quinta-feira, 28 de abril de 2011

Portugal: NADA DE NOVO NO HORIZONTE




BAPTISTA BASTOS – DIÁRIO DE NOTÍCIAS, opinião

As listas de deputados são conhecidas. Aquele sobressalto emocional que caracterizou os primeiros tempos da democracia deixou de existir. Normalizámo-nos. As regras do jogo são claras e simples: seguir, obedientemente, o jogo e as regras. Ora, o desinteresse bocejante com que o público as acompanha conquistou conotações depreciativas. O caso Fernando Nobre, pelas situações que o rodearam, agitou um pouco as águas palustres. Aqui e além, este ou aquele foram contestados. Nada de grave. O sistema dos hábitos, próprio do domínio que as direcções partidárias exercem, manteve-se inabalável.

Assegurada a continuidade, aceite com benevolente dependência a distribuição de lugares, de postos e de ascensões ou despromoções, toda a previsibilidade não será alterada. Regressam os mesmos que aprovaram leis iníquas, que obedeceram sem recalcitrar aos malabarismos dos compromissos e às traições ideológicas. As "caras" novas são a mascarada com que se mantém o fenómeno "democrático", afinal caracterizado pela irracionalidade da burocracia.

Longe vão os tempos em que as escolhas para deputados eram quase uma festa. Basta recordar quem eram aqueles outros e comparar com estes de agora. As convicções foram substituídas pelos interesses pessoais. O desencantamento, associado à regularidade monótona e funesta da rotina, tem muito a ver com a crença na "legalidade" da tradição, eternamente válida. Ou, pelo menos sem refutação.

Quem selecciona os deputados não somos nós. Aliás, nem sequer sabemos quem são e para aonde vamos. Não lemos os programas dos partidos, e acedemos ao domínio "carismático" dos secretários-gerais ou dos presidentes, submetidos às evidências do poder, numerosas vezes criadas pela comunicação social.

A manipulação declarada ou latente a que somos sujeitos explica e justifica o abandono pessoal ou a fé resoluta com que seguimos o cherne (para lembrar a grande metáfora de O'Neill) e a cegueira política com que votamos naqueles que nos maltratam.

Reconhecemos, mesmo, como condição irreparável, a existência de um "arco de poder", constituído por dois (ou três) partidos, no qual os outros, embora representando dois ou três milhões de portugueses, não são admitidos. No absurdo desta situação, rigorosamente antidemocrática, assentam os pilares da democracia. Em Portugal e lá fora. Nisso, não somos nada originais.

Somos nós e a nossa circunstância, como ensinou Ortega, ou as circunstâncias podem ser modificadas por nós, como queria Marx? Penso que a renovação ou a alteração da nossa existência social passa pela substituição radical do sistema económico. Este pertence não apenas a estruturas astutamente edificadas, com guardiães ferozes e centuriões espalhados por todos os confins, como às "doenças da crença", o mal maior das nossas servidões.

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