sábado, 27 de agosto de 2011

OS ÚLTIMOS SOLDADOS DA GUERRA FRIA




AGORA VALE - Cia das Letras

A história dos agentes secretos infiltrados por Cuba em organizações de extrema direita dos Estados Unidos - Fernando Morais.

Organizações criminosas internacionais, aventuras mirabolantes, disfarces perfeitos, emissários secretos, conquistas amorosas: o novo livro de Fernando Morais traz todos os elementos de suspense de um romance de espionagem. Mas não contém um só pingo de ficção. Contando a saga da Rede Vespa, um seleto grupo de agentes secretos que se infiltrou em organizações anticastristas em Miami, o autor nos transporta ao incrível mundo desses James Bonds tropicais, que ao contrário do agente secreto inglês têm ainda de enfrentar uma profunda penúria de recursos — técnicos e financeiros — enquanto desempenham seu trabalho perigoso e solitário.

No início da década de 1990, Cuba criou a Rede Vespa, um grupo de doze homens e duas mulheres que se infiltrou nos Estados Unidos e cujo objetivo era espionar alguns dos 47 grupos anticastristas sediados na Flórida. O motivo dessa operação temerária era colher informações com o intuito de evitar ataques terroristas ao território cubano. De fato, algumas dessas organizações ditas “humanitárias” se dedicavam a atividades como jogar pragas nas lavouras cubanas, interferir nas transmissões da torre de controle do aeroporto de Havana e, quando Cuba se voltou para o turismo, depois do colapso da União Soviética, sequestrar aviões que transportavam turistas, executar atentados a bomba em seus melhores hotéis e até disparar rajadas de metralhadoras contra navios de passageiros em suas águas territoriais e contra turistas estrangeiros em suas praias.

Em cinco anos, foram 127 ataques terroristas, sem contar as invasões constantes do espaço aéreo cubano para lançar panfletos que, entre outras coisas, proclamavam: “A colheita de cana-de-açúcar está para começar. A safra deste ano deve ser destruída. [...] Povo cubano: exortamos cada um de vocês a destruir as moendas das usinas de açúcar”. Em trinta ocasiões, Havana formalizou protestos contra Washington pela invasão de seu espaço aéreo por aviões vindos dos Estados Unidos — sem nenhum efeito. Enquanto isso, em entrevistas, líderes anticastristas na Flórida diziam explicitamente: “A opinião pública internacional precisa saber que é mais seguro fazer turismo na Bósnia-Herzegovina do que em Cuba”.

Os últimos soldados da Guerra Fria narra a incrível aventura dos espiões cuba---nos em território americano e revela os tentáculos de uma rede terrorista com sede na Flórida e ramificações na América Central, e que conta com o apoio tácito nos Estados Unidos de membros do Poder Legislativo e com certa complacência do Executivo e do Judiciário. Ao escrever uma história cheia de peripécias dignas dos melhores romances de espionagem, Fernando Morais mostra mais uma vez como se faz jornalismo de primeira qualidade, com rigor investigativo, imparcialidade narrativa e sofisticados recursos literários.

Fernando Morais (Mariana, Minas Gerais, 1946) é jornalista e trabalhou no Jornal da Tarde, na revista Veja e em várias outras publicações da imprensa brasileira. Recebeu três vezes o prêmio Esso e quatro vezes o prêmio Abril de jornalismo. Publicou, pela Companhia das Letras, Olga; Chatô: o rei do Brasil; Corações sujos; A ilha e Cem quilos de ouro, e, pela Planeta, O Mago, Montenegro e Toca dos Leões.

“Ao meio-dia, depois de lançar do ar o jovem Michel Marín, o último aluno de paraquedismo inscrito no turno da manhã, René viu que o pequeno aeroporto estava semideserto. Aproveitou a hora de almoço dos dois funcionários da torre de controle, cortou com um alicate os cabos do radiocomunicador e enfiou o microfone no bolso do macacão. Desceu as escadas aos saltos e entrou na cabine da única aeronave estacionada fora dos hangares. Era um Antonov An-2 verde, de asas duplas, fabricado na Rússia quarenta anos antes, aparelho utilizado em Cuba para fumigação agrícola e como rebocador de planadores. Quando o pessoal de terra se deu conta de que algo estranho ocorria, o avião já estava no ar.

