domingo, 18 de outubro de 2015

Pinto da Costa: Obiang é um irmão, um militante da luta de libertação nacional



São Tomé e Príncipe

A visita oficial do Presidente da Guiné Equatorial, é considerada por Pinto da Costa como um convívio entre irmãos. Um irmão verdadeiro, acrescentou o Chefe de Estado são-tomense, que recordou as acções de Teodoro Obiang Nguema Mbasogo , durante o período da luta pela libertação de São Tomé e Príncipe.

Por isso o considerou como um militante da luta pela libertação nacional. «Em 1972 quando se criou o MLSTP na Guiné equatorial, o Presidente Obiang estava lá. Depois disso a partir de 1972, ele tinha a missão de defender os líderes de libertação. Em 1973 houve o assassinato de Amilcar Cabral, com a mão da PIDE Portuguesa, e teve que se tomar medidas severas para proteger os dirigentes, e o Presidente Obiang liderou a comissão que tinha a missão de proteger os dirigentes são-tomenses que estavam na Guiné Equatorial», relatou Pinto da Costa.

Os dois irmãos que se reuniram na manhã de domingo no Palácio do Povo, fizeram uma vasta análise da situação dos dois países, mas também do continente africano.

O Presidente da Guiné Equatorial, recordou que não vinha a São Tomé há cerca de 3 anos, mas que o seu homólogo regularmente o visitou na Guiné Equatorial. Segundo Obiang, actualmente o continente africano se confronta com graves problemas económicos imposto, «pelos donos do mundo e da economia mundial».

Daí que os dois chefes de Estado analisaram o cenário e estudam a melhor forma de se posicionarem em relação ao momento actual.

Em termos das relações bilaterais, o Presidente de São Tomé e Príncipe, prosseguiu realçando os aspectos históricos e de consanguinidade. «São relações muito estreitas que vêm do passado. Guiné foi colónia portuguesa durante 300 anos. Por isso deixou raízes. Muitos são-tomenses iam a Fernando Pó. Há sangue cruzado de tal forma que temos que aproveitar esta ocasião para melhor estreitar as nossas relações», frisou.

Os dois países são membros da CEAC, da Comissão do Golfo da Guiné, e da CPLP a comunidade lusófona. Aspecto que segundo Pinto da Costa, reforça a parceria bilateral em benefício da região africana e da CPLP.

Guiné Equatorial integra também o grupo dos países africanos de expressão portuguesa, os PALOP.

Abel Veiga – Téla Nón

Guiné Equatorial propõe a São Tomé e Príncipe criação de empresa mista para explorar petróleo



São Tomé, 18 out (Lusa) - O presidente da Guiné Equatorial, Obiang Nguema Basogo, propôs hoje a criação de uma empresa mista com S. Tomé e Príncipe para explorar o petróleo existente na fronteira marítima entre os dois países.

Há uma zona limítrofe "entre a Guiné Equatorial e São Tomé e Príncipe que tem uma bolsa muito importante e, quando se iniciou a prospeção, eu vim aqui para firmar o acordo de limitação da fronteira marítima com São Tomé", explicou Obiang.

"Eu proponho que procuremos empresas que nos possam ajudar a explorar o petróleo que existe na fronteira comum. Podemos fazer o se chama de empresa mista entre São Tomé e Guiné Equatorial e dividir o produto da exploração desta grande bolsa que está na nossa fronteira comum", acrescentou o presidente da Guiné Equatorial.

O chefe de Estado, que iniciou hoje uma visita de 48 horas a São Tomé e Príncipe a convite do seu homólogo são-tomense, Manuel Pinto da Costa, lançou a proposta durante uma conferência de imprensa conjunta dada pelos dois presidentes na capital são-tomense.

"A Guiné Equatorial era um país pobre, que beneficiou do seu próprio petróleo. Temos feito prospeções na zona e São Tomé também tem petróleo como a Guiné Equatorial. Só falta encontrar mecanismos para explorar esse petróleo e é a única solução para que São Tomé e Príncipe possa despegar-se", sublinhou.

A delegação do presidente da Guiné Equatorial integra mais de 40 membros, entre os quais quatro ministros, como o das minas, indústria e energia.

"O nosso ministro das minas visitou várias vezes São Tomé enviado por mim e é nesse sentido que poderíamos ajudar São Tomé a explorar o seu petróleo nas zonas livres. Sei que têm acordo com a Nigéria e não temos que impedir os acordos firmados com outros países africanos", sublinhou o Presidente da Guiné Equatorial.

A cooperação com S. Tomé e Príncipe em particular e a concertação de posições sobre os graves problemas que afetam o continente africano estiveram no centro do encontro entre os dois chefes de Estado.

Obiangue Nguema Basosgo, que se desloca à capital são-tomense na sua primeira visita após a integração da Guiné Equatorial na comunidade dos países de língua portuguesa, "agradeceu aos países da CPLP" por terem admitido o seu país e o "grande apoio" de S. Tomé e Príncipe para que essa integração fosse possível durante a reunião de Timor-Leste.

Para o presidente Pinto da Costa, o país tem de se organizar para melhor aproveitar os apoios dos parceiros.

MYB // JLG - foto em Téla Nón

Macau é "uma bomba prestes rebentar" e crise do jogo pode fazê-la explodir -- académico



Hong Kong, China, 17 out (Lusa) -- O investigador da Universidade de Macau Newman Lam manifestou hoje preocupação em relação à estabilidade do território, que considerou uma "bomba" que a queda das receitas dos casinos pode fazer rebentar.

Lam, que falava na Conferência Anual da Associação de Ciência Política de Hong Kong, acredita que Macau está à beira de uma crise, mas defende que isso pode não ser mau.

O investigador traçou um cenário de descontentamento crescente e de quebra da legitimidade do Governo de Macau que, juntamente com a descida das receitas dos casinos, principal fonte de receita pública e setor em que assenta a economia da região, pode pressionar a população a agir.

Lam apontou números do Programa de Opinião Pública de Hong Kong, relativos a 2014, segundo os quais a satisfação da população de Macau em relação ao desenvolvimento democrático atingiu 26,5% em 2014, o valor mais baixo desde que os dados começaram a ser recolhidos.

Também a confiança na fórmula chinesa "um país, dois sistemas" atingiu os seus mínimos: 69,6%. E apenas 37,6% disseram no ano passado estar satisfeitos com a proteção dos direitos humanos e 56,2% aprovaram o trabalho do chefe do Executivo, segundo o mesmo inquérito.

"Qual é o motivo para a descida da confiança? Depois da liberalização do jogo, o fosso salarial aumentou, os ricos ficaram mais ricos, os pobres mais pobres. Os preços do imobiliário subiram a pique, 28,2% da mão-de-obra é importada, o Governo não consegue resolver o problema do trânsito. Macau está cheia, já nem queremos ir até ao Senado, são demasiados turistas", resumiu.

O investigador chamou também a atenção para o surgimento de novos "grupos críticos" além da Associação Novo Macau, como a Juventude Dinâmica e a Macau Civic Power, que, apesar de "poucos e pouco efetivos", são "um sinal do que vem aí".

