quinta-feira, 31 de maio de 2018

O DIA DA CRIANÇA, UM DIA SERÃO TODOS


A agenda das consciências determinou para amanhã o Dia da Criança. A liturgia variada associada à efeméride vai acontecer como de costume. As visitas, os passeios, as festas, etc., as idas a espectáculos de todas as naturezas mostrarão uma comunidade preocupada em fazer as crianças felizes. Muitas estão e parecem divertir-se, felizmente. Algumas outras terão de passar por um dia cansativo.

A imprensa fará eco dos múltiplos eventos dirigidos às crianças, ouvirá por uma vez as crianças e produzir-se-ão, certamente, muitos discursos dirigidos aos miúdos e ao seu mundo.

Claro, neste dia, ouvi-las sobre o que pensam do mundo, do seu mundo e da vida das pessoas, é "giro". É verdade que passa depressa, amanhã já não as ouvimos sobre o que as inquieta e lá voltam os miúdos, muitos, a gritar e a agitar-se para se fazerem ouvir.

Tudo bem, pois que seja. Este tipo de efemérides serve também para isso mesmo, a encenação, sempre bem-intencionada da preocupação que descansa as consciências.

É verdade, felizmente, que muitas crianças vivem felizes, por assim dizer, adoptadas pelos pais, acolhidas pela escola e pela comunidade, são o futuro a crescer.

No entanto e nestas alturas lembro-me com frequência do Mestre Almada que na Cena do Ódio falava sobre, "a Pátria onde Camões morreu de fome e onde todos enchem a barriga de Camões". De facto, apesar da vaga de discursos e iniciativas em nome das crianças, muitos passam mal, muito mal, todos sabemos. Não cabem no Dia da Criança.

Não cabem os que diariamente são vítimas de crimes e maus-tratos.

Não cabem muitos dos que vivem numa instituição esperando por uma família que nunca virá.

Não cabem os que, por várias razões, são alvo de discriminação e a quem são negados direitos básicos.

Não cabem os que vivem em famílias que os não desejam e mal os suportam.

Não cabem os que apenas comem o que refeição única na escola lhes possibilita.

Não cabem os que vivem em famílias a quem roubaram a dignidade do trabalho e que, por isso, sobrevivem envergonhadamente na pobreza que nos deveria envergonhar a nós.

Não cabem os que a escola não consegue ajudar a construir um futuro a que valha a pena aceder e sofrem políticas educativas pouco amigáveis para os miúdos.

Não cabem os que sofrem de solidão e isolamento sem que se perceba como não estão bem.

Na verdade, estes miúdos de que acabei e falar por vezes parece que não existem, são transparentes, nem os vemos. Por isso, comemora-se o Dia Mundial da Criança com a convicção ingénua ou voluntarista de que, como dizia Pessoa, "o melhor do mundo são as crianças" e que elas são felizes, todas.

O que, obviamente, não corresponde à realidade mas os poetas ... são uns fingidores.
E sabem o que é mais inquietante?

Para o ano vou voltar com este texto, não prescreve.


Portugal | Assembleia da Fantasia


Miguel Guedes | Jornal de Notícias | opinião

Nuno Melo, ironicamente, imaginou-se no Pavilhão da Fantasia da Disney-Paris enquanto assistia ao Congresso do PS mas o jogo do faz-de-conta rapidamente migrou para a Assembleia da República-Lisboa. Por alucinação democrática, por cinco votos de consciência, continuaremos país a viver no reino da Fantasia, fingindo que nada existe, que a realidade não é o que é e que não acontece no dia-a-dia dos hospitais, que a vontade inabalável que resulta do sofrimento atroz é liberdade e escolha individual que não deve ser respeitada.

Para os deputados que chumbaram os quatro projectos de lei sobre a despenalização da eutanásia, sobra uma informação: a realidade impõe-se, os factos são mais pesados do que os grãos de areia que preferem espalhar no chão. Porque a vida compreende a morte, a liberdade de poder decidir é agora projecto adiado que não tem como não fazer caminho na próxima legislatura. Num país que tantas vezes prefere atrasar-se uma década quando legisla sobre a realidade (lembremos os casos da despenalização do aborto ou do consumo de drogas), trazer a questão para o debate político foi a maior vitória táctica de quem se bateu pela despenalização.

