sábado, 21 de janeiro de 2017

Portugal. CASINO OU ASSALTO



Os banqueiros não param de nos surpreender. Fernando Ulrich, presidente do BPI, disse à imprensa que afinal de contas os accionistas dos bancos é que tinham suportado os custos da crise financeira. 

Miguel Tiago – AbrilAbril, opinião

Sim, quando Ulrich diz que não foram os contribuintes que pagaram a banca e que os bancos destruíram 35,5 mil milhões de euros aos seus próprios accionistas, está a esconder uma parte muito importante da verdade.

Vamos aos dados públicos mais fiáveis: os bancos portugueses, entre 2000 e 2007, distribuíram 6,151 milhões de euros em dividendos aos seus accionistas e, entre 2008 e 2010, distribuíram mais 1,192 milhões.

Entre 2011 e 2014, o valor distribuído em dividendos cai drasticamente para 253 milhões de euros. No período entre 2008 e 2014, os bancos foram recapitalizados por privados num total de 14 233 milhões de euros e 11 450 milhões de euros pelo Estado.

Este valor não inclui os custos com a operação BPN, que já ascende a qualquer coisa como 6 mil milhões de euros e pode vir a ficar ainda mais cara. E temos também de acrescer a esses 11 450 milhões os 3,3 mil milhões que implicou a resolução do Banif, o que faz com que a participação pública directa em aumentos de capital da banca ascenda ao 14 750 milhões, ultrapassando o esforço dos accionistas privados.

Mas a verdade vai muito além desta álgebra elementar onde Ulrich tenta situar o debate sobre quem pagou as dívidas da banca. Os 35,5 mil milhões dos accionistas que Ulrich diz terem sido destruídos nos bancos portugueses, dando a entender que os accionistas suportaram o incumprimento do crédito das famílias e das empresas quase sozinhos, existem de facto? Como foram destruídos?

Se, por um lado, é verdade que o crédito não pago gera uma quebra tremenda no balanço dos bancos, por outro lado não podemos esquecer que é supostamente para precaver esse risco que os bancos cobram as taxas de juro exorbitantes que cobram e que também por isso exigem garantias a todas as pequenas e médias empresas e famílias a quem emprestam dinheiro. No entanto, como já vimos, entre 2000 e 2007, andaram a distribuir dividendos gerados por créditos que concediam sem qualquer avaliação de risco.

Ulrich manipula a verdade de várias formas: em primeiro lugar, a banca não destruiu 35,5 mil milhões de euros aos accionistas. Os accionistas entraram nos aumentos de capital das instituições, de livre vontade, porque o negócio lhes era favorável e o investimento que fizeram não foi destruído. Pelo contrário, nas instituições que não foram alvo de medida de resolução ou nacionalização, o capital dos accionistas continua lá e continua a ser dos accionistas.

Em segundo lugar, os aumentos de capital foram em muitos casos financiados por empréstimos. Ulrich usa nas suas declarações o exemplo do BES, cujos accionistas terão participado em aumentos de capital no valor de 13 mil milhões de euros.

Ignorará porventura que a Comissão de Inquérito parlamentar ao caso BES/GES apurou que uma boa parte desses aumentos de capital tinha origem em créditos concedidos por instituições bancárias, muitos deles com origem no próprio BES? Ou seja, o BES alimentou créditos a empresas de fachada que depois regressavam ao banco sobre a forma de capital, quando na verdade era crédito.

Ao mesmo tempo, o BES financiava as actividades da família e das várias empresas do GES sem que estes pagassem os empréstimos contraídos no BES. Isto significa que os grandes accionistas do BES não retiraram dividendos dos 13 mil milhões que colocaram nos aumentos de capital, mas que também nunca lá os colocaram verdadeiramente porque esse dinheiro não era deles.

«O BCP, que entra amanhã com mais um mega-aumento de capital no mercado (primeiro dia de transação de direitos), pediu aos accionistas 9,405 mil milhões de euros desde 2001, e pagou em dividendos 1,837 mil milhões, o que significa que os accionistas "deram" ao banco 7,568 mil milhões de euros», lê-se na peça redigida pelo Jornal Económico em torno das declarações do banqueiro.

Então não se está a ver que os accionistas deram ao Banco 7,568 milhões de euros? Então e esses 7,568 milhões não são dos accionistas? Não são capital da instituição detido por esses mesmos accionistas? E que mais queria Ulrich? Que os accionistas da instituição não tivessem de investir? A qualquer momento podem vender as suas participações ao preço de mercado e isso é uma das maravilhas do capitalismo. Com isso, tanto podem perder como ganhar, dependendo do valor da acção no momento da venda.

