O
académico Egídio Chaimite diz que a proposta do Governo provincial de Sofala
revela "intolerância política".
O
Governo provincial de Sofala, no centro de Moçambique, pretende dividir a
segunda maior cidade do país em duas partes. O Governo provincial diz que,
reduzindo a área gerida pelo Conselho Municipal da Beira, se poria fim ao
desequilíbrio na distribuição de meios materiais e de serviços, como o
abastecimento de água ou energia.
O
projeto é mal visto pelo autarca Daviz Simango, do Movimento Democrático de
Moçambique (MDM), a segunda maior força da oposição no país.
"Para
satisfazer esses apetites de amarras ao poder, devia [o Governo] pensar que
quem manda é o povo, através de referendo ou eleições", afirma Simango,
citado pela agência de notícias Lusa.
Egídio
Chaimite diz que a proposta de dividir a Beira revela "intolerância
política". Em 2010, o académico moçambicano apresentou uma tese intitulada
"Descentralização e Competição Política: A questão da delimitação do
Município da Beira".
DW
África: Os planos do Governo são uma forma de "cortar as pernas" ao
MDM ou há realmente motivos que os justifiquem?
Egídio
Chaimite (EC): O facto do projeto surgir nessa altura suscita inúmeras
questões. Estamos num período eleitoral [as eleições gerais estão marcadas para
15 de outubro] e acabámos de sair de um outro, em que o candidato do MDM à
presidência do município foi eleito. O que é interessante é que o primeiro
projeto [de divisão da Beira, após as autárquicas de 2003] começou justamente
depois do município passar para as mãos da oposição [na altura, a RENAMO].
Agora, também depois de um processo eleitoral, volta-se a tocar na questão.
Para
além de não ser oportuno levantar essa questão nesta altura, o projeto mostra
claramente o nível de intolerância política que se vive. Até porque retirar do
município aquela área de Nhangau, Nhangoma e Tchonja não terá grande impacto
nos resultados eleitorais a nível municipal, porque a zona não tem muitos
eleitores.
DW
África: Pode-se ver esta intenção do Governo da província de Sofala como uma
espécie de preparação para as próximas eleições autárquicas?
EC: Se
o território passar para a gestão de um distrito, passando a ter gestão
governamental, a FRELIMO tem claramente muito mais influência. Eu até prefiro
acreditar mais nessa hipótese, associando-a também à questão da intolerância,
do que em algo que possa estar diretamente vinculado a essas eleições que se
avizinham.
E
se for [avante] o projeto da FRELIMO, ela dá mais um tiro no próprio pé, porque
está a levantar um barulho que claramente lhe será desfavorável, sobretudo
tratando-se da Beira.
DW
África: Será que o maior desenvolvimento dessa região passa por dividi-la? Não
seria melhor direcionar mais investimentos para a cidade da Beira, por exemplo?
EC: Quando
fiz o meu trabalho de fim de curso, havia um plano de urbanização em
Nhangau-Sede, um dos bairros que se pretendia desanexar. O plano do município
incluía a questão de arruamentos, a instalação de fontes de água, energia…
Nessa altura, afirmava-se que o município não prestava serviço. Mas o município
defendia-se, dizendo que eles tinham um plano e que podiam não conseguir
prestar um ou outro serviço, tal como acontece em tantos outros municípios,
incluindo Maputo, mas o seu grande projeto era expandir e melhorar a prestação
de serviços, não só nas áreas que estão mais próximas da cidade em si, mas também
nas chamadas áreas de expansão.
Provavelmente
o projeto deveria passar mais por isso, pela canalização de mais investimentos,
para que a zona também pudesse ficar mais desenvolvida.
DW
África: E que espaço de manobra tem o MDM para travar este projeto?
EC: É
relativamente curto. Recordo que, quando o debate surgiu, acabava também de se
discutir a questão da colocação da figura de representante do Estado no
município da Beira, que também foi visto como uma manobra para tentar obstruir
o funcionamento normal do município, colocando uma figura que não só faria
sombra, mas também conseguiria angariar um pouco mais de apoio para a FRELIMO.
E, nessa altura, um dos entrevistados com quem tive a oportunidade de conversar
dizia: "nós negamos com veemência essa figura, mas apesar de termos negado
e dito que essa figura não podia e não deve aparecer aqui, acabaram
colocando". Isso apenas para dizer que, por mais que o MDM utilize ou
recorra a um ou outro instrumento, a FRELIMO sempre consegue quando quer.
Deutsche Welle - Autoria Nádia
Issufo - Edição Guilherme
Correia da Silva / António Rocha
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