Ainda assim, sublinhou que Macau tem sido uma cidade pacífica, com poucos protestos e uma resposta moderada da sociedade civil. Mas a "crise do jogo" pode vir a acabar com este cenário: "As pessoas de Macau põem muita ênfase na harmonia. Não as temos visto agir como em Hong Kong. O que as pessoas pensam e o que manifestam são coisas diferentes, elas inibem-se. A harmonia é uma coisa boa, mas pode tornar-se uma bomba", afirmou.

O académico acredita que há um sentimento de saturação que, aliado a uma juventude "mais informada e que não aceita com tanta facilidade as decisões da autoridade", pode fazer tremer a estabilidade social.

O professor deu o exemplo da associação de estudantes de Macau que, "quando se assinalou o fim da guerra, com uma enorme parada pela vitória [da China] contra o Japão", disse que a data deveria ser lembrada com flores, discursos e visitas aos túmulos dos que morreram.

"Nunca vi nada assim acontecer na associação de estudantes. Acho que é um sinal claro que estamos a olhar para uma geração com uma mente independente, que não aceita apenas o que lhe dão, que pensa e que talvez até se atreva a falar", acrescentou.

Lam prevê também consequências para os bolsos dos residentes de Macau em 2016, antecipando o fim dos cheques anuais à população, cortes no orçamento e despedimentos nos casinos.

"Não acreditem nos jornais que dizem que estamos no caminho da recuperação, os jornais são controlados pelo Governo. Não vejo a China a amenizar a política anticorrupção e, por isso, a recuperação de Macau não vai acontecer", alertou.

O que Macau precisa, defendeu, é de uma reforma económica, que reduza a dependência do jogo e, acima de tudo, garanta acesso à habitação: "Acho que esta crise vai pressionar o Governo e isso pode ser uma coisa boa. Quando as pessoas se aperceberem que há uma bomba prestes a rebentar, talvez façam alguma coisa para a impedir de explodir". 

ISG // ZO/JLG

Governo de Macau vai continuar a controlar "dimensão do crescimento" do jogo



Macau, China, 18 out (Lusa) - O Governo de Macau disse hoje que vai continuar a limitar a abertura de novas mesas de jogo no território e a controlar a "dimensão do crescimento" do setor, lamentando as críticas recentes de um operador de casinos.

Na sequência de críticas de Steve Wynn, o norte-americano que preside à Wynn Resorts, o executivo de Macau reafirmou, em comunicado, a intenção de regulamentar a gestão do jogo "com vista a fomentar o desenvolvimento ordenado da indústria".

O objetivo do Governo de Macau é diversificar a economia, dependente, atualmente, do jogo, e tornar o território num "centro mundial de turismo e lazer", ou seja, com componentes de atração de visitantes para além do jogo.

"A otimização da estrutura industrial do território, a promoção da diversificação adequada da economia, o controlo apropriado da dimensão do desenvolvimento do sector do jogo, constituem consenso na sociedade local" e "representam ainda a direção inalterável da governação" do Executivo de Macau, lê-se no comunicado hoje divulgado.

Quanto aos pedidos para mesas de jogo em projetos em desenvolvimento pelas operadoras no território, o Executivo garante que não mudará o limite já definido para abertura de novas mesas e que a resposta a cada pedido levará em consideração fatores como o "desenvolvimento do mercado" e a adequação dos novos casinos e 'resorts' ao objetivo de construção do centro mundial de turismo e lazer em Macau.

Segundo o mesmo comunicado, o secretário para a Economia e Finanças do Governo de Macau, Leong Vai Tac, reuniu-se hoje com responsáveis da Wynn por causa destas questões e o Executivo "emitiu, há dias, instruções internas" às operadoras de jogo no território para desenvolverem as suas atividades "nos termos da lei, otimizando os planos de gestão, a fim de elevar a imagem das empresas e sua capacidade concorrencial".

Na semana passada, Steve Wynn disse que em 45 anos de ligação ao negócio dos casinos, nunca viu nada como aquilo que está a acontecer em Macau, considerando "irracional" os limites introduzidos às mesas de jogo em novos 'resorts' e que as operadoras só saibam quantas mesas poderão criar poucas semanas antes de abrirem os novos casinos.

"Construímos dezenas de milhares de quartos, restaurantes e atrações, mas dizemos [às pessoas]: 'vocês não podem jogar porque não há mesas'. Bem, essa é uma das razões por que elas vêm a Macau. Se quiserem minar e sabotar a viabilidade desta indústria, imponham limites às mesas. Sou muito crítico desta decisão, porque não a entendo de maneira nenhuma", afirmou, sublinhando que tem 45 anos de experiência neste negócio e nunca viu uma situação semelhante.

Steve Wynn, citado pela agência Bloomberg, falava numa conferência telefónica com analistas, a partir dos Estados Unidos, no dia em que foram divulgados os resultados da empresa que lidera relativos ao terceiro trimestre do ano.

A Wynn Macau teve uma quebra homóloga de 37,9% das receitas líquidas no terceiro trimestre, para 585,1 milhões de dólares (514,4 milhões de euros). Já a operação em Las Vegas caiu 3,9%.

As receitas dos casinos de Macau, o maior centro de jogo do mundo, estão em queda desde junho de 2014, tendo registado em setembro o valor mais baixo dos últimos cinco anos.

MP (ISG) // JLG

TUFÃO DEIXA MILHARES DE DESABRIGADOS NAS FILIPINAS



Koppu destruiu casas, derrubou árvores e provocou deslizamentos de terras e enchentes no norte do país, obrigando mais de 25 mil pessoas a deixarem suas casas. Pelo menos quatro pessoas morreram.

O tufão Koppu destruiu neste domingo (18/10) casas, derrubou árvores e provocou deslizamentos de terra e enchentes no norte das Filipinas, obrigando que mais de 25 mil pessoas a deixarem suas casas, segundo o governo local. Pelo menos quatro morreram. Duas perderam a vida afogadas, uma sofreu um choque elétrico e outra foi morta pela queda de uma árvore.

Milhares de famílias foram abrigadas em alojamentos de emergência. Operações de resgate são realizadas na província de cultivo de arroz de Nueva Ecija, onde os rios transbordaram e inundaram várias aldeias. "As pessoas estão pedindo ajuda, porque as águas estão subindo. As equipes de resgate não podem entrar na área", afirmou o chefe local da proteção civil, Nigel Lontoc.

Imagens de televisão mostram a fúria dos rios, destruindo casas e arrastando grandes detritos, como troncos de árvores.

O tufão atingiu a costa da vila pesqueira de Casiguran, situada a cerca de 200 quilômetros a nordeste da capital Manila, antes do amanhecer deste domingo, com rajadas até 210 quilômetros por hora, durante cerca de sete horas.

Apesar do enfraquecimento da tempestade, as autoridades locais alertaram para as fortes chuvas que também podem provocar enchentes e deslizamentos de terra na cordilheira, conhecida pelos seus terraços de arroz nas encostas das montanhas.

As Filipinas são afetadas por cerca de 20 tufões por ano. Um dos mais destruidores foi o Haiyan, que passou em novembro de 2014, matando pelo menos 6, 3 mil pessoas e deixando 4 milhões de desabrigados.

