sábado, 25 de julho de 2015

Portugal. A MERCEARIA DOS DEPUTADOS



Domingos de Andrade – Jornal de Notícias, opinião

A elaboração das listas de deputados é um dos momentos mais confrangedores da política portuguesa. Pelo que revela da incapacidade de renovação dos partidos e do que nos espera no Parlamento, pelas lutas internas por um lugar em S. Bento, e pelo que demonstra da unidade em torno da liderança. Pena que o sumo se passe nos bastidores e que pouco transpareça para o público, porque a decisão do voto devia estar, também, assente na análise que pudéssemos fazer dos nossos parlamentares.

É por tudo isso que o espetáculo proporcionado esta semana pela distrital do Partido Socialista do Porto merece uma leitura um bocadinho mais aberta.

Primeiro, porque é a primeira vez que uma lista do Porto é chumbada pela direção nacional, com óbvias responsabilidades do líder José Luís Carneiro, que não soube consensualizar vontades, ou se soube não foi o que pareceu. E se não lhe facilitaram a vida, deveria ter sido ele a poupar António Costa aos avanços e recuos expostos na praça pública. A lista final será sempre olhada como um mal menor, feito de acertos negociados à última hora. No mínimo, é mau para quem lá consta.

Segundo, o que se passou no Porto é uma síntese perfeita das dificuldades do secretário-geral do PS em se afirmar, não só dentro do partido, como no país. Se António Costa não consegue convencer os seus, como é que vai convencer os outros?

O caos foi geral e público, ainda que no final os resultados até possam ser positivos. Anunciou cabeças de lista contra as distritais, colocou paraquedistas a mais, teve que refazer listas por conterem elementos envolvidos em casos judiciais, contentar seguristas e costistas e ferristas.

A escolha de Ferro Rodrigues, de resto, só se justifica pela sua vontade férrea de federar o partido. Sem estar aqui em causa a sua seriedade, não podia haver pior escolha para comunicar com o país.

Em vez de o partido estar constrangido por uma liderança forte que dita as regras para uma lista de deputados fortes, a olhar o futuro e a escolher os melhores, temos um partido unicamente interessado nas suas contas de favor.

Falta, agora, ver o processo na coligação PSD/CDS-PP, com a urgência de conciliar o partido de Paulo Portas com as necessidades de Passos Coelho, a influência, ou a sua perda, de Marco António Costa, a ambição de Luís Montenegro e o poder, aparentemente discreto, de Miguel Relvas.

Não é fácil, mas também aqui o PS corre o risco de levar uma lição.

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