domingo, 27 de março de 2016

INADMISSÍVEL COBERTURA AOS NEGÓCIOS CORRUPTOS DA FAMÍLIA DOS SANTOS




O absurdo aconteceu: Isabel dos Santos vai dominar o banco privado português BCP, graças à ajuda do primeiro-ministro português, António Costa. E com a bênção de Marcelo Rebelo de Sousa. Inadmissível!

Paulo de Morais* – Folha 8

Afilha do presidente angolano vai poder assim entrar, a título pessoal, no capital do BCP, tendo a luz verde para esta operação sido comunicada pessoalmente a Isabel dos Santos, em audiência privada, pelo próprio António Costa. Consequência imediata: como a Sonangol, que Isabel também controla, é hoje o maior acionista do BCP, este passará a ser um banco privativo da família do presidente angolano.

A intermediação na venda do BCP por parte do Governo de Lisboa é uma atitude que envergonha o Estado português, o seu sistema financeiro. Esta é uma situação que não se pode admitir num estado democrático europeu moderno.

Em primeiro lugar, porque o Governo se imiscui assim na vida de um banco privado, duma forma intervencionista inadmissível, violando os direitos dos legítimos accionistas do banco e colocando em xeque a transparência e a confiabilidade da Bolsa de Lisboa.

Tudo isto apenas para poder satisfazer um capricho de Isabel dos Santos, que se quer manter banqueira na Europa, no momento em que vê em risco a sua participação num outro banco, o BPI. BPI cuja Administração vai ser ajudada, também por António Costa, na entrega do banco aos espanhóis do La Caixa.

Em segundo lugar, porque não há qualquer justificação para esta subserviência dos órgãos do Estado português às vontades da família de Eduardo dos Santos que, em Portugal, parece dominar toda a classe política, da direita à esquerda. Subserviência que é perversa para Portugal e é já crónica. Toda a família se movimenta impunemente no território geográfico e empresarial português.

Isabel adquire participações em empresas portuguesas com créditos obtidos na banca… em Portugal. Mas também Marta dos Santos, irmã do Presidente, usufruiu dum crédito de 800 milhões de dólares, provenientes do banco português BES para financiar os seus negócios imobiliários em Talatona. Também foi proveniente do BES o capital com que os filhos adquiriram uma herdade em Aveiras de Cima. Tudo isto só se tornou possível com a conivência dos partidos políticos portugueses: desde a cumplicidade do PCP, partido “irmão” do MPLA, e do Partido Socialista, parceiro de Dos Santos na Internacional Socialista – ao interesse activo de empresários ligados ao PSD e ao CDS.

Esta atitude de apoio do Governo português a Isabel dos Santos é, ainda por cima, assumida com uma justificação mais do que esfarrapada. Com o argumento de que não quer permitir a ‘espanholização’ da Banca portuguesa – supostamente assediada por banqueiros espanhóis – António Costa entrega um banco… a espanhóis; e o outro, para evitar a ‘espanholização’, vai parar às mãos dos capitais corruptos da família Dos Santos.

Nesta sua acção – ilegítima! – António Costa conta ainda, e surpreendentemente, com o apoio do novo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que se vem justificar de forma ainda mais esfarrapada do que Costa. Argumentando que “a Constituição (portuguesa) subordina o poder económico ao poder político”, defende uma intervenção do poder político português, em subordinação ao poder económico; ainda por cima, ao poder económico de cidadãos e grupos empresariais estrangeiros, espanhóis e angolanos.

*Vice-Presidente da TIAC – Transparência e Integridade, Associação Cívica

Leia mais em Folha 8

Ativistas angolanos conhecem sentença mais de quatro meses depois – esta 2ª feira



Os 17 ativistas angolanos acusados em coautoria de atos preparatórios para uma rebelião e um atentado contra o Presidente deverão conhecer a sentença do tribunal de Luanda esta segunda-feira, arriscando uma pena de prisão superior a dois anos

No decurso do julgamento, que se arrasta desde 16 de novembro, sempre rodeado de fortes medidas de segurança, o Ministério Público (MP) angolano deixou cair a acusação de atos preparatórios para um atentado contra o Presidente José Eduardo dos Santos.

Contudo, como disse a procuradora Isabel Fançony Nicolau, as reuniões semanais realizadas entre maio e junho de 2015 pelos ativistas, até à detenção numa destas sessões, não serviriam apenas para ler um livro - de um dos réus, usado como prova -, mas estes planeavam como concretizar os atos de rebelião, pedindo por isso a condenação em coautoria.

A esta acusação sobre os 17 jovens ativistas, a procuradora acrescentou, nas alegações finais deste julgamento, um pedido de condenação por organização de malfeitores, também pelo facto de os réus não terem respondido às questões colocadas pelo MP e do juiz, incorrendo numa moldura penal entre os dois e os oito anos de cadeia.

Já as três equipas de advogados de defesa pediram a absolvição dos acusados, alegando que não foi provada a acusação e que não existem provas de atos preparatórios passíveis de enquadramento criminal, recordando que os jovens reuniam-se apenas para falar sobre política.

"Vai acontecer o que o José Eduardo [Presidente] decidir. Tudo aqui é um teatro, a gente conhece e sabe bem como funciona [o julgamento]. Por mais argumentos que se esgrimam aqui e por mais que fique difícil de provar esta fantochada, se assim se decidir seremos condenados. E nós estamos mentalizados para a condenação", afirmou, em declarações exclusivas à Lusa, no arranque do julgamento, o 'rapper' luso-angolano Luaty Beirão, um dos acusados.

O julgamento foi marcado por vários episódios, como a decisão do juiz da causa, Januário Domingos, de mandar ler na integra, durante dois dias de audiência, as quase 200 páginas o livro do réu Domingos da Cruz, mas também vários protestos na rua junto ao tribunal, uns a favor dos ativistas outros defendendo "Justiça sem pressão".

Foram ainda polémicas as notificações pelo Jornal de Angola para ouvir em audiência dezenas personalidades nacionais nomeadas nas redes sociais para integrar um governo de salvação nacional - que segundo o MP assumiria funções após a destituição do poder eleito -, ou aos protestos dos ativistas em tribunal, descalços e sempre com frases de contestação ao regime angolano e aos atrasos no processo escritas nas roupas, tendo mesmo sido expulsos da sala pelo juiz numa das sessões.

O julgamento sofreu ainda sucessivos adiamentos, devido às faltas dos declarantes, e decorreu sem a presença em tribunal de observadores das representações diplomáticas acreditadas em Luanda e com a Amnistia Internacional a não considerar o julgamento como justo.

Entre 20 de junho e 18 de dezembro, 15 dos acusados permaneceram em prisão preventiva - outras duas jovens aguardaram sempre em liberdade -, altura em que as medidas de coação foram revistas, passando a prisão domiciliária.

Já em janeiro, um dos acusados, Manuel "Nito Alves", foi condenado em julgamento sumário a seis meses de prisão, por injúrias ao tribunal, tendo recolhido à cadeia.

O mesmo aconteceu este mês com o professor universitário e investigador Nuno Dala, que se recusou a comparecer em tribunal, em protesto contra a alegada falta de assistência médica dos Serviços Prisionais, tendo o juiz da causa alterado a medida de coação para prisão preventiva. Já na cadeia, o ativista iniciou a 10 de março uma greve de fome de protesto.

A leitura dos quesitos deste processo está agendada para as 10:00 de segunda-feira, na 14.ª Secção do Tribunal Provincial de Luanda, no Benfica, esperando-se em seguida a divulgação da sentença.