MD/efe/lusa - Deutsche Welle

Moçambique comemora mais um Dia Mundial da Alimentação com milhões de pobres e desnutridos



Adérito Caldeira - @Verdade

O mundo comemora nesta sexta-feira (16) o Dia Mundial da Alimentação, em Moçambique há pouco motivos para comemorar pois mais de doze milhões de moçambicanos ainda vivem no limiar da pobreza, cerca de dez milhões enfrenta a desnutrição crónica que na sua maioria são camponeses que continuam a ser marginalizados pelo Governo de Filipe Nyusi que, tal como o seu antecessor, continua a apostar nos grandes investimentos agrícolas que para acabar com a fome e a pobreza.

"Apesar de Moçambique estar a registar um nível de crescimento económico robusto e sustentado nos últimos anos, a taxa de pobreza continua inaceitavelmente elevada", disse o Chefe de Estado moçambicano para “nórdico ver”.

Embora seja um avanço Filipe Nyusi reconhecer o estado em que está a economia o Presidente precisa de admitir que a elevada pobreza se deve, nas últimas décadas após o término da guerra civil, às políticas que o seu partido Frelimo tem posto em prática.

“A pobreza extrema está desproporcionalmente concentrada nas zonas rurais e, nessas zonas, os pobres dependem mais da agricultura do que outras famílias rurais, especialmente na África Subsariana”, refere um relatório da agência das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), apresentado nesta quinta-feira(15) em Maputo, onde é também recordado que “é a dependência da agricultura por parte dos mais pobres e as suas despesas com a alimentação que fazem da agricultura uma actividade chave para intervenções de mitigação da fome e da pobreza”.

O relatório da FAO é sobre “O Estado da Alimentação e da Agricultura” em todo o mundo mas assenta bem para a realidade em Moçambique onde os mais pobres vivem efectivamente nas zonas rurais e são camponeses.

Ora o Plano Quinquenal de Nyusi propõe-se continuar a exterminar a agricultura familiar, que é praticada pela maioria dos moçambicanos mais pobres, orientando-a para a produção industrial e intensiva, promovendo a agricultura comercial e o fomento das culturas estratégicas, tradicionais e emergentes orientadas para o mercado.

Por outro lado, a produção de comida é cada vez menos suficiente para as necessidades dos moçambicanos, embora no Orçamento de Estado a fatia da agricultura tenha aumentado, grande parte desse dinheiro é aplicado em sectores que não têm efeito directo sobre a produção.

Facilitar o acesso aos fertilizantes, desde estarem disponíveis nas zonas rurais até terem preços acessíveis, criar créditos para os camponeses, melhorar as infra-estruturas e serviços para aceder a mercados justos são alguns dos desafios mais do que conhecidos da agricultura em Moçambique.

De acordo com o relatório SOFA 2015 da FAO, “Programas de obras públicas criam infra-estruturas importantes para as comunidades e contribuem directamente para a economia local, quando elaborados e implementados adequadamente”. O drama é que em Moçambique as obras públicas criam elefantes brancos como o estádio nacional do Zimpeto, a ponte para a Catembe que pouco ou nada contribuem para os camponeses.

Pior tem sido o endividamento público cujo ponto mais alto foi o empréstimo avalizado ilegitimamente pelo Governo de Armando Guebuza para uma empresa de pesca de atum cuja viabilidade sempre se soube não existir.

“A luta contra a fome e a pobreza tem de ser feita sobretudo nas zonas rurais. Mais investimentos devem ser feitos em prol de pequenos produtores, agricultores familiares, mulheres rurais, comunidades pesqueiras e indígenas bem como outros grupos vulneráveis ou marginalizados”, enfatiza a FAO no seu relatório de 2015 onde sugere que medidas de protecção social são necessárias na luta contra a fome e a pobreza. “Longe de criar dependência ou reduzir o esforço de trabalho, ao ajudar as famílias a ultrapassar limitações de crédito e liquidez, a protecção social fortalece os modos de vida e fomenta actividades dentro e fora de explorações agrícolas.”

Mas em Moçambique a protecção social, que varia entre os 310 e os 550 meticais mensais, cobre apenas cerca de 15% da população necessitada.

“Protecção social por si só não é suficiente. Famílias pobres e vulneráveis normalmente enfrentam múltiplas limitações e riscos e os modos de vida rurais podem ser melhorados através de iniciativas agrícolas e de protecção social conjuntas”, recomenda a FAO que escolheu protecção social e agricultura como tema do Dia Mundial da Alimentação deste ano.

Moçambique. RÁDIO FRELIMO FAZ 40 ANOS



@Verdade - Editorial

É inegável a importância que a Rádio Moçambique (RM) tem na nossas vidas, para a maioria dos moçambicanos continua a ser a única fonte de informação diária e actual. É preciso reconhecer o bom trabalho que a RM nos tem prestado ao longo dos 40 anos, comemorados no passado dia 2 de Outubro, não só trazendo informação mas também educação, desporto e diversão, contudo a rádio sustentada pelos nossos impostos não tem sido rigorosa e objectiva particularmente quando os assuntos são relativos ao Governo e ao partido Frelimo.

Pior do que ignorar assuntos de interesse público, como a Rádio estatal fez quando o povo saiu às ruas de Maputo e da Matola em Fevereiro de 2008 e depois em 2010, tem sido a primazia e o espaço concedido a assuntos do partido no poder por isso não é de estranhar que o presidente do partido Frelimo, e Presidente de Moçambique, diga que "o serviço público de comunicação não pode deixar-se distrair com a concorrência pouco patriótica".

O patriotismo a que Filipe Nyusi se refere deve ser a cobertura claramente favorável ao seu partido que tem sido feita pela única rádio com cobertura, cada vez mais, nacional desde que há eleições em Moçambique.

A primazia à propaganda do partido Frelimo chegou ao extremo de, em Abril de 2008, a RM (e também a Televisão de Moçambique), interromperem a transmissão em directo de um informe do Procurador-Geral da República na casa do povo para reportarem a reunião dos antigos combatentes do partido dos camaradas.

Por isso é questionável o “papel unificador do povo moçambicano”, que o Chefe de Estado diz que a Rádio Moçambique tem, quando nos recordamos da forma como reportou o recente cerco e invasão à residência do líder do maior partido da oposição em Moçambique.

Também não é verdade que a antena nacional seja “palco privilegiado da luta política e democrática”. Quando horas de programas de debates, análises e comentários foram radiodifundidos com a presença de convidados apenas do partido Frelimo ou simplesmente alargados à oposição que se auto-intitula construtiva, mas todos sabemos ser vassalos do partido que nos governa desde 1975?

O desafio que fica para o futuro imediato é que o serviço público de rádio traga-nos informação com zelo, profissionalismo e, acima de tudo, imparcialidade, caso contrário que nos inibam de pagar a taxa de rádio e nem usem os fundos do Orçamento do Estado, que sejam os membros do partido Frelimo a custear a Rádio Moçambique.

