Paulo
Baldaia – Diário de Notícias, opinião
O
facto é que há cada vez menos eleitores a participar na festa da democracia e
cada vez mais, entre os que participam, a votar branco ou nulo. Há muitas
teorias a explicar este facto, mas nenhuma se sobrepõe à ideia de que os
eleitores confiam cada vez menos nos eleitos. É transversal o preconceito de
que eles são todos iguais, mas quando se prolonga um pouco mais a conversa
percebe-se que o "todos" diz quase exclusivamente respeito aos
partidos do arco da governação (PS, PSD e CDS), aqueles que se libertaram da
ideologia para se agarrarem ao pragmatismo mas que, mesmo assim, são incapazes
de assumir antecipadamente o mínimo compromisso.
Percebe-se
que, em pré-campanha eleitoral, todos neguem a possibilidade de um entendimento
alargado entre quem teve a responsabilidade de governar Portugal nos últimos 40
anos. Eles não querem parecer iguais. Afinal, se há cada vez mais gente a
acreditar que não está nada de substancial em causa quando somos chamados a
votar, é natural que haja cada vez menos gente a dar-se ao trabalho de o fazer.
Por outro lado, se há cada vez mais partidos e movimentos a apresentar-se
contra o sistema, é natural que os eleitores descontentes, mas que ainda assim
desejam votar, o façam nesses partidos.
Regressando
aos partidos do arco da governação, em que o voto é feito com uma expectativa
acrescida de que conte para a escolha do governo. O afastamento dos eleitores
tem tendência para crescer quando a diferença entre estes partidos está cada
vez mais centrada na escolha do líder. Se há cada vez menos ideologia e cada
vez mais o culto da personalidade, a consequência óbvia é que numa sociedade
onde parecemos todos cada vez mais iguais, no pior dos sentidos, os eleitores
considerem que não há diferença entre estes partidos. Podem os actuais líderes
fazer juras de ódio ao bloco central, tentando assim evitar serem vistos como
fazendo parte do mesmo problema, mas os eleitores percebem que lhes estão a
atirar areia para os olhos.
O
que devia distingui-los é a ideologia, a defesa de um modelo de sociedade mais
justo, a convicção de que governar não é apenas fazer a gestão corrente. Com a
ausência de compromissos, sem expectativas de que ele possa vir a acontecer, os
partidos do arco da governação estão a dizer aos eleitores que não são capazes
de tomar decisões que influenciem positivamente a vida do país, mesmo que
apenas num momento em que os políticos agora no activo tenham democraticamente
cedido o poder a outros. Quanto mais os eleitores se afastam deles, mais eles
os empurram para longe, com a suprema arrogância de quererem dizer como se pode
e não se pode votar. Em democracia, a soberania é exercida pelo povo. Convém
que não se esqueçam disso.
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