segunda-feira, 28 de maio de 2018

CURTO E BOM


“Sejam felizes!” É deste modo que Pedro Cordeiro, o operário das letras, jornalista, que hoje lavra o Expresso Curto, termina. Muito obrigado, igualmente.

O início da obra exposta no Curto de hoje abraça Itália e a situação política naquele país da bota que pontapeia permanentemente a Sicília. O resto vão ler a seguir. Extra esta antecipação que fazemos no Curto hoje não vai acontecer porque queremos separar o trigo do joio e possuímos matéria para vos apresentar com opinião de colaboradores do PG. O Curto está bom, é de ler. A seguir, mais logo. Abraçaremos o Congresso do PS e muito mais. Volte mais tarde aqui ao PG que temos “coisas boas” para si.

Bom dia e boas festas aos animais de estimação ou vadios que por si passem. Sigam o voto do Pedro e… “sejam felizes! (PG)

Bom dia este é o seu Expresso Curto

O que correu mal, a massa ou o molho? Marco Bellini diz que é tudo...

Pedro Cordeiro | Expresso

Bom dia!

Se foi daqueles que há dias andaram a decorar o nome de Giuseppe Conte, o desconhecido professor de Direito indicado para primeiro-ministro da Itália, fixe antes o de Carlo Cottarelli. Este economista e ex-alto cargo do Fundo Monetário Internacional vai hoje ao Palácio Quirinale, sede da presidência da República, a pedido do chefe de Estado Sergio Mattarella. Quem sabe se não sai nomeado chefe do Governo… mas nada de previsões, já que a terceira maior economia da Zona Euro é pródiga em surpresas.

Conte fora escolhido para liderar um Executivo de coligação entre dois partidos antissistema, a Liga (outrora “do Norte”, favorável à independência de parte da Itália, hoje nacionalista, sempre xenófoba) e o Movimento 5 Estrelas (M5S, fundado pelo comediante Beppe Grillo e nascido dos protestos de “indignados” contra a austeridade). O acordo entre a Liga e o M5S parsa formar Governo previa que nem o líder daquela (Matteo Salvini) nem o deste (Luigi Di Maio) fossem primeiro-ministro. Foi assim que há uma semana surgiu Conte como solução de compromisso, logo manchada pelas aldrabices no currículo académico do indigitado.

Ontem Conte renunciou a formar Governo, depois de Mattarella ter rejeitado a sua proposta para ministro das Economia: Paolo Savona, um homem que quer reformular os tratados europeus. Aos 81 anos, antigo ministro da Indústria nos anos 90, garantiu que quer “uma Europa diferente, mais forte, mas mais igual”, e que é com investimento público, não com cortes orçamentais, que se reduz a dívida. A verdade é que a contestação a Bruxelas fazia parte de um rascunho do programa da aliança M5S-Liga, embora tenha sido expurgada da versão final. Agora o euroceticismo volta pela porta grande e faz implodir a tentativa de formar Governo.

“Não posso aceitar imposições de ministros”, avisou o Presidente da República, que garante não ter recusado Savona “de ânimo leve” e até sugeriu, para a pasta da Economia, o líder parlamentar da Liga, Giancarlo Giorgietti. Os partidos da coligação abortada nem quiseram ouvir falar disso. “Se temos um ministro que não é apreciado em Berlim, isso quer dizer que é o ministro certo”, afirmou Di Maio. Pede a destituição de Mattarella, no que o jornal La Stampa considera “uma deriva que o país deve evitar”.

Alessandro Battista, deputado do M5S, acusa o Presidente de ter “abolido a democracia”: “Savona foi punido por delito de opinião. Antes de voltarmos às urnas é preciso acusar Mattarella de atentado contra as instituições”. A manobra foi, assegura, “premeditada”.

Voltar às urnas parece ser o destino de 60 milhões de italianos, informa “The Guardian”, com a imprensa transalpina a apontar o dia 9 de setembro para legislativas antecipadas, seis meses e cinco dias depois das últimas. Mattarella, sobre isto, nada disse. Até lá, o ainda primeiro-ministro Paolo Gentiloni (do Partido Democrático, de centro-esquerda) vai avisando no Twitter que é preciso “salvar o país”.