IGREJA CATÓLICA QUER MEDIAR NO CONFLITO EM MOÇAMBIQUE



Não é a primeira vez que os bispos católicos moçambicanos pedem o diálogo entre o Governo do Presidente Nyusi e o maior partido da oposição, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO). E a consternação cresce.

Os bispos católicos moçambicanos dizem ter ficado preocupados com o cerco das forças de segurança à casa do líder do maior partido da oposição, a RENAMO, no passado dia 9 de Outubro. Na ocasião foi desarmada a guarda pessoal de Afonso Dhlakama.

Numa conferência de imprensa, em 15 de outubro, o arcebispo da Beira, Dom Cláudio Dalla Zuanna, referiu, no entanto, que há que pôr fim à proliferação de armas no país: "Os partidos ou grupos que confiam nas armas para resolver ou para impor a sua razão, já estão do lado daquele que vai perder. É preciso, com certeza, fazer um trabalho, para convencer que as armas não podem estar espalhadas no país nas mãos de qualquer cidadão".

"Dhlakama quer dialogar"

Dom Cláudio Dalla Zuanna foi um dos mediadores que foi à casa de Afonso Dhlakama, durante o cerco das forças de segurança. No domingo passado (11.10), Zuanna visitou o líder da RENAMO, tendo Dhlakama reiterado a vontade de resolver os diferendos políticos através do diálogo.

"Foi uma conversa tranquila. Vi um homem tranquilo. Ele continua a afirmar o seu desejo de um diálogo, que seja um diálogo construtivo, um diálogo sobre assuntos concretos, sobre tentar enfrentar algumas questões práticas. Isto é o que ele afirmou", disse o arcebispo.

Carta ao Presidente

Os bispos católicos redigiram esta semana uma carta ao Presidente da República, Filipe Nyusi, e ao líder da RENAMO, Afonso Dhlakama, em que solicitam um encontro entre ambas as partes, disse o arcebispo da Beira em conferência de imprensa.

"Vimos reafirmar a nossa inteira disponibilidade, e já esta semana o fizemos, por escrito, dirigindo uma carta pessoalmente ao Presidente da República e ao líder da RENAMO. Os bispos católicos aliam-se a quantos amam a paz. Para procurarmos juntos os caminhos que nos conduzam a todos à consolidação da paz, a que Moçambique tem direito e de que tanto precisa", anunciou.

Dom Cláudio disse ainda aos jornalistas que a visita planeada à Beira, no sábado (17.10), do Presidente moçambicano, será o momento ideal para as duas partes se encontrarem no sentido de pôr um ponto final à crise política.

Arcénio Sebastião (Beira) – Deutsche Welle

Angola. DIÁLOGO EXCLUSIVO COM LUATY BEIRÃO




“NÃO PERCEBI O PORQUE É QUE FIZERAM ISSO COMIGO”

Folha 8 digital

Apesar da extrema cordialidade e generosidade do Director da Prisão de Alta Segurança de Calomboloca não foi permitida a entrada de telemóveis e outros meios pessoais que não sejam um único documento. É uma clara regra de segurança admissível numa penitenciária de tão elevado nível. Por isso, a conversa que se segue resulta de um esforço de memória sobre o diálogo com Luaty Beirão ao longo de uma visita feita na qualidade de amigos e pessoas que cruzaram os caminhos na base de uma empatia natural e estando a defender ideais de reforma do Estado para que melhor se adapte as necessidades de todas as gerações de angolanos.

O que atrai e é superior em Luaty Beirão, é o sentido de verticalidade moral que erradia em todas as suas acções, vindo disso um profundo sentimento de solidariedade e uma clara convicção suportada por uma expressiva inteligência muito rara em jovens da sua idade. Tão cara é a personalidade deste jovem, que não é possível privar com ele sem que se lhe ganhe a confiança e o companheirismo de tão naturalmente solidário que é. E o que é curioso em Luaty Beirão é em como um ateu convicto como é, chega ter mais fé do que os mais fervorosos religiosos, tal como é curioso que as suas feições se assemelhem a imagem de Jesus Cristo tal como é perfeitamente pintado sobre telas sacras.

É evidente que a conversa aqui expressa não representa se quer 15% de tudo quanto falamos. São apenas resquícios de uma memória ainda fresca e não é completamente fiel à letra dos argumentos expendidos. Mas exprime claramente o espírito do que foi falado. O diálogo assumido por mim, é apresentado no plural considerando a participação de outras pessoas. Por razões de protecção de direitos de personalidade das partes intervenientes, o diálogo não faz referência de qualquer delas.

Estando num estado de manifesta debilidade física, Luaty Beirão foi trazido até nós com apoio de agentes da guarda prisional. Depois de um demorado abraço, a conversa entre nós fluiu:

PERGUNTA - Sabes, Luaty, viemos de emergência por ter recebido uma mensagem que dizia que estavas em es­tado crítico de saúde.

LUATY BEIRÃO: Agradeço a vossa visita. Nem sei como é que conseguiram que eu fosse solto da cela em que me en­contro. Estou há 20 dias sob castigo e estou proibido de re­ceber visitas. Fico muito feliz por terem conseguido que isto acontecesse…!

P- Não somos os únicos, tens mais visitas a aguardarem lá fora.

LUATY BEIRÃO: Porque é que não entram?

P - Infelizmente foi aberta uma excepção apenas para nós, dada a urgência que temos em falar sobre a tua greve de fome!

LUATY BEIRÃO: Ah, ok !(ar­rastou os dedos trémulos so­bre o cabelo escuro descui­dado).

P - Como é que te sentes?

LUATY BEIRÃO: Muito mal. Hoje acordei com tonturas. Mas o resto está tudo bem. Continuam com o plano da concertação? É que precisa­mos encontrar um equilíbrio entre o poder e o povo. Pre­cisamos de continuar a pensar na necessidade de reduzir os conflitos na sociedade. Não podemos continuar a viver numa situação em que as boas intenções das pessoas não são levadas em conta. Eu nem compreendi porque é que nos prenderam…!

P - Continuamos sim a pen­sar numa estratégia de aproximação entre a socie­dade e o poder político. Já começamos a sentir mais vontade de dialogar em toda a sociedade. Acho que a vossa prisão despertou a sociedade para os exageros que têm acontecido e os ex­cessos de zelo desnecessári­os. Participamos nas jor­nadas parlamentares dos partidos da oposição realiza­das há semanas e sentimos a manifestação dessa vontade pelos partidos políticos. Nas recomendações finais fi­cou a ideia da necessidade de diálogo com o partido no poder. Só não sabemos se entre os partidos políticos isso tem pernas para andar. Mas foi bom ouvir isso dos próprios líderes dos partidos políticos.

LUATY BEIRÃO: Pro­curar equilíbrios. É necessário. A socie­dade não pode con­tinuar a mergulhar em conflitos sociais cada vez mais profundas. Estamos a pressionar para que aceite dialog­ar connosco. Você sabe disso. E as nossas mani­festações são pacíficas por isso mesmo. Olha, comecei a escrever umas notas sobre a TEORIA DO PERDÃO para avançarmos para uma fase em que os angolanos têm que se perdoar mutuamente e promover harmonia entre si. Essa teoria não é para achar culpados e meter na cadeia. É para que as pessoas saibam apenas o que as pessoas fizeram e depois tudo se perdoa. É a melhor forma de recomeçar­mos essa sociedade. Mas era para enriquec­er aquele documento sobre a concertação politica e económica que nós elaboramos da outra vez. Lembras-te?