PVJ // EL - Lusa

Rusgas em casas de líder da Renamo são mais um episódio de tensão em Moçambique



As rusgas realizadas hoje na sede de Maputo da Renamo, principal partido da oposição, e em casas do líder partidário são mais um episódio da tensão político-militar entre a Renamo, principal partido da oposição, e o Governo.

A Renamo (Resistência Nacional Moçambicana) ameaça governar à força nas seis províncias onde reivindica vitória nas eleições gerais de 2014, acusando o partido no poder, a Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique), de ter protagonizado uma fraude eleitoral no último escrutínio.

Um dos momentos mais complicados desta escalada de Rustensão ocorreu a 09 de outubro de 2015, quando a polícia moçambicana invadiu a casa de Afonso Dhlakama, na cidade da Beira, centro de Moçambique, e prendeu guardas do partido de oposição.

Lusa

Moçambique. ATÉ QUANDO A PARTIDARIZAÇÃO DO ESTADO?



@Verdade, editorial

Senhores camaradas, sabemos que o poder – aquele é, normalmente, do povo – é vosso. Mas pedimos que nos livrem, um pouco, das vossas imposições políticas. Nós, como cidadãos nacionais, desta Pátria Amada, temos a prerrogativa de escolhermos o partido que achamos ideal. Este nosso direito está plasmado no artigo 53, número 2 da Constituição da República de Moçambique – Lei Mãe – por isso há que respeitarmos todos!

Devemos, sim, pertencer à Frelimo, mas isso deve ser da nossa livre e espontânea vontade. Porque é que continuam a nos forçar a participar nos encontros de índole política contra a nossa vontade? Aliás, tais encontros decorrem em instituições públicas e, como se isso não bastasse, acontecem sempre no horário de trabalho, ou seja, interrompem as actividades laborais para satisfazer para nos obrigar a assistir a encontros cheio de nada e coisa nenhuma. Isso é grave!

Estamos a dizer que não queremos pertencer ao partido A ou B ou então C, só porque alguém está forçar-nos sob pena de perdermos a nossa nacionalidade, como pretendeu, há dias, o vosso camarada Paulo Awade, governador da província de Tete, aquando os seus pronunciamentos sobre os nossos irmãos que se encontram refugiados em Kapise, no vizinho Malawi.

Como dissemos no começo dessas nossas linhas, sabemos que o Governo de Moçambique é constituído pela Frelimo, mas tal facto não vos dá direito de decidirem por nós – o povo. Portanto, com todo respeito pedimos que parem com vossas reuniões nas instituições. Tomámos conhecimento do último encontro havido no sábado passado, no Instituto de Formação de Professores (IFP), mais conhecido por IMAP, na cidade de Nampula. Há relatos de formadores e formandos dando conta de que a participação naquele encontro era obrigatória e que até ameaçavam que caso alguém falte, nem que seja por qual motivo, seria sancionado. É triste isso!

Porém, ser formador ou formando de um instituto de formação do Estado não é sinónimo de ser simpatizante ou membro do partido no poder ou de um outro. Dissemos, ainda, que ser um funcionário ou agente do Estado não é, também, sinónimo de ser camarada. Isto tem que ficar claro para todos nós.

O caso que supra mencionamos é, apenas, um de muitos que ocorrem em todo território moçambicano. Que o digam os professores, alunos, enfermeiros, os agentes da Polícia! Se nos permitirem, podemos especular que a Polícia trabalha ao serviço do partido dos camaradas, o que é um pecado gravíssimo!

Neste país e com este Governo que temos, sob liderança da Frelimo, a condição primária para se atingir um cargo de chefia é preciso ter um cartão vermelho. Que o digam todos os directores das escolas e outros chefes nomeados no sector público! Aliás, um funcionário ou agente do Estado pode perder o seu posto de emprego só porque comunga com os ideais dos partidos da oposição. E nós, como o povo, perguntamos, é por isso que, abusando da sua maioria na Assembleia da República, reprovaram o projecto de Lei que visava despartidarizar o Estado?

PALOP e Timor-Leste recebem quase 1,7 milhões por dia em ajudas oficiais até 2020



Lisboa, 26 mar (Lusa) - Os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e Timor-Leste vão receber quase 1,7 milhões de dólares por dia de ajuda oficial da União Europeia e do Banco Mundial até 2020, segundo a consultora CESO.

Em entrevista à Lusa, o vice-presidente da CESO - Development Consultants disse que estes seis países vão receber pelo menos 1842 milhões de dólares entre 2015 e 2020 do Banco Mundial, a que se juntam mais 1227 milhões da União Europeia, num total de quase 3070 milhões, ou seja, mais de 1,6 milhões de dólares por dia até final da década.

"Estes são os valores que o Banco Mundial e a União Europeia têm programado conceder a projetos de desenvolvimento, nalguns casos, e em apoio direto ao Orçamento, noutros casos", disse Rui Miguel Santos em entrevista à Lusa.

Para o vice-presidente desta consultora especializada em ajuda ao desenvolvimento e na elaboração de programas de políticas de desenvolvimento, "no caso da União Europeia, estas verbas referem-se a donativos a estes países para programas, projetos e apoio orçamental em diferentes áreas".

Os montantes que já estão adjudicados não estão ainda direcionados para programas específicos, explica o consultor: "Este bolo divide-se em apoio ao orçamento e a projetos, a divisão vai sendo feita, portanto nem tudo há de ir para as empresas que executem os programas, nem tudo há de ir para o orçamento".

Rui Miguel Santos pormenorizou que em Moçambique e Cabo Verde as verbas vão quase todas para o Orçamento, enquanto em Angola e Guiné-Bissau é tudo para projetos, explicando que "a lógica é dar apoio orçamental apenas aos países que tenham administrações públicas mais sólidas e onde haja credibilidade adicional para se ter a certeza do investimento e maturidade na gestão de fundos internacionais".

O financiamento de investimentos por parte de instituições financeiras multilaterais é uma das oportunidades a que as empresas podem recorrer para expandirem a sua estratégia de internacionalização, mas para Rui Miguel Santos há ainda muitas dificuldades e constrangimentos, para além de um enorme desconhecimento sobre estas potencialidades.

"Há muito poucas empresas portuguesas neste mercado, e há um grande desconhecimento da indústria e como se concorre a estes financiamentos, e depois, em segundo lugar, as empresas esbarram com dificuldades porque envolve trabalhar em inglês ou francês, e depois há também o problema da competitividade e da exigência dentro do próprio setor", explica o consultor.

A CESO - Development Consultants é uma consultora especializada em gestão de políticas públicas que trabalha exclusivamente com contratos financiados por agências multilaterais como a Comissão Europeia e o Banco Mundial, ou seja, auxiliam os governos, através da assessoria a ministérios, a formular, definir e gerir as políticas públicas que depois são candidatas a receber financiamento externo.

MBA // PJA

A CONSPIRAÇÃO DE TIMOR-LESTE



Nos 17 anos desde que Timor-Leste ganhou a independência, o governo australiano apropriou-se de cerca de 5 mil milhões de dólares em petróleo e gás, dinheiro que pertence ao seu pobre vizinho.

John Pilger*

Documentos secretos encontrados nos Arquivos Nacionais Australianos fornecem um relance sobre como foi executado e encoberto um dos maiores crimes do séc. XX. Ajuda-nos também a compreender como e a favor de quem o mundo funciona.

Os documentos referem-se a Timor oriental, agora conhecido como Timor-Leste, e foram escritos por diplomatas da embaixada da Austrália em Jakarta. A data é novembro de 1976, menos de um ano após o ditador indonésio general Suharto tomar a então colónia portuguesa na ilha de Timor.

