Manuel Carvalho Da Silva | Jornal de Notícias | opinião
Sempre que as sociedades
atravessam períodos de crise ou de descalabro, o trabalho e os trabalhadores
são muito maltratados: os sindicatos, fortemente atacados, perdem
representatividade e força.
Sempre que se retomam a afirmação
das liberdades, da democracia, da justiça social e da economia ao serviço de
todos, os sindicatos são chamados à participação, tornando-se atores
importantíssimos nos processos de desenvolvimento.
Dados divulgados pela Organização
para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), dizem-nos que Portugal
tinha, em 2016, uma taxa de sindicalização de 15,3%. Há outras estimativas no
plano nacional que oscilam conforme as fontes a que recorrem e o universo de
trabalhadores considerados. Quais as causas desta baixa taxa?
Os sindicatos deparam-se com
profundas mudanças na divisão internacional e social do trabalho, com
alterações estruturais das empresas, da forma de organização e prestação do
trabalho, com impactos brutais da financeirização da economia, com uma
precarização crescente. Quem comanda as agendas destas mudanças, a partir da
cartilha neoliberal, é o poder económico e financeiro a quem o poder político
se vem subjugando e oferecendo legislação antilaboral e políticas públicas a
seu favor. Assim se vai desvalorizando o trabalho e as instituições de
representação dos seus interesses específicos, bem como o seu papel de
mediação.
O exacerbado individualismo, que
formata as pessoas na promoção de práticas egoístas e as responsabiliza pelos
seus fracassos, impede a construção de identidades coletivas e enfraquece uma
instituição historicamente fundamental no mundo laboral, que é a contratação
coletiva. Sem contratação coletiva - como hoje constatamos em Portugal - os
salários não evoluem de forma estabilizada, morrem as carreiras profissionais
que tanta falta fazem, não são reconhecidas e enquadradas as novas profissões,
a saúde e segurança no trabalho são secundarizadas. Querem transformar o
direito do trabalho em muleta da competitividade e da maximização do lucro e no
dia a dia cilindra-se a liberdade sindical. Por outro lado, especuladores ou
gestores que destroem emprego para engordar acionistas são mais valorizados que
empresários que criam emprego.
Entretanto, há desafios que os
sindicatos têm de tomar em mãos, com redobrada determinação: i) trabalhar na
base e assegurar aí representatividade e ação, por muito complexa e trabalhosa
que seja essa tarefa dada a diversidade de condições em que hoje se trabalha;
ii) apostar, de forma articulada, na formação e renovação de quadros e no
desenvolvimento regular de estudos que sustentem as propostas e reivindicações
sindicais, fugindo da incorporação de paradigmas dominantes manipulados; iii)
definir bem as agendas sociais e laborais e saber agilizá-las com as agendas
políticas, questão que obriga a cuidar da autonomia e independência face aos
partidos políticos, ao poder económico e a outros; iv) reforçar capacidades de
comunicação com os trabalhadores e de relação aberta e motivadora com a
sociedade.
Naturalmente, os sindicatos são
menos valorizados quando fica frágil o seu poder. Mas os trabalhadores
continuarão a necessitar de se organizarem para assegurar direitos coletivos e
individuais, e poderem intervir na fixação equilibrada dos deveres a que estão
sujeitos.
*Investigador e professor
universitário
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