acções contra a Autoridade do Estado. O voto popular não lhes foi outorgado para minar os fundamentos da democracia. 

O Estado Democrático e de Direito exige de todos os agentes políticos responsabilidade e tolerância. É absolutamente irresponsável um político dizer publicamente que “Angola é um barril de pólvora”. Revela uma inquietante intolerância quem no Parlamento afirma que os terrenos são do povo e por isso todos podem construir onde quiserem. Afirmações destas nem eram toleráveis na Idade da Pedra.

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