O
julgamento dos 15+2 activistas continua fértil em casos sui-generis, sendo o
ocorrido hoje digno de figurar no “Guinness Book of Records” da bestialidade
judicial. Assim, vão deixar a cadeia e ficar em prisão domiciliária na próxima
sexta-feira, dia 18, por decisão do juiz Januário Domingos, baseada numa lei
que ainda não está em vigor.
De
facto, a musculatura exibida pela diligente representante do Ministério
Público, Isabel Fançony, ao solicitar a prisão do advogado Walter Tondela por
este ter interpelado o juiz, Januário Domingos, é prova disso.
O
juiz recusou-se, inicialmente, a conceder a palavra aos advogados de defesa
para que estes se pronunciassem em relação a um requerimento interposto pela
própria procuradora, solicitando a alteração da condição carcerária dos
arguidos, para a partir do dia 18.12 (sexta-feira) passarem a condição de
prisão domiciliária, mas com fundamento numa nova Lei n.º 25/15 de 18 de
Setembro, Lei das Medidas Cautelares.
O
quiproquó começou precisamente quando o juiz admite o requerimento da
magistrada e concede um despacho favorável, “esquecendo-se” que a mesma Lei
ainda não entrou em vigor, facto que só ocorrerá no próximo dia 18.
“Meritíssimo
como se pode despachar favoravelmente, hoje (15.12), sobre uma lei que ainda
não entrou em vigor”?, questionou o advogado, na convicção (ingénua) de que na
barra dos tribunais a linguagem é a do Direito.
Ledo
engano. Aqui, a lei que impera é da força ditatorial partidocrata e da
bestialidade jurídica, que mutilando descaradamente o Direito, não augura a
busca da justiça.
Recorde-se
que que os tribunais angolanos vão poder passar a aplicar, a partir de 18 de
Dezembro, a prisão domiciliária em alternativa à prisão preventiva, no âmbito
da nova legislação de medidas cautelares que introduz também a figura do juiz
de turno.
As
medidas constam do novo Regime Jurídico das Medidas Cautelares em Processo
Penal e das Revistas, Buscas e Apreensões, que foi apresentado no dia 23 de
Novembro, em Luanda, a juízes, investigadores e procuradores do Ministério
Público e que harmoniza a aplicação da prisão preventiva durante a fase de
instrução.
De
acordo com o director-nacional de Política de Justiça, Pedro Filipe, a nova lei
passa a definir prazos “muito concretos” da aplicação da prisão preventiva,
algo que até agora não acontecia, nomeadamente pelas sucessivas prorrogações
(45 dias) permitidas.
De
acordo com a explicação do responsável, a prisão preventiva passa a prever o
limite de quatro meses na fase de instrução preparatória e mais dois meses na
fase judicial, nos crimes comuns. Além disso, não pode ser aplicada a mulheres
grávidas a partir de seis meses de gestão ou cidadãos maiores de 65 anos com
complicações de saúde.
“É
um pendor muito mais humanista da lei, mais preocupado com a protecção os
direitos e das garantias do arguido, sem querer retirar a eficácia dos órgãos
judiciais como um todo”, indicou.
Um
dos objectivos da nova lei, referiu ainda Pedro Filipe, é limitar a aplicação
da prisão preventiva em Angola, para que apenas possa ser decretada nos casos
mais graves.
“Para
isso, passamos a ter alternativas, como a prisão domiciliária, a restrição de
saída do território nacional, o termo de identidade e residência ou o caso do
pagamento de uma caução económica”, explicou o director-nacional de Política de
Justiça.
Uma
“grande inovação” da nova lei é a introdução do juiz de turno, em todos os
tribunais do país, com a possibilidade de “reapreciar” – a pedido do arguido –
as medidas de coacção aplicadas pelo Ministério Público, ainda na fase de
instrução preparatória.
“Para,
num prazo máximo de cinco dias, se pronunciar sobre a manutenção ou alteração
da medida cautelar imposta”, sublinhou Pedro Filipe.
A
introdução da aplicação da prisão domiciliária como uma alternativa à prisão
preventiva constitui outra novidade desta legislação, que vem substituir a
actual lei da prisão preventiva, em vigor até 17 de Dezembro.
“É
um elemento completamente novo, em que vai ser possível a pessoa estar privada
da liberdade, mas estando em sua casa, apenas com o impedimento de não poder
abandonar porque está sob vigilância policial ou por meios electrónicos”,
explicou o procurador-geral adjunto da República de Angola, Pascoal António
Joaquim.
Com
isto, acrescentou, pretende-se que a prisão preventiva durante o processo
instrutório funcione como “última medida”.
Na
altura, questionado pela Lusa, não se comprometeu com a possibilidade de o
Ministério Público propor a prisão domiciliária como medida cautelar já a
partir do dia 18 de Dezembro.
“Quanto
à aplicação da medida, tem-se estado a fazer arranjos [técnicos]. Talvez não,
talvez sim. É uma questão que vamos ver, mas é uma medida de coacção que vigora
a partir dessa dada e é passível de ser aplicada”, apontou.
Folha
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