segunda-feira, 6 de julho de 2015

NOVO MINISTRO GREGO DAS FINANÇAS DIZ QUE NÃO VAI ACEITAR ACORDO INVIÁVEL




O novo ministro das Finanças, Euclid Tsakalotos, já tomou posse. Em declarações afirma que a Grécia merece melhor e que não pode aceitar um acordo inviável.

Euclid Tsakalotos é oficialmente o novo ministro das Finanças grego. Depois de ter tomado posse garantiu que a Grécia merece melhor e que não pode aceitar um acordo inviável.

A tomada de posse de Tsakalotos acontece depois de Yanis Varoufakis se ter demitido esta segunda-feira. As razões que levaram Varoufakis a demitir-se prendem-se com o facto de querer facilitar as negociações com os credores.

Notícias ao Minuto

FIDEL DE CASTRO ESCREVE A TSIPRAS. “FOI UMA BRILHANTE VITÓRIA”




Os líderes políticos da Argentina, Bolívia, Venezuela e Cuba congratularam-se publicamente com a vitória do ‘OXI’ no referendo. O infoGrécia mostra algumas dessas mensagens e publica a carta enviada por Fidel Castro a Alexis Tsipras, em que o histórico líder cubano faz um elogio à capacidade de resistência do povo grego face às “agressões externas” e alerta para a fragilidade da paz no mundo.

Carta de Fidel Castro a Alexis Tsipras:

Exmo. Sr. Alexis Tsipras, Primeiro-Ministro da Grécia

Felicito-o calorosamente pela sua brilhante vitória política, cujos pormenores segui de perto pelo canal Telesur.

A Grécia é muito familiar para os cubanos. Ensinou-nos Filosofia, Arte e Ciências da antiguidade quando estudávamos na escola e, com elas, a mais complexa de todas as atividades humanas: a arte e a ciência da política.

O seu país, especialmente a sua valentia na atual conjuntura, desperta admiração entre os povos latinoamericanos e caribenhos deste hemisfério, ao ver como a Grécia, perante agressões externas, defende a sua identidade e a sua cultura. Eles também não esquecem que um ano após o ataque de Hitler à Polónia, Mussolini deu ordem às suas tropas para invadir a Grécia, e esse valente país repeliu a agressão e fez retroceder os invasores, o que obrigou ao envolvimento de unidades blindadas alemãs em direção à Grécia, desviando-se do objetivo inicial.

Cuba conhece o valor e a capacidade combativa das tropas russas, que unidas às forças do seu poderoso aliado da República Popular da China, e outras nações do Médio Oriente e Ásia, procurarão sempre evitar a guerra, mas jamais permitirão alguma agressão militar sem resposta contundente e devastadora.

Na atual situação política do planeta, quando a paz e a sobrevivência da nossa espécie estão presas por um fio, cada decisão, mais do que nunca, deve ser cuidadosamente elaborada e aplicada, de forma a que ninguém possa duvidar da honestidade e da seriedade com que muitos dos dirigentes mais responsáveis e sérios lutam hoje por enfrentar as calamidades que ameaçam o mundo.

Desejamos-lhe a si, estimadíssimo companheiro Tsipras, o maior êxito.

Fidel Castro

InfoGrécia

Dhlakama. Líder da Renamo ameaça voltar a fechar principal estrada de Moçambique




O líder da Renamo, Afonso Dhlakama, ameaçou hoje voltar a paralisar a principal estrada que liga o sul e o norte de Moçambique (N1) e expulsar administradores do Governo, assegurando que não precisará de usar a força.

"Vou esticar a corda e acabar com a paciência", avisou Afonso Dhlakama, líder da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), principal partido da oposição, sobre a sua exigência de governar em seis províncias, no centro e norte do país, onde reclama vitória eleitoral.

Afonso Dhlakama discursava nas cerimónias do 35.º aniversário do Destacamento Feminino da Renamo, celebrado hoje numa antiga base do movimento, em Macoca, posto administrativo de Dombe, Manica, no centro de Moçambique.

No seu discurso, o líder da Renamo insistiu que vai continuar a exigir a criação de autarquias provinciais, como forma de ultrapassar o que alega ter sido uma fraude nas eleições de 15 de outubro de 2014, ameaçando que voltará a paralisar a N1, à semelhança do que aconteceu durante 17 meses, no último conflito com o Governo e que só cessou em setembro do ano passado, com um número desconhecido de mortos e milhares de deslocados.

"Vou parar a estrada e dizer que nenhuma viatura passa hoje", afirmou Dhlakama, do mesmo modo que diz que vai evacuar edifícios públicos e expulsar administradores locais nomeados pelo Governo, "sem fazer guerra e sem bater em ninguém".

O presidente da Renamo voltou a afirmar que já "engoliu muitos sapos" no que chama a sua luta pela democracia em Moçambique e repetiu a ameaça de que, se a Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique, no poder) "continuar a brincar", vai "governar à força".

Dhlkama dirigiu-se ao atual Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, recomendando que não siga os conselhos dos seus antecessores, Joaquim Chissano e Armando Guebuza, por considerar que os tempos mudaram e desta vez tem de ser levado a sério.

A Renamo contesta o resultado das últimas eleições gerais e propõe a criação de autarquias à escala provincial em todo o país, mas pretende governar com efeitos imediatos nas seis regiões onde reivindica vitória eleitoral.

O projeto das autarquias provinciais foi chumbado no parlamento pela maioria da Frelimo, mas Afonso Dhlakama já declarou que este modelo de governação vai avançar "a bem ou a mal".

Lusa, em Notícias ao Minuto

MOÇAMBIQUE INCINERA PELA PRIMEIRA VEZ MARFIM E CORNOS DE RINOCERONTE




O marfim e cornos de rinoceronte incinerados na capital moçambicana, Maputo, foram apreendidos em diferentes ocasiões em vários pontos do país. Ambientalistas consideram a incineração um desincentivo a caça furtiva.

Aconteceu nesta segunda-feira (06.06) a primeira incineração de presas de marfim, cornos de rinocerontes e outras peças da história faunística de Moçambique. Cerca de 2.500 toneladas resultantes da caça furtiva, avaliadas em milhões de euros, estão até agora a ser reduzidas a cinzas.

A inciativa é do ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural e envolve o ministério do Interior. As organizações e ativistas ambientais também participam na qualidade de observadores.

A DW África falou com um deles, Carlos Serra Jr., que começa por destacar esta iniciativa inédita e o seu simbolismo.

DW África: Trata-se de uma iniciativa inédita no seu país?

Carlos Serra Jr.(CS): Sem dúvida, porque anteriormente este ato se resumia a apreensão e depois o armazenamento dos produtos apreendidos “sine die”. A legislação prevê, entre outras soluções que os produtos possam ser alienados em hasta pública. Mas a decisão governamental foi no sentido da sua incineração. Até porque houve sinais de tentativas que nos levaram a crer que, de facto, enquanto não estiverem criadas as condições de segurança necessárias esta é a melhor solução. Portanto, incineração de tudo que foi apreendido nos últimos tempos e passando esta mensagem muito forte para o mundo mostrando o real comprometimento do Governo moçambicano na luta contra a caça furtiva, contra o comércio internacional de produtos faunísticos e contra o crime organizado. Mas também uma mensagem para os sindicatos do crime organizado para deixar claro que o crime não compensa. Foi preciso muita coragem e neste aspeto acho que Moçambique deu um exemplo muito importamte.