O terror que se seguiu tem poucos paralelos: nem mesmo Pol Pot conseguiu matar proporcionalmente tantos cambodjanos como Suharto e os seus amigos generais mataram em Timor oriental. De uma população de quase um milhão, um terço desapareceu.

Foi o segundo holocausto do qual Suharto foi responsável. Uma década antes, em 1965, Suharto tomou o poder na Indonésia com um banho de sangue que eliminou mais de um milhão de vidas. A CIA referiu: «Em termos de número de mortos, os massacres estão entre os piores assassínios em massa do séc. XX.»

Este acontecimento foi saudado na imprensa ocidental como “um raio de luz na Ásia” (Time). O correspondente da BBC no sueste asiático, Roland Challis, descreveu mais tarde o encobrimento dos massacres como um triunfo da cumplicidade e silêncio dos media, A “linha oficial” era que Suharto tinha “salvo” a Indonésia de um assalto comunista.

«Evidentemente que as minhas fontes britânicas sabiam qual o plano americano,” disse-me. “Havia corpos retirados dos relvados do consulado britânico em Surabaya e navios de guerra britânicos escoltaram um barco cheio de tropas indonésias para tomarem parte neste holocausto terrível. Só muito mais tarde soubemos que a embaixada americana estava a fornecer nomes [a Suharto] e a abatê-los na lista à medida que eram eliminados. Houve um acordo. Do estabelecimento do regime de Suharto fazia parte o envolvimento do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial [dominados pelos EUA]. Foi esse o acordo.»

Entrevistei muitos dos sobreviventes de 1965, incluindo o aclamado escritor indonésio Pramoedya Ananta Toer, que testemunhou um sofrimento épico «esquecido» no ocidente só porque Suharto era «o nosso homem». Era quase inevitável um segundo holocausto em Timor oriental, rico em recursos e colónia indefesa.

Em 1994, filmei clandestinamente em Timor oriental. Encontrei uma terra de cruzes e inesquecível sofrimento. No meu filme, «Morte de um Povo», há uma sequência filmada a bordo de um avião australiano voando sobre o mar de Timor. Decorre uma reunião. Dois homens de fato fazem saúdes com champanhe. «É um momento verdadeiramente histórico,» balbucia um deles, «verdadeira e unicamente histórico.»

É o ministro dos Estrangeiros da Austrália, Gareth Evans. O outro é Ali Alatas, o principal porta-voz de Suharto. Estamos em 1989 e estão fazendo um voo simbólico para celebrar um acordo de pirataria a que chamam «tratado». Foi isto que permitiu à Austrália, à ditadura de Suharto e às companhias petrolíferas internacionais dividirem os despojos dos recursos em petróleo e gás de Timor Leste.

Graças a Evans, ao então primeiro-ministro da Austrália, Paul Keating – que encarava Suharto como uma figura paternal – e a um gang que conduzia a política externa da Austrália, este país distinguiu-se como o único país ocidental a reconhecer formalmente a conquista genocida de Suharto. O preço, disse Evans, foram «montanhas» de dólares.

Membros deste gang voltaram a aparecer há dias em documentos encontrados nos Arquivos Nacionais por dois investigadores da Universidade de Monash em Melbourne, Sara Niner e Kim McGrath. Funcionários superiores do Departamento de Negócios Estrangeiros relatam pela sua própria mão violações, tortura e execuções de timorenses de leste por tropas indonésias. Em anotações rabiscadas num apontamento que refere atrocidades num campo de concentração, um diplomata escreveu: «parece divertido». Outro escreveu: «a população parece extasiada.»

Relativamente a um relatório da resistência indonésia Fretilin que descreve a Indonésia como um invasor «impotente», outro diplomata zombava: «Se o inimigo era ”impotente”, conforme lá está dito, como é que conseguem violar todos os dias a população capturada? Ou será que se deve a isto?»

Os documentos, diz Sarah Niner, são «prova evidente da falta de empatia e de preocupação pelos abusos de direitos humanos em Timor-Leste» no Departamento de Negócios Estrangeiros. «Os arquivos mostram que esta cultura de encobrimento está intimamente ligada à necessidade de o DNE reconhecer a soberania indonésia, para iniciar as negociações sobre o petróleo no mar de Timor-Leste.»

Tratou-se de uma conspiração para roubar o petróleo e o gás de Timor-Leste. Em telegramas diplomáticos divulgados de agosto de 1975, o embaixador australiano em Jakarta, Richard Woolcott, escreveu para Canberra: «Parece-me que o Departamento [de Minerais e Energia] poderia ter interesse em resolver a atual diferença na fronteira marítima acordada e isso poderia ser muito melhor negociado com a Indonésia… do que com Portugal ou com o Timor português independente.» Wolcott revelou que tinha sido informado sobre os planos secretos da Indonésia para uma invasão. Telegrafou para Canberra que o governo devia “ajudar à aceitação pública na Austrália” e contrariar «o criticismo contra a Indonésia».

Em 1993, entrevistei C. Philip Liechty, um antigo funcionário de operações senior da CIA na embaixada de Jakarta durante a invasão de Timor-Leste. Disse-me ele: «Foi dada luz verde a Suharto [pelos EUA] para fazer o que fez. Fornecemos-lhe tudo o que precisava [desde] espingardas M16 [até] apoio logístico militar dos EUA… talvez 200 mil pessoas morreram, a maior parte não-combatentes. Quando as atrocidades começaram a surgir nos relatórios da CIA, a maneira que arranjaram de tratar do assunto foi encobri-las o máximo tempo possível e quando já não podiam mais ser encobertas foram apresentadas de forma atenuada e em termos gerais, de modo que as nossas próprias fontes foram sabotadas.»

Perguntei a Liechty o que teria acontecido se alguém tivesse denunciado. «A sua carreira teria terminado,» respondeu. Disse-me que esta entrevista comigo era uma forma de reparação pelo «mal que senti».

O gang da embaixada australiana em Jakarta parece não sentir tal angústia. Um dos escribas dos documentos, Cavan Hogue, declarou ao Sydney Morning Herald: «Parece a minha caligrafia. Se fiz tal comentário, sendo eu o cínico filho-da-mãe que sou, teria certamente sido com espírito de ironia e sarcasmo. Isso referia-se ao comunicado de imprensa [da Fretilin] e não aos timorenses.» Hogue declarou que houve «atrocidades de todos os lados».

Como pessoa que relatou e filmou as provas do genocídio, acho esta última observação especialmente profana. A «propaganda» da Fretilin que ele ridiculariza era rigorosa. O relatório subsequente das Nações Unidas sobre Timor Leste descreve milhares de casos de execução sumária e violência contra mulheres pelas forças especiais Kopassus de Suharto, muitas delas treinadas na Austrália. «Violação, escravatura sexual e violência sexual foram instrumentos usados como parte da campanha programada para infligir uma profunda experiência de terror, impotência e desespero nos apoiantes pró-independência,» diz a ONU.

Cavan Hogue, o brincalhão e «cínico filho-da-mãe» foi promovido a embaixador senior e mais tarde reformado com generosa pensão. Richard Woolcott foi promovido a chefe do Departamento dos Negócios Estrangeiros em Canberra e, na reforma, ensinou como um «respeitado intelectual diplomata».

Foram despejados jornalistas na embaixada australiana em Jakarta, especialmente empregados de Rupert Murdoch, que controla quase 70% da imprensa da capital. O correspondente de Murdoch na Indonésia era Patrick Walters, que noticiou como «impressionantes» os «êxitos económicos» de Jakarta em Timor-Leste e «generoso» o desenvolvimento daquele território empapado de sangue. Quanto à resistência timorense oriental, estava «sem líder» e derrotada. De qualquer modo, «ninguém é agora preso sem os procedimentos legais apropriados».

