Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*
Apesar de garantir que milhões e milhões de angolanos (presumo que cerca de 99%) vão votar no MPLA, o regime angolano continua dar porrada em todos aqueles que sejam, ou aparentem ser, da UNITA.
No dia em o “querido líder”, também conhecido por “o escolhido de Deus”, esteve no Huambo, os efectivos da Guarda Presidencial espancaram um jovem por este ter cometido o mais grave dos crimes: usava uma camisola da UNITA.
Diga-se, contudo, que o MPLA bem avisou. Quando, no início deste nês, discursava no Estádio Nacional de Ombaka (Benguela) o ministro dos Antigos Combatentes e Veteranos da Pátria, general Kundi Paihama, disse que os que lutarem contra o MPLA e contra José Eduardo dos Santos “vão ser varridos”.
Como o regime só reconhece a existências de um único deus, Eduardo dos Santos, não admite que existam dúvidas, não aceita que a sua liberdade termine onde começa a do Povo. Vai daí, intimida, ameaça, espanca, rapta e mata quem tiver a veleidade de contrariar o “querido líder”.
Na senda do que tem feito ao longo dos anos, o MPLA acusa a Oposição de enveredar por "manifestações violentas e hostis, provocando vítimas, inventando vítimas, incentivando a desobediência civil, greves e tumultos, provocando esquadras e agentes e patrulhas da polícia com pedras, garrafas e paus". E como, segundo o regime, todos são culpados até prova em contrário, Eduardo Militão bateu todos os índices de criminalidade ao circular no Huambo com uma camisola da UNITA, ainda por cima no dia em que o dono do país estava na cidade.
Outro crime que está a atormentar as soberbas mentes do regime respeita ao facto de, segundo o MPLA, haver indícios de que demasiados angolanos estão a pensar sem ser com a barriga. E isso não pode ser tolerado. Desde logo porque pensar faz ver que existe uma diferença entre a hiena que chora e a que entoa o hino do MPLA.
Tendo na memória as manifestações dos jovens ou a mais recente de ex-combatentes, não adianta, pelo menos por enquanto, dizer que a polícia (armada até aos dentes) e os seus capangas à civil, desrespeitam o direito à manifestação e os direitos humanos. E não adianta porque Angola não é um Estado de Direito mas, antes, um reino em que o soba tem plenos poderes, inclusive para mandar matar quem pense de maneira diferente.
Seja como for, todos esses manifestantes ajudam a semear a Primavera, embora até agora vivam no mais duro Inverno. Todos gritam que "a polícia é do povo, não é do MPLA", ma continuam a esquecer-se que o MPLA é Angola e Angola é o MPLA.
Recorde-se que a 3 de Setembro do ano passado, uma manifestação organizada pelo movimento de jovens terminou com a detenção de 21 manifestantes, 18 dos quais foram julgados e condenados a penas de prisão entre um mês e 90 dias, por ofensas corporais à Polícia e danos materiais.
Em Angola "vive-se uma democracia com medo", disse na altura o "rapper" angolano Mona Dya Kidi. Mentira. No reino de Eduardo dos Santos existe a mais avançada democracia de que há conhecimento… Duvidam? É só perguntarem, entre outros, a Cavaco Silva, Passos Coelho ou Durão Barroso. E se, mesmo assim, tiverem dúvidas perguntem ao insuspeito… José Eduardo dos Santos.
Falar, no caso de Angola, de democracia com medo é uma forma de branquear a situação, compreensível no contexto de que os angolanos sabem que o regime mata primeiro e pergunta depois. Aliás, se existe medo é porque não existe democracia.
O regime de Eduardo dos Santos sabe bem que a melhor forma de exercer a sua “democracia” é ter 70% da população na miséria, é ter tirado a coluna vertebral à esmagadora maioria dos seus opositores políticos e militares, a começar por Geraldo Sachipengo Nunda e acabando em “Black Power”.
O regime não brinca em serviço e, por isso, nada como preventivamente mostrar aos manifestantes (bem como aos jornalistas) que quem manda em Angola, tal como em Portugal, é o MPLA.
Defender a liberdade de expressão não é nada do outro mundo, mas é algo que o regime não quer. Tudo quanto envolva a liberdade (com excepção da liberdade para estar de acordo com o regime) é algo que causa alergias graves a Eduardo dos Santos.
Recorde-se, a propósito das manifestações, que Bento Bento, o chefe do posto do MPLA em Luanda, foi claro quando disse: "Quem tentar manifestar-se será neutralizado, porque Angola tem leis e instituições e o bom cidadão cumpre as leis, respeita o país e é patriota."
Apesar de tudo, as manifestações fazem – por muito pequenas que (ainda) sejam - tremer o regime. A tal ponto que – relembremos - perante o anúncio da primeira manifestação, o Governo angolano apressou-se a pagar salários em atraso nas Forças Armadas e na Polícia, a fazer promoções em série e a, inclusive, a mandar carradas de alimentos para a casa de milhares de militares.
Basta também ver que, perante essas manifestações, o regime pôs nas rua e por todo o lado – mesmo em locais onde os angolanos nem sabiam que iria haver manifestações – os militares e a polícia a avisar que qualquer apoio popular aos insurrectos significava o regresso da guerra.
No entanto, por muita força que tenha a máquina repressora do regime angolano (e tem-na), por muito apoio que tenha de alguns órgãos de comunicação estrangeiros, como a RTP, nunca conseguirá fazer esquecer que a luta continua e a vitória é certa.
* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.
Título anterior do autor, compilado em Página Global: SONHAR COM COMIDA E ARROTAR DE SATISFAÇÃO
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