Rafael
Barbosa – Jornal de Notícias, opinião
Para
nos salvarmos (...) é necessário deixar de lado o Governo, a sua cultura, a sua
forma de mentir, as suas fábulas. Basta! Temos de dizer: "Já não
acreditamos em vocês"; "não temos nenhuma confiança em vocês, porque
sois uns ladrões, sois corruptos, sois inventores de enganos!" - Dario Fo,
entrevista ao "El País", 15/9/2014
Aproximar
os eleitos dos eleitores e reduzir o número de deputados. Um assunto que surge
quase sempre pelo pior motivo: um político quer à força ser popular,
mostrando-se disponível para meter os outros políticos na ordem. É um paradoxo
e também por isso acaba esquecido na gaveta dos temas populistas. O duvidoso
protagonismo nesta matéria cabe, desta vez, a António José Seguro, por estes
dias em dupla campanha pelo poder - partidário e governamental - e portanto
necessitado de ser duplamente popular. Comecemos pela aproximação dos eleitos
aos eleitores. Propõe o líder do PS - como em tempos o líder do PSD - que se
introduza o voto preferencial. Qualquer coisa como o eleitor votar não apenas
numa lista partidária, mas no deputado preferido dentro dessa lista. Ambos
beberam no trabalho do cientista político Manuel Meirinho (entre outros), não
acrescentando nada de original.
Acontece
que quando um político acrescenta argumentos a uma ideia que, em teoria, é boa,
acaba por estragá-la. Pretende Seguro "garantir aos portugueses a escolha
do seu deputado". Para além de não se perceber muito bem para que haveria
de querer cada português o "seu deputado", sabemos que o deputado
nunca seria nosso. Com ou sem voto preferencial, estão amarrados a essa bizarra
instituição da disciplina partidária, a que uma parte dos deputados dos
partidos do arco da governação acrescentam os fretes e favores que lhes
garantem a sobrevivência (emprego) na política.
Se
Seguro e outros líderes partidários querem aproximar eleitos de eleitores,
então esforcem-se para quebrar o ciclo do caciquismo partidário, batalhem para
tornar a liberdade de voto na regra e não na exceção, permitam a candidatura de
listas de cidadãos independentes ao Parlamento, imponham limite de mandatos aos
primeiros-ministros, ministros e deputados. Ou acabaremos todos, como Dario Fo,
a acusá-los de inventores de enganos.
Falemos,
por outro lado, da redução do número de deputados. É evidente - dadas as
circunstâncias descritas acima, que pressupõem uma atuação parlamentar com
espírito de manada - que não são necessários 230 deputados. Metade, até menos,
seria suficiente para garantir o funcionamento do Parlamento tal qual ele se
coloca agora. Mas convém ter em conta um outro aspeto. O efeito imediato deste
tipo de medida é diminuir a proporcionalidade em benefício dos
"grandes", ou seja, do PSD e do PS. Ou seja, CDS, PCP e BE ficariam
reduzidos a grupos parlamentares inorgânicos, enquanto os novos pretendentes a
romper com as bancadas do costume ficariam para sempre do lado de fora. Se o
objetivo for o de manter a casta, ainda que reduzida no efetivo, não há melhor
fórmula do que reduzir o Parlamento para 181 deputados.
Sem comentários:
Enviar um comentário