terça-feira, 31 de março de 2015

LANÇADA CAMPANHA INTERNACIONAL A FAVOR DE RAFAEL MARQUES




Organizações de defesa dos Direitos Humanos pedem a anulação das acusações contra o jornalista, cujo julgamento foi suspenso e prossegue no dia 23 de Abril

O Comité para a Protecção dos Jornalistas (CPJ), uma organização americana de defesa da liberdade de imprensa sediada em Nova Iorque (Estados Unidos), apelou às autoridades angolanas para o abandono das acusações contra o jornalista processado em 24 casos de difamação.

Segundo o CPJ, o jornalista Rafael Marques de Morais foi notificado Terça-feira, durante a sua comparência em tribunal, de 15 novas acusações de difamação, elevando para 24 as acusações até aqui formuladas contra ele.

A coordenadora do programa África do CPJ, Sue Valentine, considera que as autoridades angolanas desejam quebrar a resistência e dissuadir Marques de Morais de produzir relatórios críticos, mantendo-o nos procedimentos judiciais que duram há mais de dois anos.

“Exortamos as autoridades angolanas a abandonar as acusações e encetar um processo de reforma da sua legislação ultrapassada sobre difamação”, defendeu.

Marques de Morais incorre numa pena de 14 anos de prisão, se, no termo do seu julgamento, for reconhecido culpado das acusações.

Em causa, está o livro do jornalista Rafael Marques, intitulado “Diamantes de Sangue: Corrupção e Tortura em Angola”, que denuncia alegados homicídios e outras violações graves dos Direitos Humanos nas províncias das lundas, envolvendo empresas diamantíferas.

A partir de Portugal, a secção local da Amnistia Internacional (AI) lançou uma campanha a pedir que se retirem as acusações contra o jornalista e investigador angolano que é indiciado por sete generais e por duas empresas diamantíferas de ter cometido alegados crimes de difamação, calúnia a atentado ao bom nome.

A petição foi enviada ao primeiroministro português, Passos Coelho e ao ministro dos Negócios Estrangeiros, Rui Machete, na qual a AI pede que os governantes lusos “encorajem” o Governo de Angola a retirar as acusações, por considerar que Rafael Marques “está a ser alvo de perseguição por exercer o seu direito à liberdade de expressão protegido pelo direito internacional”.

A acção é concertada com a AI nos Estados Unidos, onde petição idêntica será enviada ao secretário de Estado, John Kerry, e no Brasil.

Três dezenas de organizações cívicas manifestaram igualmente, em carta aberta, a sua preocupação com a possibilidade de o activista “não ter um julgamento justo”.

A carta tem entre os signatários responsáveis de ramos da Amnistia e de organizações como a Transparency International, o Comité para a Protecção dos Jornalistas, o Centro Robert F. Kennedy para a Justiça e Direitos Humanos, a União dos Advogados Pan-Africanos e a organização não-governamental angolana Omunga.

Outras 17 organizações defensoras dos Direitos Humanos são também citadas pela imprensa como se tendo aliado à luta de Rafael Marques contra o Governo angolano, endereçando uma carta à União Africana e às Nações Unidas a pedir atenção para o caso. Entre elas, destaca-se a Federação Internacional dos Direitos Humanos, a Freedom House, a Associação Omunga e a Transparência Internacional que dirigiram uma carta aos relatores especiais da Comissão Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e à Organização das Nações Unidas (ONU).

No documento intitulado “Um apelo urgente sobre o processo contra Rafael Marques”, as 17 organizações mostraram-se bastante preocupadas com o processo em curso contra o jornalista, mas também pela forma como as autoridades angolanas têm supostamente ignorado o papel dos defensores dos Direitos Humanos.

O coordenador da Associação Omunga, José Patrocínio, uma das subscritoras da carta, é citado como tendo declarado que “uma das questões muito preocupantes é, de facto, Angola ainda não reconhecer de forma concreta e formal nem as associações de defesa dos Direitos Humanos nem os próprios activistas”.

Para José Patrocínio, “isto causa uma série de embaraços, uma série de problemas, ameaças e insegurança. Mesmo que uma pessoa apresente uma queixa gravíssima como aquela, se por acaso não apresentar provas – e não estamos aqui a reflectir se Rafael Marques conseguiu ou não apresentar as provas – a Procuradoria, atendendo à gravidade das denúncias, com o papel de defesa dos Direitos Humanos dos angolanos, deveria avançar o processo”.

Ele afirmou que este processo pode querer limitar todas as acções investigativas dos defensores dos Direitos Humanos em Angola.

“Por isso, nós subscrevemos esta carta conjuntamente com 16 organizações internacionais no sentido de que seja recomendado ao Estado angolano que reconheça esses direitos fundamentais e o seu papel importante”, disse.

José Patrocínio defende que “Angola deve reconhecer que Rafael Marques exerceu esses direitos enquanto defensor e jornalista no sentido de se investigar acusações muito graves. A Procuradoria deveria ter alguma precaução na protecção de Rafael Marques e ao mesmo tempo avançar uma investigação no sentido de saber se aquele fumo tem ou não fogo concreto”.

De acordo com o responsável da OMUNGA, a carta assinada pelas 17 organizações internacionais “vai obrigar o relator a entrar em contacto com as instituições angolanas no sentido de se poderem chegar a recomendações”, explica.

“Podem inclusivamente escrever ao Presidente da República, mas será dentro de um processo diplomático, no sentido de também ouvir a outra parte e depois fazerem recomendações”, concluiu.

O Observatório para a Protecção dos Defensores dos Direitos Humanos – programa conjunto da Federação Internacional das Ligas dos Direitos do Homem e da Organização Mundial Contra a Tortura, também diz estar preocupado com o julgamento, afirmando que “Rafael Marques estava já na mira das autoridades há vários anos e que este julgamento “é apenas mais uma demonstração da determinação do regime em colocar obstáculos à sua liberdade de expressão”.

Os sete generais, em conjunto com a Sociedade Mineira do Cuango, são citados como estando a exigir uma indemnização de mais de um milhão de dólares americanos ao jornalista e ativista Rafael Marques.

Os mesmos generais tinham apresentado em Portugal, em 2012, uma queixa-crime contra o jornalista, mas o processo foi arquivado.

Os queixosos, segundo a imprensa lusa, são os generais Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, Carlos Alberto Hendrick Vaal da Silva, Adriano Makevela Mackenzie, João Baptista de Matos, Armando da Cruz Neto, Luís Pereira Faceira e António Emílio Faceira.

O País (ao)

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