P - Claro. E continua­mos a enriquecer com novas ideias.

LUATY BEIRÃO: E só não entendo porque nos confundem com gente de má fé. Nós devíamos ser aprovei­tados para ser a ponte entre o poder e o povo. Mas ninguém quer saber de nós. Ninguém quer dialogar…É muita pena!

P - Falando da tua greve de fome. Não achas que devias sus­pendê-la?

LUATY BEIRÃO: Sus­pendê-la para quê? Hoje fiz 18 dias desde que deixei de comer e já não me resta muito tempo de vida!

P - Conhecendo como és, sabemos que não é fácil demover-te das tuas convicções. Mas não achas que a tua greve de fome seria mais eficaz se a fizesses na fase do julgamento que é a altura propícia para a tua defesa?

LUATY BEIRÃO: Alba­no, eu sei que está tudo perdido. Para um pro­cesso que vem sendo viciado desde o inicio, não me parece pruden­te esperar que eu venha a ser inocentado, mes­mo sendo realmente inocente em relação as acusações. Então o que pretendo é estar provisoriamente livre para estar com a minha família pela última vez e enquanto aguardo pelo julgamento. Se o crime admite liberdade provisória porquê é que não me libertam? Nem se quer estou a pedir para não ser julgado e condenado. Isso é outra fase. Quero apenas go­zar dessa liberdade que a lei me permite para es­tar com a minha família. E depois me conformo com o tempo de conde­nação que eles darem!

P - Mas com essa greve de fome nem se quer chegas a fase de jul­gamento, que é o ver­dadeiro momento da defesa dos teus ideais e do contágio ao públi­co, porque as pessoas estão curiosas em ou­vir da vossa própria voz, o que se passou realmente para serem presos. Se não che­gas ao julgamento, aí o movimento revolu­cionário perde lider­ança…!

LUATY BEIRÃO: Oh, Albano, você sabe que eu detesto esse nome. Não me fale em movi­mento revolucionário e eu não sou líder de nada!

P - Luaty, a chefia es­colhe-se. Mas a lider­ança de um indivíduo flui entre os membros do grupo de forma natural. Ela impõe-se por si mesma através da admiração que os outros nutrem pelos valores que defende e pelo sentido de co­erência que manifes­tas. Estivemos na área do bloco em que estás encarcerado e per­cebemos que todos os reclusos e muitos dos guardas prisionais ad­miram muito a tua ver­ticalidade e sentem-se tocados pela causa que defendes. Isso é liderança…!

LUATY BEIRÃO: Al­bano, sabes que sempre defendi que os grupos não devem ter líderes. Eu acho que sou igual a qualquer um e faço o que posso e devo fazer!

P - Seja como for, acabas sendo a pessoa com a maior ascend­ente moral sobre os outros. A tua verticali­dade acaba impondo isso, mesmo. Percebe-se que aqui um gener­alato em que estás no topo…!

LUATY BEIRÃO: (Risos). Eu percebo aonde queres chegar. Mas olha a decisão da greve de fome foi toma­da em grupo. Eu nem se quer queria toma-la porque achava que era uma medida extrema. Mas a maioria acabou optando porque con­cluímos que enquanto não nos libertassem ninguém pararia com a greve de fome!

P- Mas os outros pa­raram de fazer greve de fome.…!

LUATY BEIRÃO: Sei que pararam. Mas a minha decisão está tomada. Já não posso recuar. É minha palavra dada ao grupo!

P - Mas em nome do grupo devias parar…!

LUATY BEIRÃO: Não faz qualquer sentido. Onde fica a minha hon­ra? Saiba que a minha própria mãe esteve cá e implorou para que eu parasse com a greve. A minha es­posa trouxe a minha filha para o mesmo objectivo. Se para as pessoas mais preza­das da minha vida eu não abri excepção, faz algum sentido eu parar com a greve ag­ora, que já nem posso comer e estou muito debilitado? Eu já fiz o meu pedido a família para quando morrer ser cremado e ter as cinzas atiradas ao mar!

P - Não temos pala­vras para tanta ele­vação moral e firmeza de espírito!

LUATY BEIRÃO: Olha que ao longo desse tempo que estou em greve, hoje foi a primei­ra vez que senti falha no sistema nervoso central. Sinto falhas na memória e as vezes não sinto as pernas. Não me parece que eu venha a resistir mais 2 dias!

P - Tens bebido água?

LUATY BEIRÃO: Ten­ho. Parece ser água com soro…Não sei bem!

P - Disseram-nos que já tinhas sido encaminhado para o Hospital-Prisão de São Paulo para inter­namento…!

LUATY BEIRÃO: Che­garam a levar-me em companhia de mais presos. Mas acabei sen­do o único que não saiu da viatura e voltou a re­gressar para aqui. Não percebi o porque é que fizeram isso comigo!?

P - Aqui te é permitido ler?

LUATY BEIRÃO: Posso. Tenho lido alguns liv­ros. A minha esposa trouxe-me uma Bíblia Sagrada…!

P - Ainda, bem que tens a Bíblia Sagrada. Se não a tivesses nós traríamos uma na próxima visita…

LUATY BEIRÃO: Já li a Bíblia Sagrada debaixo para cima. Já li a maio­ria dos livros todos do Velho Testamento e todos os livros do Novo Testamento e fiz ano­tações e tudo. Temos tido missas, vem um pastor ou um padre para essas coisas. Mas sabes que não acred­ito em Deus. Como é que vou acreditar num Deus que mata os próp­rios filhos, que se vinga …! (risos)

P .…Que se arrepende. Qualquer dia ainda acorda e diz que o homem já não vai para o paraíso porque está fechado! (risos)

LUATY BEIRÃO: Vê lá meu! (risos)

P - (risos) Olha a tua história me faz lem­brar a do filho de Win­ston Churchill, o es­tadista britânico da 2ª guerra mundial. O Pai era crente mas o filho não. Um dia o pai pediu a um pastor para que persuadisse o filho a ler a Bíblia Sagrada. E então o pastor con­seguiu aproximar-se ao filho e propôs que lesse apenas duas ou três páginas. Caso não gostasse do que leria podia devolva-lo. Aconteceu que o filho leu toda a Bíblia Sagrada e inclusive fez anotações, tal como fizeste na tua. O pastor entusiasmado com a sua vitória so­bre o filho, regressou vários dias depois, curioso em saber se tinha gostado. O filho pôs-se a rir e respon­deu: “Afinal é este Deus que vocês ado­ram? Tão sádico, homi­cida, vingativo, ran­coroso…não acredito que se possa acredi­tar num ser tão cruel” (risos)

LUATY BEIRÃO: Vê lá meu! (risos)

P - É claro que Deus não pode ser enten­dido dessa forma. Não se pode conceber um Deus com emoções e todos os defeitos hu­manos tal como vem escrito na literatura sacra. Há uma her­menêutica mais pro­funda que nos coloca diante de um Deus que torna o próprio mal e o bem como partes que concordam num todo harmonioso e elevam a sua verdadeira es­tatura de regulador universal. Se Deus é amor, faz algum sen­tido que ele mande matar o seu povo de forma sádica e homi­cida tal como vem no velho Testamento? Se Deus é todo-poderoso que sentido faz haver um outro ser chamado diabo que o contraria? Alguma coisa está errada na hermenêu­tica Bíblica Sagrada. Por isso, eu entendo que Deus é a combi­nação do bem e o mal e tudo que acontece tem alguma coerên­cia lógica que enten­dermos a Bíblia para além das palavras. A tua situação por ex­emplo é parecida com a história do Job.