DW África: Que quantidade de peças foram hoje queimadas?

CS: A pilha que foi constituída e cujo fogo foi ateado na cerimónia pública dirigida pelo ministro da Terra, Ambiente e do Desenvolvimento Rural, Sérgio Correia, continha marfim na forma de dentes, alguns deles de considerável dimensão, na forma também de esculturas e pulseiras e outros objetos de marfim. Também estão chifres de rinocerontes e alguns objetos feitos a partir desses chifres, para tentar ludibriar as autoridades nas fronteiras. Por outro lado, na pilha estão carapaças de tartarugas marinhas, espécie protegida em Moçambique, patas e caudas de elefantes e outras coisas ainda mais estranhas que têm valor em alguns mercados. Podia-se ainda ver troféus de outras espécies tipo búfalo e mais outros. Isto tudo totalizando mais de duas mil toneladas de produtos faunísticos. O fogo foi ateado ao princípio da tarde desta segunda-feira (06.07) e só terminará quando tudo estiver em cinzas. Devo dizer que faço parte da equipa de observadores que vai permanecer no local até amanhã terça-feira (07.07) e ser rendido por outros colegas.

DW África: E onde está a acontecer esta incineração?

CS: Está a ocorrer no autódromo de Maputo junto à praia. Foi o local escolhido dada a sua dimensão, porque tinha que ser um espaço suficientemente amplo para criar um perímetro de segurança. Estamos num área segura protegida pela força de proteção de recursos naturais e aqui vamos permanecer para que nada ocorra de errado. Só que leva tempo, cerca de 24, 36 ou 48 horas, mas vamos concluir o trabalho.

DW África: O marfim e os cornos de rinocerontes envolvidos no último caso que causou um grande escândalo em Moçambique também foram incinerados hoje?

CS: Sim. Tudo aquilo que não foi desviado está aqui. Foi feito um levantamento minucioso, obedecendo as mais rígidas regras internacionais de organização para dar um destino a esse género de produtos faunísticos e também foram colhidas amostras de ADN para efeito de investigação criminal. Isso foi tudo salvaguardado.

Nádia Issufo – Deutsche Welle

Angola. "Sou tão criminoso quanto eles," diz Agualusa sobre ativistas detidos em Luanda




Escritor angolano diz que também estava envolvido no projeto pacífico que pretendia que automobilistas buzinassem na rua pela democratização do país e maior justiça social. Ele considera que também deveria ser detido.

O rapper angolano Luaty Beirão, um dos 15 jovens ativistas detidos a 20 de junho em Luanda, continua em greve de fome e junta-se assim a Nito Alves que há dias está também sem se alimentar. Ambos encontram-se presos.

O escritor angolano José Eduardo Agualusa mostra-se solidário com os jovens ativistas que estão presos em Angola por alegada tentativa de golpe de Estado. Agualusa afirma que "estava envolvido neste projeto de manifestação," referindo-se àquela que seria uma manifestação pacífica levada a cabo pelos jovens e que acabou por os levar a todos para a prisão.

"O Luaty Beirão, que é uma das pessoas que estão presas e era o principal mentor deste projeto de manifestação, estava a organizar uma manifestação - à qual ele chamou "Buzina Só" - que seria uma manifestação pacífica, apelando aos automobilistas para buzinarem num determinado dia da semana a favor da democratização do país, de maior justiça social etc," revela.

Para o escrito angolano, tratava-se de "uma manifestação absolutamente pacífica, até um pouco ingénua".

Envolvimento de Agualusa

Agualusa diz que ele próprio também colaborou nesse projeto pacífico.

"Ele pediu-me para gravar um vídeo de solidariedade para com este projeto para disponibilizar nas redes sociais, o que eu fiz," relata.

"Nesse sentido, sou tão criminoso quanto eles. Se o Luaty Beirão e os jovens cometeram algum crime, eu também cometi," afirma o escritor.

Quinze jovens estão presos em várias cadeias de Luanda por alegadamente terem estado a planear um atentado contra o Presidente José Eduardo dos Santos e dar-se assim um suposto golpe de Estado.

"O que se está a passar é muito inquietante porque esta detenção não tem base nenhuma sustentável. A acusação é de tentativa de golpe de Estado, o que me parece completamente absurdo," avalia Agualusa.

"Os jovens estavam reunidos a ler um livro, são pessoas que não têm nenhuma ligação ao aparelho militar nem a algum partido, não têm nenhuma possibilidade sequer de pensar em fazer um golpe de Estado. Portanto, esta acusação é completamente absurda e, nesse sentido, é muito preocupante porque está-se a prender pessoas apenas porque estão reunidas tentando organizar uma manifestação pacifica. Isto é um recuo enorme na democratização do país," conclui o escritor.

Para Agualusa, "se um governo tem medo de 15 jovens aos quais acusa de tentativa de golpe de Estado, significa que este regime é extremamente fraco e pode ser, enfim, derrubado facilmente e a qualquer momento sem que nós saibamos muito bem o que vai acontecer a seguir, porque não há partidos políticos de oposição forte."

Falta informação sobre detidos

Em relação aos jovens detidos, a DW-África também falou com Isabel Correia, a mãe de Osvaldo Caholo, um dos jovens que foi detido posteriormente - em sua casa, na quarta-feira passada (01.07) -e está na prisão.

"A Procuradoria-Geral da República, que pronunciou-se, não nos dá nenhum detalhe," lamenta.

"Consegui falar com ele no sábado (04.07). Ele não demonstra tristeza quando vê a família, mas está preocupado. Ele alimenta-se. Hoje fomos lá levar comida, mas não era o dia para visita, então não nos deixaram entrar," revela a mãe de Caholo.

Perguntada sobre o tratamento que tem sido dado ao seu filho na cadeia, Isabel Correia diz que não sabe "se ele está a ser bem tratado".

"Está numa cela, sempre fechado. Isso não é tratamento, para quem não cometeu nenhum crime? Não sabemos onde bater para nos esclarecer, dizem que ele é preso do Presidente e não nos dizem mais nada," dasabafa.

Entretanto, deputados da UNITA, o maior partido de oposição angolana, anunciaram que vão visitar, nesta terça-feira (07.07), os 15 jovens ativistas na prisão.

Manuel Ribeiro – Deutsche Welle

Afropress: UM DECÊNIO DE LUTA POR UM BRASIL DESNUCLEARIZADO DE RACISMO



Alberto Castro* - Afropress, opinião

Todo o aniversário clama por uma celebração, pequena e íntima que seja. No caso da Afropress existem todos os motivos para celebrar em grande e eles se resumem ao simples fato de há dez anos a esta parte a agência aparecer e se manter no ar de forma permanente e estóica na luta por fazer da sociedade brasileira um espaço livre dessa autêntica bomba nuclear chamada racismo que tantas vítimas já causou e continua a causar à humanidade.

É um decênio de participação na linha da frente de uma luta destemida e sem tréguas de Davi contra Golias pela igualdade racial, justiça e inclusão social, política e econômica no Brasil. Um decênio de derrota para os racistas e fascistas que volta e meia a tentaram silenciar e que certamente espreitam uma oportunidade de voltar à carga, com todos os seus fluxos biliares de ódio racial.

