domingo, 31 de maio de 2015

Angola. HOUVE GENOCÍDIO NO MONTE SUMI. ESTÃO IDENTIFICADOS OS MANDANTES



William Tonet, no Huambo - Folha 8 digital (ao) - 30 maio 2015

O massacre protagonizado pelas forças militares e policiais, no dia 16 de Abril, no Monte Sumi, no Huambo, terá nesta entrevista a visão de um membro de uma ONG de Direitos Humanos, que mais tem trabalhado para apurar dados e localizar os sobreviventes, Ângelo Kapwacha vai trazer uma imagem muito próxima deste fenómeno, Kalupeteka, pois ele está no terreno e tem sentido os gemeres e clamor das vítimas.

FOLHA 8 – O que se passou de concre­to, no Monte Sumi?

Angelo Kap­wacha – No dia 16 de Abril de 2015, pelas 14 horas, a Polícia Nacional coligada com as Forças Armadas foi atacar o Acampamento da Igreja Adventista do 7º Dia-Luz do Mundo fundada em 2002 pelo Pastor José Juli­no Kalupeteka, dissidente da Igreja Adventista do 7º Dia. O ataque fora or­denada pelo governador provincial do Huambo, o General Kundi Payhama segundo as suas próprias afirmações prestada aos deputados da Coligação CASA-CE aos 28 de Abril de 2015 segundo as quais: “eu ordenei a tropa para cercar a montanha e agir”. Este ataque que resultou na morte massiva de milhares de fiéis da Igreja Adventis­ta do 7º DiaLuz do Mundo fora igualmente endossada (autorizada) pelo próprio Presidente da República que através do seu discur­so do dia 20 de Abril de 2015, o Presidente dizia: “a seita religiosa denominada ‘A luz do Mundo’ formu­lou a sua própria doutrina com base no fanatismo religioso, no ódio em vez do amor ao próximo, na di­visão e na mentira, com o propósito de não respeitar a autoridade do Estado e de promover a anarquia. Essa doutrina fomenta a desin­tegração da sociedade e a separação das famílias, es­timula o pecado e é contra os valores, os princípios morais e cívicos e os usos e costumes do povo ango­lano Dizem também que as famílias devem vender os seus bens, em particular as suas casas, abandonar as aldeias e vilas e viver nas montanhas e florestas… a acção dos órgãos de De­fesa, Segurança e Ordem Interna vai continuar com o mesmo vigor para des­mantelar completamente essa seita…” com este dis­curso que nada contém de conciliação e pacificação, o Presidente autorizou a di­zimar os fieis porque disse claramente em seu discur­so que “a acção dos órgãos de Defesa, Segurança e Or­dem Interna vai continuar com o mesmo vigor para desmantelar completa­mente essa seita…!”

Assim, a montanha do Sumi, entra na História de Angola pós-independên­cia como o único lugar onde, pela primeira vez, o Governo massacrou massivamente um novo tipo de inimigo: o Povo de Deus. Nunca, na história de Angola, na era colonial (500 anos de colonização) houve confronto entre o Estado e algum grupo étnico-religioso com consequência de milhares de mortos, sem funerais pú­blicos e saque de seus bens e perseguições de sobrevi­ventes. Por isso, a História do Sumi considera-se, um genocídio étnico-religioso sem precedente.

F8 – Porque diz tratar-se de genocídio?

AK - Dissemos que se tra­ta de genocídio étnico-re­ligioso porque dos dados apurados até ao momento revela que 95 a 100% dos crentes massacrados são de etnia Ovimbundu resi­dentes em Luanda, Kwan­za-Sul, Benguela, Huambo, Bié, Huila, Kuando-Kuban­go a julgar pelos apelidos o que caracteriza este ge­nocídio como guerra tri­bal contra os Ovimbundu. Também a Igreja liderada pelo pastor José Julino Ka­lupeteka fora rotulada pelo Governo através da pro­paganda da TPA e RNA ser uma Igreja Tribal por proferir sermões em Lín­gua Nacional Umbundu, língua mais falada em An­gola a seguir a Língua Por­tuguesa, por isso, reforça a tese de este massacre ter carácter de Genocídio tri­bal contra os Ovimbundu identificados numa Igreja o que se qualifica como genocídio étnico-religiosa e ao ser ligado ao partido UNITA acaba por ter o pendor étnico, religioso e politico partidário. Assim, então fica claro a premedi­tação de destruir um grupo étnico religioso por ser co­notado com um partido da oposição.

F8 - Porquê essa convic­ção?

AK – Porque as mortes in­discriminadas, as buscas e execuções extrajudiciais subsequentes, a denegação de atendimento médico e medicamentoso dos feri­dos, a denegação de funerais culturalmente dignos aos mortos civis, a denega­ção de acesso ao local para os activistas de direitos hu­manos e jornalistas inde­pendentes e entidades in­ternacionais violam todos os preceitos legais internos e internacionais, o que re­tira do Estado Angolano a valorização do primado da lei, dando lugar ao primado da força, destruindo os ali­cerces do Estado de Direi­to e Democrático.

F8 - Quais as razões de se atacar, a integridade mo­ral da congregação reli­giosa de Kalupeteka?

AK - Logicamente não há nenhuma razão. Mas o Go­verno de Angola encontra razão para tudo. Onde não há problema ele (Gover­no) arranja problemas e injecta lá e depois encontra fórmula de evidenciar tais problemas e imputar, por meio da manipulação culpa aos inocentes para fazer valer o seu ponto de vista. A igreja do Pastor Kalupeteka, à semelhança de outras tantas igrejas, ela era dotada de sua identi­dade doutrinária, tem suas práticas, suas ideias e suas crenças como idiossincrasia normal de instituições religiosas, por isso em ne­nhum momento poderiam ser atacados e mortos de forma inaceitável como foram massacrados os seus crentes. Por outro lado o Estado Angolano ao atacar de forma inaceitável a po­pulação civil de uma Igreja viola o artigo 18.º do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos da ONU que citamos:

§1. Toda pessoa terá direito à liberdade de pensamen­to, de consciência e de religião. Esses direito im­plicará a liberdade de Ter ou adotar uma religião ou crença de sua escolha e a liberdade de professar sua religião ou crença, indivi­dual ou coletivamente, tan­to pública como privada­mente, por meio do culto, da celebração de ritos, de práticas e do ensino.

