terça-feira, 5 de agosto de 2014

REPITO!



João Luís

Mais uma originalidade portuguesa. A aplicação de dinheiros públicos num banco privado ao invés de ser anunciado (e explicado) pelo Governo, a mesma foi apresentada pelo excelentíssimo senhor governador do Banco de Portugal que serviu de capa protectora aos governantes mais preocupados com a temperatura do mar.

Nessa sua alocução repisou o excelentíssimo senhor governador por diversas vezes o termo «repito».

Informou ele que foram praticados «atos de gestão gravemente prejudiciais aos interesses do Banco Espírito Santo, S.A.» e também «a violação de determinações do Banco de Portugal que proibiam o aumento da exposição a outras entidades do Grupo Espírito Santo» actos esses que foram «praticados num momento em que a substituição da anterior administração estava já anunciada traduziram-se num prejuízo adicional na ordem de 1,5 mil milhões de euros face ao expectável na sequência da comunicação do Banco Espírito Santo, S.A. ao mercado datada de 10 de julho». 

E dizia ele que a operação apresentada «não implica custos para o erário público. O capital social do Novo Banco, de 4,9 mil milhões de euros, é integralmente subscrito pelo Fundo de Resolução» mas, como o Fundo de Resolução «entrou em funcionamento apenas em 2012 e não está ainda dotado de recursos financeiros em montante suficiente para financiar a medida de resolução aplicada ao Banco Espírito Santo, S.A., o Fundo contraiu um empréstimo junto do Estado Português».

Posto isto, temos o seguinte: o Governo foi rápido na procura de uma “solução” para o BES que por acção mafiosa dos seus administradores «desenvolveu um esquema de financiamento fraudulento entre empresas do grupo». Fico à espera que com a mesma rapidez a Justiça actue e responsabilize quem deve ser responsabilizado. Numa situação desta natureza desde logo se devia mandar penhorar os bens da “família”, mas isto sou eu a falar que não passo de um simples esmifrado.

Apesar de nos terem afiançado que «uma coisa são os negócios que a família Espírito Santo tem e outra coisa é o banco. É muito importante que os agentes portugueses e os investidores externos consigam, não apenas perceber bem esta diferença, mas estar tranquilos relativamente à situação do banco», dizia o Sr. Coelho, logo corroborado pelo Sr. Silva que afirmou sapiente que «os portugueses podem confiar no BES dado que as folgas de capital são mais do que suficientes para cobrir a exposição que o banco tem à parte não financeira, mesmo na situação mais adversa», repito, apesar de nos terem afiançado total certeza naquela instituição bancária o certo é que o dinheiro que não há para a escola e saúde públicas, para os pensionistas e reformados aparece num estalar de dedos e por artes de engenharia financeira para livrar essas entidades colectivas e particulares que de forma abnegada tudo fizeram pela salvação da sua bolsa. Repito, tudo fizeram pela salvação da sua bolsa.

Para ornamentar o embuste sobre a não implicação de custos para os portugueses, vêm governantes e apêndices do costume afirmar uns que «será um empréstimo que será pago quando o banco for vendido, daqui a 4-6 meses» e «não há dinheiro do Estado, o dinheiro vem do fundo da resolução» (Ganda Nóia Mendes); e há até quem afirme que o dinheiro é da troika como se não fôssemos todos nós a pagar os juros daquele empréstimo.

Ó rapaziada, ainda há alguém que acredite nas certezas governamentais, presidenciais e outros que tais?

Quem permitiu a continuação do CEO do BES após irregularidades várias e fuga ao fisco? Repito, quem permitiu a continuação do CEO do BES após irregularidades várias e fuga ao fisco?

Quem nos garante que o buraco não seja maior? Repito, quem nos garante que o buraco não seja maior?

Em caso de incumprimento do Novo Banco que garantias temos de ser ressarcidos? Repito, em caso de incumprimento do Novo Banco que garantias temos de ser ressarcidos?

Sendo o financiamento feito com dinheiros públicos (empréstimo ou não) porquê a administração do Novo Banco ser privada? Repito, sendo o financiamento feito com dinheiros públicos (empréstimo ou não) porquê a administração do Novo Banco ser privada?

Quem nos garante que os accionistas do velho banco não processarão o Estado e o novo banco? Repito, quem nos garante que os accionistas do velho banco não processarão o Estado e o novo banco?

Que por cá andaram a fazer os comissários da troika que cada estada em Portugal nos custaram os olhos da cara e não deram pela coisa? Repito, que por cá andaram a fazer os comissários da troika que cada estada em Portugal nos custaram os olhos da cara e não deram pela coisa?

Ninguém. Ninguém nos garante e lá diz o povo: cautela e caldos de galinha…

Chegando aqui perguntam vocês, mas esta melga não pára de escrever? Então finalizo com o que diz a imprensa estrangeira sobre o assunto.

O Wall Street Journal olha para o BES e considera ser "surpreendente" que o Banco de Portugal tenha dado recentemente garantias sobre a instituição e passado pouco tempo o banco esteja a ser resgatado.

Em Espanha, o jornal El País conclui que "desde a noite de domingo, o Banco Espírito Santo foi nacionalizado e entrou em período de liquidação. A segunda nacionalização da sua longa história parece ser definitiva".

O Financial Times afirma a incapacidade do banco em atrair potenciais investidores que "estão agora mais atentos após emergir dos resultados do primeiro semestre que o banco pode enfrentar outras potencias imparidades relacionados com à sua exposição ao grupo Espírito Santo e que ainda não foram contabilizadas, assim como potencias perdas da sua unidade bancária angolana [BESA]".

A agência Reuters considera que o resgate é um retrocesso para a situação económica e financeira de Portugal imediatamente a seguir à saída da troika do País.

Na Alemanha, o diário Süddeutsche Zeitung fala em "revés" para a situação económica e financeira de Portugal com mais um resgate bancário.

Notas:
Fundo de Resolução: O Fundo de Resolução foi criado pelo Decreto-Lei n.º 31-A/2012, de 10 de Fevereiro, que veio introduzir um regime de resolução no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei nº 298/92, de 31 de Dezembro.

Com efeito, com a publicação do referido Decreto-Lei n.º 31-A/2012, teve lugar uma revisão profunda do regime de saneamento de instituições de crédito, anteriormente em vigor, e a sua substituição por uma nova abordagem de intervenção do Banco de Portugal junto de instituições de crédito e determinadas empresas de investimento em dificuldades financeiras. As medidas previstas no novo regime visam, consoante os casos, recuperar ou preparar a liquidação ordenada de instituições de crédito e determinadas empresas de investimento em situação de dificuldade financeira, e contemplam três fases de intervenção pelo Banco de Portugal, designadamente as fases de intervenção corretiva, administração provisória e resolução.

Neste contexto, a principal missão do Fundo de Resolução consiste em prestar apoio financeiro à aplicação de medidas de resolução adotadas pelo Banco de Portugal.

O Fundo de Resolução é uma pessoa coletiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, tem a sua sede em Lisboa e funciona junto do Banco de Portugal.

Deste Fundo faz parte entre outras entidades bancárias a Caixa Geral de Depósitos.

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