Análise
ao hospital, baseada em questionários recolhidos entre 2012 e 2013, traça um
retrato negro da instituição onde se entrecruzam os interesses públicos e
privados de "grupos poderosos".
O
Hospital de Santa Maria, o maior do país, está minado por uma teia de
interesses e lealdades a partidos políticos, à maçonaria e organizações
católicas, conclui um estudo que avaliou a qualidade e funcionamento de seis
instituições nacionais.
A
análise ao Hospital de Santa Maria (HSM), a cargo de Sónia Pires, salienta que,
"apesar das melhorias registadas a partir de 2005", a unidade
hospitalar "continua atravessada por fortes conflitos de interesse e atos
nas zonas cinzentas ou silenciadas que se configuram como corrupção".
"A
Maçonaria, a Opus Dei e a ligação a partidos políticos ainda são três
realidades externas que intersetam a esfera do HSM", refere o estudo
"Valores, qualidade institucional e desenvolvimento em Portugal,
encomendado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, que vai ser apresentado
na quinta-feira.
A
investigadora, que se baseou em questionários e entrevistas recolhidos entre
2012 e 2013, traça um retrato negro da instituição onde se entrecruzam os
interesses públicos e privados de "grupos poderosos", nomeadamente na
classe médica e na direção de serviços de apoio que condicionam o funcionamento
dos serviços a nível de recursos humanos e aquisição de material clínico.
O
diagnóstico era ainda pior há dez anos: "a situação estava fora de
controlo, não havendo registos de utilização do equipamento e verificando-se
roubos regulares, por parte de médicos e de outro pessoal, que se serviam a seu
bel-prazer dos armazéns do hospital para fornecer as suas clínicas
privadas".
O
fecho do hospital chegou a ser ponderado e foi necessária "a intervenção
enérgica" do ministro da Saúde, que nomeou um novo Conselho de
Administração e um novo presidente para salvar a instituição, refere o
documento, acrescentando que esse dirigente e a sua família receberam ameaças
de morte e chegaram a ser acompanhados por uma escolta policial.
Sónia
Pires destaca que "as condições melhoraram" entretanto, mas continuam
a ser "prática comum" pequenos atos de corrupção como, por exemplo,
"troca de favores, fazendo passar à frente, nas listas de espera, amigos e
familiares, e o médico assistente canalizar os pacientes que têm de fazer
análises para laboratórios privados dos quais é sócio".
A
corrupção foi mais evidente até meados de 2000, e sofreu uma quebra com a
reorganização dos serviços.
"Com
efeito, a introdução da informatização dos serviços, as alterações nas chefias
dos serviços de apoio (com a vinda de atores do setor privado bancário ou do
setor dos seguros de saúde), a entrega de relatórios de contas por serviço,
área ou departamento, ou a externalização de certos serviços (como a
alimentação, a lavandaria ou obras de manutenção) fazem com que o despesismo
seja mais controlado", adianta o relatório.
O
documento revela igualmente casos de absentismo de chefias médicas nos serviços
de ação médica e nomeações dos diretores de serviço feitas "à revelia das
normas e regulamentos".
Justifica,
por outro lado, a permanência de alguns médicos no serviço público com o facto
de "pertencer ao HSM ser útil para conseguir o estatuto social e simbólico
próprio à profissão", admitindo que, embora se mantenham os melhores
elementos, há ausência de meritocracia, nas nomeações e na promoção.
"Os
processos de nomeação não são claros e estão atravessados por outras dinâmicas
como os jogos de interesse e as lutas entre professores na Faculdade de
Medicina, e a presença de dinâmicas externas próprias à sociedade portuguesa --
como a maçonaria, a Opus Dei e a ligação a partidos políticos (ligação mais
recente, temporalmente, e com ênfase particular no Partido Comunista e no
Partido Socialista)", salienta a investigadora, baseando-se nas
informações que recolheu.
Santa
Maria foi a organização mais mal classificada entre as seis analisadas no
estudo (Autoridade Tributária, ASAE, EDP, Bolsa de Lisboa, Hospital de Santa
Maria e CTT), destacando-se essencialmente na avaliação sobre inovação e
flexibilidade tecnológica.
No
entanto, a partir de 2011, as restrições orçamentais no Serviço Nacional de
Saúde condicionaram a introdução de maior flexibilidade tecnológica e inovação
nos serviços, notou Sónia Pires.
O
estudo envolveu vários investigadores e foi coordenado pela professora da
Universidade Nova de Lisboa Margarida Marques e pelo professor da Universidade
de Princeton Alejandro Portes.
Lusa
em Diário de Notícias
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