Coincide o decênio da criação da Afropress com a o da proclamação da Década Internacional dos Afrodescendentes (2015-2024), instituída pela resolução 68/237 da Assembleia Geral da ONU no dia 23 de dezembro último. Aumenta assim a responsabilidade da agência e a de todos os que a fazemos na árdua e muitas vezes incompreendida tarefa de conscientização das sociedades em que estamos inseridos, dos respectivos governos, quanto à necessidade cimeira de luta sem concessões ao preconceito étnico-racial e ao racismo, à xenofobia e à demais formas de intolerância, principalmente nesta era de insanos extremismos.

No restrito âmbito da luta contra o racismo, poucos são os países que mostram inequívocos comprometimentos e avanços embora todos ou quase todos se vangloriem de suas legislações avançadas neste domínio. Segundo a ONU, em todas as Américas são cerca de 200 milhões as pessoas que se identificam como afrodescendentes cujos antepassados de forma forçada e trágica fizeram desenvolver as nações do norte envolvidas no processo contribuindo para a acumulação primitiva de capital das suas elites enquanto eles e seus descendentes se viam totalmente privados, destituídos de igual possibilidade.

A par dos distintos traços de africanidade herdada, une a esmagadora maioria afrodescendente o retrato da pobreza, da discriminação sociorracial e da consequente marginalização. Une-os também a vontade e a determinação em honrar a memória dos ancestrais, reescrever a narrativa histórica contada sobre eles apenas na perspectiva de seus algozes de um lado e do outro do Atlântico, resgatar e manter vivas as suas manifestações socioculturais que tanto influenciaram o mundo, as Américas em particular, permitindo que resistissem.

Urge por isso retomar o tão combatido debate reivindicativo sobre a reparação para que a justiça seja feita aos que, cativos, foram destituídos de toda as hipóteses de acumulação de riqueza para legar aos seus descendentes.

A história não é um documento morto de importância como muitos, por conveniência política ou ideológica, às vezes a tentam pintar, apagar ou reduzir. São tão válidas as suas páginas mais belas que enaltecem os nossos feitos e que, por isso, mantemos sempre abertas, como as suas páginas mais cruéis. Estas não devem ser simplesmente fechadas e esquecidas para, de uma forma confortável e cobarde, fugirmos para a frente pensando que assim nos libertarmos dela.

Acontecimentos recentes e bem presentes um pouco por todo o mundo demonstram que cedo ou tarde ela retorna e pode ser terrivelmente punidora quando não aprendemos as suas lições. Basta ver o insulto para toda a humanidade que são as tragédias quase cotidianas no mar Mediterrâneo enquanto políticos europeus egoístas, para dizer o mínimo, alguns com frescas responsabilidades históricas e morais, esgrimem entre si argumentos sobre quem acolhe quem e quem não acolhe ninguém.

A riqueza e o conforto que hoje desfrutam anestesiou-os, não os permite acordar e olhar criticamente as páginas da suas própria história. Vale que ela, implacável, acaba um dia por fazê-los acordar para a leitura de suas páginas descartadas. E isso normalmente acontece à duras penas.

Voltando ao decênio da Afropress, durante o mesmo o mundo viu os EUA elegerem por duas vezes Barack Obama, sem dúvida um tremendo avanço num país de doloroso caminho na luta pela igualdade racial. Mas os que se apressaram a enaltecer apenas as grandes virtudes da América anunciando apressadamente o feito como sendo a inauguração da sua era pós-racial desiludiram-se. Testemunharam recentes acontecimentos com raízes em ódio racial em que o massacre numa igreja de Charleston foi a tragédia maior. Como o próprio Obama reconheceu, os EUA têm um problema com o racismo que não encontra paralelo em sociedades igualmente desenvolvidas. Um problema que mostra a necessidade de um novo e revigorado movimento pelos direitos civis dos negros. 

Foi um decênio em que o mundo viu o jovem britânico Lewis Hamilton quebrar as barreiras raciais num desporto até então apenas branco e sagrar-se bicampeão mundial de Fórmula 1. Viu o igualmente britânico Steve McQueen fazer história com o filme ''12 Anos de Escravidão'', tornando-se no primeiro diretor negro a ganhar o Oscar desde que a maior premiação do cinema mundial foi instituída em 1929.

Mas, a mesma Inglaterra marcadamente multicultural que produziu Hamilton e McQueen ainda não erradicou atitudes doentias de gente como alguns adeptos do Chelsea que impediram um homem de entrar no metrô de Paris, por ser negro. A mesma Inglaterra generosa de abolicionistas e humanistas como William Wilberforce e Olaudah Equiano, tem hoje um primeiro ministro que se recusa a receber refugiados de suas outrora espoliadas colônias. 

O decênio viu também belezas negras como a angolana Leila Lopes (2011), a queniano-mexicana Lupita Nyongo'o (2012) e a japonesa Ariana Miyamoto (2015) quebrarem barreiras estéticas num universo fértil em preconceitos raciais ao serem eleitas, respectivamente, Miss Universo, mulher mais bonita do mundo e Miss Japão, pese embora todos os simbolismos, negociatas e marketing existentes em torno desse tipo de controversos eventos. 
   
A própria África sub-subsahariana, ainda a braços com a cura de profundas feridas do recente colonialismo, viu a Zâmbia ter um vice-presidente branco, Guy Scott (2011-2014), que se tornou presidente interino (2014-2015) por falecimento do titular Michael Sata. E ele não foi o primeiro africano branco a liderar um país democrático na era pós-colonial do continente. Esta distinção vai para Paul Bérenger, primeiro-ministro das Maurícias entre 2003 e 2005, atualmente líder da oposição. Certamente nem um e nem o outro serão os primeiros e últimos africanos brancos a assumir o topo do destino dos seus países. 

No Brasil, o decênio da Afropress viu Joaquim Barbosa no comando da mais alta Corte do país. Mas testemunhou também no governo Dilma o desaparecimento de faces negras, ao contrário do que prometia o governo Lula que deu visibilidade a quatro ministros negros: Benedita da Silva, Gilberto Gil, Orlando Silva e Matilde Ribeiro.

Resta agora Nilma Gomes que substituiu Luiza Bairros como titular da SEPPIR, uma Secretaria de segundo escalão com categoria ministério, uma espécie de reserva ministerial para negros. Algo vai muito mal num país de maioria negra que produziu Barbosa mas não encontra negros à altura para ministérios de primeiro escalão.

Enquanto isso, países europeus como a França e a Grã-Bretanha cuja população negra ronda mais ou menos 3%, respectivamente, vêm integrando mais representantes de minorias étnicas que o Brasil em seus elencos governativos, incluindo o primeiro escalão. A título de exemplo, Christiane Taubira, ministra da justiça é simplesmente a terceira figura mais importante na hierarquia do governo francês. 
    
Foram aqui apontados apenas alguns exemplos que mostram que foi possível driblar o racismo e progredir um pouco por todo o mundo, outros que mostram o contrário e outros que se apresentam muito preocupantes. A estes acrescento, no caso brasileiro, a intolerância para com religiões de matriz africanas e o número cada vez mais preocupante de jovens negros que, tal como nos EUA, têm suas vidas ceifadas de forma prematura e brutal por forças de segurança que refletem um racismo estrutural e institucional profundamente enraizado nas respectivas sociedades e mais ou menos presente um pouco por todo o mundo.

À Afropress, sua equipe de jornalistas e colaboradores nas mais diversas áreas, e ao Dojival Vieira em particular, seu mentor e editor, uma palavra de reconhecimento, agradecimento e incentivo à continuação da luta desigual e sem tréguas contra o racismo, essa bomba nuclear de múltiplas consequências que faz perigar o futuro da humanidade no seu progresso e na sua sã convivência.

