Martinho Júnior, Luanda
Figuras:
Soros, o integralismo lusitano e Agualusa… “dilatando a fé e o império” .
1
– A observação histórico-antropológica dos relacionamentos internacionais entre
Portugal e Angola permitem-nos tirar muitas conclusões de ordem sócio-política,
económica e financeira em época de “democracias representativas”, até pelo
carácter da “representatividade” que nelas se espelha no âmbito dos
impactos capitalistas neo liberais, que permite no caso português a estreita
conexão entre a oligarquia nacional agenciada e o poder, ao jeito dum zelador “Bilderberg” que
a nível aberto (com toda a panóplia de “medias” ao seu dispor) rege
publicamente o jogo dos intervenientes, uns “tradicionais”, como os que se
inscrevem no PS, no PSD e no CDS, outros espreitando a janela da alternativa,
como no caso do BE… num processo similar aliás ao que acontece com a indústria
portuguesa do futebol!
Esse
não é um rescaldo do 25 de Abril, mas é um efectivo rescaldo do que foi
conseguido pela aristocracia financeira mundial com o 25 de Novembro em
Portugal, a partir do qual se imprimiram às instituições um quadro europeu de
democracia burguesa, onde as oligarquias nacionais se sentem à vontade e onde à
vontade se estabelecem os nexos conservadores apropriados que as têm vindo a
agenciar e motivar, avassalando-as sobretudo às poderosas oligarquias
britânica, alemã e francesa, sem as quais seria muito difícil a elas haverem
negócios favoráveis, que providenciassem em época das grandes especulações
financeiras não só muitos lucros, mas sobretudo a “financeirização” da
própria economia, algo que tem a ver também com os alicerces de
sustentabilidade das “correias de transmissão” para com África…
Esse
foi um processo que interessou por outro lado à própria NATO, que desde a
origem, tirando partido de sua geo-estratégia, havia levado a que Portugal
mesmo com um governo fascista e colonial fosse membro fundador do pacto.
Foi
aliás a NATO, ou países seus membros, que propiciaram ao Portugal do Estado
Novo o armamento, o equipamento e os suportes de toda a ordem para que os
sucessivos governos fizessem durante tanto tempo as campanhas de África e
passassem ao “apartheid” sul-africano uma parte dos meios para o
engenho e a arte da defesa dos seus interesses e o agenciamento de Savimbi,
apesar das bastantes (mas quantas vezes insuficientes) pressões internacionais
em contrário.
Como
Portugal após o 25 de Novembro é contudo um país periférico mas não desprezível
nos seus“bons ofícios” em relação a projectos de “correias de
transmissão” histórica e antropologicamente à disposição dos mais
poderosos circuitos capitalistas neo liberais, os factores disponíveis não são negligenciáveis
nos relacionamentos internacionais, particularmente em relação à costa
Atlântica africana e tendo Angola como o horizonte mais apetecível (sem deixar
de considerar as“especialidades” de Cabo Verde, da Guiné Bissau e de São
Tomé e Príncipe), algo que o neo liberalismo teve a oportunidade em traduzir no
espectro bancário, nos negócios, nos relacionamentos sócio-políticos “à
direita” e, como não podia deixar de ser, no espectro de relacionamentos
de inteligência que “preferencialmente” se cultivou a partir do eixo
da inteligência económica que se distendem até aos “nexos invisíveis” com “cobertura” da
NATO.
2
– As imensas necessidades tecnológicas e de “know how” para que
Angola avance em termos de emergência económica e num quadro de luta contra o
subdesenvolvimento colocam-se de há décadas com toda a acuidade e essa é a
garantia maior para o trabalho de sapa que vai sendo feito, aproveitando a paz
para a instalação da terapia de choque e, com ela formatar as “novas” elites
e“burilar” o estado angolano até os seus níveis mais elevados, e com eles,
por via sócio-política, procurar “deep inside”, assumir as posições mais
nevrálgicas dentro do próprio MPLA.
Em
Lisboa, por exemplo, quer o CAP do MPLA, quer a Casa de Angola, estão a “ser
tomados” por dentro por antigos simpatizantes da UNITA (e retornados
próximos ao ELP e a Jaime Nogueira Pinto); eles estão a aproveitar desse “desembarque” para
um novo “para Angola e em força”, indiciando objectivos próprios, com a
cobertura de servirem o MPLA…
Em
contraste, um caso público, crítico e singular “de rotura” (haverá
regra sem excepção?) deu-se no quadro da CPLP quando Angola propôs a Guiné
Equatorial para membro permanente, algo que o governo português tem tido muitas
dificuldades em digerir por que atípico em relação segundo argumentam, à
língua, algo de que se nutrem alguns argumentos estritamente conservadores em
Portugal…
…Para
Angola não é atípico numa estratégia de paz assente nos vínculos gerados a
partir do petróleo e do gás em direcção ao Golfo da Guiné, tendo em conta a
progressão da disseminação do caos, de há cinco anos a esta parte, depois do
fim da “revolução verde” na Líbia e os aspectos históricos daquele
pequeno país africano, meio continental, meio insular, que física-geograficamente
envolve São Tomé e Príncipe!
