Martinho
Júnior, Luanda (textos anteriores)
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– Uma abordagem sobre a qualidade do ensino e da educação-formação em Angola,
só poderá ser feita com rigor se antecipadamente houver a preocupação de se
avaliar a sociedade angolana no seu conjunto, nas suas particularidades mais
sensíveis e nos relacionamentos entre os seus grupos sócio-políticos, tendo em
conta os fenómenos que se foram desencadeando de 1985 até à presente data, ou
seja nos últimos 30 anos…
Efectivamente
o estado angolano, que durante muitos anos foi, é e poderá ser a principal mola
impulsionadora de políticas que visem resgatar o povo angolano do
subdesenvolvimento histórico e crónico a que foi votado, passou sem remissão
duma orientação socialista que era enunciada como marxista-leninista, para
uma “economia de mercado” que sofre os impactos do modelo de
capitalismo neo liberal que a hegemonia unipolar instrumentaliza nas suas
fórmulas de globalização e se reflectem hoje em África, mais que nunca!
Para
tal, essa hegemonia unipolar aplicou um choque acentuado por via
da “guerra dos diamantes de sangue” que prevaleceu entre 1992 e 2002,
através de instrumentos que preparou desde o colonialismo, de forma a
justificar as alterações profundas do carácter de relacionamentos estado-sociedade
e por dentro da sociedade, “obrigando” por fim à alavancagem social
de grupos que tendem a assumir o papel duma oligarquia, sintomaticamente avessa
a compromissos de raiz que advêm das lutas travadas pelo movimento de
libertação contra o colonialismo, o “apartheid” e algumas das suas
sequelas!
O
resultado é alguns grupos dessa oligarquia, em formatação particularmente desde
2002, cujas entidades na maior parte dos casos não verteram suor nas frentes de
combate de então, chegarem ao ponto de se procurarem estabilizar num
poder-síntese, cujos contornos sociais se estão a instalar cada vez mais em
plataformas de “apartheid social”, autênticas “ilhas” que são
mais visíveis na capital do país e podem ser observadas até na geografia humana
de Luanda.
A
essas “ilhas” subsiste o fenómeno de ser muito mais exequível e
possível os relacionamentos com o exterior, do que os relacionamentos com as
outras classes sociais angolanas, que passaram a ser alvo de exploração
desse “sorvedouro” e a serem tratadas como tal!
Para
os de dentro, instalados em condomínios murados, com sensores, arames farpados
e guarnições próprias de segurança, os beneficiários tornam-se condes e barões
insensíveis ao resto da sociedade e dispostos a nutrir cada vez mais seus
próprios umbigos, a qualquer preço!
O
carácter desses grupos oligárquicos está a assemelhar-se cada vez mais até nos
termos dos seus comportamentos e atitudes, aos grupos oligárquicos da América
Latina, agenciados e assimilados pelo império em seu “pátio traseiro”, que
têm produzido tão nefastas políticas sobretudo desde o 11 de Setembro de 1973,
quando foi derrubado pela força o Presidente democraticamente eleito do Chile,
Salvador Allende!
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– A harmonia indispensável para, com a implementação da lógica com sentido de
vida se ter capacidade para exercitar paz, justiça, democracia participativa e
equilíbrio social, mobilizando tanto quanto o possível as mais amplas massas
populares, está a começar a esvair-se com essa perniciosa situação, cujos
trilhos assentam quantas vezes em parcerias público-privadas que sorvem as
energias do estado para benefícios desses grupos oligárquicos, que agora como
um polvo tendem a monopolizar as capacidades financeiras em proveito próprio,
sem qualquer tipo de prudência, ou de controlo, ou de simples critérios de
prestação de contas!
Essas
oligarquias estão a ser formatadas a partir de dentro do aparelho de estado,
abrindo miríades de “oportunidades” na sua envolvência, no seu
entorno e absorvendo os pagamentos devidos à sua “funcionalidade” privada
nessas “oportunidades” tornadas empresas que, desse modo, sem
concursos públicos, sem prestação de contas e sem fiscalização, tendem a
tornar-se em impunes e irresponsáveis polvos mercenários e anti-patrióticos!
A
assimilação aos processos de globalização, por via desse sorvedouro, que estão
a ser interiorizados a partir particularmente do “modelo
português” do estado derivado do golpe do 25 de novembro que levou ao
cúmulo da “troika” formada pelo PS-PSD-CDS, trouxe para Angola os
mesmos ingredientes filosófico-doutrinários-ideológicos da crise, os
mesmíssimos comportamentos e atitudes, as mesmas religiões… e até o mesmo
padrão manipulável de bancos!...