Em dezembro de 1993, um dos empregados mais antigos de Murdoch, Paul Kelly, na altura editor-chefe do The Australian, foi nomeado pelo ministro dos Estrangeiros Evans para o Instituto Austrália-Indonésia, uma instituição fundada pelo governo australiano para a promoção dos «interesses comuns» de Canberra e da ditadura de Suharto. Kelly levou um grupo de editores de imprensa a Jakarta para uma audiência com o assassino de massas. Há uma fotografia de um deles que se está curvando.

Timor-Leste ganhou a independência em 1999 com o sangue e a coragem da sua gente vulgar. A pequena e frágil democracia foi imediatamente sujeita a uma implacável campanha de assédio pelo governo australiano, que procurou manobrar para lhe retirar o direito legal de propriedade sobre a exploração das reservas submarinas de petróleo e gás. Para o atingir, a Austrália recusou reconhecer a jurisdição do Tribunal Internacional de Justiça e a Lei do Mar e alterou unilateralmente a fronteira marítima a seu favor.

Em 2006, foi finalmente assinado um acordo do tipo mafioso, em grande parte segundo os termos da Austrália. Pouco depois, o primeiro-ministro Mari Alkitiri, um nacionalista que tinha feito frente a Canberra, foi efetivamente deposto naquilo que ele chamou uma «tentativa de golpe» por «estrangeiros». Os militares australianos, que tinham tropas de «manutenção de paz» em Timor Leste, tinham treinado os oposicionistas.

Nos 17 anos desde que Timor-Leste ganhou a independência, o governo australiano apropriou-se de cerca de 5 mil milhões de dólares em petróleo e gás, dinheiro que pertence ao seu pobre vizinho.

A Austrália tem sido chamada o «vice-xerife» da América no Pacífico Sul. Um dos homens com crachá é Gareth Evans, o ministro dos Estrangeiros filmado a erguer a taça de champanhe para saudar o roubo dos recursos naturais de Timor-Leste. Hoje, Evans é um frequentador de púlpitos fanático que promove uma marca belicista conhecida por «RTP» ou «Responsabilidade para Proteger». Como co-presidente de um tal «Global Centre» sediado em Nova Iorque, dirige um grupo de influência apoiado pelos EUA que pressiona a «comunidade internacional» para atacar países onde «o Conselho de Segurança rejeita ou não aceita propostas de solução em tempo razoável». O homem indicado, conforme os timorenses podem confirmar.

*Jornalista australiano


Tradução: Jorge Vasconcelos

Fonte: O Diário – em Diário Liberdade, 12 Março 2016

AS MORTES DOS JORNALISTAS QUE INVESTIGAVAM A QUEDA DO WTC - estímulo à memória



Esta é uma reposição do Página Global. Artigo compilado do Diário Liberdade com data de 18 de Fevereiro de 2015. Porquê repô-lo? Para estimular a memória dos que nos lêem. Também para recordar que a verdadeira história do fatídico 11 de Setembro de 2001 está, muito provavelmente, por contar, por descobrir, em prol da verdade exigida pelos norte-americanos e pelo mundo.

Também provavelmente está por contar a verdadeira causa da morte quase em simultâneo dos três jornalistas que investigavam o hediondo ato terrorista. A coincidência de estarem a elaborar aquele trabalho de investigação e de todos eles morrerem… dá para desconfiar. Coincidência?

Para além do estímulo às nossas memórias para recordarmos que a história do 11 de Setembro ainda está por contar também queremos homenagear os três jornalistas em questão. Morreram pelas alegadas razões que vieram a público? Ou esta é outra história que está por contar? Foram assassinados? Talvez um dia se venha a saber a verdade.

Página Global

Morrem três jornalistas que investigavam a participação dos EUA em demolição das Torres Gêmeas

Estados Unidos - Aporrea - [Tradução do Diário Liberdade] Três jornalistas que trabalhavam em um documentário sobre o envolvimento do governo norte-americano na demolição das torres gêmeas morreram nos últimos dias.

Trata-se do ex-repórter internacional da NBC Ned Colt, o correspondente da CBS News Bob Simon, e o jornalista do New York Times David Carr.

Bob Simon, de 73 anos, foi assassinado na quarta-feira na cidade de Nova York em um acidente automobilístico e na quinta-feira Ned Colt, de 58 anos, dizia-se que tinha morrido por um derrame cerebral massivo, seguido em poucas horas por David Carr, de 58 anos, quem colapsou e morreu em seu escritório na sala de redação do New York Times.

Bob Simon, Ned Colt e David Carr
Os três jornalistas mais Brian Willias, quem teve que renunciar à NBC por mentir sobre uma notícia do Iraque, tinham formado uma companhia independente de notícias em vídeo no mês passado e apresentaram os documentos de segurança necessários que lhes permitiriam o acesso ao arquivo mais secreto do Kremlin, onde se encontrariam provas relacionadas com os atentados de 11 de setembro de 2001.

Em relação a esses arquivos do 9/11 em poder do Kremlin, o presidente Putin tinha alertado que iria divulgá-los.

Os especialistas norte-americanos acham que, apesar do fato de as relações entre os EUA e a Rússia terem chegado no ponto mais grave desde a Guerra Fria, Putin entregou até Obama problemas menores. Os analistas acham que isto é só a "calma antes da tormenta".

Putin vai golpear e estaria preparando o lançamento de provas da participação do governo dos Estados Unidos e dos serviços de inteligência nos ataques do 11 de setembro.

O motivo para o engano e o assassinato de seus próprios cidadãos terá servido aos interesses petroleiros dos Estados Unidos no Médio Oriente e das suas empresas estatais.

A ponta de lança da empresa de notícias em vídeo independente que pretendia descobrir a verdade do 9/11 foi David Carr, quem no New York Times foi um valedor de Edward Snowden e após ter visto o documentário Citizenfour, tratou de ir dormir "mas não podia".

Carr estava seriamente desiludido com o New York Times pela elaboração da memória da guerra da Ucrânia "e não só por não dizer a verdade, mas também pelos emblemas nazistas nos capacetes de soldados leais ao regime da Ucrânia lutando contra os rebeldes".

Outro que trabalhava muito com Williams e Carr neste projeto do vídeo do 9/11, foi Ned Colt, quem após sair de NBC News continuava sendo um amigo de toda a vida de Williams e aperfeiçoou suas habilidades humanitárias enquanto trabalham no Comitê Internacional de Resgate. Por sua vez, Bob Simon considerava "extremamente lamentável" a manipulação dos meios de comunicação no período prévio à guerra dos Estados Unidos no Iraque.

Após a destruição da imagem de Williams, e a estranha morte de Carr, Colt e Simon, o regime de Obama enviou um "mensagem clara" à elite norte-americana quanto à exposição dos seus segredos mais obscuros.

Pior ainda, as elites dos meios nos EUA agora fogem de medo e o regime de Obama ameaça agora os meios de comunicação alternativos com ilegalizar todos os sites dissidentes.

Para isso tem uma escandalosa uma proposta legislativa de Ordem Fraternal da Policial Nacional para classificar qualquer crítica contra a policia nas redes sociais como um "crime de ódio".

