quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Angola: NÃO. NÓS NÃO NOS CALAMOS DIANTE DESTES GOVERNANTES INSENSÍVEIS!

 


MEDIDA ESTÚPIDA DOS COLONOS NEGROS
 
Osvaldo Catengue – Folha 8, 8 fevereiro 2014
 
O governo de Luanda, ciente por ordem su­perior de que as zun­gueiras são agentes do crime organi­zado, eventualmente res­ponsáveis pela corrupção no país, tão criticada nos areópagos internacionais, lançou uma operação de limpeza quase étnica con­tra as vendedoras ambu­lantes na cidade. É que, presume-se, a capital fica mal na fotografia que nos quer apresentar com fatos Hugo Boss ou Ermene­gildo Zegna. É claro que as meias estão rotas, mas como não se vêem…
 
E nessa operação de lim­peza pura e dura, como aliás faz parte do código genético do regime, vale tudo. Os detidos, mulhe­res, homens e crianças são enclausurados segundo a regra número um dos di­reitos humanos que vigo­ra por cá: todos a monte e sem as mínimas condi­ções. A Polícia Nacional entende que pôr meia centena de pessoas numa cela é o adequado. Acrescentam que quem não esti­ver satisfeito pode sempre fugir e, é cla­ro, levar uns tiros.
 
As zunguei­ras, como an­golanas de ter­ceira categoria, são empilhadas numa cela no Posto Policial do Mar­çal, e nem mesmo o facto de estarem acompanhadas por filhos recém-nascidos evita que sejam tratadas como mercadoria de baixo valor. Não é um espectá­culo digno para figurar nas tais fotos com que o regi­me mostra só uma das par­tes da capital. Mas como essas imagens dificilmente chegarão ao público, a Po­lícia Nacional e o regime man­tém-se impávi­dos e sere­nos, co­nheci­da que é a coni­vência do mundo dito civilizado.
 
E, é claro, ficam virados do avesso e com o dedo no gatilho quando aqui per­guntamos: Até quando? E acrescentamos: Porra, isso é demais… prendem, violam, assassinam e todos nos calamos?
 
Depois de um manancial de ameaças, enquadráveis na estratégia de reeduca­ção patriótica do regime, as vendedoras são liberta­das e avisadas que, no caso de reincidirem, as penas serão bem mais pesadas. Mas, como em qualquer democracia, se as zun­gueiras tiverem dinheiro para passar por debaixo da mesa, a situação altera-se. É que, bem vistas as coisas, os polícias também têm família para sustentar e, no caso, um dinheiro extra ca­lha sempre bem. E se a isso juntarem os bens confisca­dos, que não são inventa­riados, o pecúlio pode ser bem generoso.
 
Ainda não há muito tem­po, foi em Novembro do ano passado, o director­-geral adjunto do Instituto de Formação de Finanças Públicas (INFORFIP), José Magro, ressaltou a impor­tância da Segurança Social abranger um maior núme­ro de contribuintes, num país onde o mercado de trabalho informal está em expansão. E até disse que “é necessário que também a Segurança Social tenha um maior leque de con­tribuintes, nomeadamen­te as zungueiras, que não têm qualquer protecção social...”
 
Ser zungueira em Angola não é, ao contrário do rótu­lo dado pelo regime, sinó­nimo de delinquente. Pelo contrário, é uma alterna­tiva que une o engenho e barriga numa luta desigual contra a fome. Num país assimétrico, há poucos empregos para os autóc­tones que, contudo, têm família e direito legítimo a uma vida digna.
 
As nossas mulheres, sim as zungueiras são cidadãs de pleno direito e não uma espécie menor de escra­vas, carregam os filhos pe­las ruas de Luanda porque a isso são obrigadas. Se tivessem outra opção não hesitariam, em colocá-las em creches sociais. Este governo sabe o que isso é? Seguramente não.
 
Querê-las equiparar, como faz o Governo, a margi­nais e delinquentes é, só por si, um crime contra os mais elementares direi­tos humanos. Nem todas, nenhuma até, conseguem ter o privilégio de vender ovos e assim tornarem-se nas mulheres mais ricas de África, como aconteceu com Isabel dos Santos.
 
Num país com elevadas taxas de desemprego e em que o acesso a uma forma­ção escolar ou profissio­nal são privilégios só ao alcance de muito poucos, ser zungueira é um acto heróico que – admite-se – precisa de ser regulariza­do, exactamente na pers­pectiva que advogava José Magro.
 
Sujeitando-se a todo o tipo de violência física e moral, muitas vezes por parte das autoridades, as zungueiras comem o pão que o Diabo amassou para, sabe Deus como, amealhar alguma coisa que as sus­tente e alimente a barriga, tradicionalmente vazia, dos filhos e outros fami­liares. Trabalham de sol a sol, palmilham longas dis­tâncias, apregoam a vida que transportam nas suas mercadorias, e como se esse martírio não fosse su­ficiente, ainda são tratadas pelo regime como se de escravas se tratassem.
 
Tivessem os governantes capacidade para servirem em vez de se servirem, todos estes dramas pode­riam ser evitados. O res­peito por quem zunga e kinguila é o mínimo que se pode, e deve, exigir aos que, pelo acaso da vida (ra­ramente por competência) estiveram (ou passaram) do lado certo da história, tornando-se dependentes do partido e que, por isso, tudo fazem para manter os imerecidos privilégios, renegando os irmãos que por coerência ou má sorte vivem do outro lado, nos musseques.
 
Regressemos às preocu­pações manifestadas em Luanda pelo director-geral adjunto do INFORFIP, José Magro, na confe­rência sobre o Plano de Pensões e Protecção So­cial em Angola – Situação Actual e Desafios Futuros, promovida pela MERCER, empresa portuguesa com actividades nas áreas de risco, estratégia e capital humano.
 
“Os trabalhadores têm que ter consciência que se isso (Segurança Social) não es­tiver a ser feito, no futuro vão ter problemas, estão a ser penalizados. Podem neste momento ter algum benefício, porque este va­lor que recebem hoje é bom, mas amanhã pode­rá ser mau”, referiu José Magro, corroborando a importância da Segurança Social abranger um maior número de contribuintes, num país onde o mercado de trabalho informal é ele­vado
 
“É necessário que também a Segurança Social tenha um maior leque de contri­buintes, nomeadamente as zungueiras, que não têm qualquer protecção social, os que estão doentes, os que têm os filhos doentes e também as domésticas, estas classes têm de ser pensadas no sentido de amanhã terem o seu futu­ro salvaguardado”, subli­nhou José Magro.
 
No que diz respeito à fis­calização, José Magro dis­se que a Segurança Social e as Finanças têm feito as suas inspecções, mas é ne­cessário que elas tenham uma maior abrangência tendo em conta a dimen­são do país, salientando ainda que o trabalho de consciencialização deve ser maior no sector priva­do, visto que no Estado os descontos são já uma tra­dição.
 

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