§2. Ninguém poderá ser submetido a medidas coercivas que possam restrin­gir sua liberdade de Ter ou de adotar uma religião ou crença de sua escolha.

§3. A liberdade de mani­festar a própria religião ou crença estará sujeita a pe­nas às limitações previstas em lei e que se façam ne­cessárias para proteger a segurança, a ordem, a saú­de ou a moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas.

§4. Os Estados-partes no presente Pacto compro­metem-se a respeitar a li­berdade dos pais - e, quan­do for o caso, dos tutores legais – de assegurar aos filhos a educação religiosa e moral que esteja de acor­do com suas próprias con­vicções.

Este Pacto Internacional dos Direitos Civis e Polí­ticos fora ractificado por Angola em Abril de 1992 tempo a partir do qual, este instrumento jurídico inter­nacional entra no ordenamento jurídico angolano como parte normativa in­terna e a sua violação tem equivalência a violação tipificada como genocídio de qualquer lei angolana. Assim o próprio Executivo e o seu Titular, cumulati­vamente, ferem os bens jurídicos protegidos pelas instituições supraestaduais como a ONU. O Governo ao atacar a Igreja Adventis­ta do 7º Dia Luz do Mundo viola gravemente a Cons­tituição de Angola, sobre­tudo o seu artigo 41º que citamos:

(Liberdade de consciência, de religião e de culto)

1. A liberdade de consciên­cia, de crença religiosa e de culto é inviolável.

2. Ninguém pode ser priva­do dos seus direitos, perse­guido ou isento de obriga­ções por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política.

3. É garantido o direito à objecção de consciência, nos termos da lei.

4. Ninguém pode ser ques­tionado por qualquer au­toridade acerca das suas convicções ou práticas re­ligiosas, salvo para recolha de dados estatísticos não individualmente identificá­veis.

F8 - Era uma congrega­çãoo com aceitaçãoo só na classe baixa?

AK - Do ponto de vista de mobilização a Igreja Ad­ventista do 7º Dia – Luz do Mundo não pregava para classes sociais específicas. Evidentemente que pregar para as classes médias e as classes altas tem maior exigência em termos de persuasão. Existiam muitas pessoas letradas a nível da Igreja do Pastor kalupeteka. A sua linha doutrinária era admirada por outros pas­tores intelectuais e conhe­ço sociólogos que se de­dicaram a estudar a linha de valores daquela Igreja como uma micro-refor­ma teológico-doutrinária que estava a marcar uma ruptura entre a doutrina deísta baseada no Antigo Testamento sobretudo no Pentateuco com enfase nos 10 Mandamentos, que é a base fundamental da Igre­ja Adventista do 7º Dia. O pastor kalupteca introdu­ziu inovações teológico­-doutrinárias que merecem atenção de teólogos e so­ciologos por isso podemos encontrar profundidade na sua pregação e não era ne­nhuma pregação enganosa e de baixo teor qualitativo. Do ponto de vista metodo­logico, o pastor José Julino Kalupeteka, se inspirava no método peripatético (peripato) usado por Jesus Cristo, pregando para as pessoas ao ar livre e ser seguido aonde vai. Mesmo estarem desapegados dos bens materiais como casas, riquezas era a própria dou­trina de Jesus Cristo pregar. A classe baixa, no geral tem mais fé em Deus do que as classes altas. Todos sabe­mos que os grandes ricos e as classes média e altas têm muito pouca fé. É raro encontrar nas igrejas, os professores universitários, os cientistas, os grandes políticos serem altamente dedicados a Deus, mas os pobres, os menos escola­rizados, as zonas rurais, usam parte de seu tempo dedicado ao Divino.

F8 - Havia escolas nas sanzalas onde saíram os seus seguidores?

AK - Começaria por dizer que, o Acampamento da Igreja Adventista do 7º Dia­-Luz do Mundo, se instalou na Montanha do Sumy em 2007. Portanto desde que se instalou lá, já passam muitos anos. O Governo não construiu nenhuma escola no monte Sumy que tenha sido abandonada pe­las crianças dos crentes. O Governo não construiu nenhuma infraestrutura sanitária no Monte Sumy nem água nem luz electrica mas o Governo sabia que lá viviam mais de 5 000 cren­tes numa migração sazonal quase permanente.

Nos últimos meses, a geo­grafia de origem da Igreja Adventista do 7º Dia - Luz do Mundo era variada. Os seguidores do Pastor José Julino Kalupeteka vinham de Luanda principalmente Cacuaco, Viana, Estalagem, Quicolo, Funda, Quilunda, Caope, Benfica, Morro­-Bento e São-Pedro da Barra. De Benguela vinham principalmente do Lobito, Balombo, Ganda, Cubal, Caimbambo. Vinham mui­tos do Bié sobretudo Chin­guar, Cunhinga, Cuito e do Cuando-Cubango sobretu­do Chitembo, Menongue, Cuchi. No Huambo eram maioritariamente da Ci­dade do Huambo, Caala, Ekunha, Bailundo, Lon­duimbali etc. da Huila vi­nham de Matala, Caconda, Kalukembe, Chipindo, Ku­vango etc. do Kwanza-Sul vinham dos Seles, Kasson­gue, Quibala, Waku-Kun­go, Sumbe. Podemos de­terminar que em todas as localidades de onde os se­guidores vinham, pode se imaginar que teria havido falência do Estado, quanto a eficácia das escolas, pois muitas crianças, mesmo, na zona do palácio presi­dencial não conseguem estudar.

F8 – Como assim?

AK – Vou só dar-lhe um exemplo. Na zona do palá­cio, em Luanda, uma escola histórica, o Executivo man­dou destruir, para lá erguer um grande prédio do Ban­co BESA, que arruinou a economia angolana, por­tanto um banco conotado com a corrupção.

F8 - O que faz um popular sair da sua sanzala para abraçar uma causa reli­giosa no mato?

