quarta-feira, 23 de setembro de 2015

POIS, NA VERDADE, OS GREGOS TÊM-NOS NO SÍTIO



Pedro Tadeu – Diário de Notícias, opinião

Achei a convocação do referendo na Grécia, de rejeição às medidas de austeridade, um suicídio político. Achei a cedência do primeiro-ministro Alexis Tsipras às exigências da troika, 24 horas depois do referendo, uma traição ao povo grego. Achei o fecho dos bancos e o racionamento de dinheiro através das caixas automáticas, durante semanas e semanas, o resultado violento de uma nabice extrema do governo Syriza/Anel. Acho esta segunda vitória eleitoral do Syriza uma bofetada dada pelo povo grego ao poder europeu, com ainda maior estalo do que aquele que soou a 25 de janeiro passado.

A troika pôs os gregos a pão e água, quase literalmente, através do Banco Central Europeu, quando este fechou a torneira ao sistema financeiro grego logo após a vitória do "não à austeridade" no referendo de 5 de julho. A cumplicidade do BCE com o poder político europeu era linear, óbvia, evidente e foi muito grave o governo grego ter, mansamente, deixado chegar as coisas a esse estado sem ter alternativa viável - e a convocação do referendo soou, portanto, como declaração patética para uma guerra antecipadamente perdida, um pretexto para o inimigo proceder ao aniquilamento de toda a resistência numa única batalha. E, de facto, em horas, o Syriza/Anel aceitou rapidamente e sem condições a inevitável capitulação.

Os vencedores dessa luta, liderados politicamente pela Alemanha e pela França, trataram de restabelecer uma relativa normalidade na vida quotidiana dos gregos, levando BCE, FMI e Comissão Europeia a concederem novos empréstimos e garantindo verdadeiros despojos de guerra que a imposição de inúmeras privatizações lhes oferece.

Pois acontece que nestas legislativas o eleitorado grego (que quer no referendo quer neste domingo recusou validar sondagens da treta) informou agora a Europa que a guerra, afinal, ainda não acabou.

O que a renovação quase intacta dos votos concedidos ao Syriza/Anel declara é que os gregos não desistiram: não podem ganhar rapidamente a Merkel, Hollande, Dijsselbloem, Draghi, Juncker e Lagarde então, pacientemente, propõem-se prolongar a luta, com avanços e recuos, com vitórias e derrotas, certamente com contradições e erros, mas tentando sempre caminhar no sentido do seu objetivo principal: garantir que quem manda na terra dos gregos são mesmo os gregos... Têm-nos no sítio.

Olho para a disputa eleitoral portuguesa. Oiço os debates dos dirigentes que têm acesso à televisão, à rádio, à imprensa generalista. Quem será capaz de, sem perder o sentido da responsabilidade, com calma e bom senso, garantir o início de um caminho para Portugal voltar a ser, um dia, verdadeiramente pertença dos portugueses?...

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