Com algumas excepções, o debate que antecedeu a votação foi elevado e digno. Assistimos, porém, à teoria do "alarme social" do inefável Abel Matos Santos que receava que as pessoas de idade pudessem entrar doentes num hospital dizendo, e cito, "eu não quero morrer, será que me vão eutanasiar?". Esta e outras formas espúrias de manipular a realidade, criando cinicamente a confusão sobre a possibilidade de um Estado-matador que espreita às portas da doença, são insultuosas e difíceis de classificar. Viver a vida em modo de voo é uma opção individual mas convém não enganar as pessoas em matéria de consciência. As palavras de Laurinda Alves, escritas em modo "observador", são tão graves e manipuladoras como alguns cartazes onde se lia "Por favor não matem os velhinhos" ou "Eutanásia? Não mates, cuida!". Este tipo de contra-informação faz parte da miséria humana mas, ainda assim, há limites. Agora espera-se, de todas as trincheiras, algum pudor e silêncio.

Sobram algumas notas, assistidas. Recusar debater uma questão porque não consta de um programa eleitoral é declinar o poder legislativo da Assembleia da República. Evitar mais um veto presidencial não é necessariamente fazer um favor a Marcelo. Criar obstáculos ao um debate porque o debate não foi até aí suficiente, é hipotecar uma boa decisão. Ao contrário dos seus camaradas espanhóis em 1998, os primeiros a apresentar um projecto de lei na Câmara dos Deputados para despenalizar a morte assistida, ver o PCP institucionalizar-se à Direita é doloroso.

O autor escreve segundo a antiga ortografia

*Músico e jurista

Portugal | Balança alimentar


O nosso país, apesar de entre os países da União Europeia ter a terceira maior Zona Económica Exclusiva, é deficitário em produtos da pesca e, em quase todos os grandes grupos de produtos alimentares.

José Alberto Lourenço | AbrilAbril | opinião

A análise da evolução da balança alimentar de qualquer país constitui um indicador fundamental de avaliação da sua soberania, reflectida na sua maior ou menor dependência do exterior em bens agro-alimentares.

No caso português essa avaliação conduz-nos invariavelmente à nossa adesão à CEE em 1986 e às consequências directas sobre o sector primário (agricultura, silvicultura, pecuária e pesca) da chamada política agrícola comum e da política comum das pescas.

Uma e outra permanecem na nossa memória colectiva como incentivadoras de abandono das terras, de abate de gado, de redução da frota de pescas, de diminuição da captura de pescado, em suma do crescente abandono da agricultura e pescas.

Por mais que se procure esconder a realidade, os números não mentem e aí estão eles de forma nua e crua a espelharem a evolução do nosso sector primário: a produção agrícola caiu 44% em termos reais, entre 1986 e 2017, e o emprego cerca de 66% – este sector empregava cerca de 900 mil trabalhadores para agora empregar pouco mais de 300 mil –, enquanto o sector das pescas viu a captura de pescado reduzir-se 63% e o emprego 60%.

A quebra registada na produção de cereais (85%), de plantas forrageiras e de batatas (75%), de outros produtos vegetais (60%) e de frutos (12%) são, juntamente com a quebra na produção animal e no pescado, os exemplos mais significativos e que nos nossos dias têm impacto nas necessidades acrescidas de importações e consequentemente no nosso défice alimentar.

 Os dados mais recentes divulgados pelo INE referentes à nossa balança comercial de bens alimentares mostram que o défice desta balança atingiu em 2017 cerca de 4 mil milhões de euros, 29% do nosso défice comercial de bens. 

O nosso país, apesar de entre os países da União Europeia ter a terceira maior Zona Económica Exclusiva, é deficitário em produtos da pesca e, em quase todos os grandes grupos de produtos do reino animal, reino vegetal e produtos das indústrias alimentares.