Estamos juntos e misturados para mais uma década de batalhas incessantes.  

*Alberto Castro (na foto) é correspondente de Afropress em Londres e colabora em Página Global

Brasil. RESISTE IZIDORA: 30 MIL AMEAÇADOS DE DESPEJO EM BELO HORIZONTE



Bárbara Ferreira – Carta Capital

A intransigência da Prefeitura e de uma construtora podem causar uma mega-desocupação e a destruição de centenas de casas; área é 7 vezes maior que o Pinheirinho

Em meio a um enredo que envolve Prefeitura, governo do estado, governo federal e iniciativa privada, Belo Horizonte hoje é palco de um dos maiores conflitos territoriais urbanos do Brasil: cerca de 30 mil pessoas podem ser despejadas e ter suas casas destruídas. A reintegração de posse, pedida pela Prefeitura e autorizada pela Justiça Mineira, está suspensa por decisão liminar do Superior Tribunal de Justiça (STJ) expedida no dia 29 de junho (segunda-feira). A decisão judicial não é definitiva. Se a liminar for derrubada no STJ, a desocupação pode ocorrer a qualquer momento.

Batizada de Izidora, a ocupação mineira é formada por 3 vilas interligadas (Esperança, Rosa Leão e Vitória) e tem cerca de 20 mil pessoas a mais que a paulista, quase todas morando em casas de alvenaria.

A enorme área da Mata do Izidoro, na região norte da capital mineira, é sete vezes maior do que o terreno onde ficava Pinheirinho, a ocupação em São José dos Campos, interior de São Paulo, desocupada em 2012 em uma ação violenta da Polícia Militar. O Pinheirinho tem 1,3 milhão de metros quadrados e Izidoro, 9,5 milhões. Na ocupação mineira há ainda cerca de 20 mil moradores a mais.

O prefeito Márcio Lacerda, do PSB, pretende construir na área 13 mil apartamentos populares com verba do Programa Minha Casa Minha Vida –a maioria tem dois quartos e 43 m². As obras ficariam a cargo da Direcional Engenharia e a família Werneck, antiga proprietária do terreno, receberia dividendos da construtora.

No caminho do empreendimento imobiliário encontra-se, porém, gente como a assistente de pedreiro Silvana Vitória da Silva. Sem emprego fixo, ela ganha aproximadamente um salário mínimo por mês e viu na ocupação uma saída para fugir do aluguel. “A gente conhece todo mundo. Criei uma nova família e não quero deixá-la.”

Depois de quase um ano de negociações tensas e ao cabo malsucedidas entre a prefeitura, os moradores e a construtora, com intermediação do governo estadual, o pedido de reintegração de posse chegou às mãos da Polícia Militar no dia 18. Na iminência de verem suas casas destruídas, os moradores recorreram ao governador Fernando Pimentel. 

Tentam estimular a gestão petista a repetir um gesto de Itamar Franco, que durante seu governo, entre 1999 e 2002, impediu a PM de realizar despejos de populações pobres. Parece pouco provável. “Aceitar a proposta do movimento, que é manter e urbanizar a ocupação, não depende do governo do estado. Para ocorrer alguma mudança, a prefeitura e o empreendedor têm de ceder”, afirma Claudius Vinicius Leite Pereira, presidente da companhia estadual de habitação e um dos mediadores na negociação.

Segundo um dos coordenadores do Movimento Resiste Izidoro, Leonardo Péricles, a prefeitura é a responsável pela situação e nunca se mostrou disposta a negociar. “Eles fazem campanha contra as ocupações, criminalizam o movimento.”

Por meio da assessoria de imprensa, a prefeitura informa ter encerrado as negociações e não pretende retirar o pedido de reintegração de posse. Para Lacerda, as ocupações Rosa Leão, Esperança e Vitória são coordenadas por grupos políticos radicais que defendem uma moradia conquistada “na marra”. “Eles estão orientados por pessoas equivocadas, de profissões religiosas, de gente da universidade e eu acho que o governo do estado está no caminho certo ao cumprir a reintegração de posse.”

Por enquanto, a única proposta concreta na mesa é realocar as famílias nos prédios a serem construídos na região. A ideia seria remanejar os moradores da Ocupação Vitória para a área onde está instalada a Esperança, o que permitiria executar a primeira etapa das obras. Durante o período entre a desocupação e a construção do empreendimento, os moradores construiriam moradias temporárias subsidiadas pelo governo estadual.

As famílias se opõem. A comunidade, afirma Péricles, está consolidada e aceitar um apartamento do programa seria um retrocesso. “O Estatuto das Cidades prevê a realocação para locais com estrutura igual ou superior às instaladas anteriormente, e não é isso o que vai acontecer. Além disso, alguns moradores não se encaixam no perfil do programa. É o caso de quem mora sozinho. Queremos contemplar a todos.”

Em nota, a Direcional Engenharia afirmou que a estrutura para onde as famílias seriam levadas é infinitamente superior àquela das atuais ocupações. “Teremos lá toda a infraestrutura necessária, como abastecimento de água e esgoto, implantação de sistema de drenagem, de energização e iluminação pública e privativa, além dos equipamentos comunitários, como escolas, postos de saúde e áreas de lazer.”

Professor da Universidade Federal de Minas Gerais, o urbanista Roberto Andrés critica a remoção. “São 8 mil famílias que em sua maioria não têm para onde ir e vão lutar para permanecer no local. É uma verdadeira tragédia social, que o prefeito parece ignorar, com conivência do governo estadual e da Justiça.”

As famílias prepararam-se para o conflito. Os moradores estabeleceram um esquema de vigília de 24 horas, para evitar serem pegos de surpresa pela polícia. Organizações sociais e líderes do movimento montaram acampamento no local e organizam a arrecadação de mantimentos e roupas.

As ameaças de despejo não são recentes. No ano passado, a PM chegou a montar uma operação. Um helicóptero despejou folhetos na ocupação com instruções para a saída dos moradores. A ação acabou suspensa, talvez por se tratar de período eleitoral. Uma tragédia, com mortos e feridos, afetaria as pretensões dos tucanos Antonio Anastasia, então governador, e Aécio Neves, presidenciável. O cenário agora é outro.

(colaborou Victor Diniz)

Na foto: A zona da mata do Izidoro, na zona norte de BH, abriga as três ocupações que, juntas, ganharam o nome de Izidora

Angola. “As prisões arbitrárias são um grande retrocesso” – Walter Tondela, advogado




Walter Tondela é o responsável pela defesa de sete dos quinze activistas detidos o mês passado em Luanda. A equipa inclui outros seis advogados.

Walter Tondela é o responsável (a equipa inclui outros seis advogados) pela defesa dos activistas Luaty Beirão, Hitler Samussuku, Albano Evaristo Bingo Bingo, Afonso Matias “Mbanza Hamza” e Sedrick de Carvalho.

A história já é conhecida. No dia 20 de Junho, 13 jovens (os restantes são Manuel “Nito” Alves, José Hata, Inocêncio Brito “Drux”, Fernando Tomás “Nicola”, Nelson Dibango, Arante Kivuvu, Nuno Álvaro Dala, Benedito Jeremias, que ainda não têm advogado) reuniram-se numa residência da Vila Alice. Analisavam e discutiam um livro. Pensavam em formas de mudar o país. Osvaldo Caholo e Domingos da Cruz foram detidos nos dias seguintes – e também são clientes de Walter Tondela.