O M5S e a Liga somaram 51,03% dos votos nas eleições de março. Se houver eleições antecipadas, e como já se viu pelas reações de ontem à noite, não deixarão de apostar na vitimização e na tese de que, recusados pelo eleitorado, os partidos convencionais tentam travar a mudança na secretaria, seguramente conluiados com Juncker e Merkel. Não faltarão alusões ao esmagamento da primavera grega que o Syriza um dia quis lançar e execrações do discurso único da Europa troikista.

É um discurso que pode pegar num país paralisado e viciado na instabilidade política (Gentiloni lidera o 64.º Governo em 73 anos de democracia), sobretudo se Mattarela der posse a a um Governo tecnocrata, à margem dos partidos, chefiado por Cottarelli. Em 2011, a nomeação do independente e mui europeísta e austero Mario Monti para substituir um Berlusconi caído em desgraça ajudou a criar condições para a irrupção do M5S, em 2013, numas eleições em que Monti se ficou pelos 8%.

Para já os mercados não se mostram em pânico, mas que dirão se as forças populistas voltarem a vencer as eleições — que podem muito bem tornar-se um plebiscito à solução de Governo travada — com votações reforçadas? E, sobretudo, que impacto terá esta crise numa União Europeia a gerir as mazelas do ignoto Brexit, já toldada por líderes claramente contrários aos seus valores fundacionais (Polónia, Hungria…) e que ainda não ergueu a cabeça depois de dez anos de crise? A Itália é, recordemos, um dos membros fundadores da então CEE (foi em Roma que o primeiro tratado foi assinado em 1957) e daqueles que são too big to fail...

Há dias Teresa de Sousa desaconselhava no “Público” quaisquer ilusões quanto à ascensão dos populistas em Itália. Agora há motivos acrescidos de receio e, alerta o “Financial Times” (acesso pago), a Europa vai ter de saber dialogar com os italianos, seja quem for que os governe.. Se num velhinho anúncio da marca Marco Bellini dois cozinheiros exaltados discutiam se o segredo da culinária italiana estava na massa ou no molho, veremos se a ira das “massas” é suficiente para haver “molho”. O que é que está a correr mal em Itália? Voltemos ao anúncio, e à sentença de uma típica mamma italiana: “Marco Bellini diz que é tudo… ele é que sabe”.

ANESTESIA EM VEZ DE BATALHA

Por cá prossegue a exegese do XXII Congresso do Partido Socialista, um conclave morno próprio de um partido no poder, mas que desiludiu face ao aperitivo. “Costa tinha de criar a ilusão de que havia alguma ação de onde não resultasse movimento: e da ação que houve, o movimento que resultou foi pouco ou nenhum”, escreve o meu camarada Vítor Matos, editor de Política do Expresso, para quem António Costa — de quem Francisco Assis disse que anestesiara o BE e o PCP na atual solução de Governo — anestesiou também o próprio PS. Eu próprio me senti anestesiado ao assistir, via rádio e TV, ao fim de semana sem batalha na Batalha, em que tão depressa se aplaudia de pé Mário Centeno como se teciam loas à inédita aliança das esquerdas. Onde a defesa da continuidade da “Geringonça” casou sem fricção com apelos à maioria absoluta. Que saudades de épicos congressos pretéritos do PS e do PSD...

O antecipado debate ideológico entre esquerda e pragmatismo nem sequer aqueceu; a luta pela sucessão vai ter de esperar, pois o primeiro-ministro avisou que não pensa reformar-se tão cedo; e nem o Voldemort socialista foi nomeado senão de passagem, numa lista cronológica enunciada por Costa e que até incluiu Seguro (uma estreia na boca do incontestado secretário-geral), e não pelo que importa. Se alguém temia que aparecessem indefectíveis a verberar o partido por ter abandonado José Sócrates, pôde suspirar de alívio. Se alguém esperava que figuras como Ana Gomes partissem a loiça (a expressão é dela), pôde encolher os ombros.

A ex-embaixadora leva, ainda assim, o prémio de aproximação. Foi voz rara no deserto a pregar contra a “captura do Estado” e a assumir as responsabilidades do PS (“Errámos!”), recusando-se a “varrer para debaixo do tapete” o que envergonha partido e país mas sem uma referência nominal àquele que, lá está, não pode ser nomeado, como diria a Mariana Lima Cunha. Também falou do fiasco dos incêndios, assunto em que o restante PS revelou, se não anestesia, conveniente amnésia.