A excepção são as bebidas, líquidos alcoólicos e vinagres, a preparação de produtos hortícolas e de frutas, e as gorduras e óleos animais ou vegetais. Em tudo o resto, o nosso país depende do exterior para satisfazer plenamente as suas necessidades alimentares.

Balança alimentar em 2017

Principais produtos deficitários (em milhares de euros)

Saldo
-3 983 700
Peixes e crustáceos, moluscos e outros invertebrados aquáticos
-1 048 100
Carnes e miudezas, comestíveis
-823 700
Cereais
-703 600
Sementes e frutos oleaginosos; grãos, sementes, etc.
-564 300
Resíduos e desperdícios das indústrias alimentares; alimentos preparados para animais
-240 400
Preparações alimentícias diversas
-227 300
Preparações à base de cereais, farinhas, amidos, féculas ou leite; produtos de pastelaria
-193 200
Cacau e suas preparações
-178 700
Café, chá, mate e especiarias
-172 700
Leite e lacticínios; ovos de aves; mel natural; produtos comestíveis de origem animal, n. e.
-163 500
Frutas; cascas de citrinos e de melões
-112 900
Produtos hortícolas, plantas, raízes e tubérculos comestíveis
-87 200
Fonte: Estatísticas do Comércio Externo (INE)
O quadro anterior é bem elucidativo da situação preocupante de dependência externa alimentar em que o nosso país se encontra e para a qual fomos conduzidos após a nossa adesão à CEE, através da destruição do nosso aparelho produtivo, da asfixia dos pequenos e médios comerciantes pelas grandes superfícies comerciais, da liberalização do comércio mundial e das imposições da política agrícola comum e da política comum das pescas. 

Espanha | Queda de Rajoy garantida após apoio basco a moção de censura


A moção de censura contra o primeiro-ministro espanhol recolhe os 180 votos necessário para passar. Os nacionalistas bascos confirmaram esta tarde o seu sentido voto, dando por garantida a destituição.

O Partido Democrata Europeu Catalão (PDeCAT) e o Partido Nacionalista Basco (PNV) confirmaram hoje o apoio à moção de censura contra o primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, apresentada pelos socialistas, assegurando o sucesso da moção na votação parlamentar de amanhã, 1 de Junho.

O porta-voz do PDeCAT, Carles Campuzano, confirmou no Congresso espanhol (parlamento) que os oito deputados daquela força partidária vão votar a favor da moção de censura promovida pelo Partido Socialista espanhol (PSOE), liderado por Pedro Sánchez.

Momentos depois, foi a vez do porta-voz dos nacionalistas bascos (PNV), Aitor Esteban, confirmar no parlamento o voto favorável dos cinco deputados daquele partido.

O apoio do PNV à moção de censura já tinha sido avançado ao início da tarde por fontes do Partido Popular espanhol (força liderada por Mariano Rajoy), que foi informado antecipadamente, segundo a agência espanhola EFE, pelos nacionalistas bascos.

Apoio era essêncial para o desfecho

Com o apoio destes dois partidos nacionalistas, a moção de censura contra o governo de Mariano Rajoy deverá passar, salvo eventuais surpresas, na votação parlamentar agendada para esta sexta-feira, o que irá significar a queda do executivo espanhol e a convocação, a breve prazo, de eleições.

O parlamento espanhol começou hoje a debater a moção de censura apresentada pelos socialistas espanhóis, que são a maior força política da oposição e que propõem que o seu líder, Pedro Sánchez, substitua Rajoy na chefia do executivo.

Os socialistas têm apenas 84 deputados, um número que fica longe dos 176 necessários (maioria absoluta) para aprovar a moção. Porém, com os apoios expressos, Pedro Sánchez terá conseguido 180 votos favoráveis, de acordo com as contas feitas pela imprensa espanhola, e a moção de censura deverá passar.

Os socialistas e o seu líder insistem que, depois de ter sido conhecida a sentença do «caso Gurtel», há uma semana, com vários antigos membros do PP condenados por corrupção, o actual executivo minoritário perdeu a confiança dos espanhóis e a credibilidade internacional necessária para continuar em funções.

