sábado, 23 de abril de 2016

Angola. Presidência comprometida. Pai e filho na lista de “corruptos” dos Papéis do Panamá




A Rede Africana de Centros de Jornalismo de Investigação (ANCIR) confirmou as suspeitas de muitos dos angolanos, o Vice-presidente da República, Manuel Domingos Vicente e seu enteado Mirco de Jesus Martins, constam da lista de beneficiários em Offshores em paraísos fiscais, investigados no já famigerado caso “Panama Papers”. 

A teia de “corrupção” internacional desmistificada nos documentos de Panamá remonta de 2015, quando um alegado empregado dos escritórios de advogados Mossack Fonseca, sita na República do Panamá, contactara o Jornal alemão Suddeutsche Zeitung, e forneceu-lho documentos relativos às atividades da sociedade Mossack Fonseca. Antes deste “ovo podre” para os pobres governados ser divulgado, os dados tiveram que ser indexados de forma sistemática. Isto foi feito através do software Nuix, usado também por investigadores internacionais. Entretanto, os documentos foram introduzidos em computadores de elevado desempenho para reconhecimento ótico, de modo a digitalizar o texto. A seguir foi compilada uma lista de pessoas relevantes e foram sendo paulatinamente divulgadas, e neste intervalo de divulgação de indivíduos mais importantes no mundo e que tenham negociatas em Offshores em Paraísos fiscais, os angolanos já suspeitavam de que constasse nomes de dirigentes “nossos” nos referidos documentos, mas na verdade, muitos não esperavam que fosse o do Vice-presidente da República, o ilustre engenheiro Manuel Domingos Vicente, muito menos de seu enteado, Mirco de Jesus Martins.

MANUEL VICENTE PODERÁ TER BENEFICIADO DE 15 MILHÕES DE USD

Segundo o citado documento que foi partilhado e minuciosamente analisado por 400 jornalistas de 107 órgãos de comunicação social em mais de 80 países, por além de Manuel Vicente e seu enteado, constam outros políticos angolanos e altas patentes da Polícia e das Forças Armadas Angolanas, ligadas as referidas investigações. Quanto a criação de offshores em paraísos fiscais com dinheiro referente a negócios realizados em Angola, a ANCIR divulgou ter havido duas empresas, nomeadamente, Markwell e Pinsong, ambas constituídas nas Ilhas Virgens Britânicas, tinham como objectivo, intermediar para que a Angola Natural Resources obtivesse licença de exploração de petróleo em águas profundas, angolanas. E pelo sucesso da operação, a Markwell recebeu, alegadamente, cerca de 15 milhões de dólares em comissões. Entretanto, a história sobre a comissão de USD 15 milhões iniciou em 2007, quando a Espírito Santo enviou um contrato à Mossack Fonseca, no qual garantia que a Markwell iria criar condições no apoio necessário à Angola Natural Resources (ANR). 

O objectivo, segundo o Panama Papers, era conseguir grandes participações em licenças de exploração de petróleo e por isso a Pinsong comprometia-se a fazer o pagamento dos 15 milhões em três tranches, sendo a última enviada assim que a ANR conseguisse as licenças, e assim aconteceu. No entanto, fazendo fé nas informações em nossa posse, a empresa Pinsong é dirigida por Pedro Ferreira Neto (um dos administradores da Escom, na altura do Grupo Espírito Santo, actualmente da Sonangol), e a Markwell é liderada por Andres Sanchez – o mesmo nome aparece nos Papéis do Panamá ligado a empresas de lavagem de dinheiro de criminosos como o ditador chileno Augusto Pinochet.

O Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação revela ainda que entre os emails trocados entre a Espírito Santo e a Mossack Fonseca em 2007, mostram que o grupo português, com sede na Suíça, pedia para que fosse alterado o nome da Middle Mining Ld. para ANR. Nestes mesmos documentos consta o pedido da Espírito Santo para que as acções da ANR fossem emitidas pelo Grupo de Investimento Escom. Alterado o nome e com novas acções, a ANR passou a ser uma subsidiária da Escom Investiments B.V., fundada pelo luso-angolano José Hélder Bataglia dos Santos e cujo director executivo é Pedro Manuel de Castro Simões Ferreira Neto, o mesmo que aparece como director da Pinsong.