AK - Primeiro digo que, a ideia de que a montanha do Sumy é mato profun­do, é uma criação pro­pagandística do Governo preconceituoso depois de massacrar os crentes da Igreja Adventista do 7º Dia-Luz do Mundo. Para o beneficio dos que não conhecem o Huambo, a montanha do Sumy fica a 30 minutos da cidade do Huambo. Se encontra no foral do municipio da Caála nas coordenadas geográficas e cartográficas de latitude 12º51’9 Sul e de Longitude 15º33’38 Este. Estando no aeroporto do Huambo, a montanha do Sumy aparece na posição sudoeste numa distância de sensivelmente 30 quiló­metro do centro da cidade por via Ngongowinga. É uma montanha cercada de dezenas de aldeias com destaque para a aldeia do quilómetro 25, justamente, por distar à 25 quilometros a contar da sede municipal da Caála numa linha recta na estrada que liga Huam­bo à Huíla por via Caconda e Caluquembe. Por exem­plo a barragem do Ngove fica muito mais distante da cidade do Huambo (93 km) ao passo que a montanha do Sumy fica a 32 Kilome­tro passando do Huambo directamente para o Sumy sem escalar Caála. Porém por via da Caála o Sumy fica há 48 kilometro. E pelo facto de a estrada estar bem reparada, faz-se de carro 20 há 25 minutos essa distância é mais ou menos do 1º de Maio em Luanda, até Viana (Vila). Será que uma distância da Sagra­da Familia em Luanda até Cacuaco cria um mito de selvajaria? Claro que só na base de propaganda políti­ca própria do Governo an­golano do MPLA!

F8 – Explique-se melhor...

AK - As pessoas que têm um compromisso com Deus, possuem uma fé inabalável. E encontram o lar onde encontram Deus. O desapego, a pastoral da pobreza voluntária, o sa­crificio em busca da “vida eterna” supera os bens passageiros. As popula­ções que abraçaram a fé da Igreja Adventista do 7º Dia –Luz do Mundo incar­naram a Palavra, percebe­ram a Mensagem e aban­donaram tudo para seguir Jesus Cristo. Visto de fora pode parecer “absurdo” e incompreensivel, aos olhos dos descrentes, por isso é encarado como um fanatismo insensato. Mas é a lógica da fé e não pode ser entendido numa pers­pectiva humana e material desgarrada das virtudes es­catológicas.

F8 - Podemos falar de falência do Estado? Ou as pessoas deixaram de acreditar nele?

AK - O adágio diz que “não há fumo sem fogo”. To­dos os acontecimentos do mundo não surgiram como fruto do acaso, ou predis­posição dos loucos. A hu­manidade, por mais que sejamos indiferentes a isto, está constituída por várias classes, extratos e rela­ções desiguais e interde­pendentes. Essas relações se constroem mediante expectativas das classes dependentes em relação à boa-fé, honestidade e jus­tiça das classes decisoras. Se essas expectativas fo­rem defraudadas, surgem tensões entre os grupos de vários níveis. A relação entre as classes governan­tes e as populações têm características de relações ‘supersticiosas’, onde os di­rigentes, os governantes e os detentores de poder são as referências sociais para a segurança dos agregados humanos mais vulneráveis. Essas referências sobre­vivem à virtude, à crença na perfeição e na infalibi­lidade humana dos chefes, bastando a boa-fé, vontade e motivação.

O surgimento de muitas religiões em Angola pode ser enquadrada numa cor­relação causa-efeito em re­lação ao fenómeno de má e mal governação do Estado sustentado pelo MPLA. Antropológica e sociolo­gicamente o Homem e mulher tendem a buscar soluções no universo ima­ginário e transcendente de forma desesperada como resposta a degenerescên­cia e crise de representa­tividade político-temporal. Para além da corrupção en­démica, da sufocação das liberdades fundamentais dos cidadãos, o Governo angolano tem na ineficácia e ineficiência governativa como sua marca, assim os cidadãos dentro da sua liberdade natural buscam o Divino e as alternativas temporais como escapa­tória, como ruptura com o Estado irresponsável. Por esta razão de um tem­po a esta parte o Governo Angolano perdeu quase totalmente a credibilida­de e a autoridade. Assim, os cidadãos começam a inventar as formas de au­togovernar-se e por perder credibilidade e autoridade o Governo recorre à for­ça, a repressão, a coerção como forma desespera­da de recuperar o crédito perdido. Como é óbvio, no meio de turbulência social surgem líderes carismáti­cos que tentam conduzir o povo para fora da opres­são. Num Governo falido como o “nosso” os caris­máticos pastores conse­guem encontrar “ovelhas” que buscam novas e ver­dejantes pastagens, os po­líticos visionários podem colher também adeptos a seus programas futuristas e visivelmente alternativas felizes.

O Estado angolano clama por uma reforma geral e todos nós somos convi­dados a contribuir com o nosso máximo potencial mesmo que nós, cegos pela soberba, nos matem como animais, ainda assim é o nosso dever morrendo tentando salvar o Estado­-Nação e o Solo— Pátrio. O Nosso Governo que sustenta o Estado está num nível de deterioração de relações com o povo, numa depuração moral e sem mais sentido humanís­tico de relações societais a isto a Ciência Política cha­ma Estado da Natureza ou Estado Selvagem porque a Ciência Política ensina que na selva só a força oferece poder e autoridade ao Leão. O Governo que com sua força leonina esmaga todos os pequenos como o Leão que devora as pequenas lebres na floresta, perdeu moral, perdeu noção da lei personalista perdeu a força da razão e deu aval a razão da força. O nosso Governo habituou-nos a governar com armas de fogo e nunca com as leis, com o cérebro e a alma racional. O povo igualmente vive apenas com a sua alma vegetativa no lugar de alma racional. Assim, chega-se num Es­tado onde todos cumprem as suas funções vegetativo­-biológicas no lugar de serem gregários entes da história. É o Governo que nos arrasta para essa dete­rioração moral e social.

F8 - Kalupeteka tinha ca­risma?

