segunda-feira, 25 de agosto de 2014

CORRUPÇÃO E FALTA DE DIÁLOGO ESTÃO NA ORIGEM DAS DESERÇÕES NA UNITA



Folha 8, 23 agosto 2014

Paulo Lukamba Gato sabe, sobretudo pela expe­riência da guerra mas, igualmente, pelos ensina­mentos da paz, que a verda­de é algo que muitas vezes dói muito, mas tem tam­bém a certeza de que só ela cura. Por isso não teme di­zer que a deserção de mui­tos dos militantes do seu partido, a UNITA, se deve à corrupção (uma epidemia nacional com raízes no co­lonialismo português) e à falta de diálogo entre a lide­rança do partido e as bases.

Embora de forma mais ou menos silenciosa, a verdade é que as deserções de mili­tantes da UNITA, ainda o maior partido da oposição, têm gerado preocupação no seio dos dirigentes do Galo Negro. Embora os ex-militantes estejam a filiar-se noutros partidos, o principal beneficiário é o MPLA. Esta constatação não é boa para a UNITA, tal como é muito má para a democracia que todos almejam mas que o MPLA só aceita porque, segundo o seu líder, José Eduardo dos Santos, “foi imposta”.

O deputado e antigo se­cretário-geral da UNITA, o general na reforma Pau­lo Lukamba Gato, não tem medo da verdade e entende que o partido não pode pe­dir ajuda à onça para com­bater o gato bravo. Ele sabe, por experiência própria, que depois de derrotar o gato a onça os vai comer.

O general Gato, que falava à margem de um seminário na província do Huambo, disse que uma das princi­pais razões que provoca o abandono de muitos mili­tantes das fileiras da UNI­TA tem origem na ‘’falta de diálogo permanente’’ entre a direcção do seu partido, liderado por Isaías Samuku­va, e os militantes da base.

Por outras palavras, os di­rigentes que trocaram a mandioca pela lagosta estão a esquecer-se que ainda há, e com o MPLA haverá por muitos longos anos, mui­tos angolanos que deram o corpo e a alma pela UNITA e que hoje estão apenas a sobrevier nas margens da vida e da dignidade.

E o ex-secretário-geral da UNITA apresenta soluções: “Temos a receita, é o diálo­go permanente, institucio­nal a todos os níveis. Tem de se dialogar, os dirigen­tes têm de ter tempo para dialogar, de aprofundar o contacto, estar próximo das preocupações dos militan­tes para podermos prevenir esse tipo de casos que são sempre prejudiciais para a imagem do partido.”

A corrupção é também para este prestigiado militante da UNITA um outro factor por detrás deste abandono. Por outras palavras, Lukam­ba Gato considera que as condições económicas di­fíceis em que vivem inclu­sive dirigentes do maior partido na oposição, facili­tam a actividade do MPLA que, por não ter problemas financeiros, alicia o pessoal da UNITA com malas de dólares e cargos governati­vos. Ou seja, entre a barriga vazia e um saco de arroz a escolha é simples. Aliás, já ninguém no Galo Negro se lembra que o Presidente Sa­vimbi dizia que preferia ser livre de barriga vazia do que escravo com ela cheia.

Apesar deste cenário aus­picioso para o MPLA e trá­gico para a UNITA, Paulo Lukamba Gato acredita que a Direcção “vai fazer tudo para que o partido possa es­tancar este movimento de abandono”, explicando que “este não é um movimento permanente, mas de vez em quando surge como fru­to da situação muitas vezes difícil, da situação que as pessoas estão a atravessar e, face a certas promessas, as pessoas cedem frente às dificuldades do dia-a-dia.”

Embora Lukamba Gato não esteja só nesta análise, o certo é que outras figuras de topo da UNITA prefe­rem o silêncio e, como no passado recente, preferem ser assassinados pelos elo­gios do que salvos pela crítica. Foram disso exem­plos as saídas de militantes como Carlos Morgado, Joa­quim Icuma, Abel e Améri­co Chivukuvuku.

Actualmente, na cúpula do maior partido na oposição, uma das figuras contestatá­rias da actual liderança é o deputado e ex-secretário­-geral, o general Abílio Kamalata Numa. Para ele a actual liderança não tem sido capaz de fazer uma verdadeira oposição contra o actual Governo do MPLA, o que de certa forma, origi­na as deserções.

“Precisamos de uma lide­rança firme na UNITA. A liderança actual do meu presidente Samakuva é uma liderança que vai fa­zendo o que pode, mas não pode pressionar o MPLA para as alterações que Angola precisa. Temos de mudar isso tudo, só nesse contexto é que todos esses aspectos irão mudar,” diz Abílio Kamalata Numa.

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