Rosário
Gamboa* – Jornal de Notícias, opinião
O
que queremos de "novo" neste ano que começa? Vale a pena sonhar, ou a
"realidade" de que nos falava o presidente da República será sempre
mais forte que as ideias?
A
história é feita de convulsões entre a realidade - como conjuntura dominante -
e as ideias que procuram transformá-la, segundo uma dialética complexa, que
longe de qualquer ordem moral nem sempre se processa pelo caminho dos valores
que dão corpo aos ideais iluministas fundadores da Europa democrática dos
direitos humanos.
Mas
há conquistas indiscutíveis. Há, acima de tudo, uma população mais letrada,
informada e consciente dos direitos a que deve aspirar, que sabe que a
realidade, ainda que violenta e sem razão moral, não é algo transcendente que
fatalmente tenhamos de aceitar, mas uma construção humana.
O
horizonte da política, no seu veio mais simples e puro, ancora aqui. São as
nossas decisões e escolhas que fazem o futuro e, por isso, não nos podemos delas
demitir.
Desejo,
assim, que 2016 seja o ano da saída limpa. Não porque os problemas deixaram de
existir - a dívida, o desemprego, a regulação transnacional com suas regras e
atores... Mas porque os enfrentamos com determinação, e conhecimento; porque
fomos capazes de construir propostas novas com sentido, mobilizadoras da
vontade coletiva; propostas claras que não atirem para debaixo do tapete o lixo
inconveniente.
Estamos
cansados de sermos afastados das verdadeiras decisões; de percebermos que por detrás
duma solução bem anunciada se encontrava encoberto um mar de detritos. Estamos
cansados de gente cansada que, a pretexto de uma má gestão, se demite de
assistir a um doente, a um aluno, relegando para o domínio sombrio do "não
tenho culpa" a consciência ética e crítica que fazem a vida pessoal e
pública.
Será
limpa a saída de 2016, se o reino obscuro da "realidade" for
desembaciado em nome do direito de todos a uma informação criteriosa que
mobilize a escolha. Se as regras de distribuição de um Orçamento do Estado parco
forem feitas com transparência, sem reforços e subterfúgios ocultos e as
apostas nele inseridas conduzam a um caminho desejado de reformas, discutido e
maioritariamente partilhado.
*Presidente
do Instituto Politécnico do Porto
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