AK - Antes de analisarmos o carisma da figura e pes­soa do José Julino Kalupe­teka, de quem eu nunca tive aproximação pessoal, porque fui educado como Católico e nós os Católicos não temos muitas afinida­des religiosas com os Ad­ventistas do 7º Dia. Aliás, temos pontos de vistas teologico—doutrinários opostos; e vou evidenciar aqui a linha teológico-dou­trinária da Igreja Adven­tista do 7º Dia. Me explico: do ponto de vista teológico-doutrinária, a Igreja Adventista do 7º Dia, é Adventista de “Advento” porque acreditam que o Messias, Redentor da Humanidade que os pro­fetas, quer maiores quer menores anunciaram ao longo do Antigo Testa­mento, ainda não veio e está para chegar em bre­ve. Portanto esta Igreja se enquadra nas outras igre­jas Deístas, isto é, aquelas que acreditam na exis­tência de Deus, mas não aceitam em Jesus Cristo como Salvador da Humanidade, por isso não celebram nem o Natal de Nascimento de Jesus Cristo nem outras festas Cristãs, nem celebram a Páscoa de Ressurreição. Fundamentam a sua doutrina no Decálogo, ou seja nos 10 Mandamentos da Lei de Deus, e a base de sua doutrina é o Antigo Testa­mento; o 7º Dia fá-lo em memória do dia em que de acordo com o 1º Livro da Bíblia Sagrada, o Gene­sis, Deus criou o Mundo em 6 dias, porém no 7º dia Descansou. Os 10 Man­damentos recomendam guardar rigorosamente o 7º Dia como Único Dia de Adoração em oposição ra­dical às Igrejas Cristãs que acredita na Existência de Deus e acreditam em Je­sus Cristo como Salvador, adoram aos domingos do Latim “Domini Dei” Dia do Senhor (1º dia da semana em que Jesus Cristo res­suscitou dentre os mortos) por isso, são Cristãos e seu “regime” teológico é o Cristianismo cujo caminho escatológico passa por Je­sus Cristo “…Ninguém vai ao Pai senão por mim…” e interpretam de forma holística a missão Salvífica da Humanidade através do sofrimento e morte de Jesus Cristo na cruz tendo ressuscitado no 3º dia se­gundo as escrituras.

Daqui podemos ver onde enquadrar o pastor José Kalupeteka: o senhor José Julino Kalupeteka conquis­tou a devoção pessoal dos súbditos à causa de uma fé inabalável e pela confiança na sua pessoa, na medida em que se singulariza por qualidades prodigiosas, pelo heroísmo ou por ou­tras qualidades exempla­res que fez dele um chefe fundador daquela Igreja depois de ser humilhado na Igreja Adventista do 7º Dia-Luz do Mundo, da qual fora expulso como herege. A emergência retumbante do José Julino Kalupeteka, homem que não frequen­tou a universidade nem ensino médio nem bási­co, não viajara para países ilustres, podemos aceitar no seu poder carismáti­co, que o Profeta exerce sobre milhares de seus seguidores, no seu maior carisma influenciou os comportamentos das pes­soas induzindo obediên­cia, seguimento e entrega até a Montanha do Sumy abandonando por exemplo Luanda, Benguela, Huam­bo os famosos centros “metropolitanos” como se auto arrogam. Abandona­ram o luxo das “novelas da TV Record e da Globo bem como a luxuria e li­bertinagem urbana e se recolheram no silêncio das árvores para ouvirem a voz de Deus que os chamam segundo apelara o Profeta aos seus sequazes. A his­tória conheceu líderes que pela sua capacidade pes­soal de mobilizar estimula­ram paixões, consentindo os maiores dos sacrifícios e dificuldades que uma pessoa era capaz de suportar.

O inenarrável Pastor José Julino Kalupeteka, semi­-analfabeto, comunicador nato, mobilizador apaixo­nado, maravilhoso cantor gospel, funda a sua Igreja Adventista do 7º Dia-Luz do Mundo, como respos­ta ao afastamento da sua Igreja-Mãe, a Adventista do 7º Dia. Para conseguir captar igualmente as pai­xões dos seguidores, in­troduz uma suave reforma da essência da Igreja Ad­ventista Clássica, para ser transformada em Igreja Cristã, reconhecendo Jesus Cristo como Salvador que já remira a humanidade de seus pecados, aguardando apenas a sua Segunda Vin­da Gloriosa sob as nuvens. E que a Igreja do Pastor Kalupeteka introduz uma implícita reconciliação teológico-doutrinária entre todas as Igrejas cristãs de radicalmente Deísta pas­sando para adoração a San­tíssima Trindade típica do Cristianismo. O que veio a ameaçar seriamente a identidade radical de todos os adventistas clássicos do mundo, por isso considera­-se LUZ DO MUNDO ou seja iluminar todos os Ad­ventistas do 7º Dia espa­lhados pelo mundo afora, a reconhecer Cristo como Salvador da Humanida­de. Aí foi considerado he­rege, blasfema e a Igreja Mãe lança uma destrutiva campanha de diabolização do filho e sua inovação. Essa diabolização se caracterizou pela difamação, calúnia, injúria, estigmati­zação, rotulagem de todos os vícios e desprezando o seu culto religioso apenas como um ritual de supers­tição e feiticismo sem va­lor teológico. Assim, a pri­meira machadada contra a Igreja Adventista do 7º Dia­-Luz do Mundo é lançada pela sua Mãe (Adventista do 7º Dia) que a vende ao Governo pelo lado malévo­lo até a Guerra do Sumi.

F8 - O que sabe sobre a forma como ele foi detido

AK - José Kalupeteka fora detido pelas Forças Arma­das Angolanas e entregue à polícia de Investigação Criminal. Da informação que tenho, José Kalupeteka foi apanhado na madruga­da do dia 17, pelas 3 horas juntamente com um dos seus filhos. Espancado, torturado mas não foi morto, o que provocou desenten­dimento entre as FAA que o capturaram e a Polícia Anti-Terror que o deseja­ram ardemente para o ma­tar. Ainda uma fonte das FAA confidenciou-me que a polícia flagelou com tiros as FAA para recuperar Kalupeteka porque tinha or­dens superiores de o matar tão logo fosse encontrado e que as FAA pelo con­trário tinham ordens de o prender e apresenta-lo às autoridades o que foi seguido. Quando denunciá­mos sobre a tortura a que Kalupeteka fora submetido e que não sobreviveria, o Governo administrou cui­dados de saúde indescrití­veis para vivificar Kalupe­teka e por esta via fazer da saúde do Pastor o trunfo da propaganda de benignida­de do Governo enquanto silenciosamente continua­va o mesmo Governo a perseguir e matar os se­guidores. Da conversa que tive com 4 dos seus filhos dentre os quais 3 maiores de idade e uma adolescen­te, nenhum dos filhos teve acesso à Comarca para vi­sitar o Pai como também nenhum dos seus parentes tem acesso a ele. Existem ou­tros dois senhores que no interesse de sua protecção não irei citar o grau de pa­rentesco, esses apanharam tiros da polícia, estão feri­dos e escondidos algures fazendo tratamento clan­destino e aguardam pelo julgamento a que Kalupe­teka será sujeito e quando conhecerem o veredicto final, irão revelar “coisas” a julgar pela forma que vier a ser fechado o dossier dos detidos na sequência do massacre do Sumy. Es­ses senhores chaves, com que temos tido contactos enquanto defensores de direitos humanos, pedire­mos asilo a alguns países e encontraremos formas de os encaminhar às insti­tuições que os ajudem a sair do País porque serão mortos se forem encontra­dos pela Polícia conforme está a ser feito com muitos outros refugiados encon­trados.