René sabia que, embora a torre estivesse sem comunicação, em instantes os radares cubanos seriam avisados da fuga. E, no momento em que seu aparelho fosse detectado, caças MiG de fabricação soviética decolariam da base militar de San Antonio de los Baños, a minutos de Havana, e o forçariam a voltar. Para despistar o controle, voou quase pegado ao solo, em altitude abaixo do alcance da rede de radares. E, ao contrário do que faria qualquer piloto com destino à Flórida, não partiu em linha reta rumo a Key West, ilha no extremo sul dos Estados Unidos, trajeto que levaria apenas quarenta minutos.

Atravessou Cuba e, quando chegou ao mar, fez um giro para o nordeste, embicando o aparelho em direção ao arquipélago das Bahamas. Só ao ter certeza de que estava fora das doze milhas do espaço aéreo cubano é que entortou o avião para o oeste, desenhando no ar um zigue-zague perfeito. A manobra deu certo, mas quase custou a vida ao piloto: quando René viu as primeiras ilhotas da Flórida, já fazia uma hora e meia que tinha decolado de Cuba.

O combustível só era suficiente para mais dez minutos de voo. Com as mãos suando, sintonizou seu rádio com a torre da base aeronaval de Boca Chica, trinta quilômetros ao norte de Key West, anunciou que era um desertor cubano e que o avião estava em pane seca. Recebeu autorização da Marinha para aterrissar numa das três pistas da unidade militar e, quando as rodas do pesado Antonov tocaram no solo americano, o tanque do avião estava praticamente vazio. “Audaz defecção”, “dramático retorno”, estampavam os jornais, no dia seguinte, ao celebrar o feito. “Depois de protagonizar uma história de heroísmo, valor e compaixão”, registrou o diário Miami Herald, “o audaz René González” não teria problemas para ser aceito pela comunidade cubana em Miami.”

Confira entrevista com Fernando Morais sobre o processo de pesquisa para "Os últimos soldados da Guerra Fria"

Qual foi seu primeiro contato com a história dos membros da Operação Vespa, os espiões cubanos em Miami?

Eu soube da história no dia das prisões dos dez agentes cubanos pelo FBI, em setembro de 1998. Ouvi a notícia no rádio de um táxi, no meio do trânsito, em São Paulo, e na hora pressenti que ali havia um livro embutido. Viajei a Cuba para tentar levantar o assunto, mas encontrei todas as portas fechadas. Para se ter uma ideia, Cuba só assumiu que eles de fato eram agentes de inteligência três anos depois, em 2001. O tema era tratado como segredo de Estado.

Como foi pesquisar em Cuba? Você teve pleno acesso a documentos oficiais? E do lado norte-americano?

Os cubanos só liberaram o assunto para mim no começo de 2008. A partir de então fiz cerca de vinte viagens a Havana, Miami e Nova York. O governo de Cuba liberou todo o material disponível e permitiu que eu entrevistasse quem quisesse, inclusive mercenários estrangeiros que haviam sido presos depois de colocar bombas em hotéis e restaurantes turísticos de Cuba e que tinham sido condenados à morte.

Nos Estados Unidos foi mais difícil. Como os agentes do FBI são proibidos de dar declarações públicas, só consegui entrevistas em off. Mas graças ao FOIA — FreedomofInformationAct, a lei que regula a liberação de documentos secretos — e após pesquisas nos arquivos da Justiça Federal da Flórida, tive acesso a cerca de 30 mil documentos enviados pela Rede Vespa a Cuba e que haviam sido apreendidos pelo FBI nas casas dos agentes cubanos em Miami. E os serviços de inteligência cubanos me deram uma cópia do megadossiê sobre o terrorismo na Flórida que Fidel Castro entregou a Bill Clinton com a ajuda do escritor Gabriel García Márquez.

Quais personagens do livro você conseguiu entrevistar? Poderia falar um pouco deles?

Ao todo fiz quarenta entrevistas. Foram dezessete em Cuba, 22 nos Estados Unidos, e no México entrevistei a cantora brasileira De Kalafe, que havia sido vítima da intolerância de líderes anticastristas na Flórida. Entrevistei diretamente um dos presos, René González, via e-mail, e os demais por intermédio de seus familiares em Cuba. As mensagens (as minhas perguntas e as respostas deles) eram previamente censuradas pelas direções das prisões e limitadas a 13 mil caracteres por semana — se tivesse uma letra ou uma vírgula a mais, a mensagem se autodestruía.