AbrilAbril com agência Lusa

Na foto: O primeiro-ministro espanhol, Mariano Rajoy, à saída da sessão de manhã no parlamento, a pretexto da moção de não-confiança contra ele, que reúne o apoio necessário para ser aprovada. 31 de Maio de 2018, Madrid, Espanha.Créditos JUAN CARLOS HIDALGO / EPA

Itália | O golpe de Estado do presidente Mattarella


Jacques Sapir [*]

O que aconteceu na Itália na noite de domingo 27 de Maio pode ser considerado como um golpe de Estado legal. O presidente Mattarella bloqueou o processo democrático e constrangeu o primeiro-ministro designado à demissão, na sequência do veto que fez ao nome de Paolo Savona como ministro das Finanças. Este veto foi provocado pelas posições eurocépticas e anti-euro de Paolo Savona, antigo ministro da Indústria e antigo presidente da Cofindustria, a confederação patronal italiana. Este veto correspondeu portanto às opções ideológicas de Mattarella e pode-se pensar que foi emitido tanto a partir do [palácio] Quirinal como dos edifícios da União Europeia em Bruxelas.

É portanto um acontecimento de extrema gravidade. O M5S, que era um dos dois partidos da coligação que apoiava o primeiro-ministro decidiu então naquela noite efectuar um acto de acusação do Presidente da República por abuso de poder. Além disso, isso significa novas eleições na Itália, eleições que sem dúvida ocorrerão em Outubro próximo.

Um abuso de poder 

O Presidente da República italiana arrogou-se portanto direitos que ele não tem. Convém reler a Constituição italiana. Esta diz, no seu artigo 92: « Il Governo della Repubblica è composto del Presidente del Consiglio e dei ministri, che costituiscono insieme il Consiglio dei ministri. Il Presidente della Repubblica nomina il Presidente del Consiglio dei ministri e, su proposta di questo, i ministri. [1] » Os comentários, em particular aqueles de Constantino Morati, um dos redactores da Constituição italiana, são muito claros sobre este ponto: "A proposta dos ministros feita pelo primeiro-ministro designado deve ser considerada como estritamente obrigatória (contraignante) para o chefe do Estado" [2] . A recusa a ratificar uma nomeação não poderia justificar-se senão no caso de condenações criminais ou de conflitos de interesse demasiado evidentes.

Ao opor o seu veto à nomeação de Paolo Savona, o Presidente Mattarella ultrapassou realmente os poderes que lhe eram conferidos no quadro da Constituição. Deste ponto de vista, pode-se considerar que se trata de um "golpe de Estado", um "golpe de Estado" certamente legal mas ainda assim um "golpe de Estado". A reacção dos dois partidos que apoiam o governo do Sr. Conte, o M5S e a Lega, não se fez esperar. Desde domingo à noite o dirigente do M5S, Sr. Luca di Maio anunciava que o seu movimento iria apresentar uma proposta de inculpação do Presidente por abuso de poder (mas este procedimento é longo e com pouca probabilidade de êxito) e Matteo Salvini, o dirigente da Lega, falava de ocupação financeira da Itália.

Um golpe de força

Pois o Presidente Mattarela não se contentou em provocar a demissão do Sr. Conte. Ele também escolheu o Sr. Carlo Cattarelli, um antigo economista do FMI e partidário da mais brutal austeridade orçamental, como primeiro-ministro. Não seria possível exibir melhor o seu desprezo pelo voto dos eleitores italianos aquando das eleições gerais de 4 de Março último, uma votação significou o colapso dos dois partidos, o PD e a Forza Italia, que haviam dominado a vida política italiana desde há uma quinzena de anos, e o êxito dos dois partidos anti-sistema, opostos justamente a esta austeridade, que são o M5S e a Lega. Deste ponto de vista, quando comentadores italianos, quer sejam da Lega ou pertença à esquerda alternativa como o filósofo Diego Fusaro, falam de "golpe de Estado dos mercados financeiros e da União Europeia", não se pode duvidar que os actos do Presidente Mattarella não dão credibilidade às suas declarações.

