sábado, 8 de novembro de 2014

Fundação portuguesa e timorense Mari Alkatiri trocam acusações de usurpação autoral




A ideia de criar uma zona de economia social de mercado em Timor-Leste está a ser disputada por uma fundação portuguesa e pelo ex-governante Mari Alkatari, que trocam acusações de usurpação autoral.

A Fundação Lusitânia, criada em 2009 e ligada à Igreja Católica, acusa o antigo primeiro-ministro timorense Mari Alkatiri de "usurpar" e controlar a Zona Especial de Economia Social de Mercado (ZEESM), uma queixa que é recusada pelo ex-governante que garante que é sua a autoria do projeto.

Há um ano, a fundação portuguesa anunciou que iria criar, em 2014, duas ZEESM -- modelo de desenvolvimento que alia a criação de riqueza e o combate à pobreza --, uma em Cabo Verde e outra em Timor-Leste.

Segundo disse à Lusa, na ocasião, Rogério Guimarães, presidente da fundação sem fins lucrativos, a partir do segundo semestre de 2014, Tarrafal (Cabo Verde) e Oecussi (Timor-Leste) começariam a ser transformadas em "mini-Singapuras" de combate à pobreza.

Cada projeto teve um investimento inicial de três mil milhões de euros e, no caso de Timor, contava com um terço de fundos públicos. É aqui que entra Mari Alkatiri. Em 2011, a Lusitânia fez o primeiro contacto com Timor e concedeu ao ex-primeiro-ministro o papel de co-autor do programa.

Porém, segundo a Lusitânia, desde então o ex-governante timorense "começou a tentar controlar todo o processo e fazer da fundação uma simples consultora".

Em declarações à Lusa, Mari Alkatiri conta outra versão, garantindo que foi dele "a ideia de economia social de mercado" em Timor-Leste. "Eles não tinham noção nenhuma disso. Não é deles. Onde é que registaram? Eles nem sabiam. Eu tenho troca de correspondência com eles, nunca sequer conseguiram assimilar a ideia", insiste.

"Basicamente, o que ele está a fazer, e fez, é usurpar um programa que é um programa de combate sustentado e global contra a pobreza", contrapõe Rogério Guimarães.

Acusando Alkatiri de "trabalhar nas costas" da fundação e de "fazer tudo para a desacreditar", inclusive "secar em termos de recursos", garante à Lusa: "Não vamos arredar pé da criação de todo este processo, mas, acima de tudo, da sua execução."

Prometendo "lutar pela verdade", a fundação recusa-se a "desvirtuar" o programa, registado "há meses" como "estudo científico na área económica e social".

Em dezembro de 2011, a fundação levou a Timor-Leste "um programa de biocombustíveis" e recebeu "um mandato" para o desenvolver da parte do então presidente do parlamento timorense Fernando Lassama, que depois adoeceu. Alkatiri surgiu como uma alternativa e a fundação convidou-o para vir a Portugal, o que aconteceu em dezembro de 2012.

A 14 de dezembro, Alkatiri assinou um "ato de receção documental e aceitação de nomeações". Na carta, dirigida à fundação e a que a Lusa teve acesso, o ex-governante timorense acusa a receção do plano de conceito do projeto de uma ZEESM em Oecussi e aceita "o convite" para integrar o conselho científico da fundação e ser o seu representante na Ásia.

"Aceito, desde já, os convites que me fizeram por achar que este conceito ZEESM - Zonas Especiais de Economia Social de Mercado, criado e desenvolvido pela fundação, é inovador e revolucionário e, por isso, irei apresentá-lo e defendê-lo com determinação, junto das autoridades de Timor-Leste, bem como em toda a Ásia", lê-se no documento.

"O programa é da fundação, criado por ela, está registado", realça Guimarães, realçando que a Lusitânia continua "aberta à conversa", mas avisando: "Se necessário, iremos às últimas consequências, aos tribunais internacionais, onde for."

Alkatiri tem outra versão. "Eles são os maiores usurpadores", acusa. "Eles aparecem em Timor com um projeto completamente diferente e o projeto da zona especial fui eu que introduzi", garante.

"Levei anos a ponderar sobre o fracasso dos modelos de desenvolvimento no mundo. Muito antes de conhecer o senhor Rogério Guimarães, já tinha as ideias todas e eu é que dei essa ideia a eles", repete.

Questionado sobre o envolvimento com a fundação, confirma ter sido convidado para o conselho científico. "Não devia ter aceitado. Aceitei porque queria ajudar", justifica.

Porém, garante "nunca" ter sido representante para a Ásia e não ter recebido "nem um centavo" da fundação. "Antes pelo contrário, eles é que tiveram algum dinheiro do Estado de Timor-Leste à minha custa", contrapõe.

"Não tenho nada a ver com eles já. Por que é que tenho que informar? Ele não é meu chefe. Sempre atuei nisso como representante do Estado de Timor-Leste", realça.

Falando à Lusa a partir de Oecussi, Alkatiri adianta que a ZEESM "já está a arrancar" no enclave.

"Não preciso deles para avançar, porque a ideia é minha. Onde é que se viu uma pessoa que não contribui com um centavo a querer controlar o projeto todo? Pedem-me a mim para arranjar dinheiro para a própria fundação, uma fundação que anda por aí a pedir dinheiro em todo o lado e ninguém dá", atira.

Lusa, em Sapo TL 

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