*Diário Liberdade

A RECOLONIZAÇÃO DA LÍBIA



Omar al-Mukhtar
Manlio Dinucci*

Na comédia dos erros do teatro da política, o primeiro ator Renzi disse que "a Itália fará sua parte" na Líbia, em seguida - logo que o Pentágono declarou que a Itália fará o "papel principal" - ele disse que "a missão militar italiana na Líbia não está na ordem do dia", quando, na verdade, essa missão já começou, com as forças especiais que o parlamento italiano colocou às ordens do primeiro ministro. E, para dar a luz verde oficial, o primeiro ministro Renzi espera pela formação, na Líbia, de "um governo super-sólido que não nos faça repetir os erros do passado".

Vamos olhar para o passado, enquanto esperamos que a miragem de um "governo super-sólido" apareça no deserto líbio. Em 1911, a Itália ocupou a Líbia com um corpo expedicionário de 100.000 homens. Logo após o desembarque, o exército italiano fuzilou e enforcou 5.000 líbios, enquanto deportava milhares. Em 1930, por ordem de Mussolini, metade da população de Cirenaica, cerca de 100.000 pessoas, foi deportada para 15 campos de concentração, enquanto a força aérea, para esmagar a resistência, bombardeou aldeias com armas químicas, e a região foi cercada com 170 km de arame farpado. O líder da resistência líbia, Omar al-Mukhtar, foi capturado e enforcado em 1931. Em seguida, começou a colonização demográfica da Líbia, com a ocupação de terras mais férteis e deslocamento da população para terras áridas. No início dos anos 1940, a Itália foi derrotada na Líbia pelo Reino Unido e os Estados Unidos. O emir Idris al-Senussi, convertido em rei pelos ingleses, em 1951, concedeu a essas duas potencias o direito de utilizar bases aéreas, navais e terrestres em solo líbio. Às portas de Trípoli, Wheelus Field se converteu na base aérea e nuclear mais importante dos Estados Unidos no Mediterrâneo.

Em 1956, o rei Idris firmou com a Itália um acordo que a isentava pelos danos causados na Líbia e permitia que a comunidade italiana conservasse seu patrimônio. Os campos petrolíferos líbios, descobertos nos anos 1950, acabaram nas mãos da empresa britânica British Petroleum, da estadunidense Esso e da italiana Eni. Duramente reprimida, a rebelião dos nacionalistas desembocou em 1969 em um golpe de Estado - sem derramamento de sangre e de corte nasserista - dos "oficiais livres" liderados por Muammar al-Gaddafi. A monarquia foi abolida, a República Árabe Líbia obrigou os Estados Unidos e o Reino Unido a sair das bases militares e nacionalizou as propriedades estrangeiras. Durante as décadas seguintes, a líbia alcançou, segundo o Banco Mundial, "altos indicadores de desenvolvimento humano", com um crescimento do PIB de 7,5% ao ano, uma alta renda média por habitante, acesso universal à educação primária e secundária e 46% de acesso ao ensino superior. Mais de 2 milhões de migrantes africanos encontravam trabalho na Líbia. Este Estado, que constituía um fator de estabilidade e desenvolvimento no norte da África, havia favorecido com seus investimentos o nascimento de organismos que haviam possibilitado a autonomia financeira e o surgimento de uma moeda própria da União Africana. Os Estados Unidos e a França - como pode comprovar os correios eletrônicos de Hillary Clinton - decidiram bloquear "o plano de al-Gaddafi de criar una moeda africana", como uma alternativa ao uso do dólar e do franco CFA.

Para isso, e para se apropriar do petróleo líbio, a OTAN, sob as ordens dos Estados Unidos, lançou a campanha contra al-Gaddafi e, na Itália, a "oposição de esquerda" italiana esteve na linha de frente dessa campanha. O resultado foi a destruição do Estado líbio, que também foi atacado por dentro por grupos terroristas e forças especiais.

O subsequente desastre social, que já matou mais pessoas que a própria guerra, sobretudo entre os migrantes, abriu caminho para a reconquista e a repartição da Líbia. Onde a Itália volta a desembarcar, pisoteando a própria Constituição, e retomando seu passado colonial.

*Manlio Dinucci - Geógrafo e geopolítico. Últimas publicações :Laboratorio di geografia, Zanichelli 2014 ;Geocommunity Ed. Zanichelli 2013 ; Escalation. Anatomia della guerra infinita, Ed. DeriveApprodi 2005.

Voltaire.net - Tradução Choldraboldra - Fonte Il Manifesto (Itália)

OBAMA CRIA UM NOVO SISTEMA DE MANIPULAÇÃO DA INFORMAÇÃO



O presidente Obama decidiu substituir o «Center for Strategic Counterterrorism Communications», criado em 2011, por um «Centro de Resposta Global». Para tal assinou, a 14 de Março de 2016, um decreto confidencial —mas, do qual uma cópia circula já (ver anexo junto)—.

A nova administração terá por funções lutar contra o recrutamento feito por grupos terroristas. Colocado sob a autoridade do secretário de Estado, ela é dirigida por Michael D. Lumpkin (foto). Será «integrada», quer dizer, administrada por um conselho composto de representantes de vários ministérios e agências de inteligência ou de propaganda. Dispõe de um orçamento de 20 milhões de dólares anual. Que serão utilizados não para produzir mensagens, mas para subvencionar, o mais discretamente possível, blogueres (blogueiros-br) ou líderes de opinião cujas mensagens são julgadas eficazes. Ela irá trabalhar, exclusivamente, em países estrangeiros.

Lembremos que os E.U. consideram oficialmente como grupos «terroristas» grupos que eles possam apoiar extra-oficialmente, assim como qualquer grupo resistente ao imperialismo; razão pela qual o Centro está ligado ao Departamento de Estado mesmo que seja dirigido por um alto-funcionário da Defesa, Michael D. Lumpkin, actual assistente do secretário da Defesa para as Operações Especiais e Conflitos de Baixa Intensidade.


Voltaire.net - Tradução Alva

EUA: UMAS ELEIÇÕES INFERNAIS



William Blum [*]

Se as eleições presidenciais americanas vierem a ser entre Hillary Clinton e Donald Trump, e o meu passaporte for confiscado, e eu for FORÇADO a escolher entre um e outro, ou me PAGAREM para isso… vou votar em Trump.

A minha maior preocupação é a política externa. A política externa americana é a maior ameaça à paz mundial, à prosperidade e ao ambiente. No que toca à política externa, Hillary Clinton é um desastre total. Do Iraque e da Síria ao Líbano e às Honduras, o mundo é um local muito pior por causa dela; de tal modo que eu lhe chamaria uma criminosa de guerra que devia ser julgada. Não se pode esperar melhor das questões internas desta mulher a quem a Goldman Sachs – uma das empresas mais reacionárias, mais antissociais neste triste mundo – pagou 675 mil dólares por quatro discursos e mais do que isso em donativos políticos nos últimos anos. Somem a isso a disponibilidade de Hillary para trabalhar seis anos no conselho de administração da Walmart enquanto o marido era governador de Arkansas. Podemos esperar alterar o comportamento de uma empresa, recebendo dinheiro dela?

O Los Angeles Times publicou um editorial no dia seguinte às eleições primárias múltiplas de 1 de março que começava assim: "Donald Trump não tem perfil para ser presidente dos Estados Unidos" e depois afirmava: "A realidade é que Trump não tem qualquer experiência de governo".

Quando preciso de arranjar o meu carro, procuro um mecânico com experiência da marca do meu automóvel. Quando tenho um problema de saúde, prefiro um médico especializado na parte do meu corpo que está doente. Mas, no que se refere a políticos, a experiência não significa nada. A única coisa que conta é a ideologia da pessoa. Em quem votariam mais depressa, numa pessoa com 30 anos no Congresso que não partilhe minimamente das vossas opiniões políticas e sociais, ou até lhes seja hostil, ou numa pessoa que nunca desempenhou nenhum cargo político mas é um camarada ideológico em todas as questões importantes? Para mim, os 12 anos de Clinton em altos cargos do governo não têm qualquer peso.