Foram, de certa forma, surpreendidos com um efectivo policial totalmente armado e que interditou várias ruas. Foram detidos – para a maioria, os problemas com a Polícia começaram no dia em que decidiram ser críticos da liderança do país. No dia em que quiseram manifestar-se contra o marasmo.

Ainda no dia 20 de Junho, Luaty Beirão foi levado a sua casa para que a Polícia pudesse recolher material informático e livros. Parte desse material não lhe pertencia – era da esposa. Fala-se em flagrante delito.

Concorda com as alegações da Procuradoria-Geral da República (PGR) quando diz que os 15 detidos foram apanhados em “flagrante delito” – e depois são conhecidos os mandados de captura?

Como é que podemos assumir um flagrante delito se depois o Serviço de Investigação Criminal (SIC) divulgou os mandados de captura? Não se compreende esse paradoxo entre o flagrante delito e o mandado de captura.

Se alguém é apanhado a cometer um crime em flagrante delito não é preciso mandado de captura para ser detido?

Não. O flagrante delito diz respeito a uma acção criminal praticada e identificada pela Polícia. Se já existiam mandados de captura logicamente não faz sentido falar em flagrante delito. Tudo isto é contraditório. Os meus clientes estavam a ler um livro de um autor norte-americano chamado Gene Sharp. O livro chama-se “Da ditadura à democracia – Uma abordagem conceptual para a libertação”. Como deve compreender, a leitura e a interpretação de qualquer livro – tenho à minha frente o código de direito canónico e também costumo fazer as minhas interpretações – não constitui nenhum delito criminal. Crime é toda a acção típica, dolosa e punível pela lei penal. Fazer leituras em grupo não é crime nenhum, seja qual for o livro.

Então que conclusões podemos tirar deste caso – temos uma forte acção policial, que prendeu 13 cidadãos que estavam numa casa a ler um livro (posteriormente, outros dois cidadãos foram também detidos – Domingos da Cruz e Osvaldo Caholo)?

A conclusão a que chegamos é que houve muitas arbitrariedades. Todos foram detidos mas a Constituição, nos termos do artigo 64.º e seguintes, diz que no momento em que o cidadão é detido pela Polícia tem de lhe ser exibido o competente mandado de captura.
  
Mas entretanto surgiram alguns documentos nesse sentido, alegadamente provenientes do SIC. Quando os seus clientes foram detidos receberam algum documento ou mandado de captura?

Não. Nestas situações a Polícia deve também, segundo a lei, explicar as razões da detenção e deixar que os detidos se comuniquem com os familiares ou com o advogado – se tiverem advogado constituído. Estas formalidades todas foram imediatamente violadas.

Osvaldo Caholo é militar no activo, supostamente da Força Aérea Nacional. Isto muda alguma coisa na abordagem jurídica do seu caso?

Falei com alguns colegas que me estão a acompanhar na equipa de defesa e a conclusão a que chegamos é que a responsabilidade criminal é individual. A reflexão que fazemos é que este jovem, que nem se encontrava na casa da Vila Alice, foi detido alguns dias depois apenas por ser amigo dos outros jovens. Todos temos amigos ligados às forças de segurança. E aparece no processo, no nosso entendimento, para sustentar a ideia que o grupo até tinha militares a querer atentar contra o Estado. Foi uma detenção para fundamentar o caso.

O objectivo é dar mais força à acusação, por envolver um elemento das Forças Armadas?

Sim, para dar mais força ao processo. Tanto mais que a própria comunicação social pública até enfatiza a situação: “com realce a um oficial das Forças Armadas”. É incompreensível.

Julga que estão a utilizar todos os argumentos possíveis para compor o processo?

Talvez. Porque nos interrogatórios que acompanhei não havia matéria criminal. Deveria subsistir o princípio “in dubio pro reo”: em caso de dúvida, as decisões devem reverter a favor do réu. Parece que começa a ser um risco, principalmente para os jovens, que os cidadãos se encontrem para reflectir qualquer matéria relativa ao país. Porque daqui a pouco qualquer tipo de reflexão será olhada como um atentado – se a pessoa for a uma discoteca, a uma festa, se beber muito, se incomodar as pessoas com barulho, aqui já é tudo normal. Mas os jovens que estão a estudar ou a ler são um perigo. Isto desincentiva as pessoas que querem seguir o caminho do saber, da leitura, da actividade intelectual. Há uma contradição de valores.

Como analisa o posicionamento do Procurador-Geral da República, João Maria de Sousa, ao longo dos últimos dias?

Eu acompanhei os interrogatórios do Nito Alves, do Luaty Beirão, do Domingos da Cruz e do Evaristo Bingo Bingo. Em todos os interrogatórios, apesar de terem sido feitos em separado, tive o cuidado de dizer ao procurador responsável pelo caso que não havia nenhuma matéria criminal. O magistrado respondeu que há matéria criminal: as provas. Isto está a complicar bastante o trabalho da defesa. Ficamos sem compreender quais são as provas. Só que Sua Excelência, o Procurador-Geral da República (conforme foi possível acompanhar pela TPA) foi apresentar eventuais provas, ou factos relativos ao processo, aos grupos parlamentares. Ficamos sem compreender esta atitude.

Porquê?

Este é um processo judicial ou é um processo político? O parlamento é um órgão legiferante por excelência, onde está expressa a vontade popular sufragada nas urnas. Ali está o poder legislativo (que é o poder político). O poder judicial é soberano e independente. Enquanto mandatários e defensores oficiosos não nos foram ainda apresentadas quaisquer evidências (até porque o processo está em segredo de justiça). Sendo assim, como é possível terem apresentado eventuais provas ao poder político?

A própria PGR, ao fazer este tipo de diligências junto da Assembleia Nacional, poderá estar a violar o segredo de justiça?

Sim, em sentido lato podemos dizer que sim. Numa fase em que decorrem as devidas investigações estão a apresentar provas ao sector político do país… No sentido lato da palavra, admitimos que a PGR está a violar o segredo de justiça.

José Eduardo dos Santos falou sobre o caso na passada quinta-feira (2 de Julho), na reunião do Comité Central do MPLA, e disse que quem quer atingir o poder por “via da força não é democrata”. Lembrou o 27 de Maio de 1977. Deu a sua opinião. Mas o caso ainda nem foi julgado, o que significa que os detidos são inocentes (até que a sentença transite em julgado). Que análise faz destas declarações?

Enquanto técnico de Direito e como advogado não gosto de politizar o Direito. Prefiro jurisdicionalizá-lo e, como não pude acompanhar os posicionamentos de Sua Excelência, não tenho ainda comentários a fazer. Sobre os aspectos políticos, e como apartidário que sou, assumo que o meu partido é a Igreja Católica. E o meu líder é Jesus Cristo.

Quais são os próximos passos que a defesa vai seguir? Sabemos que a lei permite a detenção preventiva por 30 dias (com uma possível prorrogação) sem acusação formada.

