segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

TUNÍSIA: A 5 ANOS DA PRIMAVERA NORTE-AFRICANA



  Rui Peralta, Luanda

Cinco anos após os acontecimentos de 14 de Janeiro de 2011, a normalização “primaveril” continua. No palácio presidencial de Cartago o presidente tunisino, Beji Caid Essebsi, proferiu um virulento discurso, durante as celebrações, contra os seus opositores políticos, que por sua vez boicotaram o evento. Uma semana antes o partido Nidé Tunis (NT), no governo (sendo, também, o partido de Essebsi, o presidente da república), celebrava a sua fundação, o que foi um complexo momento de boa vontade, atendendo a que este partido se fragmentou pouco tempo depois de fundado. A denominada “ala esquerda” deste partido decidiu abandoná-lo e criar um novo partido. E isto devida á insistência do presidente tunisino em impor o seu filho Hafedh Essebsi, como secretário-geral do NT, o que levou ao afastamento de um largo sector da organização e á perda da maioria parlamentar, em virtude dos deputados que abandonaram o NT.

Se o discurso político tunisino parece andar turbulento, a sua economia continua com uma dependência em tudo igual ao contexto anterior da Primavera. Investimento estrangeiro e turismo barato continuam a ser os pilares da economia tunisina. A angustia criada em torno do pagamento da divida permanece. O Comité para a Anulação da Divida do Terceiro Mundo refere, no relatório anual de 2015, que 82% dos novos empréstimos concedidos pelo FMI e Banco Mundial destinam-se a pagar a divida contraída pelo anterior regime de Ben Ali. E assim a divida externa tunisina duplicou nos últimos cinco anos, passando de 11 milhões e 500 mil USD para 22 milhões de USD.

Com o sector turístico paralisado pela ameaça terrorista e a indústria do fosfato completamente estagnada e a viver um momento crítico e apático, a Tunísia é palco de disputas entre famílias pelo controlo do mercado informal (que representa cerca de 54% da economia nacional tunisina) tendo como pano de fundo a inflação e o desemprego, que em algumas regiões alcança os 40%. Por isso não é de estranhar que em 2015, segundo o Fórum para os Direitos Económicos e Sociais, tivessem ocorrido cerca de 4 mil e trezentas acções organizadas de protesto social e politico e cerca de 500 suicídios, ou que – conforme a Homeland – 6 mil jovens tunisinos estejam nas fileiras do Daesh na Síria.

O permanente estado de alerta antiterrorista em que a sociedade tunisina mergulhou, por sua vez, serve de pretexto ao congelamento das revindicações de 2011. Em nome da segurança recalca-se os motivos da crise politica e económica e impede-se o prosseguimento das alterações sociais iniciadas pelas revindicações da intifada tunisina de 2011. No contexto regional o caos e a guerra civil são ameaças constantes na Líbia e na Argélia. Apesar da fragilidade das suas fronteiras a Tunísia conserva um mínimo de estabilidade politica e social e uma institucionalização formalmente democrática (similar ao que ocorre no Egipto). Por outro lado a Tunísia sofreu - com a intifada de 2011 – duas rupturas que se complementam: 1) rompeu com a lógia do partido único (e não a substituiu pela lógica do único partido); 2) rompeu com a lógica do pensamento único (o que impediu a sociedade tunisina de cair na lógica do único partido).

Mas existiu um outro aspecto fundamental no panorama politico tunisino. No congresso que fundou o NT esteve presente, como convidado, Rachid Ghannouchi o presidente do partido islâmico Ennahda, que participa, coligado com o NT, no actual governo. Esta aliança entre o centro-direita laica (NT) e o centro-direita islâmico (Ennahda) é certo que deixa de fora a esquerda tunisina, os jovens revolucionários de 2011 e a extrema-direita islâmica mas constitui uma integração dos sectores islâmicos na arquitectura institucional tunisina, que é laica. A coligação entre o NT (que comporta muitos “fulul” do antigo regime) e o sector maioritário islâmico (perseguido no antigo regime) pode não ser a alternativa mais adequada às mudanças estruturais que a sociedade tunisina necessite mas constitui um factor decisivo para o reforço e implementação sustentável das instituições democráticas tunisinas. Sem a integração política do islamismo nunca os povos da região poderão libertar-se dos regimes autoritários laicos que utilizam o combate ao terrorismo para legitimar as suas políticas, nem do próprio islamismo politico, profundamente anti laico, que se legitima contra a influência dos “infiéis”.

É nesta excepção que a Primavera tunisina poderá constituir-se como alternativa democrática e apontar caminhos de diálogo na conturbada região do Magrebe e em todo o Norte de África.

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