O Times continuava sobre Trump: "É uma vergonha o pouco conhecimento que ele tem das questões que o país e o mundo enfrentam".

Mais uma vez o conhecimento é vencido (trumped, trocadilho não intencional) pela ideologia. Enquanto secretária de Estado (janeiro 2009-fevereiro 2013), com grande acesso ao conhecimento dos dossiers, Clinton desempenhou um papel essencial, em 2011, na destruição do estado de bem-estar moderno e laico da Líbia, provocando a sua desintegração num caos total e transformando-a num estado fracassado, que levou à ampla dispersão por todos os locais importantes do Norte de África e do Médio Oriente do gigantesco arsenal de armamento que o líder líbio Moammar Kadafi havia acumulado. A Líbia é hoje um paraíso para terroristas, desde a al Qaeda ao ISIS, enquanto Kadafi sempre foi um inimigo de terroristas.

Que bem fez a secretária de Estado Clinton com este conhecimento? Para ela, foi suficiente saber que a Líbia de Kadafi, por diversas razões, nunca seria um estado cliente suficientemente obediente a Washington. Foi por isso que os Estados Unidos, juntamente com a NATO, bombardearam a população da Líbia quase diariamente, durante mais de seis meses, justificando-se com a desculpa de que Kadafi iria invadir Bengasi, o centro líbio dos seus opositores, e portanto os Estados Unidos estavam a salvar do massacre a população daquela cidade. Claro que o povo americano e os seus meios de comunicação engoliram esta história, embora não houvesse indícios convincentes que o alegado massacre iminente alguma vez estivesse previsto. (A coisa mais próxima de um relato oficial do governo dos EUA sobre a matéria – um relatório do Serviço de Investigação do Congresso sobre os acontecimentos na Líbia naquele período – não faz qualquer referência ao alegado massacre). [1]

O New York Times afirmou que a intervenção do Ocidente na Líbia fora "defendida" por Clinton, convencendo Obama no "seu momento de maior influência enquanto secretária de Estado". [2] Todo o conhecimento que supostamente ela tinha não a impediu de cometer este erro desastroso na Líbia. E o mesmo se pode dizer quanto ao seu apoio para a mudança de regime na Síria, mais importante que o apoio ao governo sírio na sua luta contra o ISIS e outros grupos terroristas. Ainda mais desastrosa foi a invasão dos EUA no Iraque, em 2003, que ela apoiou, enquanto senadora. Ambas as políticas foram claras violações do direito internacional e da Carta da ONU.

Outro "êxito" da política externa de Clinton, que os seus dedicados apoiantes ignorarão, é o golpe que derrubou Manuel Zelaya, um progressista moderado, das Honduras, em junho de 2009. Uma história que se repete muitas vezes na América Latina. As massas espezinhadas conseguiram finalmente colocar no poder um líder empenhado em inverter o status quo, determinado a tentar pôr fim a dois séculos de opressão… e pouco tempo depois, os militares derrubam o governo democraticamente eleito, enquanto os Estados Unidos – o mentor cérebro por trás do golpe – nada fez para impedi-lo, punindo o regime golpista como só os Estados Unidos sabem punir; entretanto, os funcionários em Washington fingem estar muito preocupados com esta "afronta à democracia". (Ver "Top Ten Ways You Can Tell Which Side The United States Government is On With Regard to the Military Coup in Honduras, de Mark Weisbrot".) [3]

No seu livro de memórias "Hard Choices", Clinton revela como não se preocupou minimamente em repor Zelaya no seu devido cargo: "Nos dias a seguir [após o golpe], falei com os meus homólogos em todo o hemisfério… Delineámos uma estratégia para repor a ordem nas Honduras e garantir que se realizassem eleições livres e justas, rápida e legitimamente, que tornassem irrelevante a questão de Zelaya".

A questão de Zelaya era tudo menos irrelevante. Os líderes latino-americanos, a Assembleia-Geral das Nações Unidas e outros órgãos internacionais exigiram veementemente o seu imediato regresso ao cargo. Mas Washington depressa retomou relações diplomáticas normais com o novo estado policial de direita, e desde então a migração infantil das Honduras para os EUA adquiriu maior ímpeto.

O cabeçalho do relatório da revista Time sobre as Honduras no final do ano (3 de dezembro de 2009) resumia a situação assim: "Política latino-americana de Obama parece-se com a de Bush".

E Hillary Clinton parece uma conservadora. E desde há muitos anos; remontando pelo menos aos anos 80, enquanto mulher do governador de Arkansas, quando apoiou fortemente os torturadores dos esquadrões da morte conhecidos por Contras, que eram o exército secreto do império na Nicarágua. [4]

Depois, durante as primárias presidenciais de 2007, a veneranda revista conservadora da América, a National Review de William Buckley, publicou um editorial de Bruce Bartlett. Bartlett foi conselheiro político do presidente Ronald Reagan, funcionário das finanças do presidente George H.W. Bush e membro de dois dos mais importantes grupos de pensamento conservador, a Heritage Foundation e o Cato Institute – Estão a imaginar o quadro? Bartlett diz aos leitores que é quase certo que os Democratas vão ganhar a Casa Branca em 2008. Que fazer então? Apoiar o Democrata mais conservador. Escreve isto: "Para os da ala direita dispostos a procurar o que há por detrás do que provavelmente lhes parece serem perspetivas idênticas dos candidatos Democratas, é evidente que Hillary Clinton é a mais conservadora". [5]

Durante as mesmas primárias, também ouvimos opinar a principal revista da riqueza corporativa da América, aFortune, com uma capa com a imagem de Hillary Clinton, e o título "Os negócios adoram Hillary". [6]

E que temos agora em 2016? Todos os 116 membros da comunidade de segurança nacional do Partido Republicano, muitos deles veteranos das administrações Bush, assinaram uma carta aberta ameaçando que, se Trump for designado, desertam todos, e alguns passarão para Hillary Clinton! "Hillary é o mal menor, de longe", diz Eliot Cohen, do Departamento de Estado de Bush II. Cohen ajudou a reunir os neoconservadores para assinar o manifesto "Dump-Trump". Outro subscritor, o autor ultraconservador de política externa, Robert Kagan, declarou: "A única opção será votar em Hillary Clinton". [7]

A única opção? Então e Bernie Sanders ou Jill Stein, o candidato do Partido Verde?... Oh, já percebo, não são suficientemente conservadores.

E Trump? Muito mais crítico da política externa dos EUA do que Hillary ou Bernie. Fala da Rússia e de Vladimir Putin como forças positivas e como aliados e será muito menos provável do que Clinton a entrar em guerra contra Moscovo. Declara que será "imparcial" quando se tratar de resolver o conflito israelo-palestino (em oposição ao apoio sem limites a Israel de Clinton). Opõe-se a chamar "herói" ao senador John McCain, porque ele foi capturado. (Que outros políticos se atreveriam a dizer uma coisa destas?)

Diz que o Iraque é "um desastre total", condenando George W. Bush e os neoconservadores que o rodeavam. "Mentiram. Disseram que havia armas de destruição maciça e afinal não havia nada. E sabiam que elas não existiam. Não havia armas de destruição maciça". Até questiona a ideia de que "Bush nos manteve em segurança" e acrescenta que "Quer gostem de Saddam ou não, ele matava terroristas".

Sim, pessoalmente ele é obnóxio. Eu teria muita dificuldade em ser amigo dele. Que importa? 