O que fica, então, deste Congresso sem noitadas nem facadas? Homenagens merecidas mas não eletrizantes a Mário Soares e António Arnaut. O prenúncio de uma próxima legislatura muito diferente, vaticina o diretor do “Público”, David Dinis. Uma renovação dos órgãos dirigentes aqui explicada pela Luísa Meireles. A belíssima fotorreportagem do Tiago Miranda. Os momentos cómicos do costume e alguns espinhos, cortesia do “Observador”, e pérolas ocultas que nos traz o “Diário de Notícias” (permitam-me que envie daqui um abraço aos camaradas do “DN” em tempos de mudança profunda). E as autópsias em duas-Comissões-Políticas-duas, o podcast político do Expresso, conduzido pelo Filipe Santos Costa.
OUTRAS NOTÍCIAS
Necessariamente em tom telegráfico, que os dois assuntos anteriores já enchem grande parte da chávena deste Expresso Curto...

EUTANÁSIA: Amanhã a Assembleia da República debate os projetos de lei sobre a morte assistida apresentados pelo PS, BE, PEV e PAN. A votação será nominal e, por uma vez, o resultado não é conhecido à partida. CDS e PCP estão contra; BE, PEV e PAN estão a favor. PS e PSD dão liberdade de voto aos seus parlamentares, sendo o primeiro mais “pró” e o segundo mais “contra”, mas o desfecho está em aberto. O “Observador” explica o que está em causa. Já agora, o semanário Expresso publicou, este sábado, um extenso trabalho com informação sobre a discussão em curso, opiniões de figuras públicas e menos públicas, relatos de casos de quem deseja ou desejou abreviar a vida (e de quem não), tudo para ajudar o leitor a compreender e a formar opinião, caso o deseje, neste assunto muitíssimo complexo e não redutível a maniqueísmos.

IRLANDA DO NORTE: Depois do histórico referendo de sexta-feira, em que os irlandeses decidiram por maioria de dois terços abrir caminho à despenalização da interrupção voluntária da gravidez (outro assunto que, pese embora a consulta popular entre sim e não, requer mais reflexão do que mera oposição binária), resta uma batata quente: o aborto coninua proibido na Irlanda do Norte, que faz parte da mesma ilha mas de outro país (o Reino Unido, onde a prática é legal há muitos anos). Há deputados a pedir a Theresa May um referendo para os norte-irlandeses dizerem de sua justiça e mesmo quem descreva o caso norte-irlandês como próprio da era vitoriana. O “Financial Times” (acesso pago) concorda. A governante estará relutante, já que o assunto é competência da administração regional da Irlanda do Norte. O pior é que esta está sem governo autónomo há mais de um ano, por falta de acordo entre os seus maiores partidos. May, está, aliás, mais preocupada com as agruras da saída (ou nem tanto) da UE.

COREIAS: Prosseguem os esforços por salvar a cimeiracancelada-mas-talvez-não entre Donald Trump e Kim Jong-un, marcada e desmarcada para 12 de junho. Os protagonistas são gente temperamental, mas as respetivas equipas vão reunindopara ver o que é possível, escreve “The Washington Post”. Afinal, Nixon também teve os seus apuros com cimeiras e isso não o impediu de protagonizar uma histórica aproximação à China nos anos 70.

FUTEBOL: Encerrada a época europeia com a 13.ª conquista da Liga dos Campeões pelo Real Madrid, sábado à noite (3-1 sobre o Liverpool, ver-se-á se foi o último jogo de Cristiano Ronaldo pelos merengues), os olhos voltam-se para o Mundial e a Tribuna Expresso explica como se prepara a grande prova, que começa a 14 de junho. Para as bandas de Alvalade continua o calvário e o (ainda, mas como, senhores?!) presidente do Sporting volta a ser desmentido. Desta vez, pelo Ministério Público e a propósito das gravíssimas agressões do dia 15 em Alcochete.

COLÔMBIA: O próximo presidente do país sul-americano será Iván Duque ou Gustavo Petro. O primeiro, que somou 39,14% na primeira volta das eleições, celebrada ontem, é herdeiro político do antigo presidente Álvaro Uribe (2002-2010), da direita mais dura. O segundo (25,09% dos sufrágios) é um ex-autarca de Bogotá, antigo guerrilheiro e pende para a esquerda. O atual vice-presidente Germán Vargas Lleras não foi além dos 7,28%, apesar de ter feito parte do Governo de Juan Manuel Santos, artífice do acordo de paz com as FARC (foram as primeiras presidenciais desde a reintegração do movimento armado na vida política) e prémio Nobel da Paz em 2016, que sai com a popularidade em mínimos. A segunda volta disputa-se a 17 de junho.