LUATY BEIRÃO: Já li. Um tipo que tinha tudo e por causa de uma discussão entre Deus e o diabo acabou per­dendo tudo só porque Deus deu ordens ao Diabo para testar a sua fé! (risos)

P - Parece ser duas en­tidades (Deus e diabo) em conflito. Mas a história de Job é uma alegoria que exprime o conflito que ocorre na nossa própria con­sciência. O que se pas­sou é que era a própria consciência de Job em conflito de fé. Estava ele na luta entre de­fender os seus ideais e a família ou bens ma­teriais. É essa a her­menêutica subjacente nesse livro. E então ac­onteceu que ao escol­her os seus princípios morais (sua fé) acabou perdendo a família e os bens materiais. Em­pobreceu e apanhou lepra. Vinham amigos para demovê-lo dos princípios e ele não aceitava, até que um dia apareceu alguém que se sentou ao lado sem lhe contrariar num mero acto de soli­dariedade. E a firmeza nos princípios foi tal que quando já estava prestes a morrer de tanto mal causado pela doença. As cir­cunstâncias alteraram favoravelmente, so­breviveu e isso tornou ainda mais forte a sua convicção (risos)!

LUATY BEIRÃO: Ok!

P - E no seu caso, os princípios morais impuseram-se igual­mente. Preferiste sac­rificar a família e os bens materiais para salvaguardares os teus princípios morais (a tua fé). E estás neste estado de debilidade física que não é difer­ente de uma doença como a lepra. Já vi­eram muitos amigos para tentar dissuadir-te. Hoje que estás há dois dias do prazo de resistência fisiológica razoável viemos nós. E pela primeira vez tens pessoas que concord­am com os teus princí­pios! (risos)!

LUATY BEIRÃO: Então acreditas no destino?!

P - Claro. Sou deter­minista e não causal­ista!

LUATY BEIRÃO: Nesse caso acreditas que o que estou a fazer é algo predestinado. Tinha que fazê-lo?

P - Se isto é tão forte em si. É porque foste preparado para isso. E se nós aparecemos nessas circunstân­cias é porque alguma vontade suprema nos guiou e pretende que tudo termine, porque já deste provas bastantes da tua fé nos teus princípios!

LUATY BEIRÃO: Olha a primeira vez que eu ia acreditando em Deus foi quando sai de Portu­gal a pé até Angola?

P - De Portugal à An­gola, a pé?

LUATY BEIRÃO: A pé, de carro, de burro, mas tudo a boleia. Foi depois de terminar a formação na Europa. Decidi sair de Portugal passando pelo Tânger e seguindo por vários países africanos até chegar a Luanda. Não fui assaltado em toda a viagem até chegar no Sambizanga quando já estava uns quilómetros de casa (risos). Mas o que me impressionou foi quando cheguei aos Camarões. Eu não tinha aonde dormir e pedia ajuda a pessoas e não via ninguém interes­sado. E era a primeira vez que não sentia soli­dariedade nenhuma. Eu já estava sem alternati­vas, quando de repente apareceu um tipo que simpatizou-se comigo e disse que era angolano e vivia há 15 anos no país. Foi ele que me acolheu e tive até uma grande refeição. Foi uma expe­riencia muito forte na minha vida!

P - Realmente é uma experiência ex­traordinária. Quando já estavas no limite das tuas possibilidades, surgiu a solução!

LUATY BEIRÃO: Então se está escrita que vou passar por isso então só me resta manter-me firme. Se sobreviver será vontade de Deus ou seja o que for, se não então também é vontade dele.

P - Percebo que não é fácil contrariar os próprios princípios, mas terás de com­preender que se não resistes até a fase do julgamento, no mínimo tens de escrever algo em tua defesa para que possamos utilizar como o teu desejo pós­tumo em termos de ideais perseguidos e justificar as tuas no­bres visões sobre o Es­tado e povo.

LUATY BEIRÃO: Não sei. Já não leio em con­dições. Estou a perder a visão… (Suspiro pro­fundo)!

P - Se queres que aceitemos a tua morte, no mínimo prometa-nos que vais fazer apon­tamentos em tua def­esa. Em defesa da causa que sempre defendeste para que ela não se perca no esquecimento contigo mesmo…!

LUATY BEIRÃO: Está bem, Albano. Vou fazer algum esforço. Mas com­preenda que nessa altura é quase sobre-humano… (Suspiro profundo)! Mas devo reconhecer que desde que estou aqui pre­so nunca tive tanto tem­po de conversa com uma visita. É extraordinário o que vocês conseguiram e estou profundamente grato por isso!

A FORÇA DA ALMA

N.B: Ao longo do diálo­go de cerca de 3 horas, percebia-se que o es­forço de Luaty Beirão em manter a conversa vinha do próprio espíri­to entusiasmado pela nossa presença, que lhe permitiu abrir-se e expor-se tão a vontade como se desabafasse para a sua própria alma. Mesmo com a visível fraqueza do corpo che­gava a dar gargalhadas em volta dos vários te­mas que tratamos. Em­bora ateu, a alma divina estava nele. Claro é ap­enas ateu porque não crê no Deus sádico tal como não creio. E essa alma fazia a sua parte sobrenatural num cor­po fragilizado. Infeliz­mente, receio que tudo isso se repercuta nega­tivamente na sua saúde já debilitada. Mas foi concerteza um diálogo necessário e uma mo­mento impar na própria vida de Luaty Beirão. Pois, percebi que aca­bou saindo com uma nova fé e com um Deus renovado na sua per­cepção.

O MEU CHORO

(P.S: Depois de ter deix­ado a prisão, longas ho­ras depois de conter as fortes emoções que me provocaram a imagem deplorável e a integri­dade impar de Luaty Beirão, e percebendo nele uma jóia rara a desaparecer, explodi em choros e lágrimas, como nunca mais me aconteceu desde o fim da infância.)

*Jurista

AOS SENHORES DEPUTADOS - O SILÊNCIO SEPULCRAL ENSURDECE A NAÇÃO ANGOLANA



O F8 lancou-me o repto para me transformar, em jornalista ligado a cobertura de assuntos parlamentares, numa altura em que se inicia mais uma ano legislativo. Foi difícil aceitar, por não ser um jornalista, mas apenas um curioso nesse domínio, pelo amor a leitura e a escrita. A fasquia da ousadia do director do F8 foi elevada, principalmente, por me transformar em pioneiro de uma iniciativa, que diz vai continuar, pelo que dei o melhor de mim, logo peço a todos, como responsável, nesta edição dos assuntos parlamentares a vossa compreensão.

