terça-feira, 7 de abril de 2015

Portugal. O SEGREDO FISCAL NÃO DEVIA ACABAR DE VEZ?



Pedro Tadeu – Diário de Notícias, opinião

Acabou de sair o almanaque fiscal de 2015. Através desse documento, emitido pelos serviços fiscais desde 1903, o cidadão fica a conhecer quais são os rendimentos das outras pessoas. Para isso basta ir a um site (taxeringskalender.com) preencher um formulário com nove perguntas de identificação, pagar 29 euros pela entrega em casa e já está.

No dito site o governo explica a utilidade deste almanaque: "você quer saber como o vizinho pode pagar um Porsche?", ou "quer comparar o seu salário com o dos colegas ou com o do patrão?" ou, ainda, "será que corre o risco de não ser pago" pela pessoa ou empresa com que está a fazer negócios?

Não é uma lista VIP nem uma base de dados secreta que, afinal, mais de 11 mil pessoas consultam. É uma rotina num país com um dos mais baixos índices de corrupção no mundo, quase sem economia paralela e no top 10 da lista das economias mais competitivas. Chama-se Suécia, não é uma República Popular, é uma monarquia constitucional defensora das liberdades individuais ocidentais.

Em Portugal houve uma tentativa no Parlamento para acabar com o sigilo fiscal mas foi rapidamente abafada pelos beneficiários do regime, que transformaram a ideia numa suposta ameaça à privacidade e num falso problema de segurança (já agora, a Suécia tem baixíssimos índices de criminalidade).

Na discussão recente sobre a lista VIP, antes que alguém viesse com "ideias perigosas", o fantasma da violação dos direitos das pessoas foi logo agitado. Acontece que a transparência da informação sobre a divisão da riqueza é um bem social de enorme importância. A riqueza é finita e a forma como ela se distribui no mundo, no país, na cidade, não é um problema individual, é de todos.

Outro assunto é saber como cada um gasta o dinheiro que obteve: se um rico faz obras caridosas ou compra uma coleção de automóveis é coisa de âmbito estritamente pessoal. Aí sim, deveria ser garantido o sigilo mas os Estados, ao generalizarem massivamente a faturação informatizada com os números de contribuintes dos consumidores - quando, para evitar a fuga fiscal, bastaria a identificação fiscal dos vendedores - estão a documentar, passo a passo, a vida pessoal, diária, hora a hora, dos indivíduos. Isto é pura violação da vida privada.... Ninguém se rala!

Moralmente, acusam os poucos defensores do fim do sigilo fiscal de "invejosos dos ricos" mas, na verdade, a manutenção deste status quo é que é imoral pois ilude toda a sociedade sobre o grau de justiça social prevalecente e facilita a vida aos criminosos: quantos escândalos financeiros, que custaram milhares de milhão ao país, teríamos evitado nos últimos 10 anos se não houvesse segredo fiscal?

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