F8 - Na sua opinião o que se passou para a morte dos 9 polícias?

AK - Os agentes da Policia mortos a golpes de cata­nas foram-no pela fúria da população quando a polícia abriu fogo contra o povo. A polícia dispa­rou indiscriminadamente contra a população civil maioritariameente crian­ças, mulheres, idosos, de­ficientes, doentes que pro­curavam saúde pela ajuda divina. A polícia quando estava a disparar contra a população nem sequer ti­nham ideia clara que os 9 agentes (oficiais) tinham sido mortos. Apenas dis­pararam com a ideia de que os chefes foram fei­tos reféns pelos crentes e a guerra seria de resgatar os chefes. Começou às 14 horas e cessou mais ou menos às 20 horas, quando começaram a encontrar os corpos dos agentes da polícia caídos separadamente, misturados com milhares de corpos dos crentes.

Sobre a morte dos agentes da polícia existem outras versões que apontam para “a teoria da conspiração” sobre um erro táctico in­duzido, sacrificando os agentes para que o álibi justificasse a dizimação dos crentes da igreja. Se atendermos a esta linha de pensamento, podemos acreditar que sim, uma vez que todos os que têm rudi­mentos minimos de conhecimento sobre buscas e re­vistas, nunca os agentes da polícia bem treinados, tentariam algemar um líder do tamanho do Kalupeteka no meio de mais de 5000 crentes à espera que ficas­sem em silêncio impávidos e serenos a ver o seu líder a ser arrastado, vergastado e atirado no carro-celular dos anti—motins. O erro táctico era premeditado para sacrificar os agen­tes secundários da polícia e por esta via justificar o massacre que veio a pôr fim à Igreja indesejada pelo Go­verno. Não existe nenhu­ma estratégia militar, tática militar e operação militar que tolere a imprudência que houve e que acabou vitimando os 9 agentes. Só tem que se explicar por via de erro metódico previa­mente bem desenhado. E não teremos muitas dúvi­das se viermos a confirmar que nenhum fiel da Igreja empunhou alguma “moca” ou catana ou enxada con­tra os agentes e que um ou outro grupo infiltrado que se fez passar por fieis da Igreja poderem ter pro­tagonizado a acção. Mas o tempo irá confirmar ou negar essa “especulação” baseada nas fontes militares que se identificaram com essa missão, deveras tenebrosa no interesse da “Segurança de Estado”.

F8 - Como foi a reacção do governo?

AK - A primeira reação do Governo foi o próprio governador provincial do Huambo, Kundi Payhama que quando a guerra come­çou no Sumy ele já havia deixado tudo preparado e disse que estava fora do Huambo a viajar. Recebeu o telefonema de que havia sinais de agressão na Mon­tanha do Sumy e ele pes­soalmente deu ordem para cercar a montanha e ata­car. Quando o Presidente da República ficou actuali­zado do cenário, reforçou o massscre, ordenando no seu discurso de que “ deve­-se desmantelar totalmente a igreja e seus crentes”. O povo morto no Sumy fora abandonado pelo Estado, apenas ficou com Deus e tanto o Governo Provincial do Huambo como o Governo Central se con­centraram na vingança dos seus agentes mortos no local e construíram sinergias entre a Polícia Nacional e as Forças Ar­madas Angolanas e mas­sacraram o povo da forma mais triste em tempo de paz. Essa foi a reacção do Governo na parte operati­va. Na parte tática, houve instruções emanadas do Comando Geral da Polícia, na voz do 2º comandante geral Paulo de Almeida, de modificar totalmente os modos de operação e que doravante a Polícia terá no uso excessivo da forma a sua maior missão. Daquele momento para cá a polícia no Huambo se tornou tão feroz que armados de dia e de noite semeiam um cli­ma de terror. Os agentes reguladores de trânsito, a polícia da ordem pública são sempre guarnecidos pela Polícia anti-terror, no meio da cidade, dia e noi­te e nas zonas rurais. Nos controlos existem sempre polícia anti-terror armada. Significa que a polícia dei­xou de ser paramilitar e passou mesmo a militares altamente armados contra uma população civil. Sabe­mos que a propaganda do Governo de que no Sumy havia armas, trincheiras, bunkers não corresponde à verdade. É tudo mentira porque a tropa que esteve na acção de massacre não encontrou nenhuma arma pelo contrário a mesma tropa para matar os fiéis usou armas pesadas como PKM, por exemplo, e ca­tanas com que cortejaram os feridos encontrados e posterioremente foram queimados conforme as imagens e vídeos que te­mos recebido.

F8 - Acha que a Polícia e FAA usaram força desco­munal?

AK - Nos vídeos que temos vindo a citar aparecem po­lícias todos armados com AKM, PKM, correntes de munições, cartucheiras de granadas F-1. As FAA usa­ram o RPG-7, ZU, Morteiro 82 mm, morteiro 60mm, os helicópteros sobrevoaram a montanha tudo está sustentado pelas imagens que temos e os vídeos feitos pelos próprios militares e alguns fiéis das aldeias pe­riféricas corajosos como, por exemplo, São Pedro, Sumy, Kaluvyavili, etc.. Al­gumas pessoas depois de mortas foram queimadas com fogo por cima. Algu­mas pessoas encontradas nas cubatas feridas foram cortejados com catanas pelas FAA e Polícia Na­cional, os vídeos confirmam tudo isto. A Polícia e as FAA enfrentaram um povo que possuía catanas e en­xadas contra armamento pesadíssimo. Foram duas companhias da Polícia de Intervenção Rápida, duas unidades técnicas anti-distúrbio e uma antí-terror que mais tarde juntou-se a Brigada Motorizada. Pelo lado das FAA foram, pri­meiramente, dois camiões militares russos Kamazes com Comandos e mais tar­de outros 3 (Kamazes) jun­taram-se a mesma causa de esmagar a população civil.