O governo do Sr. Cottarelli não terá maioria no Parlamento. Ele será portanto um governo estritamente "técnico", encarregado de gerir os "assuntos correntes" antes das novas eleições que deveriam ocorrer no Outono. Ora, o PD e a Forza Italia continuam a baixar nas sondagens actuais. Portanto é provável que estas eleições retornem uma maioria ainda mais forte ao M5S e à Lega do que aquela que têm hoje.

Antagonismo mortal 

O que acaba de se passar na Itália ilustra muito bem o antagonismo mortal que existe entre a ordem liberal e a ordem democrática [3] . O "golpe de Estado" de Mattarella deveria abrir os olhos a todos aqueles que, na Itália e em França, mas também na Espanha e em Portugal, ainda alimentam algumas ilusões quanto às instituições da União Europeia. Mais do que nunca, frente a um inimigo que não hesita em violar as suas próprias leis, será preciso pensar as condições de alianças que permitirão vencê-lo.

Além disso, este "golpe" não é único na História. Foi o que o Marechal Mac Mahon tentou em Maio de 1877 contra a maioria republicana na Câmara dos Deputados. Sabe-se o que aconteceu. Tendo esta maioria sido reconduzida por novas eleições, Mac Mahon submeteu-se e depois demitiu-se... 

28/Março/2018

[1] «O governo da República é composto pelo presidente do Conselho e ministro que constituem, em conjunto, o Conselho de Ministros.
O presidente da República nomeia o presidente do Conselho de Ministros e, sob proposta deste , os ministros". (O trecho em negrito é da minha responsabilidade)
https://it.wikisource.org/wiki/Italia,_Repubblica_-_Costituzione
[2] Mortati C., Istituzioni di diritto pubblico, Cedam Casa Editrice dott. Antonio Milani, Padova, 1952, citado na edição de 1975, p. 568
[3] Ver Sapir J., Souveraineté, Démocratie, Laïcité, Paris, éditions Michalon, 2016.

[*] Economista.

O original encontra-se em www.les-crises.fr/...

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ 

Brasil | GILMAR CONTRIBUI COM SENSAÇÃO DE IMPUNIDADE, DIZ PROCURADORA


A procuradora Adriana Scordamaglia, do Ministério Público Federal em São Paulo, criticou a decisão do ministro Gilmar Mendes de mandar soltar novamente o operador do PSDB Paulo Preto, sua filha, Tatiana Arana de Souza, e o ex-diretor da Dersa Geraldo Casas Vilela; para a procuradora, que é integrante da Força Tarefa da Lava Jato em São Paulo, a decisão do ministro alimenta a sensação de impunidade. A fala depois da audiência de custódia da prisão de Paulo Preto, que recebeu a notícia de sua soltura antes mesmo de seu final da audiência de custódia; "Foi uma audiência sui generis, que foi atropelada ao seu final com uma liberdade concedida pela última instância", criticou

SP 247 - A procuradora Adriana Scordamaglia, do Ministério Público Federal em São Paulo, criticou a decisão do ministro Gilmar Mendes de mandar soltar novamente o ex-diretor da Dersa Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, acusado de ser arrecadador de propinas para o PSDB durante os governos tucanos.

Além de Paulo Preto, sua filha, Tatiana Arana de Souza, e Geraldo Casas Vilela, ex-diretor de Assentamentos da Dersa foram presos nesta quarta-feira, 30, por ordem da juíza Maria Isabel do Prado, da 5.ª Vara Criminal Federal de São Paulo, e soltos apenas 12 horas depois pelo ministro do STF. Eles são acusados de desvios de R$ 7,7 milhões da Dersa em reassentamentos no âmbito das obras do Rodoanel Trecho Sul.

Para a procuradora Scordamaglia, que é integrante da Força Tarefa da Lava Jato em São Paulo, a decisão do ministro alimenta a sensação de impunidade. A fala depois da audiência de custódia da prisão de Paulo Preto, que recebeu a notícia de sua soltura antes mesmo de seu final. "Foi uma audiência sui generis, que foi atropelada ao seu final com uma liberdade concedida pela última instância", criticou a procuradora regional da República.

