terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Cabo Verde. CAPITAL ESTRANGEIRO PRECISA-SE



Expresso das Ilhas, editorial

O Primeiro-ministro José Maria Neves anunciou que vai a Luxemburgo nos próximos dias à procura de fundos para investir em vários projectos para as ilhas do Norte. Promete que depois no âmbito de um Afroverde 2 será a vez de projectos nas ilhas do Sul. Pena que esteja a organizar essas ofensivas de atracção de investimento estrangeiro para Cabo Verde no fim dos seus 15 anos de governação. Pena ainda que esteja a disponibilizar-se para isso quando já ficou evidente que está-se a inverter o sentido da movimentação de capitais ao nível mundial. No fim da semana passada o chamado banco central dos bancos centrais, o BIS, deixou entender que se iniciava um novo ciclo em que o volume de capitais vindos dos países emergentes em direcção aos países desenvolvidos era superior em muitos bilhões de dólares ao que se dirigia em sentido contrário.

Quando, em vésperas de eleições legislativas, Cabo Verde parece acordar para a necessidade de conseguir capitais estrangeiros para financiar a sua economia, é precisamente o momento em que o mundo dá a impressão de estar mais uma vez à beira de uma recessão. Vários acontecimentos como, por exemplo, a brusca travagem no crescimento da China, a queda dos preços de petróleo, as dificuldades crescentes dos países emergentes designadamente dos BRICS com excepção da Índia, o aumento da taxa de juros nos Estados Unidos e as persistentes dificuldades da União Europeia com o euro e o problema das migrações não auguram nada de bom para a economia mundial. Economistas de renome falam de crises da dívida soberana em países que recentemente se endividaram no processo de investimento em infraestruturas e capacidade produtiva para responder à então demanda global e agora se vêem em dificuldades em servir a dívida numa conjuntura de alta do dólar e de diminuição brusca da procura de diferentes commodities.

Cabo Verde desperta agora para atrair capitais externos depois que de um sono em que se auto- induziu fazendo acreditar e acreditando desde a crise financeira de 2008 que o capital estrangeiro tinha desaparecido. A realidade é que só desapareceu o capital especulativo na imobiliária turística. Muito outro capital ficou disponível, mas naturalmente ou se dirigia para os países com matérias-primas e outros produtos em grande procura ao nível global ou então investia em países com uma excelente competitividade externa e com um bom ambiente de negócios. É evidente que Cabo verde pela sua pobreza em recursos naturais não pertence ao primeiro grupo. Mas também por não ser competitivo nem ter um bom ambiente de negócios dificilmente podia constituir um porto seguro e lucrativo para o investimento directo estrangeiro.

De qualquer forma o governo não estava para aí virado. Durante anos manteve a sua linha de governação conseguindo crédito e investindo em infraestruturas de valor e utilidade duvidosos e em que a relação custo/benefício não trazia qualquer conforto. Mesmo quando se tornou claro que a economia não arrancava apesar dos milhões investidos, o crowding in de investimento nacional e estrangeiro não acontecia e que o desemprego não caía como desejado e prometido continuou a insistir que a culpa estava na crise financeira internacional. Lá fora a liquidez dos mercados financeiros era enorme com as políticas dos banco centrais de injecção de dinheiro na  economia. Pouco ou nada chegava a Cabo verde porque nas condições existentes do país não se via onde e porquê investir cá.

Culpabilizar o outro pelo mal ou as dificuldades da vida é um jogo que já vem custando caro a Cabo Verde a todos os níveis. A perda de perspectiva da realidade é uma das suas principais consequências. Nas proximidades de mais um pleito eleitoral é crucial colocar na devida perspectivas as promessas eleitorais postas em cima da mesa. Há quem fale agora em priorizar o emprego numa perspectiva linear como se o desenvolvimento se fizesse em etapas pré-estabelecidas e tivessem momentos certos para acontecer. O desenvolvimento porém é muito concreto. As pessoas precisam ter um rendimento digno, ter possibilidade de escolha na organização da sua vida e encontrar o ambiente certo para dar vazas à sua imaginação, exercitar a sua iniciativa e saciar as suas ambições. 

Coarta-se tudo isso quando os agentes do Estado se colocam em posição de serem arrecadores/distribuidores de tudo e não de facilitadores/reguladores do progresso social e económico. A população é tornada submissa e passiva. Num ambiente desses ninguém vê necessidade para atrair capital estrangeiro. Exportações de bens e serviços não são vistas como prioridades. Confunde-se deliberadamente meios com produção, produção com vendas, produtos que não são transaccionáveis com os transaccionáveis. Enquanto durar a ajuda externa tem-se a ilusão do desenvolvimento. Quando a realidade muda, vêem-se as consequências: o rendimento decresce, aumentam os riscos macroeconómicos, a perspectiva de emprego perde-se  e cada vez fica mais difícil libertar-se da modorra que contamina a todos.

Uma outra atitude voltada para o mundo precisa-se. O país que escolhe um novo governo para os próximos cinco anos a 20 Março tem a oportunidade de se reconduzir para o caminho da realidade. Através do confronto democrático de ideias e projectos certamente vai encontrar o caminho para garantir liberdade, felicidade e progresso para todos.

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