A administração Trump é reflexo da desagregação do capitalismo na vida política e no cerceamento de todas as vertentes da democracia, e no que de cada uma destas ainda subsiste na sociedade.
António Abreu | AbrilAbril | opinião
A sucessão dos acontecimentos podem derivar na fascização da política norte-americana em termos incontroláveis. Eles continuam a ocorrer e vive-se um ambiente de pré-ruptura que comporta a violência.
A «tese» da inevitabilidade da violência em larga escala é apregoada principalmente por organismos e comentadores de extrema-direita. O nome que demos em cima a esta crónica foi roubado a um deles.
Refiro também, entre outros, três autores norte-americanos de direita que davam conta há dias no jornal digital Politico de um seu ensaio sobre uma tendência crescente de disposição entre eleitores democratas e republicanos em aprovarem a violência em função do resultado das eleições presidenciais...
1. Quando em 25 de Maio George Floyd foi assassinado nas ruas de Minneapolis, a Covid-19 tinha começado a devastar a população mas não ocupava ainda o centro das atenções. O assassinato gerou em centenas de grandes e pequenas cidades uma revolta, reprimida, mas também geradora de violência contra lojas, mobiliário urbano, carros e símbolos históricos destruídos, e também contra agentes da polícia. A componente antirracista, mas também anticapitalista, foi expressa nestas manifestações pelo Black Lives Matter-BLM (As vidas dos negros contam) e pelos Antifas.
O impacto internacional dessas manifestações e a capacidade que tiveram em alguns estados para alcançar apoio popular muito vasto, tornaram-no um fenómeno político não descartável para as eleições presidenciais. Mesmo antes do início dessas manifestações, quer o BLM, quer outros movimentos foram chorudamente financiados pelas fundações que apoiam a campanha dos democratas, fundações essas formadas por grupos monopolistas, que também os fazem fugir aos impostos para canalizar elevado financiamento ilegal de campanhas eleitorais.
O atenuar dessas manifestações por parte do BLM pode ter correspondido a que o Partido Democrata o tenha empalmado, neutralizando as suas reivindicações anticapitalistas (que davam maior consistência à luta antirracista) em troca do apoio a Joe Biden.
Apesar desta miscelânea, uma corrente mais conservadora do Partido Democrata foi-se distanciando do «esquerdismo», por eles atribuído à influência do movimento de Bernie Sanders, afirmando que o Partido Democrata de J.F Kennedy, Lyndon Johnson e Jimmy Carter já não existe.
Que teria sido sequestrado por um movimento progressista radical de esquerda que estaria a destruir o partido por dentro. E chegaram alguns já ao ponto de reclamar que o actual Partido Democrata se passe a chamar Marxista Democrata para não iludir os seus apoiantes. E usam um paralelismo alimentar: «Se a indústria frigorífica é obrigada a divulgar totalmente o que se passa nas salsichas, por que não segue o Partido Democrata os mesmos padrões?»