É verdade que quando o volume de crédito malparado atinge determinados valores, um valor igual deve ser provisionado pelo banco, sendo retirado ao capital do accionista, mas esse é o risco do investimento privado. A questão coloca-se precisamente na ausência desse risco: é que o accionista da banca pode, de facto, vir a perder o seu capital num processo de resolução de um banco, mas não perderá o dinheiro que recebeu da instituição. O BES, por exemplo, entre 1992 e 2011, distribuiu mais de 7 mil milhões de euros em dividendos aos accionistas e, como já referimos, distribuiu muito mais do que isso em créditos.

A questão fundamental que devemos colocar não é só quem anda a pagar os buracos dos bancos, mas sim, por que motivos existem essas dívidas e como podemos permitir que a moeda e o crédito sejam geridos ao sabor do interesse de accionistas de empresas privadas, quando são importantes bens públicos.

As declarações de Ulrich demonstram a desfaçatez com que os banqueiros mascaram as suas contas, como tentam ainda responsabilizar os portugueses pelas perdas dos accionistas ao invés de reconhecer que os portugueses andam a pagar as aventuras dos banqueiros.

O homem tem o descaramento de dizer que em Portugal «o custo suportado pelo Estado e contribuintes foi muito baixo quando comparado com os acionistas e com outros países» e de dizer que será apenas de 4,4 a 6,1 mil milhões de euros o valor de gastos públicos com a banca.

Um só euro pago pelo dinheiro que os banqueiros emprestaram a amigos, ou a si próprios, ou a grandes grupos económicos sem pedir garantias, ou a empresas detidas pelos accionistas dos bancos, ou a off-shores, já seria demais, e Ulrich sente-se no direito de dizer que o Estado português até nem gastou assim tanto.

O que as declarações de Ulrich demonstram é que a República não pode deixar à confiança de privados uma matéria tão importante como a gestão da moeda e do financiamento à economia. Ulrich demonstra bem como os banqueiros continuam a mascarar as perdas dos seus bancos e como escondem que se financiam a si próprios precisamente nas instituições em que são accionistas ou em outras, através de interesses cruzados que acabam sempre por estourar nas mãos do depositante e do Estado.

É que, ao contrário de Ulrich e dos seus compinchas, grandes accionistas, os portugueses não optaram por participar no capital de bancos privados, nem por entregar milhares de milhões de euros – produzidos com o seu próprio esforço e trabalho – a bancos mal geridos ou falidos, foram pura e simplesmente obrigados a fazê-lo.

É a diferença entre jogar voluntariamente na roleta e perder e ser assaltado. Neste caso, assaltam-te para ir a seguir jogar na roleta e, na maior parte dos casos, sai-lhes o prémio. 

Miguel Tiago, deputado – Foto: Fernando UlrichCréditos/ Agência Lusa

Portugal. Bataglia denuncia Salgado e Santos Silva. Sócrates nega envolvimento



Os advogados de José Sócrates emitiram, este sábado, um comunicado de imprensa.

A manchete do Expresso deste sábado revela que Hélder Bataglia confessou ao Ministério Público que Ricardo Salgado lhe pediu para colocar 12 milhões de euros em contas na Suíça. Mais. No seu depoimento perante a equipa do procurador Rosário Teixeira, o ex-líder da ESCOM confessou ainda que Carlos Santos Silva, o melhor amigo de José Sócrates, também estava envolvido no esquema. Isto porque o dinheiro em causa tinha como destinatário final José Sócrates.

Segundo o semanário, o empresário revelou que se reunia com Santos Silva no escritório da ESCOM, em Lisboa, para definirem datas em que as transferências tinham de ser feitas e contratos que justificassem tais quantias avultadas.

A notícia do Expresso diz ainda que este dinheiro era uma compensação de Ricardo Salgado a José Sócrates por este ter defendido, enquanto primeiro-ministro, interesses do Grupo Espírito Santo no chumbo da OPA da Sonae à PT e na venda da Vivo à Oi.

Porém, o ex-primeiro-ministro vem, uma vez mais, negar todas as acusações que, direta ou indiretamente, lhe são feitas.

Num comunicado enviado às redações assinado pelos dois advogados de José Sócrates, lê-se que as notícias divulgadas hoje “são falsas, destituídas de qualquer fundamento e verdadeiramente absurdas”, sendo também “difamatórias” e estando “ao serviço destas pseudo-investigações e com origem necessária nos responsáveis por este inquérito”.

Leia aqui o comunicado enviado ao Notícias ao Minuto pela equipa de advogados que defende o engenheiro José Socrates.