São
pois os processos decorrentes do 25 de Novembro em Portugal que nos
relacionamentos bilaterais Portugal-Angola se têm vindo a tornar integrantes da
terapia neo liberal introduzida em Angola após o choque protagonizado por
Savimbi com os dez anos que durou a “guerra dos diamantes de sangue” (de
1992 a 2002), já que antes e em tempo de guerra contra o “apartheid” há
toda uma história por fazer, particularmente no que diz respeito ao espectro da
inteligência portuguesa e seus alinhamentos tão subtis quão discretos com o “apartheid”,
como no que toca aos vínculos inscritos diligentemente nos fenómenos de
desestabilização da vanguarda que constituía o Partido do Trabalho, como com os
governos mais retrógrados de África, como os de Mobutu no Zaíre, de Boigny na
Costa do Marfim, ou de Senghor no Senegal… “pré carré oblige”!
3
– Os vínculos de desestabilização da vanguarda PT, são por si toda uma imensa
história por contar, que combinam os posicionamentos dos relacionamentos
portugueses post 25 de Novembro, com a textura humana do próprio MPLA, (o
núcleo duro constituído em torno da geração do Presidente Agostinho Neto e as
gerações que foram engrossando as fileiras, vulneráveis a expedientes de
inteligência ocidental e de assimilação, inclusive vulneráveis aos “retornados”)…
A
presença da diplomacia portuguesa nos acordos de paz que foram sendo gizados
para Angola pode ser entendida num quadro desses mesmos “bons ofícios” (Alvor
antes do 25 de Novembro e Bicesse depois, algo que seria interessante comparar
nos seus meandros e postulados), com a particularidade de em Bicesse haver a
aliciante da possibilidade do incremento dos relacionamentos económicos
bilaterais Portugal-Angola, algo que se tornou tão atraente para o espectro
sócio-político do PSD e do CDS, quão para os nexos de inteligência que a partir
daí se propiciaram aos serviços portugueses filtrados a partir do 25 de
Novembro pela NATO, pelos interesses das oligarquias europeias e pela
aristocracia financeira mundial.
Em
Bicesse pode-se reconhecer os sinais do incremento dos “bons ofícios" do
estado português post 25 de Novembro em direcção à terapia de choque, pois é a
partir daí que melhor se passou a recordar quanta falta fazia a Angola os
quadros que regressaram à “mãe-pátria”, retirados atabalhoadamente e com
uma campanha a condizer pela ponte aérea financiada pelos norte-americanos e
desde logo filtrada estrategicamente pela inteligência de Frank Charles Carlucci
(“o regresso das caravelas”).
O “regresso
das caravelas” possibilitou assim a sobrevivência de doutrinas e
ideologias de indexação fascista, que se manifestaram de forma mais “operacional” com
o ELP (em Angola e Portugal) e ainda com o FRA, ESINA e algumas franjas d FUA
(em Angola), suportando hoje resíduos do saudosismo colonial que se podem
observar em páginas como o SanzalAngola, algo que está a ser aproveitado em
processos de tentativa de desestabilização simultânea do MPLA e de Angola como
o corrente, surpreendentemente (para alguns), ao sabor das iniciativas
combinadas entre sectores do PS e o BE, por um lado e a tentativa da deriva de “retornados” da
UNITA para dentro do MPLA, por outro, tendo como “sinalizador” (ainda
a língua) uma figura como Agualusa…
4
– Entregava-se assim aos norte-americanos a possibilidade de decidir
estrategicamente sobre o“vai-e-vem das caravelas”, como sobre o carácter da “alternativa” BE
(a contradição manipulada por processos subtis de ingerência em Portugal), que
os relacionamentos económicos davam garantia e sustentabilidade para o resto e,
entre o resto, os “novos” vínculos de inteligência que haveria que
cultivar, imprescindíveis para os “novos” métodos de assimilação de
que o capitalismo neo liberal tanto necessita para criar impactos afins em
Angola dadas as imensas insuficiências e carências tecnológicas e de “know
how”, para além das dificuldades em gerar desenvolvimento sustentável
abrangente e equilibrado.
Por
tabela com esse tipo de agências foi possível a aliciante da corrupção e os
enlaces entre entidades corruptoras (uma parte delas portuguesas, ao nível dos
relacionamentos intermédios dos executivos) e as corrompidas para dentro do
estado angolano, ávidas de “cabritismo”, pois previamente a evolução das
conjunturas internas em Angola propiciaram essa deriva.
De
facto o colapso da vanguarda com o fim do Partido do Trabalho, o fusível que se
instalou nos serviços de inteligência de Angola (quem os comandar deve ir para
lá com conhecimento de causa desse risco) e o fim das gloriosas FAPLA que
haviam saído vitoriosas nas batalhas contra o“apartheid” e as sequelas
coloniais (e suas próprias sequelas), deixaram um espaço vazio imenso a partir
do qual se instalou primeiro o choque neo liberal (instrumentalizando Savimbi
entre 1992 e 2002), para depois de sua morte, aproveitando o “petróleo
enquanto desenvolvimento” e as políticas de reconciliação, reconstrução
nacional e reinserção social (segundo as iniciativas da administração de George
W Bush para África e os fundamentos iniciais do laboratório AFRICOM, por um
lado, por outro da evolução conjuntural interna), se instalar a terapia neo
liberal afeiçoada às “correias de transmissão” a partir da plataforma
portuguesa post 25 de Novembro.
