sexta-feira, 3 de julho de 2015

AUSTERIDADE, UM PROJETO NAZI



Paulo Pereira de Almeida – Diário de Notícias, opinião

Recordo-me de relatos de pessoas que viveram os dias, os meses e os anos que antecederam e durante os quais durou a Segunda Guerra Mundial (de 1939 a 1945). Recordo-me vivamente de relatos espantados de quem - ainda hoje - se surpreendeu como as pessoas, em geral, e os meios de comunicação social, em particular, aderiam com uma facilidade quase inocente, irresponsável, acéfala, à ideia da "superioridade" da "raça ariana". Um comportamento néscio, que haveria de custar milhões de mortes e resultar na perseguição e no extermínio de aproximadamente seis milhões de judeus, dois terços dos cerca de nove milhões que viviam na Europa antes da Guerra, segundo os dados do projeto Holocaust - A Call to Conscience.

Mas a "Europa" parece - lamentavelmente - perder a memória histórica muito rapidamente. E - nos tempos mais recentes - parece querer fazer das políticas de austeridade e de empobrecimento um novo "projeto nazi", com a Alemanha - novamente reunificada e com grande vigor - à cabeça. Aliás, ainda nesta semana um artigo - seminal - do professor José Pacheco Pereira dava conta disto mesmo, considerando, ao comentar a situação na Grécia, que "bater nos gregos tornou-se uma espécie de desporto nacional. Tem várias versões, uma é bater no Syriza, outra é bater nos gregos propriamente ditos e na Grécia como país. As duas coisas estão relacionadas, bate-se na Grécia porque o Syriza resultou num incómodo e, mesmo que o Syriza morda o pó das suas propostas - que é o objetivo disto tudo -, o mal-estar que existe na Europa é uma pedra no orgulhoso caminho imperial do Partido Popular Europeu, partido de Merkel, Passos e Rajoy e nos socialistas colaboracionistas que são quase todos que os acolitam". Mas mais, para Pacheco Pereira - um certamente incómodo mas respeitado intelectual e pensador da área do PSD - a tradução da vitória do Syriza tem raízes mais profundas no pensamento coletivo de muitos europeus, pelo que confessa: "No dia da vitória do Syriza, o que mais me alegrou, sim, alegrou, como penso aconteceu a muita gente, à esquerda e à direita, não foi que muitos gregos tenham votado num "partido radical" ou num programa radical, ou o destino do Syriza, mas sim o facto de que votaram pela dignidade do seu país, num desafio a esta "Europa" que agora os quer punir pelo arrojo e a insolência. Escrevi na altura e reafirmo que, mais importante do que a motivação de acabar com a austeridade, foi o sentimento de que a Grécia não podia ser governada por uma espécie de tecnocratas a atuar como "cobradores de fraque" em nome da Alemanha. Por isso, mais grave do que o esmagamento do Syriza, que a atual "Europa" pode fazer como se vê, é o sinal muito preocupante para todos os que querem viver num país livre e independente em que o voto para o Parlamento ainda significa alguma coisa. Nisso, os gregos deram uma enorme lição aos nossos colaboracionistas de serviço, que andam de bandeirinha na lapela." Nem mais.

É - portanto - absolutamente espantoso, preocupante, perturbador da nossa segurança e da nossa paz no pós-Segunda Guerra Mundial, que se queira, por conta de instituições internacionais como o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, estender a ideologia neoliberal do pensamento único e da prevalência do capitalismo não regulado e dos mercados selvagens a todo o custo. Mesmo que isso implique - como já se percebeu - um novo "projeto nazi", desta vez de extermínio das instituições democraticamente eleitas nos países soberanos europeus, em detrimento de uma "Europa" de federações, o que quer que isso queira significar.

Mas - e na verdade - a História acabou com o projeto de Hitler e dos nazis. Veremos como - e uma vez mais - se vai comportar desta vez...

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