A lei prevê 30 dias de prisão preventiva. Na nossa opinião, o legislador constitucional defende a liberdade das pessoas. Então não conseguimos entender esta detenção. Todos são réus primários, são muito jovens, e se a lei nos termos do Artigo 28º (Crime contra a segurança do Estado) admite que o crime tenha uma pena de prisão até três anos, também admite a liberdade provisória ou a conversão da pena em multa de 360 dias. Actualmente estão a privar os cidadãos de um direito fundamental. Seria perfeitamente normal restituir-lhes a liberdade – é de lei – e as eventuais investigações poderiam continuar. Dentro deste contexto estivemos, no dia 1 de Julho (quarta-feira), na penitenciária onde os jovens estão detidos. E logo com um incidente preocupante. Chegamos por volta das 14 horas e encontramos o Oficial Superior de serviço.

O que aconteceu?

O senhor oficial Manuel Hoji, acompanhado pelos adjuntos Alfredo Marques e Firmino Bunga, disse-nos, a mim, ao meu colega Emanuel Rafael (que também faz parte da equipa de defesa) e ao Kyari Duarte (irmão do Luaty Beirão) que o acesso aos presos estava interdito. O Oficial Superior alegou que tem ordens superiores nesse sentido. Lembrei-lhe que a Constituição garante o direito dos advogados se comunicarem privadamente com os seus clientes. Foi-nos interdito esse direito. É um problema sério para a defesa. Porque neste momento apenas o Domingos da Cruz tem procuração junto aos autos – a confirmar que eu sou o seu representante – e apenas por uma questão de lógica: há dois anos ele enfrentou um processo na justiça que foi defendido pelo nosso escritório. Os restantes continuam sem advogado formalmente constituído por falta de uma procuração.

Esse facto limita as acções da defesa porque, formalmente, os detidos ainda não têm advogado.

Nos interrogatórios do Luaty Beirão, Evaristo Bingo Bingo e Nito Alves assinei como defensor oficioso. Se tivéssemos as procurações, seria nossa pretensão dar entrada, na semana passada, de um recurso relativo à detenção dos meus clientes. No dia 1 de Julho fomos até à Penitenciária de Calomboloca para resolver esta situação. Apelei à Constituição, mostrei-lhes alguns artigos e o oficial disse-nos que a Constituição, neste momento, não serve para nada. Que, neste momento, a única coisa que se está a cumprir são as tais ordens superiores. Estamos a falar de um Oficial Superior. A Constituição é a carta magna do país e temos um oficial a colocá-la de parte e a ter uma posição anti-constitucional.

Ou mesmo anti-republicana.

Sim. O Oficial Superior disse-nos, claramente, que a Constituição, neste momento, não serve para nada. Agora é que ficamos mesmo sem compreender o que se passa. Segunda-feira [hoje] vamos voltar à penitenciária. Estou a finalizar uma informação sobre o sucedido para o bastonário da Ordem dos Advogados. Para informá-lo deste incidente e para que possa haver alguma intervenção. Não estamos a conseguir fazer o nosso trabalho. O Oficial Superior, o senhor Manuel Hoji, (a ser verdade a orientação) está a negar justiça aos cidadãos detidos. Porque praticamente nos disse que eles não têm direito a defesa.

Quem transmitiu as tais ordens superiores? Tentou saber?

O Oficial não referiu a proveniência. A única excepção que o Oficial admitiu passava pelos advogados levarem uma procuração assinada pela PGR. Como todos sabemos, a PGR é uma instituição do Estado. Mas a Ordem dos Advogados é uma instituição independente. O exercício da profissão não está dependente de autorização da PGR. Aliás, estão na lei e na própria Constituição as imunidades e as garantias dos advogados. É inadmissível. Porque já não estamos na fase em que o colectivo de advogados do país dependia do Ministério da Justiça. Somos uma organização independente que não carece de autorização para trabalhar. Não é a PGR que tem de dizer o que o advogado pode, ou não, fazer. Os advogados não são funcionários da PGR. Aliás, a procuradoria é incompatível com a prática da advocacia.

Os detidos poderiam aguardar o desenvolvimento do processo em liberdade?

A lei, e estamos a falar do decreto número 23/10, de 3 de Dezembro (Crimes contra a Segurança do Estado), artigo 28º, diz claramente que este tipo de crimes são punidos com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias. Eles foram indiciados de terem praticado actos preparatórios de rebelião e de atentado contra o Presidente da República e outros órgãos de soberania. É óbvio que a PGR pode muito bem fixar uma caução equivalente a 360 dias para se restituir a liberdade aos cidadãos – até porque eles gozam da presunção de inocência até que a sentença transite em julgado. Até ao momento presume-se que os meus clientes são inocentes. Se essa presunção constitucional funciona até ao trânsito em julgado, a prisão preventiva parece-me um atentado à nossa justiça.
  
Também não são pessoas perigosas ou, pelo menos, que se saiba, não apresentam qualquer historial de violência.

Também não é o caso. Aliás, um dos grandes objectivos do direito penal moderno é a ressocialização. A privação da liberdade é a última instância – e é entendida como um procedimento necessário para que o indivíduo volte a ser útil à sociedade. Veja que a actividade intelectual que eles estavam a produzir é bastante útil. Numa província como Luanda, onde existem tantos delinquentes, o Ministério Público utiliza a figura da caução a vários níveis. Mas a estes jovens intelectuais, e alguns deles são professores, estão a privá-los de um direito fundamental.

A questão é que, ao longo da história de Angola, são variados os momentos de divisão. Nunca deixaram de acontecer. Que sinais podemos retirar destes factos, quando seria expectável que se vivesse um ambiente diferente, onde o foco estivesse no reforço do processo democrático e da abertura política?

É uma questão muito pertinente. Julgo que todos pretendemos construir, em Angola, uma democracia e um espaço de liberdade. As detenções e as prisões arbitrárias são um grande retrocesso. Devemos compreender que as diferenças não devem servir para nos separar, mas sim para nos unir. Uma sociedade uniformizada é uma sociedade infeliz. A diferença entre as pessoas deveria ser um motivo de satisfação. Todos estes jovens se assumem como apartidários.
  
Não são filiados em nenhum partido político?

Nada. Em nenhum partido. E todos eles têm menos de 35 anos – não têm nenhuma ambição para alcançar o poder. Apenas querem contribuir para a consolidação da democracia. Querem o melhor para os angolanos. É um paradoxo. Eles deviam ser aproveitados para dignificar ainda mais o país.
  
Ainda por cima esse é o discurso oficial: que os jovens devem estudar, ler, envolver-se nas questões do país e contribuir para um futuro melhor.

Tem de haver espírito crítico. Em sociedades democráticas as críticas são normais. Pensar diferente é um acto democrático e de cidadania. Neste caso há uma inversão de valores. Estudar e discutir um livro é entendido como um acto contrário à ordem pública – quando vemos pelas ruas meliantes, crianças fora do sistema escolar, falta de medicamentos. Estes jovens, quando se manifestaram nos termos do artigo 47.º da Constituição, que também prevê a liberdade de reunião, foram sempre detidos. Mas estavam a exercer um acto de cidadania. Daqui a pouco vamos ter uma sociedade com tantas sombras à volta de alguns poderes (e até nas forças policiais) que nem dentro da nossa casa teremos privacidade.

Pegando neste caso como exemplo, podemos chegar ao ponto de nos baterem à porta de casa para perguntar qual é o livro que estamos a ler.

É isso. Qualquer dia fazem uma lista com o que se pode e não pode ler.

Rede Angola - Miguel Gomes (Texto) e Ampe Rogério (Fotografia)

Angola. GOVERNO PREMEIA A USOKO




O Governo angolano concedeu o estatuto de instituição de Utilidade Pública à associação dos funcionários dos serviços secretos do país, numa altura em que os critérios destas decisões têm vindo a ser questionados pela oposição.

