terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Angola. O 4 DE FEVEREIRO, (UMA DAS) DATA DA LIBERTAÇÃO NACIONAL




Na próxima semana o país vai comemorar mais um 4 de Fevereiro, uma das quatro datas relacionadas com a Libertação Nacional (as outras 3 são a revolta da Baixa do Cassange (4 de Janeiro), o 15 de Março (revolta do povo bacongo) e o 13 de Março (Muangai).

Politicamente ainda há quem determine o 4 de Fevereiro (de 1961) como a única data do início da luta de Libertação Nacional e do Nacionalismo Angolano e cassada por um único partido como seu. E as celebrações oficiais que ocorrem por esta data assim o mostram e reforçam.

Todavia, como alguns autores tentam historicamente demonstrar é um erro autenticar o 4 de Fevereiro como sendo autoria política de um ou outro partido ou movimento nacional mas de uma conjugação de vários factores que contribuíram para o levantamento insurrecional do 4 de Fevereiro.

Por exemplo, recordo um antigo artigo do matutino português Público (2011) em que o historiador Carlos Pacheco, baseado em textos e documentos da antiga polícia política portuguesa PIDE/DGS, alerta para o facto de o 4 de Fevereiro poder ter a sua real origem nos norte americanos que prepararam e despoletaram a insurreição ataque à sétima esquadra e á prisão central de Luanda, por intermédio de células da UPA e do MINA em Luanda. Ora, na altura e de acordo com um texto de Jean Michel Tali (2001) citado por Pacheco “a meia dúzia de panfletos que recolhi na Torre do Tombo (...), mostram a ligação deste grupo MINA à UPA. Têm palavras de ordem do tipo «MINA-UPA – VIVA A INDEPENDENCIA DE ANGOLA, VIVA A RAINHA NZINGA MBANDI»” Pacheco reforça que, à época, era “a UPA detinha nessa altura o controlo da situação politica em Luanda. Era grande força política, não só de negros, mas também de mestiços”.

Por sua vez um Jaime Araújo de Sousa Júnior, um conhecido militante da FNLA, afirma – e vou-me socorrer de um artigo que escreveu em complemento a uma entrevista sobre a data para o portal Notícias Lusófonas, em 2007 – que o 4 de Fevereiro foi o apogeu de uma série de acontecimentos e factos que tiveram como génese um longo caminho por reivindicações para pôr fim às desigualdades que grassam em Angola e que se pusesse fim ao regime colonial, substituindo-o pela Independência, o ano de 1954 ficou marcado por acções internas de consciencialização das populações angolanas.

Segundo Jaime Araújo Júnior foi neste ano de 1954 que alguns angolanos residentes no Congo ex-Belga (hoje República Democrática do Congo) teriam deslocado a Luanda que, com o pretexto de renovar documentos e visitar familiares aproveitaram para contactar vários compatriotas como o “Cónego Manuel Joaquim Mendes das Neves, Vítor de Carvalho, António Pedro Benje, Francisco Weba e alguns outros nacionalistas. Destes contactos produziram-se as sementes do que viriam a ser, mais tarde, as revoltas de 4 de Janeiro [Cassanje] e de 4 de Fevereiro de 1961. Células clandestinas, bem estruturadas e fortes, criaram-se; que, desde 1951, as mesmas desenvolviam, particularmente em Luanda, um trabalho político intenso e também ele clandestino. Era a formação da consciência pela Libertação Nacional; irreversível e de acção cada dia mais abrangente”.

Era o início da formação da consciência pela Libertação Nacional; irreversível e de acção, cada dia mais abrangente.

Entre essas células clandestinas estavam, também, nacionalistas como, Agostinho André Mendes de Carvalho, Garcia Lourenço Vaz Contreiras, Armando Ferreira da Conceição Júnior, João Fialho da Costa – também conhecido por Costa Nkodo, ou Kimpiololo – que, segundo Araújo Júnior seriam “afectas à UPA[União dos Povos de Angola] e procediam a recolha de Quotizações (in: MEDINA, Maria do Carmo, “Angola – Processos políticos da Luta pela Independência”, págs. 137 a 153)”.