As próprias autoridades pelo menos o Comandan­te Laborinho, secretário de Estado para o Interior afirmou categoricamente que o arsenal bélico que os fiéis da Igreja Adventista Luz do Mundo tinham se resumia em 3 armas; (um dos orientadores táticos do massacre), perguntado pelo jornalista ipsi verbis:

Jornalista -“Sr Laborinho, houve muito armamento por parte dos fieis da Igreja que massacrou os 9 oficiais da polícia e travou fogo du­rante mais de 3 horas?

Laborinho - “Sim, sim, hou­ve muito armamento sofis­ticado que permitiu a baixa da nossa parte!”

- Jornalista - Tem mais ou menos o número exacto de quantas armas em posse da população ligada àquela igreja?

Laborinho - “Houve 3 ar­mas AK-M... Mas temos certeza que iremos desco­brir mais armas”, sic.

F8 – Então o quadro é di­ferente?

AK - No interesse da ver­dade intelectual, quem tem rudimentos mínimos de guerra como o sr. Labo­rinho ou o Presidente da República ou um simples camponês das zonas rurais de Angola que tenha acima de 35 anos de idade, por­tanto, que viveu a guerra civil saberia que o carrega­dor normal de um AK-M leva 30 munições. E que a julgar pelo número fornecido pela alta patente do Interior, um dos chefes que executou o massacre sob as ordens do Presidente da República, 3 AK-M equi­valeriam a 90 munições no total. Se fosse carrega­dor de 40 munições (que também existe) seriam 120 munições. Se fosse de 75 (que existem em AK-M su­per) seriam 225 munições. O disparo em rajada geral­mente em 3 a 5 minutos o carregador de 75 munições estaria vazio e não em 4 ho­ras. Sendo remuniciado, nos minutos depois de es­vaziados, os tais atiradores religiosos seriam apanha­dos de imediato, porque lá não há nem trincheira, nem bunker, seriam dis­paros frente-a-frente. Para travar duas companhias da Polícia anti-terror e um dispositivo das Forças Ar­madas Angolanas trans­portados em 5 camiões “Kamazes” das FAA, dos quais 2 vieram do Huam­bo e 3 do Ngove, segundo as fontes militares contac­tadas, carregados de ar­mamentos e de comandos altamente treinados seria totalmente absurdo, ou no mínimo estranho, travar combate durante mais de 3 horas contra 3 AK-M.

A desproporcionalidade da força é mesmo isto em que consiste: a tropa e po­lícia levaram helicópteros, canhões, morteiros, me­tralhadoras, espingardas automáticas e o povo só tinha catanas e enxadas. É muito difícil com enxadas, pá e ancinho enfrentar pelo menos a ZU-4 ou esquivar a explosão do obus de mor­teiro 82mm, ou ainda, en­frentar com moca e pau o “lança-granada Rouquete Propelente”, mais conhe­cido como RPG-7. Na po­sição alta em que a tropa estava e o povo em milha­res se espalharam a correr desnorteada escalando a montanha com bebés às costas, outros cocheando, alguns se arrastando e a tropa lançando contra eles granadas manuais dada a proximidade e lançando obuses de morteiro 60 mm e rasgando as crianças e mulheres com PKM des­carregando as correntes, e municiando gastando milhares de balas, numa estimativa de 5 a 10 tiros, contra uma criança (se­gundo relatos dos tropas) isto é uma desproporcio­nalidade desumana como foi desumana a ordem superiormente dada, pelo Presidente da República, para “desmantelar a igreja”, “cercar a montanha e agir”.

F8 - Tem noção e existem registo fidedignos de quantas pessoas terão morrido até ao momento?

AK - Até ao momento, o nosso registo praticamen­te está acima de 1500 pes­soas com nomes e apelidos e localidades de origem. Estamos a compilar as lis­tas de pessoas mortas e tecnicamente dissemos que são pessoas desaparecidas porque só se deve considerar morto quando se emite certidão de óbi­to. Pese o Governo não assumir o massacre, nós denunciaremos mesmo como desaparecidos e não mortos embora conhecen­do alguns dos lugares onde foram enterrados em valas comuns.

F8 - Podemos estar na presença de genocídio ou não? 

AK – Absoluta­mente! O que aconteceu nos dias 16, 17, 18, 19, 20 …até a data presente chama­-se genocidio. Porquê? Porque é designado, na própria Constituição, art.º 61.º como crime hediondo, logo é genocídio sempre que o Estado, ou não, esco­lhe um grupo religioso ou étnico ou geográfico e rea­liza um massacre massivo, a fim de fazer extinguir tal grupo.

F8 – Na sua opinião exis­tem mandantes?

AK - Pelo facto de o massa­cre ter sido dirigido supe­riormente pelo Presidente da República (vide seu discurso do dia 20 de Abril de 2015) pode configurar a tipificação de um plano do Estado visando massacrar e exterminar um grupo populacional devido a sua crença religiosa, igual­mente o reconhecimento por parte do governador o Huambo de ter sido ele a mandar cercar a monta­nha, encontram no Direito Penal Internacional, alojamento, como mandantes de um crime de Genocídio. Ademais, junta-se o facto de não se prestar atendi­mento médico aos feridos, tendo morrido muitos, por denegação de assistência médica, medicamentosa, conforme os relatos. A Polícia e FAA são também acusadas de terem saquea­do os bens da população; queimado cidadãos den­tro das tendas, e os presos nunca chegaram às esqua­dras, continuando desa­parecidos, até hoje após o massacre, enquadrando-se essa prática no crime con­tra a humanidade.

F8 – Mas as autoridades dizem nunca terem tido conhecimento das práti­cas dessa congregação religiosa.

