De expediente em expediente de Chico Esperto e de Dono Disto Tudo, Ricardo Salgado vai adiando o julgamento dos crimes de que é legitimamente acusado e continua a viver como nababo criminoso à tripa-forra. Disso mesmo nos dá conta a notícia do Expresso que se segue.
É lamentável que um alegado Estado de Direito e a alegada Justiça demonstrem possuir dois pesos e duas medidas para julgar e punir. Os pobres são julgados condenados e presos por dá cá aquela palha ao cometerem crimes menores, os ricos (mesmo que as suas riquezas tenham sido roubadas ou adquiridas violando as leis e a honestidade) passeiam-se em liberdade, levando vidas consonantes com os seus estatutos de afortunados apesar de sabermos serem vigaristas, corruptores, corruptos e/ou ladrões. E sabemos isso por que acabamos quase sempre por pagar com línguas de palmo e meio os seus abusos e cometimentos de ilegalidades graves que prejudicam milhões de portugueses. Vimos o que aconteceu com Oliveira e Costa e tantos outros, que vão adiando, adiando que seja feita justiça até que finalmente doenças e velhice os transfira para estado de defuntos. Eis porque com razão evidente milhões de portugueses consideram a Justiça recheada de Injustiças e/ou uma grande choldra de prestidigitadores. Ocorrendo muitas vezes que nem os próprios juízes conseguem fazer valer a devida Justiça porque os truques, os alçapões das leis, as chicas-espertices e os expedientes dos advogados dos ricos, conseguem proporcionar a liberdade, a impunidade e a intocabilidade mesmo daqueles que sabemos serem criminosos.
Tais evidências e tal Estado resulta no descrédito de duas palavras importantíssimas no seu significado. Justiça e Democracia. E sabemos muito bem que sem Justiça é impossível existir Democracia. Portugal democrático é um Estado de Direito? Sabemos que não.
Do Expresso, por Micael Pereira, a seguir, o relato de mais uma façanha do Dono Disto Tudo que tudo faz para escapar às punições dos atos ilegais de que sobejamente é acusado. Ricardo Salgado continua a ser Dono Disto Tudo (?) e os milhões de portugueses continuam a ser os trouxas. Há dúvidas? Quais?
MM | PG
O início estava marcado para esta segunda-feira, mas os advogados do antigo banqueiro do BES pagaram multa e têm agora até quarta-feira para apresentar a sua contestação e uma lista de testemunhas para serem ouvidas em tribunal
Dois meses depois de o juiz de instrução Ivo Rosa ter decidido separar a Operação Marquês em vários processos e mandar Ricardo Salgado para o banco dos réus sozinho, esse julgamento era suposto ter começado esta segunda-feira. Às nove da manhã, o aparato mediático estava montado à porta de um dos edifícios do Campus da Justiça, em Lisboa, mas a notícia correu cedo entre os jornalistas: Ricardo Salgado não ia estar presente para aquela que foi marcada por um coletivo de juízes do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa como a primeira sessão do seu julgamento.
A justificação para a ausência teria a ver com a idade — 76 anos — e os riscos associados à pandemia da covid-19. Mas também não teria valido a pena vir, porque o julgamento na realidade não teve início. Como era esperado e cuja probabilidade já tinha sido noticiada, de resto, nos últimos dias.
Francisco Henriques, o juiz que preside ao coletivo sorteado para fazer ao julgamento, aceitou o pedido da defesa do antigo banqueiro do BES para apresentar a sua contestação e a sua lista de testemunhas, já fora do prazo normal, que terminou na sexta-feira, 4 de junho, mas com uma extensão de três dias úteis, que é possível mediante o pagamento de uma multa. Francisco Proença de Carvalho, advogado de Salgado, já tinha feito saber que a defesa não teria tempo de apresentar a contestação a horas e que iria, por isso, fazer uso da extensão do prazo.
Com este adiamento, a primeira sessão do julgamento deverá ficar adiada para a próxima segunda-feira, 14 de junho. Mas o juiz só tomará a decisão se o julgamento começará mesmo nesse dia depois de analisar a contestação que ainda será apresentada.
“O julgamento não se iniciará hoje”, anunciou Francisco Henriques. “Só decidi adiar para evitar este pingue-pongue”, admitiu o juiz, queixando-se do que considera ter sido uma invasão de privacidade, numa alusão à forma como tem sido retratado na imprensa.
“Vou adiar [as sessões de] hoje e amanhã, mas as sessões dos dias 14 e 15 mantêm-se”, disse o magistrado. “Se arranjarem argumentos que considerem válidos, vou ser sensível a isso, mas para já não estou a ver porque haveremos de adiar mais o julgamento.”
Francisco Henriques explicou que o julgamento foi marcado para esta altura para aproveitar “uma aberta” na agenda do tribunal. “Estas são as únicas datas que tenho disponível antes de ir de férias”, admitiu o juiz. “Em setembro devo ter mais algumas datas [livres], mas a partir de outubro vai ser muito difícil, porque vamos ter um julgamento grande até ao final do ano que nos vai ocupar três dias por semana.”
Com um estilo muito próprio, o magistrado referiu-se à defesa com algum humor (“dá-me prazer fazer julgamentos com advogados de gabarito”) e mostrou algum à vontade em abordar a questão da separação do processo de Salgado. “Não é normal haver este tipo de separação”, disse, para acrescentar: “Mas, bem ou mal, ele [o processo] foi separado”. E sublinhou que “ele [Salgado] tem de obedecer à lei, tal como todos os outros” e, face ao que está em causa, não vê “fundamento para não fazer o julgamento”.
Francisco Proença de Carvalho argumentou, quando lhe foi dada a palavra, que “é sensível” às explicações do tribunal e compreende a queixa do juiz sobre o “pingue pongue” de que diz ser vítima, mas fez saber que a contestação a apresentar pela defesa “não vai ser pequena” e que incluirá vários requerimentos de prova. O advogado pediu, inclusive, mais tempo mas o coletivo não mostrou muita abertura para isso, ainda que o juiz não tenha fechado totalmente a porta a que, assim que a contestação seja apresentada e analisada, o julgamento possa ter novas datas que acomodem a complexidade alegada pela defesa do banqueiro.
No final de uma sessão que durou menos de uma hora, Francisco Henriques anunciou que “oportunamente será anunciada uma nova ordem de trabalhos em relação aos meios de prova que não puderam ser produzidos hoje e amanhã”. Para esta segunda-feira à tarde estava previsto o coletivo ouvir duas testemunhas de acusação, entre elas o inspetor tributário Paulo Silva, que foi responsável pela investigação da Operação Marquês.
Acusado pelo Ministério Público em outubro de 2017 de 21 crimes, incluindo de ser o corruptor ativo do ex-primeiro-ministro José Sócrates, a quem teria pago 29 milhões de euros, segundo a tese dos procuradores, Ricardo Salgado acabou por ser pronunciado pelo juiz Ivo Rosa a 9 de abril deste ano por apenas três crimes de abuso de confiança.
Segundo o despacho de pronúncia de Ivo Rosa que determinou o envio para julgamento em separado do antigo banqueiro (pelo facto de esses três crimes não estarem relacionados com nenhum dos outros arguidos também pronunciados), Ricardo Salgado apropriou-se alegadamente de forma criminosa de 10,75 milhões de euros com origem numa conta da Suíça da ES Enterprises, uma companhia offshore que tem sido considerada pelo Ministério Público como tendo funcionado como um gigantesco “saco azul” do Grupo Espírito Santo ao longo de várias décadas.
Micael Pereira | Expresso
Imagens: 1 - Luís Barra; 2 - em Observador/Google
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