5
– A “open society” de George Soros só poderia progredir e chegar à
manipulação contraditória que se está a assistir em Angola, graças aos “bons
ofícios” da plataforma portuguesa providencialmente instalada face às
inadiáveis dificuldades que o país tinha de enfrentar, não sendo nesse âmbito
de estranhar os laços, por tabela e por exemplo, entre Ana Gomes, o BE e os “revus”,
com papeis bem definidos na aplicação “providencial” da doutrina
oportuna de Gene Sharp, algo que tem também a ver com a repescagem das linhas
ultra conservadoras entre elas a dos saudosismos dos “retornados”.
É
também George Soros que “providenciou” entre outros a “fuga” tão
oportuna em função da evolução da conjuntura internacional e interna de muitos
países, (desde a Rússia a Angola, passando pelo Brasil), dos “Panama
Papers”, algo que tem a ver com a instalação propositada da desestabilização em
vários países do mundo e também no MPLA e em Angola.
Ele
próprio dono de “offshores”, Soros pode decidir que listas fazer sair e
que listas se manterão em segredo… conforme o “diktat” das
conveniências e interesses dos grandes patrões da aristocracia financeira mundial.
O
fenómeno de corrupção-assimilação dentro do estado angolano, (quando entre os
maiores corruptores se podem contar entidades portuguesas, inclusive no quadro
dos fenómenos inerentes à banca de feição neo liberal que rege também uma parte
substancial da vida portuguesa ao ponto de ser parte integrante e indispensável
para as “políticas de austeridade”), sendo um processo lógico
eminentemente económico e financeiro, deu origem ao contraditório da
manipulação, ou seja o surgimento lógico duma oposição sócio-política difusa,
que não se coíbe no socorro à doutrina aliciadora de Gene Sharp, tal a sua
pressa em assumir a “alternância democrática” que apregoa e faz mover
uma parte da juventude, mesmo sabendo quão as “revoluções coloridas” e
as“primaveras árabes” são choques neoliberais e não “golpes suaves” que
utilizam a candura energética da massas juvenis para abrir caminho aos seus
inconfessáveis fins!
Uma
análise antropológica das distintas espécies comportamentais humanas
componentes dessas duas esferas de manipulação e ingerência, a da corrupção por
um lado e a dos seguidores de Gene Sharp por outro, em Portugal e em Angola,
permitiria avaliar quão o processo português post 25 de Novembro se acoplou ao
processo de “portas abertas” imposto a Angola no âmbito da terapia de
choque e as “correias de transmissão” se tornaram em processos “novos” de
assimilação dirigidos à tentativa de formatação das “novas” elites
angolanas, em grande parte aliás responsáveis pelo quadro de alienações que se assiste
em Angola até nas televisões públicas do estado angolano.
A
entidade portuguesa modelada em Portugal sob o peso da austeridade com algumas
notáveis e compreensíveis excepções, tornou-se assim numa entidade subserviente
e parasitária no quadro dos impactos capitalistas neo liberais dirigidos para
dentro de Angola em função das necessidades urgentes de ordem tecnológica e de “know
how” e isso serve para justificar na profundidade o “vai-e-vem das
caravelas”!...
6
– Por outro lado, esses vínculos possibilitam o afã da inteligência ocidental
com contribuição dos serviços portugueses que minam muito dos laços económicos
e comerciais, bem como “o mundo”dos negócios e dos bancos, que preenchem o
vazio deixado com o contínuo enfraquecimento dos serviços de inteligência
angolanos que nos dez primeiros anos de independência haviam garantido a
soberania com um inusitado rigor, obstáculo insuportável para a “abertura
de portas” que sobreveio depois de 1985…
É
cada vez mais evidente que todo esse processo se distende também por dentro do
MPLA podendo-se constatar a instalação progressiva de expedientes humanos
indexados aos impactos do capitalismo neo liberal, procurando marginalizar
paulatinamente, com maior ou menor grau de consciência disso, muitos outros
membros que antes estiveram vinculados a expedientes anteriores que vigoraram
na década primeira da independência, particularmente aqueles com maior e mais
responsável rigor e sentido crítico, assumidos mesmo nas situações com que se
depararam em tempo de guerra e de agressão a Angola
Rigor
e sentido de responsabilidade patriótica, assim como falta de capacidade de
análise e de crítica, vão-se tornando cada vez mais dispensáveis por parte de
algumas dessas correntes“ascendentes”, ainda que hajam outros animados de
espírito construtivo e chamem a atenção para o desencadear de extensivos
fenómenos que em cheio vão atingindo a vida do país e do próprio MPLA, uma
parte crítica deles por dentro do miolo das instituições...
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