A maior parte do capital da Escom pertencia na altura ao Grupo Espírito Santo, 67 por cento. Três anos depois estas acções foram compradas pela Sonangol. Bataglia manteve os seus 33 por cento.

Ainda em 2007 foi emitida a versão final do contrato para beneficiar a ANR na exploração dos blocos petrolíferos 9, 20, 21 e o Centro e a Sonangol, sob a liderança do actual vice-presidente da República de Angola, Manuel Vicente, abre-se o processo de concessão de licenças. Entretanto, a investigação não conclui para quem foram os 15 milhões de dólares que passaram pela Markwell. A origem deste montante pode estar directamente ligada à Escom, a principal interessada em beneficiar a subsidiária ANR, mas segundo os investigadores dos Papéis do Panamá, os beneficiários de tal montante poderá ser o próprio Bataglia, fundador e presidente da Escom, ou Manuel Domingos Vicente, que, através da Aquattro International S.A. estava ligado a maior parte dos interesses do Grupo Espírito Santo em Angola

Mirco de Jesus Martins, enteado do Vice-presidente da República, Manuel Vicente, aparece na lista dos documentos do Panamá, segundo ANCIR, como o último beneficiário em várias empresas de paraísos fiscais.

Segundo a Rede Africana de Centros de Jornalismo de Investigação (ANCIR, na sigla em inglês), Mirco tem a tarefa de esconder as verdadeiras identidades dos beneficiários das offshores, o que garantiu de tal forma que nem a Mossack Fonseca tinha dados sobre essas figuras.

“Políticos com altos cargos não foram ingénuos ao ponto de usarem os seus próprios nomes”, escreve a ANCIR. “Foram criadas estruturas organizacionais complexas para manter as acções na posse de outras pessoas, ou testas-de-ferro de outras empresas de fachada que eram geridas por uma série de fiduciários.”  De acordo os jornalistas investigadores, os líderes angolanos são os mais difíceis de se identificar (achar) nestas listas do Panama Papers, e por isso, dizem, “Vamos procurar de outra maneira”.

Entretanto, Mirco de Jesus Martins continua sendo alvo de cartas da Agência de Investigação Financeira nas Ilhas Virgens Britânicas sobre empresas em que surge como o último beneficiário, entre as quais, Shaman, Rolika, Heli-Vest e Halifax.

Algumas das instituições, segundo a Rede Africana de Centros de Jornalismo de Investigação, foram criadas com “apenas” USD 300 e rapidamente foram extintas, indicando que teriam existido para esconder contas bancárias e acções de outras empresas. Na tentativa de saber quais os reais proprietários das empresas em que Martins surgia como último beneficiário, a Mossack Fonseca teve de pedir ajuda a outros agentes para criar empresas de fachada, uma delas a Interfina.

Esta última é referida num documento de 2013 como gestora de 15 instituições, entre elas a Halifax, General Corporate, Farvel e Kumar – que existiam para deter contas bancárias no Líbano, Portugal, Gibraltar e Suíça.

As outras cinco – como a Shaman e Sicas, têm acções portuguesas e em duas empresas ligadas à aviação que se identificam como de compra e consultoria. Para garantir a manutenção das suas actividades nas Ilhas Virgens Britânicas, Martins admitiu, segundo a fonte que viemos a citar, a Mossack Fonseca já não ter qualquer ligação com entidades financeiras angolanas como o Banco Kwanza. Confirmou ainda que teve acções da Sakus, uma empresa fantasma que possuía 3,6 por cento do capital do Banco de Investimento Africano (BAI) de Angola, o mesmo que chegou a ser investigado por um comité do Senado dos Estados Unidos e pelo HSBC porque 40 por cento das acções eram detidas por figuras políticas, incluindo Manuel Vicente. Entretanto, o grupo de jornalistas responsável pelo continente africano na fuga de informação da Mossack Fonseca teve acesso a mais de mil documentos referentes apenas a Angola. VOLTAREMOS.

Folha 8 digital

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