ESPANHA: Pablo Iglesias, líder do Podemos (esquerda populista) e a sua companheira Irene Montero, porta-voz parlamentar do mesmo partido, foram absolvidos do crime de desvio pequeno-burguês, digo, foram confirmados nos cargos pela militância, num referendo digital, apesar de terem comprado um chalé de luxo no valor de 600 mil euros (o mesmo valor, curiosamente, que Iglesias criticara o ex-ministro da Economia de direita por ter gasto na aquisição de uma casa. Entre os militantes que votaram, 68,42% não defendem a reeducação de Iglesias e Montero, informa “El País”.

MANCHETES DE HOJE

Público: Patrões contam com o apoio de Rui Rio para o acordo laboral

Diário de Notícias: Carros novos vão ser mais caros já em setembro

i: Ronaldo muito perto de assinar pelo PSG

Jornal de Notícias: Carta por pontos tira das estradas 59 automobilistas

Correio da Manhã: 17 mil médicos e enfermeiros emigram

A Bola: Fica Ronaldo

Record: Bruno de Carvalho: “Jesus não foi suspenso nem levou tau-tau”

O Jogo: Herrera ‘forever’

Negócios: Tranquilidade visada no cartel dos seguros

Jornal Económico: Manuel Pinho prestes a voltar a ser arguido

O QUE ANDO A LER

Um pequeno livrinho vermelho, que não o de Mao. Trata-se de “Antes é que era bom!”, título que vai buscar frase irritante e que a desmonta pela pena do filósofo e historiador francês Michel Serres. Aos 87 anos, mostra notável juventude de espírito ao rejeitar a ilusão nostálgica que tanta vez nos assalta, em prosa acessível e que arranca sorrisos. Veja-se este trecho sobre higiene:

“…a higiene só se tornou uma prática generalizada muito tempo depois de 1950. Nesses dias da minha infância, a revista Elle impôs-se, não sem estrondo, recomendando às mulheres que mudassem de calcinhas todas as manhãs. Toda a gente ria à socapa, a maioria das pessoas escandalizava-se, o resto achava uma tal exigência impossível. No entanto, a reputação da revista provém desse apelo, que pôs para sempre às avessas as famosas palavras de Bonaparte a Josefina: ‘Regresso do campo, não volte a lavar-se!’ E os deuses teriam apreciado que, por essa mesma altura, houvesse um periódico semelhante para os machos fedorentos. As estatísticas dizem que a esperança de vida aumentou sobretudo graças a esta propagação civil e súbita da higiene. Antes, vivíamos no reino do amarelo-claro.”

O QUE ANDO A VER

A segunda temporada de “13 Reasons Why”, série da Netflix baseada no livro homónimo de Jay Asher sobre o suicídio de uma adolescente americana. Temas como bullying, novas tecnologias, alienação, sexo, relações entre pais e filhos, entre professores e alunos e entre amigos entram-nos pelo ecrã com a força de um soco. Impressionou-me uma espécie de disclaimer no primeiro episódio desta temporada, em que os atores da série despem a personagem que encarnam para recomendar a quem já teve pensamentos suicidas que não assista, pelo menos sozinho, e a divulgar linhas telefónicas de apoio. Ainda bem que o fazem, fruto de polémica que a primeira temporada suscitou por alegada “glamourização” do suicídio. A série é bem escrita e interpretada e não pode senão interpelar-nos. Falar de suicídio é preciso.

Sem mais, que este Expresso Curto já parece aqueles baldes de café que servem na América, desejo-lhe uma óptima segunda-feira e uma excelente semana (se está em Lisboa, passe pela Feira do Livro, que abriu há dias e dura até dia 13, e aprecie os jacarandás que começam a florescer). Amanhã o Curto volta, hoje estamos em permanência no Expresso online e às seis da tarde contamos-lhe a jornada no Expresso Diário. Sejam felizes!