11/março/2016

[1] www.fas.org/sgp/crs/row/RL33142.pdf
[2] New York Times, February 28, 2016
[3] www.commondreams.org/...
[4] Roger Morris, antigo membro do Conselho de Segurança Nacional, Partners in Power (1996), p.415. Para um exame abrangente de Hillary Clinton, ver o novo livro de Diane Johnstone, Queen of Chaos .
[5] National Review online, May 1, 2007
[6] Fortune magazine, July 9, 2007
[7] www.creators.com/read/pat-buchanan/03/16/will-the-oligarchs-kill-trump

[*] Autor de Killing Hope : US Military and CIA Interventions Since World War II

O original encontra-se em williamblum.org/aer/read/144 . Tradução de Margarida Ferreira.

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ 

BRUXELAS: OS CAVALEIROS DO PRÓPRIO APOCALIPSE



Mário Maestri*, opinião

Cheguei em Bruxelas, em janeiro de 1974, refugiado da ditadura brasileiro, em 1971, e, a seguir, do golpe chileno, em 1973.

Na Bélgica, obtive refúgio político e completei graduação e pós-graduação em História. Encontrei um país cinza, chuvoso mas solidário, que recebeu os refugiados do Chile de braços abertos. Estudei na UCL, universidade católica, com bolsa de estudos financiada por sindicalistas, militantes de esquerda e membros do minúsculo Partido Comunista belga. Morei sempre em Bruxelas, onde convivi com jovens belgas e estrangeiros, de diversas origens, sobretudo italiana e norte-africana. A partir do fim da II Guerra Mundial, a Bélgica, grande centro industrial europeu, sustentou sua expansão econômica com a importação maciça de trabalhadores italianos, poloneses, etc., destinados às minas de carvão, fundamentais à retomada da metalurgia e indústria do país.

Em 1946, os italianos, 200 mil no total, foram os primeiros a chegar.. Literalmente substituíram, no trabalho e nos alojamentos, os prisioneiros alemães e de direito comum, forçados a descer nas minas de carvão, trabalho duro e danoso à saúde. Aquela imigração oficial foi interrompida, pela Itália, após a explosão de mina em Marcinelle, com centenas de trabalhadores italianos mortos. A seguir, o Estado belga contratou a importação de trabalhadores com a Espanha [1956] e com a Grécia [1957] e, mais tarde, com a Turquia e com o Marrocos. Nos anos 1960, com forte impulsão industrial, trabalhadores espanhóis, portugueses, etc. chegaram ao país, em forma individual, para empregarem-se também na indústria. Um tipo de imigração que livrou o Estado belga de compromissos com os governos dos países que cediam os trabalhadores. Do norte da África, chegaram muitos trabalhadores, até poucas décadas.

Uma População Multi-Nacional

Em 1974, conheci uma Bélgica multi-nacional, sobretudo quanto à classe trabalhadora. Naqueles anos, os filhos dos imigrados chegavam à universidade, de acesso universal e gratuita. Companheiros e companheiras refugiados amigos - chilenos, brasileiros, argentinos, etc. - conheceram e casaram-se com belgas nativos ou filhos e filhas de operários estrangeiros. Em Bruxelas conheci minha atual esposa, universitária nascida em aldeia próxima a Charleroi, filha de italiano chegado precisamente em 1946 para labutar nas minas de carvão daquela região. Não havia diferenças de qualidade no tratamento de um jovem belga nativo e de um filho de imigrados, mesmo que aflorassem elementos de descriminação, conhecidos por todas as vagas imigratórias. Situação que tendia à dissolução, com o passar dos anos e a absorção-naturalização das gerações nascidas na Bélgica. Mesmo conhecendo o italiano, espanhol, árabe, etc., os filhos de imigrados tinham, como primeira língua, o francês ou o holandês, línguas das duas comunidades nacionais que, desde a invenção da Bélgica, em 1830, dividem-se o país aos beijos e tabefes.

Tive grandes amigos e amigas do norte da África e da África Negra, em geral militantes e simpatizantes de esquerda, como normal na época. Nos unia as mesmas visões difusas de mundo e a devoção à cerveja belga, excelente. Os jovens de origem norte-africana, nascidos na Bélgica, tinham a mesma adesão à religião dos pais do que eu tinha à dos meus - isto é, nenhuma. Os jovens de origem norte-africana que conheci abominavam o fundamentalismo islâmico, assim como os jovens progressistas brasileiros abominam o nosso fundamentalismo evangélico. Denunciavam-no como movimento propiciado pelo imperialismo britânico e estadunidense, sobretudo através da Arábia Saudita, para enfraquecer os então fortes movimentos de libertação nacional de inspiração mais ou menos esquerdista, nacionalista, laica que avançavam no mundo dito árabe.

O fundamentalismo era inimigo a ser abatido.

No Marrocos, Egito, Líbia, Argélia, etc., havia governos nacionalistas, anti-fundamentalistas, com amplas fricções com os USA e seus aliados. Não eram governos emanados da população e possuíam fortes contradições com suas classes trabalhadoras e populares, mas garantiam espaços de convivência social e alguns direitos civis mínimos, com destaque para as mulheres. Sobretudo em comparação com sociedades como a Arábia Saudita. Em Bruxelas, mesmo nos bairros de imigrados norte-africanos, apenas as mulheres mais idosas portavam o véu. Jamais vi alguém portar uma burca, até retornar ao Brasil em final de 1977. Na Bélgica, o racismo era sobretudo contra a população negro-africana, em boa parte oriunda da ex-colônia belga, com pouca expressão entre os trabalhadores. A colonização do Congo foi singularmente desumana, praticando crimes inimagináveis.

Em 1991, quando Florence retornou a Bruxelas para terminar os estudos universitários, a situação mostrava-se já diversa, sobretudo em relação aos trabalhadores imigrados norte-africanos, últimos chegados, e dos seus filhos nascidos na Bélgica. Matriculamos Gregório, nosso filho, nascido na Bélgica, em 1977, em colégio público de Etterbeek, bairro onde morávamos e onde se concentram as instituições europeias. Não sabíamos que o colégio constituía uma espécie de depósito de filhos de norte-africanos, provenientes de famílias que viviam já conheciam situações precárias. A tensão entre os jovens norte-africanos e os belgas de origem era forte, espelhando situação que se degradaria nos anos seguintes. Quando menina e adolescente, na escola, Florence sofrera pouco o peso de sua origem italiana. Mas volta de seus pais para a Itália, após a aposentadoria, anos mais tarde, foi sentida como enorme perda pela pequena comunidade operária em que viveram.

Um Italiano, Primeiro Ministro

Com o passar dos anos, os filhos de italianos, portugueses, espanhóis, etc. integraram-se profundamente no país, em geral ocupando postos crescentemente especializados no mundo do trabalho e na sociedade. Esse processo foi propiciada pela educação pública, por direitos sociais inimagináveis para o Brasil e graças a um mercado de trabalho em expansão. Recentemente, o cargo de primeiro ministro do governo federal da Bélgica foi assumido por filho de operário italiano imigrado. Não foi por choque de civilização, como proposto pelo conservadorismo, que o mesmo não ocorreu com os norte-africanos.