"A audiência estava se encerrando com a manutenção da prisão dos corréus José Geraldo e Paulo Vieira", conta Adriana. "Causou-me inda mais estranheza o teor da decisão cujo HC foi concedido de ofício para a corré Tatiana [filha de Paulo Preto]".

Na decisão que concedeu a liberdade a Paulo Preto, Gilmar afirmou que o juiz de primeiro grau decretou a prisão preventiva porque a defesa de Preto teria exercido influência em outras testemunhas, mas apontou como prova "tão somente a presença da advogada da empresa DERSA na referida audiência".

Brasil 247

Brasil | Sair da crise com a volta da democracia e respeito à legalidade


É difícil encontrar na história da República um governo tão desmoralizado quanto o chefiado por Michel Temer. 

Desmoralização que ficou exposta, mais uma vez, nos últimos dias, quando o presidente usurpador tentou em vão demonstrar controle sobre a grave crise que sua própria política irresponsável de preços, praticada pela Petrobras, provocou e colocou o país à beira do colapso.

A raiz dessa desmoralização é a evidente falta de legitimidade do presidente golpista, abandonado inclusive por setores da classe dominante que conspiraram pelo assalto ao poder, em 2016. Setores empresariais aturdidos pela grave crise econômica causada pela política de favorecimento exclusivo aos especuladores financeiros e aos patrões estrangeiros do golpe de 2016, principalmente os Estados Unidos, que abocanham sofregamente parcelas cada vez maiores do patrimônio público, como a Petrobras, e das riquezas brasileiras, como o pré-sal.

No fundo do poço de sua insignificância, que é medida pelos meros 4% de apoio ao seu desgoverno, registrados pelas pesquisas de opinião, o presidente se esforça para manter um discurso de aparente normalidade. Age como alguém que, preso nas chamas de um incêndio que provocou, acende um cigarro e tenta demonstrar tranquilidade.

Não faltam exemplos de governos ilegítimos na história da República. Os mais candentes talvez sejam os governos dos generais após o golpe de 1964. Que basearam sua tentativa de legitimação na força das armas, como admitiu no Ato Institucional nº 2: “Em nome da revolução vitoriosa”.

Bravatas são se traduzem em legitimidade. Os governos dos generais duraram muito tempo – 21 anos –, até que a ilegitimidade daqueles governos antinacionais e antipopulares ganhasse as massas e varresse a ditadura do cenário político brasileiro. Com o atual inquilino do Palácio do Planalto a história foi mais rápida e, no curso da greve dos caminhoneiros, proliferam noticias sombrias de transformação da crise social e econômica em grave crise política, havendo inclusive aqueles que, no campo antidemocrático, tentam pescar em águas turvas, e sonham em cancelar a eleição presidencial de outubro de 2018.

Não existe a possibilidade de uma saída aventureira para a crise que resultou do golpe de 2016. Qualquer saída à margem da legalidade e da institucionalidade vai acrescentar maiores camadas de ilegitimidade a qualquer governo que surja dela. O caminho para o fim da crise é o respeito à legalidade, a volta do crescimento econômico, com empregos e distribuição de renda que beneficie o conjunto da nação. É o urgente restabelecimento da soberania nacional e a devolução do patrimônio brasileiro e das riquezas nacionais a seus verdadeiros donos – os brasileiros que só nas urnas, e apenas através delas, podem decidir os rumos que o país vai trilhar.

O governo ilegítimo de Michel Temer surgiu, em desrespeito à lei e à democracia, da conspiração golpista dos setores mais reacionários e direitistas. A crise que o país vive nesta semana de verdadeira desorganização da vida nacional, é consequência direta das medidas antidemocráticas, antipopulares e antinacionais impostas pelo governo golpista, que paralisou a economia e impôs seu pesado custo (traduzido entre outras coisas nos preços do gás de cozinha, da gasolina e do diesel) ao povo e aos trabalhadores. Esta é a história de uma crise anunciada, desde as primeiras horas deste governo que favorece apenas ao grande capital, brasileiro e estrangeiro.

O reverso desta crise é o amplo e pleno restabelecimento da lei, da democracia e do respeito aos direitos sociais, políticos e democráticos dos brasileiros.

Portal Vermelho | editorial

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