AK – Mentira! O gover­nador Kundi Payhama ia frequentemente visitar o acampamento religioso, e passava uma mensa­gem de paz, quando estava a preparar a guerra, com a infiltração de agentes da Polícia Secreta e dos Servi­ços de Inteligência Militar, numa clara demonstração de má fé, premeditação e preparação do massacre doloso.

Pelo facto de ter sido pro­vado que o povo religioso massacrado não possuía nem armas de fogo, nem bunkers, nem trincheiras, em nada representava pe­rigo contra o Estado e a “Paz” conclui-se que ata­cou-se uma população civil indefesa que nos seus ins­trumentos rudimentares domésticos como enxadas, catanas, machados com que praticavam a lavoura de que viviam, se defen­deram do Governo que lhes atacou e em legítima defesa abateram 9 agentes da polícia, que se lamenta a sua morte.

F8 - Como será o desfe­cho final?

AK - Ainda não posso me antecipar sobre o desfe­cho. O Estado está a escon­der milhares de pessoas mortas. Isto é de todo um absurdo. Os mortos dei­xaram vizinhos, deixaram parentes, deixaram histó­ria. Os agentes da polícia que participaram no mas­sacre de genocídio, foram usados para matar os seus irmãos e esses mesmo agentes, estão a ajudar­-nos a indicar onde jazem os corpos de muitos cida­dãos inocentes, barbara­mente assassinados. Por isso penso, que o desfecho final, vai depender do grau de consciência do povo ante mais esta barbárie, os intelectuais da sociedade civil e todas as forças vivas do país. O Governo está a manipular tudo através de propaganda na Televisão, Rádios e jornais públicos e com apoio de Igrejas ba­juladoras e irresponsáveis, usadas para desvirtuar e diabolizar Kalupeteka. Mas como “não se pode tapar o sol com a peneira a ver­dade já chegou e veremos como desenhar o fim. Mas não tenho ideia nem quero me antecipar. Pelo menos o genocidio é étnico e fo­ram, utilizados, também, polícias Ovimbundus para massacrar outros ovim­bundus.

F8 - Acha estar a ver poli­tização deste caso?

AK - Obviamente. O Reve­rendo Huambo, por exem­plo, recentemente, deu uma entrevista (tenho-a na integra), à “Rádio Co­mercial Despertar”, onde intitulou-se ser Presidente de todas as “Igrejas Ilegais”, mais de 1000 e destas ser­virem, de base eleitoral, do MPLA. Que recebeu orien­tações do Presidente da República, por intermédio de outros pastores, com documentos assinados por aquele, para mobilizar to­das as igrejas ilegais em seu redor que sirvam de base eleitoral ao MPLA. A Igreja Adventista do 7º Dia - Luz do Mundo do José Ju­lino Kalupeteka, não aderia em nada ligado a política, logo, era considerada ile­gal. Kalupeteka entendeu bem “dar a César o que é de César e a Deus o que é de Deus” por isso não ade­riu ao Censo Populacional, não carece, segundo o n.º 4 da artigo 41.º da Constitui­ção e quanto as campanhas de vacinações é tudo uma falácia. O MPLA na pessoa do 1º Secretário do Parti­do no Huambo, o General Kundi Payhama e os secre­tários municipais da Caála, sobretudo o mais velho Somakessenje, todos tenta­ram dissuadir Kalupeteka a clarificar a sua veia política e “evangelizar” a favor do MPLA. Mas, negando-se a fazer, foi considerado “fa­nático” e ilegal.

F8 – Não terá sido esta ra­zão, que levou, no âmbito da legalidade, a Procura­doria a emitir um Manda­do de Captura?

AK - Não! Mesmo que o Mandado de Captura fosse instruído de forma legal, imparcial e discreta, como manda a lei, a Investigação Criminal e o próprio De­partamento de Buscas e Apreensões, sabem ou de­veriam saber, da proibição de se prender alguém em local de culto, no caso, Ka­lupeteka, enquanto líder, não deveria ser, mas o foi, na lógica: “não está conos­co é contra nós”!

F8 – Está a falar de mor­tes propositadas e de ca­riz político?

AK - Definitivamente o povo inocente foi morto por causa de intolerância política. Nenhum Gover­no, por mais ditadura que seja, mataria milhares de pessoas só porque a igreja deles é ilegal. Em Ango­la existem várias igrejas nessas condições, mas como são subservientes e lideradas pelo Reverendo Huambo, podem seguir em frente. Mas como Ka­lupeteka fora renitente à pressão político-partidária, premeditada e dolosamen­te foi, com derramamento de sangue, desmantelado, tal como orientou o Presi­dente da República.

F8 - Kalupeteka era um temor?

AK - Sim! Kalupeteka ar­rogava que a sua Igreja tinha, 1.060.000 (um mi­lhão e sessenta mil) fiéis até 2014 em todas as pro­víncias de Angola. Tendo uma capacidade de mobi­lizar milhares de pessoas, que abandonaram as suas províncias, para ir viver na periferia da Caála, com ten­dência de um crescimento dinâmico, era temido. Ele abominava a vida urbana, denunciava os vícios, com­batia a hipocrisia e pregava Deus, como o maior de todos os reis da terra. O mas­sacre do Monte Sumy é um Genocídio étnico-reli­gioso, mas politicamente é um massacre pré-eleitoral, para que José Julino Ka­lupeteka não mobilizasse milhares de pessoas que iriam se abster de votar ou então votar nos adversários políticos. Kalupeteka jogava com as paixões das pessoas. Pregava, cantava e denunciava a depravação alarmante dos valores mo­rais na sociedade angolana. Abominava a corrupção, imagem de marca da ac­tual governação angolana. Denunciava a ganância e pregava a justiça. Os seus sermões eram uma espécie de “TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO”, logo, tornou-se numa grande ameaça ao poder. A sua palavra era forte e ameaça­dora nos ouvidos do Poder, como era o dinheiro do falecido Valentim Amões, que igualmente atordoava, antes das eleições de 2008. Uma mera coincidência de realce, pois, por aquela parte geográfica de Ango­la, não pode emergir um líder com notoriedade e que se oponha claramente às orientações enraizadas, tais como dizia o Dr Antó­nio Agostinho Neto, num de seus comícios do Lu­bango em 1976 “…Temos muitas religiões em Ango­la: Católicas, Protestantes e Feiticeiros! Qualquer uma dessas religiões se tenta­rem lutar contra o MPLA, serão energicamente des­truídas”.