Adecisão consta de um despacho presidencial de 29 de Junho e atribuiu este estatuto e respectivos benefícios à associação mutualista Usoko, que, lê-se, tem por finalidade “assegurar a protecção social complementar e a solidariedade social dos funcionários dos Serviços de Inteligência e Segurança do Estado”.

O despacho reconhece ainda que os objectivos e propósitos da Usoko “abrangem todo o território nacional” e que esta decisão, tendo em conta os “fins de interesse geral” que a associação persegue, mereceu o parecer favorável do Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos.

O governo aprovou, em Março último, a atribuição do mesmo estatuto à associação União das Associações Locais de Angola (Amangola), tendo a UNITA criticado a decisão. Alegou nomeadamente tratar-se de uma ramificação do partido no poder desde 1975, o MPLA.

A UNITA recordou a existência de outras associações que operam no país como “verdadeiros” auxiliadores do Estado, citando os exemplos da “Mãos Livres” ou da Associação Justiça Paz e Democracia, críticas das políticas do Governo e com forte intervenção cívica, que continuam sem ter acesso ao referido estatuto e apoios estatais previstos.

Folha 8 (ao)

Angola. “HÁ PROGRESSOS NO RESPEITO DOS DIREITOS HUMANOS” – Bento Bembe



Óscar Silva - Angop

As condições que a paz propicia ao exercício dos Direitos Humanos, os serviços disponibilizados pelo Executivo em matéria de necessidades básicas para a dignidade do cidadão, a criminalidade, a humanização das cadeias e a vulnerabilidade das crianças e mulheres diante do tráfico de seres humanos e da prostituição, são aspectos apontados, em entrevista à agência Angop, pelo secretário de Estado dos Direitos Humanos, António Bento Bembe.

Angop –  Angola vai comemorar 40 anos de Independência. Como caracteriza a situação dos direitos humanos no país?

António Bento Bembe – Todos nós, angolanos, estamos a viver a evidência dos progressos alcançados no quadro do respeito, da defesa e promoção dos direitos humanos. Mas o exercício dos direitos humanos vem-se concretizando, cada vez mais, após o alcance da paz em todo o país. Simplesmente, é nesta condição que podemos dizer que estamos agora em melhores condições de tratar de forma séria e responsável esta temática dos direitos humanos. Como se pode ver, graças à paz, temos conseguido pôr ao alcance das populações aquilo que pode garantir as melhores condições de vida. As condições em que Angola ficou mergulhada logo depois da Independência não permitiram que os dirigentes do país pudessem tratar, de uma forma dedicada, do respeito e da promoção dos direitos humanos, matéria que agora abordamos, uma vez conseguida esta paz. Há progressos que temos vindo a registar no quadro da defesa e promoção dos direitos humanos. Quando falamos da promoção dos direitos humanos não é teoria, mas é uma questão prática, é uma forma  de concretizar aquilo que dignifica a nossa população. Hoje podemos ver em todas as províncias a construção de fogos habitacionais, podemos ver, constantemente, novas escolas a serem erguidas, hospitais inaugurados, enfim, várias infra-estruturas sociais que são construídas em benefício da população. O Executivo tem estado agora a oferecer os serviços que constituem as necessidades básicas ou fundamentais para que o povo possa viver com dignidade.

Angop –  Ao falar das necessidades básicas para que um povo possa viver com dignidade, imediatamente estamos a falar dos direitos humanos. Como é que as estruturas do Estado se têm interligado umas com as outras?

ABB –   O Executivo cumpre as suas obrigações no que diz respeito às acções relacionadas com a defesa e protecção dos direitos humanos, quando se constroem  escolas, hospitais, estradas, pontes, se distribui água e electricidade às populações. Mas é preciso saber que o tempo ainda não é suficiente para podermos dizer que todo o cidadão está à altura de poder contribuir para o respeito dos direitos humanos com vista à dignidade dos angolanos. É preciso tempo e formação para que a população possa compreender e, gradualmente, ultrapassar situações que ainda são registadas em algumas instituições. Nessas instituições confiamos uma certa tarefa, mas ainda temos funcionários que não entendem que o cidadão é o centro da vida pública. Há muitos funcionários que ainda não entendem este pressuposto. É preciso um trabalho sério de formação constante. É por isso que temos estado a divulgar uma série de actividades para inculcar o sentido de humanismo nas pessoas, com vista a inculcar o princípio dos valores da cultura dos direitos humanos e da dignificação da pessoa humana, isto é, inculcar o humanismo de maneira a permitir que essas pessoas, em primeiro lugar, sejam elas conscientes de que têm direitos e ao mesmo tempo sujeitam-se a compromissos e responsabilidades a assumir em relação à defesa e promoção dos direitos humanos.

Angop –  Como é materializada a cultura de respeito dos direitos humanos?

ABB – Estamos a falar de uma educação para inculcar valores, processos e modelos de comportamento para que as pessoas sejam capazes de dignificar-se a si próprias e a outro ser humano. É um conjunto de valores que temos estado a transmitir a cada cidadão, valores básicos para uma convivência harmoniosa e pacífica numa sociedade justa, livre e democrática. A educação é um processo que começa desde a infância nos lares e continua na escola, na igreja, na comunidade e assim, sucessivamente, ao nível da Nação. É uma cultura indispensável, porque a educação constrói-nos. É necessária esta acção para inculcarmos valores, para fazer com que os nossos cidadãos se sintam responsáveis e possam contribuir para uma sociedade cada vez mais justa, harmoniosa e pacífica.

Angop –  Como é feita a educação para a promoção dos direitos humanos?

ABB –  Estamos a dar bons passos, como certamente tem acompanhado, e os órgãos de comunicação social têm divulgado as notícias sobre a promoção dos direitos humanos. Neste contexto, estamos a realizar seminários, mesas redondas e outras acções com vista a transmitir conhecimentos sobre os direitos humanos a todos os cidadãos. Gradualmente, os cidadãos angolanos estão a tomar consciência de que têm direitos e responsabilidades relativas à tarefa de construção de uma sociedade pacífica, democrática, de paz e justa.

Angop –  Considera que a população já está satisfeita com o direito à habitação?

ABB –   Não podemos contentar toda a população de uma única vez, porque este tipo de direitos, como o da habitação, está incluso nos direitos sociais e económicos, os quais são cumpridos através de acções do Estado, mas consoante as condições financeiras. É verdade que o cidadão nem sempre acredita quando os órgãos estatais anunciam que existe escassez de condições financeiras, mas o Estado tem de fazer as coisas de acordo com as prioridades, devido às limitações com que se debate. Contudo, podemos ver como há projectos habitacionais espalhados por todo o país. Isto para dizer que, de uma forma gradual, vamos dando resposta às necessidades dos cidadãos. Grande parte dos cidadãos está satisfeita com as centralidades que estão a ser erguidas, um pouco por todo o território nacional, aos quais se unem os que têm beneficiado de outros bens que o Estado tem posto à disposição da população, tendo em conta a melhoria das condições de vida e a dignidade do povo angolano.

Angop –  Tem andado por várias províncias e visitado muitas unidades penitenciárias. Pode falar-nos um pouco da humanização das cadeias?

