Martinho Júnior, Luanda
1
– A situação fito sanitária e de saúde em Luanda tornou-se catastrófica, em
função da insuficiência gritante de medidas para se fazer face preventiva e
atempadamente às transformações ambientais e climáticas em curso e decorrentes
dos fenómenos que se prendem com um similar do“El Niño” no Atlântico, que
a partir do segundo semestre de 2015 tem vindo a atingir com múltiplos impactos
Angola e sobretudo a desamparada mole humana que habita na sua maioria de forma
tão precária a província-capital.
De
nada valeram as previsões globais, cada vez mais debatidas nos mais diversos
fóruns internacionais sobre o ambiente e sobre o clima, no sentido da
inteligência angolana despertar para a rapidez com que o aquecimento do planeta
está a acontecer e, se algum conhecimento sério sobre as consequências desse
aquecimento houve, ao que tudo indica parece ter-se julgado que ou as
ocorrências seriam para outros lá pelo Pacífico, ou não se produziriam com a
rapidez com que efectivamente ocorreram dentro do espaço nacional, com a
produção em cadeia de problemas como os sentidos em Luanda!
Fica-se
com a desalentadora sensação que os responsáveis ao mais alto nível deslocam-se
para o exterior sem saberem recolher devidamente os ensinamentos desembocam nos
fóruns internacionais, por que estão a demonstrar serem incapazes de os aplicar
quando regressam a Angola, incapazes até de lançarem campanhas preventivas
adequadas ao aquecimento global, com prévia leitura de suas consequências e dos
cenários correspondentes nas mais diversas províncias, municípios e comunas do
país.
Os
meios de comunicação de massas, (jornais, rádios e televisões), com uma carga
de exaustiva alienação esbatida na grelha da maior parte dos seus programas, em
grande parte vocacionados para o “show-off”, para transmitir “imagens
de marca”, para emitir as mensagens de religiões que de há muito não têm os pés
assentes na Terra atirando os contemporâneos para as “calendas gregas” de
há mais de dois mil anos, para publicidades enganosas de quem quer fazer lucro
a partir da miséria, ou para a “propaganda” de baixa qualidade, nem
alertas produziram de forma atempada mas constante, muito menos souberam
transmitir simples mensagens motivadoras, capazes de mobilizar os humanos para
fazerem face ao gradual agravamento da situação.
2
– No Página Um Blogspot de 5 de Setembro de 2007, depois em repetição ainda no
mesmo Página Um Blogspot a 13 de Janeiro de 2011 alertei sem que alguma vez houvesse
qualquer tipo de reacção saudável para a seguinte síntese que passo
seguidamente a reproduzir na íntegra, juntando da segunda vez uma situação que
se teria tornado evidente na Clínica Girassol, de acordo com uma notícia
publicada pelo Clube-K de 24 de Dezembro de 2010 (“Clínica Girassol presa a
empresas da antiga PCA”).
“UMA
SAÚDE MERCENÁRIA EM NOME DO MERCADO
A
lógica neoliberal do mercado, ao converter um direito fundamental, o direito à
saúde, numa simples mercadoria, é responsável pelo desastre que está patente
particularmente nos enormes subúrbios das grandes cidades, com evidência para
Luanda.
Acabar com os centros não qualificados, mas continuar com essa lógica de saúde enquanto mercadoria e não saúde enquanto direito fundamental, é contribuir para:
- Continuar a mentir ao povo angolano, pois não haverão transformações de natureza ético-filosófica à medida das prementes necessidades, tendo em conta os terríveis índices de mortalidade existentes.
- Continuar a incrementar o fosso das desigualdades que é uma vergonha histórica para os verdadeiros patriotas.
- Iludir os factores essenciais da paz, que precisa sobretudo de muito maior equilíbrio económico e social, de muito mais justiça social (a paz não pode ser estritamente considerada como uma ausência de acções armadas!).
Uma saúde mercenária, jamais será a opção correcta para, em consciência, tornar possível gerar mais felicidade e mais vida em benefício do povo angolano!”…
Embalados
pela acção psicológica e “pelas luzes” da era Bush do “petróleo
para o desenvolvimento”, sem que fosse possível adoptar uma atitude avisada,
inteligente, esclarecida, clarividente ou sequer comedida face à possibilidade
de logo na era Obama o petróleo se vir a tornar num terrível“excremento do
diabo”, alguns angolanos embalaram na orgia das ilusões, das alienações, do
esbanjamento e no caos neoliberal com impactos abruptos inclusive nas esferas
sociais, ou seja na educação (conforme nossa denúncia referente ao comportamento
irresponsável do antigo Ministro António Burity da Silva em relação por exemplo
à produção de livros escolares que lhe propiciaram exponencial enriquecimento
ilícito), como em sectores da saúde, onde muitas clínicas privadas foram sendo
instaladas como cogumelos, absorvendo o que havia a dissipar dos recursos do
estado angolano que todos deveriam saber honrar e defender, como ele foi
honrado e defendido durante a primeira década de independência, até 1985!
