Francisco Louçã – Público, opinião
Uma
reunião relâmpago do Eurogrupo e um ultimato: a
Grécia tem quatro dias para repor o programa de austeridade que foi
recusado pelas urnas.
Deste
modo, nestes dias vertiginosos, três traços ficam claros. Primeiro, todo o
aparelho político europeu se uniu contra a Grécia: na conferência de imprensa
que apresentou o ultimato juntaram-se, simbólica e excepcionalmente, dois
socialistas, Moscovici e Dijsselbloem, e duas figuras da direita europeia,
Lagarde e Tusk. A Grécia está isolada, todos os governos de direita e de centro
querem a sua punição e só tem o apoio de quem recusa a destruição (o Financial
Times dá conta da carta
de 32 personalidades insistindo na mudança da posição do Estado
português).
Segundo,
a União Europeia não admite nenhuma alternativa à austeridade. A escolha é
esta: ou a Grécia continua as privatizações e a compressão salarial ou é
expulsa, não se sabe como ou com que legitimidade, mas fica de fora. A Europa é
a austeridade. É uma prisão.
Terceiro,
o governo alemão está disposto a tudo, mesmo a uma grotesca arrogância que
pouca gente acharia plausível. Ao dizer hoje que “sinto muito pelos gregos, que
elegeram um governo que se porta de forma irresponsável”, Schauble ultrapassou
uma barreira de agressividade e impunidade que terá consequências. A Alemanha
passou a ser isto.
Assim,
ninguém – o Eurogrupo, o governo alemão, os outros governos – deixou qualquer
dúvida: ou a Grécia se verga ou sai do euro. A Grécia nem teria o direito de
divulgar a proposta que lhe foi feita, acrescentam as autoridades europeias, e
se o fez, é uma “provocação”, persiste o Eurogrupo, porque nenhum governo pode
dar a conhecer este segredo.
Do
outro lado, o governo grego usou todas as armas que a democracia pode gerar.
Obteve um mandato eleitoral claro. Procurou o apoio da opinião pública em todos
os países. Conduziu uma disputa política que nunca ninguém tinha visto na
Europa. Destapou a face de uma Alemanha imperialmente exibicionista. Usou o seu
recurso mais importante: propôs negociações prudentes, esperando que o
adversário não usasse a arma de destruição massiva. Mas encontrou um muro de
“intimidação” (Tsipras) ou de imitação de “tortura” no estilo da CIA
(Varoufakis) e, em todo o caso, a condição do ultimato: ou continua a
austeridade ou rua.
As
autoridades europeias colocaram-se por isso numa posição em que não admitem
nada senão a cedência. Assim, o que se vai passar nos próximos dias, salvo
mudança miraculosa, parece estar escrito. Pode haver ou não nova reunião do
Eurogrupo, mas, segundo as autoridades europeias, a condição preliminar é que a
Grécia reponha a política de Samaras e do PASOK. A partir daí, não havendo
acordo, começa a contagem decrescente para o “Armagedeão”, nos termos de
Varoufakis, e será o BCE o instrumento da cólera desta divindade: no dia em que
cortar o crédito de liquidez aos bancos gregos, a Grécia tem de emitir moeda
para salvar o país. E esse dia poderá vir em breve. A Grécia
pode então reagir de muitas formas. Pode convocar uma sessão extraordinária do
parlamento, pode pedir a opinião da população e organizar um referendo. Mas
terá poucos horas para responder ao ataque, porque terá sido expulsa do euro,
pela força ilegítima de um ultimato, seguido de uma retaliação.
As
consequências de um desfecho deste tipo são imensas e voltarei ao tema em breve. Em todo o caso,
não será menos do que mudar a vida da esquerda, que será forçada a reconhecer
que nesta Europa o destino é a austeridade. E mostrar, o que também não é pouca
coisa, que na União não se respeitam regras nem leis nem tratados, a Alemanha
manda e é tudo.
O
ultimato à Grécia é o culminar do desastre da austeridade. Mas é também o
início de tempos muitos mais perigosos.
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