Entrevistei, também pessoalmente, o agente que fugiu clandestinamente para Cuba antes das prisões, o piloto de caças-bombardeiros Juan Pablo Roque. Em Nova York entrevistei o jornalista Larry Rohter, do New York Times, que teve a casa metralhada e os freios de seu carro cortados depois que escreveu reportagens denunciando a ligação de lideranças anticastristas da Flórida com os atentados a bomba contra Cuba. E em Miami entrevistei líderes anticastristas diretamente envolvidos com os atentados contra Cuba, como o líder da organização Hermanos al Rescate, José Basulto.

As organizações de extrema direita descritas no livro continuam atuantes na Flórida?

Os tradicionais inimigos da Revolução Cubana, os autodenominados anticastristas verticales, estão morrendo ou já estão muito velhinhos. Quando eu terminava o texto final do livro, por exemplo, morreu Orlando Bosch, que era considerado o inimigo número 1 de Fidel Castro. Ainda é possível ver em Miami manifestações de rua contra a Revolução, mas as novas gerações parecem mais interessadas em ouvir salsa do que em colocar bombas.

5 comentários:

Anónimo disse...

CUBA É UM LABORATÓRIO DE INTELIGÊNCIA PARA OS ESTADOS UNIDOS.

1 ) É em Cuba que hoje se estão a estudar os métodos de, recorrendo a meios como a Internet, abrir janelas humanas para dentro da sociedade, a fim de as expandir, por via de grupos manipulados e de forma a insuflar os vírus da subversão.

2 ) Os cubanos estão a dar conta da agressão de novo tipo, que leva à profunda atenção sobre os focos que vão sendo criados dentro do corpo social da ilha e é por isso que é tão importante não só o isolamento desses grupos, como o combate que está a ser feito, infiltrando-os.

3 ) O que não "conseguiu pegar" em Cuba, está a ser utilizado noutras latitudes, integrando os "projectos" desta natureza nas "revoluções coloridas", que se estão a espalhar com êxito no Médio Oriente e no Nordeste Africano.

4 ) África deve recorrer a Cuba para se aperceber esse tipo de fenómenos que são especialmente dirigidos para as suas próprias elites!

Martinho Júnior.

Luanda.

Anónimo disse...

PARA AJUDAR A SE TIRAREM AS MELHORES CONCLUSÕES:


Praticamente à mesma hora que o Página Global publicou este artigo, o Cubadebate publicava o seguinte:

Jefe de Oficina de Intereses de EEUU hizo labor de Inteligencia sobre Internet en Cuba - http://www.cubadebate.cu/noticias/2011/08/26/jefe-de-oficina-de-intereses-de-eeuu-hizo-labor-de-inteligencia-sobre-internet-en-cuba/

Martinho Júnior.

Luanda.

Anónimo disse...

DENÚNCIA!

No preciso momento em que fazia comentários ao artigo publicado pelo Cubadebate, ele "eclipsou-se" da Internet.

O artigo foi indicado da seguinte forma:

Jefe de Oficina de Intereses de EEUU hizo labor de Inteligencia sobre Internet en Cuba - http://www.cubadebate.cu/noticias/2011/08/26/jefe-de-oficina-de-intereses-de-eeuu-hizo-labor-de-inteligencia-sobre-internet-en-cuba/

Suponho que Cubadebate terá sido alvo dum "ataque", por quem não quer que este tipo de artigos seja publicado!

Denuncio-o em cima do acontecimento e õ facto só reforça o meu raciocínio.

A batalha das ideias e o combate à subversão da hegemonia pode acontecer à velocidade da luz!

Martinho Júnior.

Luanda.

Anónimo disse...

Vai ser a maior choradeira por aqui quando o ditador Fidel FOR PARA A COVA !!!

Anónimo disse...

O engraçado desse texto é que ele dá a entender que o anticastrismo está derrotado por causa da morte por idade dos seus líderes.

Nossa, eu não sabia que os irmãos Castro descobriram a fonte da juventude !!! Fiquem por aí, acreditando que esse governo sobreviverá aos seus opositores. O Castrismo tem tanto futuro quanto o Franquismo teve na Espanha, com a morte do Franco. Os republicanos não voltaram ao poder (a maioria deles já tinham morrido no exílio), mas os franquistas foram enterrados pela história.

Ah, esqueci. Comparar comunismo com fascismo é ofensivo. Desculpem, eu sempre me esqueço que os comunistam têm desculpas quando oprimem, os fascistas não.

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