ABB –   Comecei este trabalho de visita às unidades penitenciárias desde que fui integrado no Executivo, em Setembro de 2007, primeiro nas vestes de Ministro Sem Pasta. Em 2010 fui nomeado secretário de Estado para os Direitos Humanos e até hoje tenho estado a fazer este trabalho e entendo bem como é que as coisas estão em todo o país. No princípio, visitei unidades penitenciárias que estavam em condições socialmente más, mas hoje registamos um grande progresso. O Ministério do Interior, que tem esta incumbência de lidar com a humanização das unidades penitenciárias, tem estado a fazer o seu trabalho. A maior parte das províncias hoje já tem unidades penitenciárias novas ou de raiz ou reabilitadas, com condições mais humanas. A humanização das unidades penitenciárias está a concretizar-se, porque actualmente os reclusos já não vivem num meio sujo. As unidades penitenciárias são novas. Porém, para nossa infelicidade, os índices de criminalidade não diminuem e o que vemos é que, anteriormente, havia unidades com uma capacidade de albergar 300 homens e o Ministério do Interior, no âmbito da humanização das cadeias, construiu unidades que albergam 500 homens. Mas hoje, da mesma forma que estava superlotada com 300 homens de capacidade, está superlotada com 500. O problema que temos é o elevado índice de criminalidade, que não volta para trás. Na maior parte das províncias o índice de criminalidade é elevado, apesar de em algumas se registar diminuição. O trabalho para a humanização das cadeias está a ser feito com três refeições diárias, extensão dos serviços de saúde, espaços de lazer, formação profissional, tendo-se criado espaços para a educação, com a construção de escolas nas unidades penitenciárias. As condições humanas nas unidades penitenciárias angolanas estão acauteladas.

Angop –  O que está a ser feito pelo Executivo para diminuir o índice de criminalidade?

ABB –  A única coisa que os Direitos Humanos podem fazer para ajudar a atenuar o índice de criminalidade é o que temos estado a fazer, sensibilizar e mobilizar. No âmbito da cultura para a promoção dos direitos humanos, procuramos dar ênfase à dimensão da pessoa humana, o valor humano e, igualmente, ensinamos que actualmente o princípio prevalecente é que o futuro das pessoas depende do comportamento de cada um –  inclusive, a educação técnica, sem ética, de nada vale –  de forma a mostrarmos a todos os cidadãos, sem excepção, que os princípios dos direitos humanos são assentes na dignidade da pessoa humana. Nós perdemos a protecção dos nossos próprios direitos lá onde violamos os direitos dos outros, facto que significa que toda a pessoa que não considera a causa dos direitos humanos como prioridade transforma-se em inimigo da sua própria existência. Se na sua vida, no seu comportamento e nas suas acções você transgride os direitos e a dignidade dos outros, significa que se está a transformar em inimigo da sua própria existência. Temos estado a ensinar e junto daqueles que têm estado a cometer vários tipos de crimes temos insistido que, por causa deste tipo de acções e de condutas estas pessoas se transformam em inimigos de si próprios.

Angop –  Como estamos em casos de tráfico de seres humanos?

ABB –   O Estado assumiu compromissos internacionais no âmbito da defesa e protecção dos direitos humanos. Tem a obrigação de criar medidas para a protecção dos direitos humanos dos cidadãos. Neste contexto, existem órgãos que intervêm na administração da justiça, como a polícia, os tribunais, os quais são sensibilizados para cumprirem as suas obrigações na defesa dos direitos dos cidadãos. O Estado tem posto à disposição dessas instituições as condições que possam permitir realizar as suas actividades, juntando-se a isso a sensibilização dos cidadãos para acorrerem a uma mesa redonda com vista a prestarem muita atenção, principalmente em relação às crianças, que têm pouca maturidade, embora se saiba que nesta questão de tráfico de seres humanos a primeira vítima é a mulher. As mulheres são traficadas e vendidas para serem usadas em questões de promiscuidade sexual, seguindo-se as crianças, por serem seres mais vulneráveis, ao fazerem amizades sem prudência. Em relação às crianças, existem casos em que os pais estão envolvidos, quando aparecem  pessoas com más intenções que surgem com o pretexto das mesmas serem enquadradas e matriculadas em estabelecimentos escolares e muitos progenitores, devido à sua situação económica, cedem facilmente. Muitos desses país não sabem que as crianças vão ser usadas para trabalhos forçados, pornografia infantil, entre outras acções. Muitas raparigas estão a ser apanhadas, ao aparecer um rapaz que lhes solicita namoro, e elas, mal conhecendo esse jovem e sem saberem que pertence a uma empresa que se dedica ao tráfico de seres humanos e de pornografia. são levadas para esse mundo. O Executivo está a fazer o seu trabalho, alertando a população para este fenómeno e para tal há uma comissão para elaborar um Plano Nacional de Combate ao Tráfico de Seres Humanos, coordenada pelo Ministério da Justiça e Direitos Humanos, com base num Decreto Presidencial.

Angop –  E a prostituição?

ABB –  É preciso saber que o tráfico de seres humanos está ligado a questões de pobreza, da mesma forma que a prostituição. Prostituição é quando alguém se oferece para actividades de promiscuidade sexual em troca de valores financeiros ou de objectos com vista a obter melhores condições de vida. Esta questão não se deve resolver à base de medidas económicas, porque há pessoas, mesmo com boas condições de vida, sem falta de dinheiro ou de outros bens, que se oferecem à prostituição. Por isso, no âmbito do trabalho que temos estado a fazer, realizámos conferências em todas as províncias, convidámos, além das estruturas estatais, membros da sociedade civil, com destaque para a Igreja e autoridades tradicionais, docentes e estudantes universitários, como instituições de acção educacional que têm responsabilidades com o cidadão, de maneira a fazer com que desperte e mude de comportamento.

Angop –  Qual foi o maior ganho no âmbito dos direitos humanos ao longo deste período?

ABB –   O maior ganho é a melhoria que se regista no grau de conhecimento das populações no cumprimento e respeito dos direitos humanos. Mais do que nunca, os direitos humanos estão a ganhar terreno. Há, de facto, um despertar muito forte no seio da população, pois actualmente todo o mundo fala dos direitos humanos, facto que me leva a sentir-me orgulhoso. Hoje, os direitos humanos estão a ser falados por toda a gente, sem vergonha nem medo, sem receio, facto que constitui um ganho muito importante, tendo em conta que as pessoas estão a tomar consciência do que são os seus direitos e já estão a exigi-los. O tratamento que esta questão está a ganhar no país, incluindo a apresentação dos relatórios em Genebra, faz pelo menos com que Angola ocupe um lugar importante e seja reconhecida como um povo que faz esforços no cumprimento das obrigações dos direitos humanos. Hoje em dia, os direitos humanos dos cidadãos estão a receber um tratamento adequado, na medida em que o Executivo está a pôr à disposição dos cidadãos todos os seus direitos.                 

Angop –  A que convenções existentes sobre os direitos humanos Angola ainda não aderiu?

ABB –  Nós, como Nação, somos livres de aderir à convenção que achamos conveniente para os interesses do país. Angola aderiu a vários tratados internacionais, com destaque para a Convenção sobre os Direitos da Criança, a Convenção dos Portadores de Deficiência, a Convenção sobre o Combate ao Tráfico de Seres Humanos e Crimes Transfronteiriços, entre outras. Contudo, os direitos humanos são evolutivos e o país avança à medida que as necessidades obrigam, podendo ou não aderir a uma certa convenção.

Jornal de Angola – foto Mota Ambrósio

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