Luísa
Rogério | Rede Angola | opinião
Quando
no fim do ano de 2014 o Presidente da República falou ao país sobre o impacto
da crise económica que acabara de se instalar pouca gente imaginou as
proporções que a desdita tomaria. Com o crónico optimismo angolense entramos em
2015 convencidos de que a anunciada seria passageira. Já enfrentamos situações
piores. Somos um povo especial. Vamos ultrapassar. Venceremos. Pensamentos do
género animaram muitos de nós diante das intempéries resultantes da baixa do
preço do petróleo no mercado mundial. Instalou-se então a crise cambial. Em
pouco tempo as divisas desapareceram dos bancos. Do dia para a noite o cidadão
comum passou a interessar-se por expressões saídas do estrito reduto de
especialistas para atazanarem a nossa vida.
O
país estremeceu quando todos se aperceberam que as reservas cambiais haviam
desaparecido. O impacto da realidade foi demasiado forte. Afinal, o país quase
nada possui além das riquezas em potência e da dignidade. A política monetária,
o desempenho dos bancos comerciais e o papel do banco central nunca tinham sido
tão questionados. Quem tinha poupanças em divisas perdeu tecnicamente o acesso
a elas. As regras para o levantamento de valores em moeda estrangeira fizeram
correr incríveis rios de tinta nos últimos anos. Na prática, as contas foram
bloqueadas. Os angolanos aperceberam-se também que alguns dos maiores
empresários nacionais investiram muito mais lá fora do que dentro do território
nacional.
Assistimos
incrédulos a denúncias de descaminhos de dinheiros públicos. Através da comunicação
social vieram à superfície casos escabrosos de corrupção. Das investigações
resultou a apreensão de algumas dezenas de milhões de dólares em países onde se
leva a sério a questão da proveniência duvidosa de capitais. Os protestos foram
recebidos com a arrogância e o silêncio habituais por parte de quem se colocou
acima dos seus concidadãos. Enquanto isso, os donos da situação continuaram a
amealharam milhões, usando bastas vezes e de forma indevida capital humano
público para fechar negócios pessoais. E a maioria da população empobreceu.
Hoje já nem se cogita falar em crise, mas sim em nova realidade.
A
menos que se registem várias sequências de feitos extraordinários com milagres
antológicos à mistura Angola não voltará tão cedo a ser o “El Dorado” do
passado recente. Grande parte dos chamados projectos estruturantes ficou no
papel. No entanto, em ano eleitoral é preciso mostrar trabalho. A agenda
inclui, naturalmente, inaugurações de projectos e de obras por concluir,
deixando a sensação de que o mais importante é aparecer na imprensa (entenda-se
televisão) e impressionar o eleitor. Só que determinadas obras têm efeito
contrário. Apetece perguntar qual a pertinência de fechar troços como o da
avenida Deolinda Rodrigues por tão longo tempo.
De
modo geral as requalificações são desejáveis. Mas seria sensato introduzir
benfeitorias em estradas secundárias antes do arranque de obras de vulto que,
para agravar, acontecem invariavelmente na época chuvosa. Há diversas zonas em
Luanda cujos trabalhos de benfeitorias foram interrompidos há vários anos,
supostamente por falta de verbas. Com uma parte ínfima de valores gastos para
melhorar locais escolhidos a dedo para impressionar dava para tornar menos
tormentosa a vida de milhares de luandenses. Já que a nova realidade do país
recomenda o uso proveitoso dos recursos que dizem ser escassos, calhava bem
alargar o foco da lupa. Ademais, a época das construções megalómanas ficou lá
atrás…
Sem comentários:
Enviar um comentário