Trouxe
por isso o mesmo tipo de vícios da sociedade portuguesa que conduzem
à “absolvição permanente” dos poderosos prevaricadores e os encargos
permanentes sobre o resto da sociedade, incluindo sobre uma classe média que,
para se estabilizar minimamente, tende a acatar passivamente as
mesmas “regras do jogo” da formatação oligárquica!
Os
grupos oligárquicos sofrem pois um duplo, ou triplo processo de assimilação,
moldados por caracteres exógenos que se impõem para dentro da sociedade, com
maior ou menor evidência, mas se impõem, muito para além dos vínculos!
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– Uma sociedade nesses termos, estabelece-se em todos os circuitos de vida do
país e muito sensivelmente na saúde, na educação, na juventude e até nos
desportos…
As
estratificações sociais reflectem-se desde os processos de encaminhamento das
crianças para as escolas (de acordo com a sua origem de classe), até ao tipo de
conteúdos escolares, à ausência de homogeneidade pedagógica,
à “gangrena” que se instala à medida que os polvos se assumem com
toda a sua arrogância e decrepitude capitalista, mercenária e anti-patriótica!
A “economia
de mercado” nesses termos provoca um encadeado de implicações que são
manipulações de tentaculares procedimentos que derivam da actuação desse padrão
de grupos oligárquicos “standardizados”, que ao beneficiarem de “mãos
livres”, são capazes até de lançar determinismos na gestação de multidões
amorfas, indiferentes aos prejuízos que recaem sobre a qualidade do ensino e da
formação humana de seus próprios filhos!
As
intenções justas do estado, de servir o povo angolano, podem assim estar
comprometidas e subvertidas nos termos duma qualidade que é alvo de
manipulações e enredos que o ultrapassam, por que muitos dos seus funcionários
se habituaram ao seu “sorvedouro” e a tão decrépitas quão corrosivas
práticas no seu entorno até ao estágio do “apartheid social”!
A
ausência de qualidade pode constatar-se em muitos dos conteúdos escolares e
particularmente nos que se referem à história de Angola, no que toca por
exemplo à saga do movimento de libertação e à sua justa luta contra o
colonialismo, o “apartheid” e contra as suas sequelas!
O
movimento de libertação em África foi uma vasta e multifacetada epopeia, tem
profundas raízes históricas, foi legítimo, em nada tem a ver, muito pelo
contrário, com processos de assimilação, não foi neutro, distanciou-se de
etno-nacionalismos, assumiu o carácter anti imperialista e não tem que
ser “lavado” por distorções segundo os óculos de projectos
oligárquicos que têm interesse e conveniência próprios, que são capazes de
recorrer a conceitos religiosos e se estão a tornar “teúdos e
manteúdos” até ao “apartheid social”!
Termo
algum, ou figura histórica alguma, pode por exemplo “lavar” as épocas
da escravatura e do colonialismo, nas suas mais heterogéneas implicações,
abordagens antropológicas, históricas, psicológicas e sociológicas!
Quando
o movimento de libertação ganhou corpo de MPLA em Angola, foi com todas as
sensibilidades humanas postas na identidade total para com o povo angolano e em
benefício de todo o povo angolano (nunca de algum grupo em especial), “de
Cabinda ao Cunene e do mar ao leste” e é evidente que essa gesta não podia
assumir qualquer espécie de “neutralidade”, a“neutralidade” que só
favorece o carácter de assimilação deste modelo inquinado de globalização que
cada vez mais se nos apresenta e se vai vincando num estado cada vez mais
amorfo, cujos caboucos foram os antigos combatentes e veteranos da pátria, os
ainda vivos e os mortos, que com tanto vigor, apesar de enfrentar tantos
obstáculos, riscos e sacrifícios, erigiram!
Ensinar
e formar gerações e gerações de jovens nos termos correntes de acordo com os
conteúdos que actualmente se nos apresentam, é quantas vezes iludir os
critérios de construção objectiva, rigorosa e exigente do próprio futuro, o que
contraria aliás os termos com que se ergueu o próprio estado angolano num
recente passado forjado no âmbito do movimento de libertação!
Por
conseguinte e dessa maneira a qualidade torna-se abaixo de zero, quando a
subversão da própria história se assume com tanta ligeireza, diversionismo e, sem
sombras para mais qualquer dúvida, tripla assimilação!
Foto:
uma escola primária angolana
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