Um
grupo de voluntários falantes da língua portuguesa tem vindo a acompanhar e a
visitar crianças angolanas carenciadas com doenças graves, a receberem
tratamento médico na Alemanha, e que se encontram no país sem a família.
"São
crianças que vêm de meios sociais extremamente carenciados. Está fora de
questão a família vir com eles", explicou Ines Thomas de Almeida,
coordenadora da campanha Tempo e Livros que se enquadra na ação social da
Berlinda, uma associação sediada em Berlim dedicada à interação cultural entre
o mundo da língua portuguesa.
As
crianças viajam até à Alemanha, ao abrigo da ação humanitária da associação
alemã Friedensdorf, onde recebem tratamento adequado em hospitais de primeira
linha durante seis meses. A instituição recolhe semestralmente cerca de 250
crianças de países com défices na área da saúde.
"A
criança vem e está perdida" lamentou Ines e "por maior que tenha sido
a fase de informação, a criança está ali a viver um filme de terror porque está
a ser alvo de tratamentos médicos intensivos num sítio onde não entende a
língua e ninguém a compreende a ela".
Em
declarações à agência Lusa em Berlim, a coordenadora do projeto disse que os
voluntários são essenciais "sobretudo na fase inicial" porque fazem a
ponte entre a equipa médica e a criança "que não entende o que se
passa".
Cristóvão,
14 anos, foi a primeira criança a receber visitas dos voluntários da Berlinda e
relembrou que a chegada a Berlim foi um "pouco assustadora" porque se
sentia "sozinho e não sabia falar alemão".
Três
anos de tratamentos depois - um período de exceção na ação humanitária do
Friedensdorf - Cristóvão está a preparar o regresso a Luanda e, além dos lápis,
livros e folhas de desenho, leva consigo a fluência do alemão que desenvolveu
ao longo da estadia em terras germânicas.
"As
crianças aprendem o alemão muito rápido, ao fim de seis meses já conseguem
comunicar muito bem", acrescentou Ines. A coordenadora do programa referiu
que a manutenção da língua portuguesa é um dos papéis do voluntário porque
"por incrível que pareça e, muita gente não acredita, muitas crianças
desaprendem o português", rematou.
Cristóvão,
que tem o quarto do hospital decorado com cartazes do homem aranha, garante
sentir-se bem na Alemanha, à parte da comida que é "esquisita", mas tem
saudades da família que não vê há três anos.
"A
ideia é não transformar demasiado a criança", mas no caso do Cristóvão
"ele já tem uma mentalidade alemã e tornou-se outra pessoa", revelou
Ines. A voluntária receia que o regresso a Luanda "seja uma enorme
deceção" porque "o que ele vai encontrar não é aquilo que ele deixou
com 11 anos".
Ines
quer agora encontrar uma instituição parceira em Angola que possa acompanhar as
crianças no regresso. Cristóvão, que conversa com a família esporadicamente por
telefone, disse: "Eles estão à espera da minha volta. Mas é bom saber que
eu também tenho uma família aqui na Alemanha".
Em
2014, o programa contou com 18 voluntários de nacionalidade alemã, angolana,
brasileira e portuguesa, mas a adesão cresceu em 2015.
A
ação humanitária do Friedensdorf - que em português significa aldeia da paz -
recebe cerca de 160 crianças angolanas anualmente e já tratou um total de 2.700
desde 1994. Duas vezes por ano, uma pequena equipa médica alemã viaja até
Luanda e seleciona as crianças que vão receber tratamento na Alemanha. Além de
Angola, a instituição trata crianças do Afeganistão, Arménia, Gâmbia, Gaza,
Geórgia, Nigéria, Quirguistão, Tajiquistão e Uzbequistão.
Lusa,
em Notícias ao Minuto
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