De toda esta acção clandestina destacam-se Herbert Pereira Inglês, Manuel da Costa Kimpiololo, que já nos deixaram, e João César Correia, por terem a difícil missão de assegurar a ligação entre o venerando Cónego Manuel das Neves, então já vice-Presidente, e a Direcção da UPA no exterior. Sobre a orientação do Cónego, outros nacionalistas se juntaram, como Paiva Domingos da Silva, Neves Bendilha, Imperial Santana e Virgílio Souto Mayor” (in: blogue Pululu, 4 de Fevereiro de 2007).

Ora não esquecer que por essa altura ocorria entre as costas angolana e brasileira um facto que ajudou a despoletar o 4 de Fevereiro. Um paquete português, anta Maria, foi tomado de assalto pelo capitão português Henrique Galvão. Este assalto trouxe a Luanda (a Kinada ou Axiluanda, a nossa capital angolana que no passado dia 25 completou a bonita idade de 440 anos) inúmeros jornalistas das Agências Internacionais porque se previa que o navio acostasse dado que Galvão queria com este assalto apoiar a candidatura de Humberto Delgado à presidência portuguesa como recordava a antiga secretária de Delgado, Arajaryr Moreira de Campos, bem como ao Brasil, onde acabou por aportar. Este facto colocou o nome de Angola nas páginas dos grandes jornais e das importantes agências internacionais.

Socorrendo-nos a Araújo Júnior, por quando do assalto aopaquete, terá chegado a Luanda um “membro da Administração (norte-americana), que clandestinamente era elemento de ligação entre o Cónego Manuel das Neves, procedeu a contactos“ (com um candidato presidencial norte-americano que não consegui obter a confirmação da sua identificação mas que tudo sugere ter sido JFKennedy). Da conversa havida o candidato terá aconselhado o Cónego a decidir-se “por uma Acção Armada e Imediata”.

Estavam assim estabelecidos o ambiente adequado, o tempo próprio e os estímulos para que na madrugada do dia 4 de Fevereiro de 1961 se desencadeasse a Acção Armada pela Independência.

Estes dois factores associados deram origem aos assaltos à 7ªesqudra junto do antigo Bairro Popular e à prisão Central de Luanda. Ou seja, tudo parece conjugar e confirmar, até pela pluralidade das figuras já indicadas que a acção do 4 de Fevereiro foi um movimento semi-expontâneo de nacionalistas angolanos ligados a vários movimento políticos já existentes – talvez interligados entre si –, e não de uma decisão monopartidária.

É altura, passados que são quase 14 anos que a Paz chegou a Angola que os partidos políticos deixem de guardar algumas datas como partidonacionais e as aceitem, em definitivo, como datas verdadeiramente nacionais, ou seja, de todo o Povo Angolano celebrando-as, não como datas partidocráticas, mas como datas unificadoras da Nação.

O 4 de Fevereiro e o 15 de Março de 1961, o 13 de Março de 1966 aliados ao 4 de Janeiro de 1960 devem formar as 4 grandes datas de Libertação Nacional. A elas, podem – devem – ser aliançadas as datas de 22 de Fevereiro e 4 de Abril (de 2002) e 17 de Setembro, Dia do Herói Nacional.

No global, estas datas devem ser recordadas – seguindo o modelar exemplo dos santomenses quanto às celebrações do massacre de “Bate Pá” – como festas de União dos angolanos e não como celebrações partidárias, por vezes de forma abusiva e menos correcta, como a História já o vem comprovando.

Muito se tem escrito sobre as estórias da história do 4 de Fevereiro e muito mais se vai continuar a escrever enquanto a mesma não deixar de ser aproveitada partidariamente. Que de forma cingida os partidos o façam, até se perfilha. Mas devem se delimitar, e unicamente, aos seus locais e celebrações partidárias.

É altura, e de uma vez, de colocar as quatro grandes datas do Nacionalismo Angolano no seu lugar próprio: no calendário nacional panteânico do Povo Angolano.

Vamos, e de uma vez, colocar a História no seu lugar e dar oportunidade ao Povo Angolano de a honrar bem assim os nossos Heróis, mas fazendo-o em nome da verdade histórica e unificadora.

Publicado no semanário Novo Jornal, edição 417, de 5 de Fevereiro de 2016, 1º Caderno, página 18

*Investigador e Pós-doutorando

**Eugénio Costa Almeida – Pululu - Página de um lusofónico angolano-português, licenciado e mestre em Relações Internacionais e Doutorado em Ciências Sociais - ramo Relações Internacionais -; nele poderão aceder a ensaios académicos e artigos de opinião, relacionados com a actividade académica, social e associativa.

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