Manuel Paulo Mendes de Carvalho Pacavira** - Folha 8 digital

Os cidadãos assistiram o início da penúltima sessão par­lamentar da actual legislatura que ter­mina em 2017, se não ocor­rerem eleições antecipadas ou adiamento das mesmas, que podem ser visualizadas pelo tom do discurso de abertura deste magno acto.

No quadro do molde dos iluminados alfaiates da constituição atípica de Fe­vereiro de 2010, o Presiden­te da República, deve de acordo com o artigo 118.º, dirigir uma mensagem so­bre o Estado da Nação, na casa das leis.

O ritual para estes breves momentos não mudou: no escasso quilómetro que dista a Cidade Alta da As­sembleia Nacional tivemos artérias bloqueadas, milha­res de tropas da Unidade da Guarda Presidencial, espalhados por Luanda, ate­morizando os cidadãos face a ostentação de tanta força militar, em tempo de paz.

De que tem medo, afinal, o Presidente da República?

De Jonas Savimbi? Já mor­reu....

Dos jovens presos políti­cos? Estão presos...

Dos cidadãos?

Dos deputados?

Dos injustiçados e discrimi­nados pelo regime?

É difícil ousar uma resposta e uma justificativa, salvo os excessos e os gastos de di­nheiro público, que oneram as contas do Estado, sem qualquer razão plausível.

Mas voltemos a Assem­bleia Nacional, onde foi estendido o tapete verme­lho, ladeado pelo grupo de dança tradicional, ao som da Marimba e a comissão de honra dos 220 ilustres soberanos eleitos em repre­sentação dos cerca de 24 milhões de almas empobre­cidas, perfilada para saudar efusivamente e venerar a chegada do cidadão, José Eduardo dos Santos nas vestes de “Camarada presi­dente”.

As palavras de ordem em sua honra se multiplicavam e os comentaristas baju­ladores, desdobravam-se em análises, até que cai um balde de água fria. “Devido uma indisposição o Presi­dente será substituído pelo vice-presidente, Manuel Vicente, que vai ler a sua mensagem...

Feita a recepção e a praxe, foi ouvir, nos cerca de 50 minutos que a nação está no rumo certo, ao longo destes 40 anos e tudo que está mal a culpa é do jovem músico Kool Klever.

Mas vamos ao que ficou de fora. O que deveria ser dito à nação, aos angolanos e aos deputados que, indivi­dualmente, representam perto de 110.000 cidadãos, a maioria empobrecida, com excepção dos 4.900 milio­nários ligados a nomencla­tura governante, partidária e bajuladora que orgulhosa e vergonhosamente, Luan­da ostenta.

Recordemos que o OGE (Orçamento Geral de Esta­do) revisto de 2015, fixou-se em 30.754.626.041,00 KWZ , o equivalente a cerca de 300 mil milhões de dólares (USD 300mm) que poderá traduzir-se num valor “per capita” de USD 1.3m, por cada um dos deputados, fazendo com que o Presi­dente da República estará diante dos legisladores mais caros de África e do mundo.

Ao consultar-se o Orça­mento da IIIª Legislatura, iniciada em 2012, notamos que o contribuinte ango­lano pobre e espoliado é “roubado” para pagar as mordomias dos legislado­res em mais de 20 abonos, subsídios e ou regalias ex­traordinárias:

1) subsídio de início de legis­latura – Kwz: 11.250.000,00
2) salário base do Presiden­te da AN - Kwz:– 507.650,00
3) salário base para De­putado simples – Kwz: 430.760,00
4) subsídio de representa­ção – 50% salário base
5) subsídio de renda de casa - 10 % do salário base;
6) subsídio de manutenção de residência - entregue no inicio de cada ano legislati­vo;
7) subsídio de comunicação – 10% do salário base
8) subsídio de férias – pro­cessado no 6º mês de cada ano
9) abono, seguro de saúde;
10) subsídios aos cônjuges –ascendentes e descenden­tes maiores e menores in­capacitados fisicamente e estudantes até aos 25 anos;
11) subvenção vitalícia – no caso de incapacidade no de­curso da legislatura;
12) pensão vitalícia – 8 anos consecutivos em exercício de mandatos;
13) bilhetes em primeira classe – em cada ano parla­mentar incluindo família;
14) subsídio de desloca­ção – Deputados nos res­pectivos círculos eleitorais (265.000,00 Kzs);
15) subsídio ao pessoal do­méstico – 307.433,00 Kwz/mês (motorista, cozinheira, lavadeira, empregada do­méstica );
16) passaporte diplomático extensivo aos cônjuges e filhos menores;
17) porte de arma de fogo;
18) assistência médica e medicamentosa;
19) deslocações no interior para PR da AN – “Per diem” de 36.000,00 kzs, despesas de representação de 80,000 kzs. Para o exterior do país: subsidio diário de USD 600, despesas de represen­tação USD 1500, despesas extraordinárias USD 1200, ajudas de custos ao em­barque USD 1000 somen­te 1x por ano (Resolução 33 de 1 de Julho de 2009);
20) deslocações no in­terior para deputados simples – “Per diem” de 28.000,00 kzs, despe­sas de representação de 60,000 kzs; para o ex­terior do país: subsídio diário de USD 450, des­pesas de representação USD 1500, despesas extraordinárias USD 1200, ajudas de custos ao embarque USD 750 somente 1x por ano (Re­solução 33 de 1 de Julho de 2009);
21) viatura protocolar e fa­miliar – 260 Lexus no valor global de USD 40milhões de dólares, incluindo viatu­ras especiais para Presidên­cia da AN (na IIª legislatura foram USD 45 milhões para 256 BMWs);
22) subsídio de fim de legis­latura – 12.160.00000, kzs

Ufa! É muita mordomia, para pouco trabalho legis­lativo, imparcial, responsá­vel, numa tribuna que não é espelho da reconciliação e conciliação nacional, bem como da contenção econó­mica. São gastadores cujo maior mérito é fazerem passar tudo e às cegas vin­do do Titular do Poder Exe­cutivo, que é um exímio pa­gador destes favores, como se pode verificar no quadro sinótico acima.

Ora são estas mordomias que levou a maioria destes deputados a inverter um princípio basilar de qual­quer parlamento, que é a fiscalização da acção do executivo, que os deputa­dos angolanos, não fazem, em cumplicidade com o Tribunal Constitucional, para beneficiar apenas o chefe, através do inconsti­tucional Acórdão 319/2013, sobre a fiscalização suces­siva ao governo.

Este arrozoado sobre a norma constitucional ofen­de a democracia e fere gra­vemente qualquer princípio democrático em que se exi­ge fiscalização daqueles que gastam o que é de todos, em nome de todos e para todos, logo os cidadãos com esta “engenharia” estão a ser de­fraudados.