F8 - Ele era um pastor po­lítico ou ajudava as for­ças políticas?

AK - Nunca foi político e nunca fez trabalho a favor dos políticos. O Governo provincial do Huambo sempre aliciou Kalupe­teka e seus fiéis. Fez tudo para lhe aproximar das arenas políticas, oferecen­do salário ao Kalupeteka através da folha da Direc­ção Provincial da Cultura, segundo algumas fontes contactadas e face as ne­gações, recebera ameaças e promessas de felicidade, como carros e outras mor­domias, tudo pelo Governo do MPLA. Todas as igrejas e ONG’s no Huambo mar­cam audiências para falar com o governador, mas este não responde, mas Ka­lupeteka teve o privilégio de ser visitado por três (3) vezes por Kundi Pahiama, sem audiência e sem buro­cracia, com este a insistir, pessoalmente, nas várias propostas. Como conti­nuou a negar, resultou no massacre: “Ou é para mim ou é contra mim”.

F8 - Como está a família de Kalupeteka?

AK - A família do pastor Kalupeteka está dividida: ele está na cadeia com um dos filhos. A esposa estava em fuga até que o Gover­no a levou de volta para a sua casa, no Kilometro 25, onde está a residir, actual­mente, com três filhos (17 e 22 anos, meninas, e o ra­paz com 20 anos). Outros parentes morreram no Sumy e alguns estão ainda em parte incerta, provavel­mente, mortos ou escondi­dos das autoridades, face a contínua perseguição aos fiéis.

F8 – O que mais deixou marcas, com este que considera ser um genocídio do século XXI?

AK – Algumas fontes in­ternas da PGR, sob ano­nimato, confirmaram-nos estar, José Julino Kalupe­teka numa “lavandaria ce­rebral”, visando negar os números, que chegam a mais de um milhar de uma barbárie, protagonizada pelas tropas governamen­tais, que pretendem que este assuma, somente, 13 mortes e que os restantes peregrinos regressaram às suas zonas de origem.

F8 – Está a dizer que a sua primeira aparição pú­blica é já nesta senda de lavagem cerebral?

AK – Sim! O pastor Kalu­peteka está a ser forçado a reconfirmar que o acampa­mento estava semi-vazio e ninguém mais morreu senão os 13 que devem ser apresentados, como seus “guarda-costas” e os 9 agentes da polícia que deverá assumir, terem ido, em missão de Paz. Se ele aceitar, dentre as várias promessas de recompensa, consta a sua libertação por inocência ou insuficiência de provas, quanto a autoria moral, nas mortes dos ofi­ciais da Polícia em “Missão de Paz” e ainda na senda dos ganhos, José Julino Ka­lupeteka verá a sua Igreja legalizada, terrenos ofere­cidos com chapas e blocos para construir, novo templo, mas já no meio urbano. Dos dados apurados, até ao momento, revela que 95 à 100% dos crentes massa­crados são de etnia Ovim­bundu.

F8 – Como a ONU tomou conta deste aconteci­mento, tão rápido?

AK – Nós enquanto patrio­tas, devemos saber a cada momento o que se está a passar no país e quanto aos assassinatos em série devemos ser coerentes denunciando. Foi o que fizemos, no interesse dos Direitos Humanos, en­quanto observadores de acordo com os mecanis­mos da ONU, instamos o Conselho de Direitos Humanos e os seus meca­nismos especiais para que um inquérito idóneo tives­se lugar em Angola a fim de se esclarecer o sucedido no Monte Sumy.

F8 – O Governo considera ter sido má-fé as infor­mações e a falência das suas provas.

AK – Agimos com sentido de responsabilidade e boa­-fé. O nosso pedido não se baseou na má-fé ou na luta contra o governo de Ango­la, como alguns incautos dirigentes querem fazer passar, através de discur­sos forçados e precipita­dos. O Ministro da (in) Jus­tiça, recorde-se, encabeçou a delegação angolana em Genebra entre Outubro/Novembro de 2014, como membro do Conselho de Direitos Humanos da ONU e recebeu quase 221 recomendações sobre vio­lações de direitos humanos em Angola. Ora, foi nessa qualidade e dos princípios da ONU, que os parceiros solicitaram um inquérito na base de instrumentos internacionais de que An­gola é parte. Estranha-se pois as suas declarações de qualificar o pedido como “ingerência nos assuntos internos”; “Violação da soberania nacional”, etc, numa flagrante, ignorância jurídica de palmatória.

F8 – Explique-se melhor.

AK - Todos os tratados e acordos internacionais ratificados, por Angola, têm validade jurídica in­ternamente e a partir daí a ONU em certas matérias usa o poder discricionário de investigar, no interes­se dos Direitos Humanos, os Estados–Membros. A ONU tem provas porque os angolanos activistas de direitos humanos recolhe­ram provas, levaram-nas aos mecanismos interna­cionais, então a ONU sabe que houve Genocídio. Por isso, aguardamos pelas evo­luções possíveis, confiando na solidariedade internacio­nal como tem sido nas lutas contra as ditaduras.

1 comentário:

Marcos, do Brasil disse...

Boa noite.

Gostaria de dizer o quanto fico triste com as decisões erradas de outros irmãos, o que leva a assassinatos como o ocorrido em Huambo.

Sobre a doutrina da igreja adventista do 7º dia, a qual sou membro, gostaria de esclarecer que acreditamos na trindade e temos Jesus Cristo como nosso salvador. Ele é o messias, o filho e o próprio Deus criador em carne. Foi morto injustamente e como prometeu um dia voltará para buscar as pessoas que O aceitarem como Mestre, como também os que morreram sem conhecer a verdade sobre sua palavra mas buscaram ser melhores seres humanos.

Se temos Jesus como nosso mestre, por amor temos que buscar seguir sua palavra para também levar esse amor através do exemplo ao nosso próximo.

Que Deus abençoe e guie a nós nessa causa primordial. Que possamos ser mansos, pacientes e misericordiosos.

Que Deus perdoe nossos pecados, em nome de Jesus Cristo.

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