França | Operações "Robin dos Bosques" e tartarugas militantes

Rémy Herrera

Os movimentos sociais neste fim de Maio continuam em numerosos lugares da França. Sua duração prolongada dá mesmo a ideia de um endurecimento dos conflitos. A contestação de fundo dirigida contra as políticas neoliberais aplicadas há mais de um ano pelo governo do presidente Emmanuel Macron não enfraqueceu. Ainda que não seja fácil para muitas famílias de trabalhadores mobilizados nas greve verem seus envelopes de pagamentos amputado no fim do mês, ou encontrar sempre a energia para comparecer à multidão das manifestações que são planificadas pelas assembleias gerais e as organizações sindicais.

Nos transportes, desde há dois meses, as greves prosseguem – de maneira regular: dois dias de greve, três dias de trabalho – na SNCF (Société nationale des chemins de fer français) e – esporadicamente – na Air France. O presidente-director-geral da Air France foi constrangido a demitir-se no princípio de Maio após os resultados de um referendo interno rejeitando suas propostas de aumentos salariais, julgadas insuficientes pelos assalariados. Na SCNF, em 23 de Maio, a intersindical anuncia que 95% dos ferroviários consultados pronunciavam-se contra a "reforma" neoliberal do sector do transporte ferroviários que o governo entende impor-lhes. Os cortejos de ferroviários, muito motivados, e na primeira linha dos movimentos de protesto, foram engrossados por agentes da função pública após inúmeras reuniões organizadas periodicamente nas grandes cidades do país.

Estão igualmente no cerne da luta desde o princípio – na realidade desde Dezembro de 2017, antes mesmo do começo da greve dos ferroviários – os trabalhadores dos sectores da energia. Em 7 de Dezembro último, os agentes das indústrias eléctricas e gasistas haviam-se posto em greve para influenciar as negociações salariais – após o congelamento dos salários nacionais de base em 2017 imposto pela política de rigor. Os trabalhadores da electricidade e do gás têm uma longa experiência de luta. O sector da energia da energia foi de facto amplamente liberalizado nestes últimos anos, sob a pressão das políticas de privatização e de abertura à concorrência desejadas pela União Europeia e complacentemente acompanhada pelos sucessivos governos franceses. A imposição destas estratégias destruidoras, visando desmantelar o serviço público – ainda que considerado excelente em França – agravou o risco de rupturas de abastecimento e provocou restrições e avarias recorrentes, assim como diferenciações de tarifas conforme os utilizadores e os territórios e frequentes altas de preço da energia destinada às famílias, inchando os lucros dos produtores privados que entraram no mercado para se apoderarem dos nichos mais rentáveis. Quase sempre, a multiplicação das ofertas de gás e de electricidade locais, privatizadas e concorrentes, é irracional. E nenhum mecanismo relativo a compromissos climáticos de descarbonização permite fixar objectivos ambientais a operadores privados.

OPERAÇÕES DE CHOQUE 

A título de acções de choque, agentes dos electricistas e gasistas em luta decidiram realizar operações de choque ditas "Robin dos bosques". Elas consistem em cortar a electricidade a grandes empresas que despedem empregados enquanto despejam enormes lucros para os accionistas. Ou, inversamente, em restabelecer a electricidade e o gás às famílias em dificuldades financeiras que não puderam pagar as suas factures de energia. Por vezes, são quarteirões populares inteiros, mesmo partes de departamento identificados como sendo desfavorecidos, que vêm suas facturas emitidas com tarifas reduzidas graças a tais operações "Robin dos bosques". Por vezes estas acções são efectuadas no decorrer de manifestações: camaradas escondem seu rosto, depois formam uma "tartaruga" (que lembra um pouco um agrupamento de rugby) acima de um alçapão que conduz a contadores subterrâneos e protegendo um deles que desce para efectuar sua missão... Depois de ele sair, a "tartaruga", com punhos levantados, grita: "A energia não é para o privado, é para nós!".

A renacionalização do sector da energia é uma prioridade entre as suas reivindicações. "Sim ao serviço público da electricidade e do gás", este é o seu slogan. A segurança energética e a igualdade de todos é o objectivo, assim como a independência energética do país e a garantia de missões ambientais assegurados por compromissos climáticos e ecológicos de descarbonização.

A energia, essencial em todos os aspectos da vida, não é uma mercadoria mas sim um bem comum. E este bem comum, resultante dos enormes esforços de equipamento do país consentidos pelos cidadãos, deve pertencer-lhe. A luta pelo serviço público da electricidade e do gás é hoje uma das dimensões chaves das lutas dos trabalhadores franceses.

27/Maio/2018

Este artigo encontra-se em https://resistir.info/ 

Na imagem: O refém e o privilegiado

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