Mas, infelizmente, os se­nhores deputados esquece­ram-se, como se poderiam lembrar, estar o salário mínimo em Angola fixado entre 15.003,00 e 22.504,50 Kwz, em 2015 quando final­mente chegou o momento de se discutir o mesmo pre­feriram adiar o debate para “outro momento melhor”, pese o salário dos legislado­res ser 25 vezes superior a de um trabalhador de base.

Infelizmente os deputa­dos parecem anestesiados, tendo em linha de conta, que ainda à pouco tempo, pasme-se, a discussão cen­trava-se entre a compra de viaturas de marca Jaguar ou BMW com valores bem aci­ma dos USD 260.000,00/por unidade. Na actual legislatura os deputados optaram por viaturas de marca Lexus que custam somente USD 150.000,00, demonstrando que em tem­pos de crise os deputados não se identificam com a austeridade.

Daí que o discurso presi­dencial tenha passado ao largo dessa situação, tal como da denúncia de prá­ticas ilícitas passíveis de abertura de CPIs para apu­rar os factos:

1) A SNL é a maior empresa pública de Angola, gerindo activos públicos, e receben­do 10% por ano das receitas petrolíferas, aventurou­-se num processo leonino de internacionalização, na Ásia, com incidência noi Iraque, sem dar explicações ao país; compra de acções empresas portuguesas e em Portugal, muitas das quais são depois, transferidas para a esfera de privados, sendo empresa charneira no denominado processo de acumulação primitiva de capital;

2) Escolha sem critérios universalmente aceites, tudo com a capa de apoiar a entrada de angolanos, na indústria de petróleo e gás, por via de esquemas parti­dários de alguns dirigentes e generais;

3) A confusão da Cobalt e Nazaki Oil, está a levar a Sonangol a ser forçada a comprar, por bilhões de dólares a participação des­tas empresas nos blocos de petróleo;

4) Os 32 biliões de dólares da conta do petróleo, re­portados pelo FMI e Banco Mundial, que o Governo só conseguiu justificar uma parte por “distorções esta­tísticas” entre a Sonangol e Ministério dos Petróleos, onde anda?

5) O BESA faliu sem antes deixar uma factura resolvi­da de USD 6 biliões, conta­bilizados, até agora, estão a ser pagos pelo contribuinte angolano, para a criação do BESA-BOM (Banco Eco­nómico SA), via Sonangol, para além de outras enge­nharias;

6) O GRN geriu biliões de dólares de fundos públicos por via dos empréstimos, na primeira versão da rela­ção com a China, criou-se o CIF e outros apêndices, a instituição faliu transferi­ram-se as dividas para a So­nangol e outras entidades do Estado, mas nunca os seus responsáveis presta­ram conta;

7) O contingente chinês está a fazer concorrên­cia desleal, aos angolanos na Zunga, no negócio do carvão e outros trabalhos menores, que em situação normal, deveriam ser ex­clusivos para os nacionais;

8) Na segunda versão da relação com a China fala-se da venda largas parcelas do território nacional, face a empréstimos multimilioná­rios, sem a autorização do parlamento;

9) Numa determinada noi­te entraram determinados dirigentes, no BNA e de lá saíram com mais de USD 150 milhões de forma ilícita;

10) Em 2010 Angola organi­zou uma das Copas Africa­nas mais caras de todos os tempos, gastando mais de USB 1,7 mil milhões de dó­lares, mas até hoje, não se conhece o relatório e con­tas dos gastos desse dinhei­ro público;

11) Investimento em mais de 1,300 mil milhões de dólares, nos projectos PRE­SILD e Aldeia Nova, que, faliram em tempo recorde, sem prestação de contas;

12) O orçamento para a in­dústria da recolha dos re­síduos sólidos em Luanda é multimilionário, mais de USD 400 milhões, mas o lixo não é recolhido e o contribuinte continua a pagar as mesmas empre­sas de costume, que não prestam contas.

Como se pode verificar es­tes assuntos continuaram, por razões óbvias a ficar de fora e os deputados, quiçá, por ser os mais ca­ros e despesistas dentre 53 nações africanas, não exi­gem, pois são “untados” com benesses, para tapar os olhos a estas aberra­ções e elefantes brancos, a maioria de iniciativa pre­sidencial, tal como as leis, que deveriam ser iniciativa e produção parlamentar;

No Kénia e na Nigéria os deputados estão a baixar os salários e regalias que au­feriam, sob pressão da so­ciedade civil que se fartou das orgias financeiras dos políticos. Na África do Sul o Presidente gastou indevi­damente USD 30 mil dóla­res e o irreverente político jovem, Julius Malema, com o seu partido o EFF, lide­ram um processo judicial, para que o Presidente seja condenado a devolver os fundos públicos, gastos em obras particulares.

Os deputados angolanos deveriam lembrar-se terem sido eleitos pelo povo de forma democrática, directa e universalmente, diferen­te de outros órgãos, que se assumem de soberania, mas tiveram eleição indirecta e a reboque do voto parla­mentar.

Em 15 de Junho de 2015, o mundo comemorou 800 anos da outorga da Magna Carta, em 1215 quando os súbditos a impuseram aoo Rei João Sem Terra, colo­cando fim aos impostos aleatórios, a delimitação do poder do rei e o habeas corpus, para além de indi­carem o parlamento como o guardião das leis e regras constitucionais.

Finalmente, à entrada des­ta sessão, os deputados esqueceram-se de fazer declarações de princípios, como alerta ao Titular do Poder Executivo, para que respeita-se a irreverêren­cia da juventude que quer democracia, liberdades, melhor educação e saúde e não golpes de Estado, que constituem uma miragem e perturbação, quando te­mos consciência de não estarmos a gerir bem a rés pública. Juntem-se os de­putados as vozes da socie­dade civil, vossos eleitores, para não se deixar que os nossos filhos morram de fome nas cadeias. De igual modo, não deveriam tolerar que se cataloga-se os taxis­tas como insurrectos, face a sua utilidade na sociedade.

Ademais deveriam ser os deputados contundentes no que toca a política de terror policial, nos lugares de culto, por simples vigí­lias que servem para aliviar o sofrimento e a dor dos fa­miliares, amigos e cidadãos. Quando se tem medo, tam­bém de vigílias estamos a passar uma má mensagem aos povos.

Por todas estas razões, os deputados deveriam com­prometer-se a fazer mehor o seu trabalho, pois o povo tem feito a sua parte e já não colhe as falsas reclama­ções da falta de meios e, das armadilhas do executivo. Se não têm condições, como advogam, para defender o povo: demitam-se, devol­vendo o poder ao Soberano, para que este volte a confiar o seu poder a outrem que melhor os represente.

Isto por não bastar dizer, em emblemáticos discur­sos: “Viva Angola de Cabin­da ao Cunene e do Mar ao Leste; ou que “somos mi­lhões e contra milhões nin­guém combate!” se nada fôr feito para dignificar a vida do cidadão, independen­temente, da sua coloração política. É tempo de agir com clare­za, transparência e honesti­dade patriótica.

*Editor (nesta edição) para Assuntos Parlamentares

*Tenente-General - Email: osconselhosdoge­neral@gmail.com

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