Os
comunistas sobem a parada sobre a Europa, ao exigirem uma conferência
intergovernamental. No balanço das suas jornadas parlamentares, fazem ainda
pontaria à fiscalidade das grandes empresas e à corrupção e criminalidade
económico-financeira, nomeadamente a criminalização do enriquecimento
injustificado
Paulo Paixão – Expresso (ontem)
O PCP quer a realização de uma conferência intergovernamental, dentro de um conjunto de iniciativas de Portugal no plano internacional, para renegociação da dívida e revogação do Tratado Orçamental. Os comunistas irão apresentar no Parlamento um projeto de resolução nesse sentido, anunciaram esta terça-feira no final das jornadas parlamentares, que decorreram em Aveiro.
A
iniciativa é justificada pela "necessidade de afastar com urgência os
constrangimentos resultantes da dívida e do Tratado Orçamental, que entravam de
imediato a recuperação económica e social e eliminam num prazo mais alargado as
hipóteses de um desenvolvimento duradouro e equilibrado".
O
PCP retoma assim uma ideia já avançada em 2011. O líder parlamentar dos
comunistas, João Oliveira, explica que a proposta avança agora de novo devido
"ao quadro de agravamento da situação económica e social a que Portugal
está submetido".
Na
ótica dos comunistas, trata-se de um colete-de-forças com três responsáveis.
"O Tratado Orçamental, assumido pelo PS, PSD e CDS, não só impede qualquer
perspetiva de desenvolvimento económico e soberano, como coloca no horizonte o
risco do afundamento do país, pelo que a sua rejeição é um imperativo".
No
discurso do PCP, nunca a ordem dos fatores é um pormenor ou uma casualidade. E
se na sessão de abertura das jornadas, no discurso de Jerónimo de Sousa, as
referências aos socialistas foram sobretudo indiretas, esta terça-feira, ao
serem elencados os autores do Tratado Orçamental, já o PS surge em primeiro
lugar (antecedendo os partidos da direita que integram a coligação
governamental).
"Enriquecimento
injustificado" na mira
Das jornadas parlamentares do PCP (com o lema "defender a produção nacional, criar emprego, valorizar salários e direitos") sai o anúncio de outras propostas, parte delas tendo como alvo a corrupção e a criminalidade económica e financeira.
Os
comunistas vão na próxima semana apresentar um projeto de lei de
"criminalização do enriquecimento ilícito, tendo como base a
obrigatoriedade de todos os cidadãos declararem e indicarem a origem concreta e
compatível com os seus rendimentos legítimos, de património ou de acréscimos
patrimoniais de montante elevado que entrem na sua posse".
Paredes
meias com estas questões está outra preocupação do PCP: "os benefícios
fiscais aos grandes grupos económicos e financeiros", dados pelo Governo,
"ao mesmo tempo que destrói a atividade dos pequenos e médios empresários
e esmaga os trabalhadores e o povo".
Naquela
perspetiva, João Oliveira lembrou que só em 2012, segundo o Tribunal de Contas,
houve 1.045 milhões de euros de benefícios fiscais de SGPS (sociedades gestoras
de participações sociais).
Por
isso, os comunistas irão propor no Parlamento "um processo alargado de
audição sobre a fiscalidade das grandes empresas nacionais e multinacionais que
operam em Portugal, incluindo a audição de membros do Governo, de grandes
empresas, das ordens dos técnicos oficiais de contas e revisores oficiais de
contas", além de "especialistas em fiscalidade", entre outros
intervenientes.
Contra
a "Lei da Selva"
No balanço de contactos mantidos em Aveiro, insurgindo-se contra o "impacto dos preços da energia na vida das empresas e das populações", os comunistas levarão ao Parlamento um projeto de resolução para a "regulamentação dos preços dos combustíveis, travando a especulação e as escandalosas margens de comercialização das petrolíferas".
Já
em defesa das micro e pequenas e médias empresas, o PCP vai pedir na Assembleia
da República a revogação diploma - designado por João Oliveira como "Lei
da Selva" - que "permite o funcionamento dos estabelecimentos da
grande distribuição 24 horas por dia, fomenta a guerra de preços liberalizando
os saldos, abre a porta a incompatibilidades e concorrências desleais de todo o
tipo".
As
propostas anunciadas esta terça-feira seguem-se à iniciativa, já conhecida, de
realização de um "debate de atualidade", a realizar esta
quarta-feira, no Parlamento. Os comunistas querem confrontar o Governo com as
"responsabilidades" no "significativo aumento da pobreza no
nosso país".
Uma
Carta da Agricultura Familiar, medidas de apoio à pecuária e às pescas, além de
propostas contra o despedimento de trabalhadores da Administração Pública (ao
abrigo das normas da requalificação e da mobilidades especial) ou para reforço
da rede de cuidados de saúde primários são outras das conclusões das jornadas
parlamentares do PCP.
A
morte lenta da Linha do Vouga
Ao longo dos dois dias das suas jornadas parlamentares, os deputados comunistas, divididos em grupos, multiplicaram-se em contactos e visitas, em vários setores de atividade e diversos serviços públicos. No total, foram cerca de duas dezenas de iniciativas.
Esta
terça-feira, segundo dia dos trabalhos, alguns deputados do PCP saíram para o
terreno ainda era noite cerrada.
A
visita teve como objetivo alertar para o "estado de degradação da Linha do
Vouga". João Oliveira, líder parlamentar, Bruno Dias (que em São Bento acompanha as
questões dos transportes) e o deputado ao Parlamento Europeu Miguel Viegas
viajaram entre Águeda e Aveiro. Experimentaram o comboio Vouguinha, como é
conhecido (na realidade trata-se de uma automotora, das que antes funcionavam
na linha da Póvoa de Varzim), ouvindo as queixas de utentes e repetindo as
posições do PCP.
Oliveira
lembrou a alguns passageiros que "o Governo, segundo o Plano Estratégico
dos Transportes, queria o encerramento da Linha do Vouga. Se não fosse a luta
das populações, ela já teria fechado".
Ainda
não fechou, mas a avaliar por certos pormenores (em alguns pontos, há erva a
crescer entre os carris e as travessas de madeira não assentam de forma
estável) para lá parece caminhar. Uma espécie de morte lenta.
Plano
de emergência para Aveiro
Esses sinais de abandono são visíveis em Aguieira, o apeadeiro visitado antes da viagem de comboio. Em alguns troços da Linha do Vouga, por questões de segurança, a velocidade não ultrapassa os 20 quilómetros/hora, segundo utilizadores.
O
"aumento da frequência" dos comboios foi uma exigência manifestada
por vários passageiros contactados pelos deputados comunistas. Outra reivindicação
dos utentes é a segurança da linha, através de adequada manutenção.
"Constatámos
que a população necessita do comboio", disse João Oliveira no final da
viagem, que durou um pouco mais de 40 minutos. Mas essa pretensão "esbarra
na política do Governo, que é de desinvestimento nesta linha e em todo o setor
ferroviário, o que leva ao desincentivo do uso do transporte público",
acrescentou o líder da bancada comunista.
Ao
cenário atual, Oliveira contrapõe a necessidade de "modernização da Linha
do Vouga, a sua eletrificação e a melhoria dos comboios". Antes, já Bruno
Dias lembrara que a última modernização das carruagens do Vouguinha foi
"feita em 1991, nas oficinas da Sorefame".
Em
relação à sua base de trabalho durante dois dias, os comunistas decidiram que
vão submeter brevemente ao parlamento um "Plano de Emergência para o
Distrito de Aveiro".
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