Depois
de fazer face à doutrina de choque que instrumentalizou Savimbi durante a
década de 1992 a 2002, os angolanos começaram a desperdiçar os 14 anos de paz
relativa, de 2002 até aos nossos dias, abrindo as portas à terapia neoliberal
do choque e por tabela ao mais abjecto mercenarismo no sector da saúde,
implicando um número cada vez mais significativo de profissionais tornados
autênticos mercenários criminosos que hoje prestam serviço simultâneo nas
instituições do estado (prendadas cada vez mais com sua ausência) para melhor
corresponderem aos “incentivos” nas clínicas privadas, ao ponto de
esvaziarem as instituições do estado angolano dos mais simples produtos básicos
de cura de ferimentos, medicação ou farmácia!
3
– Está-se antes de mais perante uma dolorosa constatação doutrinária e
ideológica, que atinge não só o estado angolano, mas também o próprio MPLA:
perdido o rigor próprio dum Partido de Trabalho que para o ser soube erguer-se
através dum Movimento de Rectificação revitalizador, foram-se experimentando
ementas social-democratas com aberturas sucessivas e cada vez mais amplas,
acordo após acordo, que deram guarida à terapia de choque neo liberal, com cada
vez menos intrínseca capacidade de resistência patriótica e até sentido de
responsabilidade humana, ao ponto de existirem implicações e consequências até
no léxico e no vocabulário sócio-político comparativo utilizado em 1985 e em
2016!
O “socialismo” tornou-se
numa figura de estilo mil vezes negada pelas características do “mercado”cada
vez mais chegado e induzido às práticas de “abertura neoliberal”,
tornando-se uma palavra no abstracto e esvaziada do seu sentido, inclusive do
sentido social-democrata do termo!
A
terapia de choque neoliberal está aí impante, produziu uma tese que emerge em
função das próprias características do estado angolano, face a uma antítese
difusa que envolve um sem número de instituições dispersas, parte delas na
oposição, para que a ingerência e a manipulação submissa à aristocracia
financeira mundial e por si instrumentalizada, se torne reitora dos espaços
sócio-cultural e sócio-político, a fim de introduzir o propício ambiente das
trevas neocoloniais que espreitam Angola!
A
tese proporciona à antítese o combustível grátis que esta por sua vez utiliza
como fogo contra a tese para a queimar!
Num
ambiente de crise económica, de crise financeira, de crise ambiental e de
profunda catarse humana atingida pelas conjugadas catástrofes, o país geme sob
suas doenças húmidas, suas misérias e suas dores, sobretudo na devassada
capital que se vai assemelhando cada vez mais a uma gigantesca agência
funerária, assistindo-se ao arrepio de imagens lamacentas e pútridas a céu
aberto e aos corredores saturados de epidemias dos desamparados hospitais,
alguns deles edifícios modernos repletos de equipamentos, mas despojados da
qualidade humana suficiente para fazer face a uma hecatombe desta natureza e
com os stocks esgotados de tanto se esvair sua própria logística!
Persistir-se
na terapia neo liberal, com a alienação dum “mercado” que não passa
duma ilusão ultraperiférica de muito mau gosto e augúrio, quando um quadro de
luta contra o subdesenvolvimento espera por uma diversificação quase emocional,
sem alguma coerente geo estratégia, será quando muito mais um paliativo do que
um enfrentamento ao nível das amplas necessidades e aspirações de todo o povo
angolano, até por que a terapia neo liberal é raiz de cada vez maiores
desequilíbrios sociais e de injustiças de toda a ordem, à medida que o neo
colonialismo se vá impondo face às resistências cada vez mais dispersas,
vulneráveis e anémicas!
As
catástrofes não nos colocam à beira do caos, elas são já o caos!
Ilustrações:
-
Visão do “El Niño” sobre a Terra;
-
Lixo e águas podres a céu aberto em Luanda;
-
Imagem do parque externo ao edifício principal do Hospital Pediátrico de Luanda.
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