quinta-feira, 11 de junho de 2015

Portugal. SÓCRATES TEVE CORAGEM



Cristina Azevedo – Jornal de Notícias, opinião

A verdade é simples e límpida como são as coisas simples: José Sócrates teve coragem em recusar a alteração de uma medida de coação que, sob todos os ângulos do seu bem-estar humano e pessoal, era mais confortável.

Ainda sem saber se será pronunciado e julgado, José Sócrates apenas eleva a fasquia da sua defesa e se expõe mais à dureza dos efeitos de uma eventual derrota nesta difícil averiguação legal por que passa.

E nestas condições agir assim é ter coragem!

Se, como se pode ler no Comunicado do Ministério Público "subsiste ainda de forma significativa, o perigo de perturbação do inquérito - de perturbação da recolha e da conservação da prova - mantendo-se também, ainda que de forma mais diminuta, o perigo de fuga", perigos esses que poderiam apenas ser controlados via controlo eletrónico remoto, então assumir a permanência numa cela fisicamente vigiada, como prova de integridade, é ter coragem!

E isto é assim, independentemente do desfecho que todo o caso venha a ter. O que, em minha opinião, torna triste, pouco inspirador e quase cobarde o discurso público que a propósito nos invadiu.

Nunca a frase "à justiça o que é da justiça" e "à política o que é da política" foi tão insipidamente usada. E até mal usada. Porque afinal, que ato político maior pode haver do que o exercício pleno da liberdade individual em nome de princípios e convicções que nos deviam pôr a todos a refletir e a discutir.

Ou todos os portugueses se sentem confortáveis com um sistema que pode prender até um ano para investigar, que pode deixar alegadamente mais de seis meses o arguido sem ter conhecimento do processo?

E, no entanto, só se ouvem declarações de piedosa inocuidade, como se o tema fosse incolor, inodoro e pianíssimo.

Eu, por mim, acho que o tema dá pano para mangas e acho que o ato corajoso de José Sócrates é uma boa deixa para a discussão.

E acho também que poderíamos ganhar coletivamente se o discutíssemos com propriedade.

Pena é que à direita e à esquerda, um discurso medroso e politicamente correto nos desmobilize de uma cidadania ativa e responsável, que tenha opinião e não tenha medo das palavras ou dos atos. E muito menos medo tenha de os adjetivar!

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