Em 1974, conheci a cidade de Charleroi, já com as minas desativadas, mas ainda centro metalúrgico dinâmico, absorvendo ainda uma mão de obra que apenas começava a exceder às necessidades. Diante das moradias operárias, operários especializados exibiam seus novos automóveis.Visitei um velho italiano, ofegante, semi-imobilizado, respirando com ajuda de oxigênio, com os pulmões destruídos, como milhares de outros mineradores. Doze anos mais tarde, visitei a aldeia em que Florence nasceu. Na periferia de Charleroi e antigos bairros industriais, deparei-me com usinas, fábricas, moradias, lojas, bares, etc. abandonados e enegrecidos pela fuligem dos alto-fornos desmobilizados. A impressão era de uma espécie de ferro-velho industrial. Na região vivia uma geração de trabalhadores lumpenizados e desmoralizados, entre eles colegas da escola de Florence, que envelheceram não raro praticamente sem jamais ter trabalhado, sustentados pelo salário-desemprego.

O Fim do Sonho Capitalista

A crise estrutural da ordem capitalista e as políticas neoliberais que ensejou, sobretudo após a vitória da contra-revolução mundial, de fins dos anos 1980, ocasionaram uma vaga gigantesca de desindustrialização, deslocamento industrial e desemprego no mundo industrializado, que golpeou duramente a Bélgica. No Sermão da Montanha do mundo real, os últimos chegados passam fome, frio e são humilhados. Os trabalhadores norte-africanos, com direito de residência, aposentaram-se ou passaram a gozar do salário-desemprego, ao igual que seus companheiros belgas. Com o agravamento da crise, foram apontados como parasitas de uma sociedade nacional que haviam e seguiam construindo. O movimento de discriminação enfatizou características somáticas e culturais antes quase desapercebidas: a forma popular de falar; a cor mais escura da pele; o cabelo negro ou crespo; a religião e cultura muçulmana; os nomes e sobrenomes árabes. Mesmo com curso secundário e universitário, os jovens de origem norte-africana nascidos no país foram marginalizados na disputa cada vez mais acirrada pelo trabalho cada vez mais escasso. Quando muito, empregaram-se nos trabalhos precários, temporários e mal-remunerados, incapazes de sustentar inserção minimamente condigna na sociedade nacional. E assim, muitos deles nasceram e têm vivido reduzidos a situação de párias, em seu próprio país.

Alguns bairros de Bruxelas, com destaque para Molenbeek , se transformaram em espécie de guetos norte-africanos, sobretudo devido aos menores preços de seus imóveis. Entretanto, neles vivem também moradores de outras origens, sem maiores problemas de convivência. Por esses azares da sorte, Gregório, hoje professor do curso de Arquitetura na ULB em Bruxelas, se alojava em casa de casal de amigos arquitetos, no mesmo lado da rua, apenas a duas casas, do último esconderijo de Salah Abdeslam.

A Morte da Utopia

O uso e o tráfico miúdo de entorpecentes, a pequena delinquência, a humilhação permanente, a inevitável desmoralização são os únicos grandes caminhos que se abrem a essa geração descartada, permanentemente assediada por forças policiais municipais que não primam pelo apreço do multi-culturalismo. Diante dela, se abre literalmente o nula, em uma sociedade que tudo promete e oferece a quem é um produtor e consumidor de maior ou menor fôlego. Por outro lado, a derrota da classe operária e o retrocesso e dissolução dos partidos e organizações de esquerda belgas e europeus ensejaram que seus programas não mais atraiam essa juventude sem futuro e destino, que descrê totalmente da organização e luta social para superação do descalabro atual. Não raro, o vazio ideológico-existencial dessa juventude é preenchido pelo fundamentalismo, reação aparentemente radical à sociedade cristã-ocidental que a marginaliza e humilha, no país em que nasceu.

O massacre e a literal destruição de nações inteiras de raízes árabes e muçulmanas - Palestina, Líbano, Iraque, Síria, Líbia, etc. -, promovidos pelos Estados Unidos e seus aliados, com destaque para os grandes Estados europeus, em nome do capitalismo e da civilização ocidental, causaram igualmente impulsão à adesão ao fundamentalismo islâmico, visto como dura resposta a esses crimes genocidas. A esse coquetel explosivo, acrescente-se elemento em geral ocultado pela grande mídia. O imperialismoocidental, em aliança com a Arábia Saudita, serviram-se nas últimas décadas do extremismo islâmico para destruir nações árabes autônomas, que defendiam estados minimamente laicos, heranças das lutas pela independência anti-colonial dos anos 1950, travadas contra a Inglaterra e a França, sobretudo.

Quando o Ocidente amava Bin-Laden

Política de destruição nacional que, em 2011, se voltou para a Síria, após o arrasamento de Líbia, Iraque, Palestina, Afeganistão, etc. Inicialmente, o levante islâmico fomentado por USA, Turquia, Arábia Saudita e estados europeus imperialistas foi saudado vivamente na Europa como movimento libertador. Ainda há dois ou três anos, a grande mídia belga, européia e mundial - brasileira inclusive -, glamourizavam os jovens europeus, sobretudo de origem muçulmana, que partiam para lutar na Síria. Esses jovens desesperados foram apresentado como fedayins da liberdade, antagonistas do terrível ditador sírio, síntese de todos os horrores do universo, como já fora Saddam, Guedafi, etc! Pouco importava que fossem doutrinados pelo islamismo fundamentalista, que acusava o “ogro sírio”, entre outros graves pecados, de sustentar Estado laico, aberto a todos os credos. A Bélgica foi um dos países europeus que forneceu um maior número de voluntários para a cruzada anti-síria. Enorme parte deles partiram de Molenbeek.

Simpatia e apoio que começou a mudar apenas quando o Estado Islâmico, com suas principais raízes nas comunidades sunitas, reprimidas pelo xiismo entronizado pelos USA no Iraque, escapou do controle de grande financiador estadunidense, para realizar demonstrações de singular barbarismo, exprimindo um programa próprio para aquela região do mundo. Então, de heróis da luta anti-ditatorial, os jovens fedayinsbelgas, franceses, espanhóis, etc. passaram a ser denunciados e perseguidos como terroristas islâmicos. Já na França e agora na Bélgica, os promotores diretos dos atentados terroristas multitudinários urbanos, comumente não são cidadãos do mundo árabe, nascidos em tugúrios rurais, educados nas obscuras madrassas financiadas pela Arábia Saudita e pelos corruptos emirados petrolíferos, criados pelos britânicos e defendidos até hoje pelo imperialismo estudunidense e inglês, os reais proprietários de suas riquezas, há dezenas de anos.

Cavaleiros do Próprio Apocalipse

Os neo-terroristas são cidadãos europeus, belgas e franceses sobretudo, de origem norte-africana, educados em escolas públicas, em geral até poucos anos sem qualquer ligação religiosa, não raro galvanizados e doutrinados nas prisões dos seus países, onde muitos foram parar por pequenos e médios delitos e crimes. Jovens que conheceram o desespero, a desmoralização, a humilhação, na terra em que nasceram, encantados pelo abismo patológico do fundamentalismo islâmico, nem que seja como forma de abandonar em uma explosão de ódio um mundo e destino que já não mais suportavam.

É por tudo isso que os ataques contra o aeroporto e uma estação de metrô de Bruxelas, por jovens nascidos naquela cidade, foi saudado por outros jovens moradores de Molenbeek, Schaerbeek e outros bairros da capital da Europa, atirando pedras contra policiais, que por ali circulam, há anos, como se estivessem em terra estrangeira. É mais uma guerra civil, de classes, ou melhor, de desclassados, sem futuro, do que um confronto de religião ou de raça, travada por desesperados, condenados a uma vida sem destino, na ferida cidade de Bruxelas.Atos terríveis que certamente degradarão ainda mais as condições de existência de uma população de origem norte-africana, embretada e sem saída, em uma sociedade européia que tudo lhe ofereceu no passado e, hoje, lhe retira até a esperança no futuro.


Mais lidas da semana