Patrícia Martins Carvalho – Notícias ao Minuto

Portugal. RICARDO SALGADO TERÁ PAGO 40 MILHÕES A SÓCRATES E ZEINAL BAVA



Ex-presidente do BES foi constituído arguido na Operação Marquês. Em causa estão ‘luvas’ por quatro negócios que implicaram decisões polémicas de José Sócrates. Inquérito pode não ficar concluído em março. 

O conjunto de provas reunido pelo Ministério Público contra Ricardo Salgado na Operação Marquês indicia que este pagou várias dezenas de milhões de euros em ‘luvas’, no período que vai de 2006 a 2011, para obter decisões favoráveis ao Grupo Espírito Santo no âmbito da participação na Portugal Telecom. Os beneficiários terão sido José Sócrates (21 milhões), Zeinal Bava (18,5 milhões) e outros administradores da PT.

Em causa estão quatro negócios que implicaram decisões políticas e empresariais polémicas: o chumbo da OPA da Sonae à PT (2006), a autonomização da PT Multimédia (2007), a venda da Vivo à Telefónica (2010) e a compra da Oi. 

Neste processo, Sócrates ordenou a utilização pela primeira vez da golden share (ação qualificada) do Estado. Em todos os casos o GES obteve dividendos milionários, mas a PT foi levada ao colapso. 

O GES foi ‘propositadamente’ beneficiado

Os investigadores suspeitam que as decisões que foram tomadas na PT nos últimos 10 anos - e que acabaram por ditar a sua morte, em 2015 - beneficiaram propositadamente os acionistas, em particular o GES, acionista de referência da operadora. 

E constatam as coincidências temporais entre as principais decisões aí tomadas (desde a derrota da OPA da Sonae até à compra da Oi) com as transferências de dinheiro para as contas de Carlos Santos Silva na Suíça. Contas estas que pertencerão na realidade a Sócrates, tendo em conta a forma como dispôs desse dinheiro.

No conjunto dos quatro negócios, couberam ao ex-primeiro-ministro, como se disse, 21 milhões de euros - que acabaram por ser depositados nas contas bancárias de Carlos Santos Silva, depois de passarem por um complexo circuito de offshores pertencentes a Hélder Bataglia (administrador do BES Angola e próximo de Salgado), José Paulo Pinto de Sousa (primo de Sócrates) e Joaquim Barroca (administrador do Grupo Lena, a que pertenceu Santos Silva).

Os 18,5 milhões de euros que o MP suspeita terem sido recebidos por Zeinal Bava, ex-CEO da PT, terão circulado através de uma offshore do GES no Panamá.

Hélder Bataglia, recorde-se, foi interrogado no passado dia 5 pelos investigadores da Operação Marquês. Já antes, em abril do ano passado, disse ao Expresso que o dinheiro que passou pelas suas offshores com destino a Sócrates tinha origem no GES: «O dinheiro do caso Sócrates vem do GES», afirmou. Bataglia é arguido neste processo por crimes de corrupção para ato ilícito, fraude fiscal qualificada e branqueamento de capitais.

Investigação entrou na reta final

O interrogatório de Salgado no DCIAP, esta semana, insere-se numa linha de investigação que entrou no verão passado na reta final. Por essa altura, após uma série de buscas a antigos gestores da PT, incluindo Zeinal Bava e Henrique Granadeiro, o MP já chegara à conclusão de que grande parte dos cerca de 30 milhões de euros que José Sócrates acumulou em contas do amigo Carlos Santos Silva tiveram origem em sociedades do Grupo Espírito Santo e corresponderão, na sua maioria, ao pagamento de comissões nos anos da sua governação, em troca de decisões do Estado em negócios e investimentos da PT que favoreceram o grupo de Ricardo Salgado.

Recorde-se que o Governo de Sócrates assumiu uma posição contrária à OPA lançada em 2006 pelo grupo de Belmiro de Azevedo à PT, tendo dado ordens à CGD, enquanto gestora da participação do Estado, para votar contra a revisão dos estatutos da operadora, na assembleia-geral de março de 2007, o que fez a OPA ir por água-abaixo. 

O chumbo da OPA da Sonae levou à autonomização da área de media e comunicações da PT, dando origem à PT Multimédia - na qual o GES ficou com 13% das ações, cujo valor era de 165 milhões de euros.

Negócios no Brasil levaram PT à falência

O MP suspeita ainda que, em 2009 e 2010, Ricardo Salgado conseguiu, mercê da sua posição na PT e com o apoio de outros acionistas, que a PT comprasse papel comercial de sociedades do GES (Espírito Santo International e Rioforte). Estima-se que os títulos de dívida da ESI subscritos pela PT ascendiam, em 2010, a 400 milhões de euros.

Seguem-se, finalmente, os investimentos e vendas que a PT fez em 2010 e 2011. Por ordem de Sócrates, o Estado usou a sua golden share na PT para impedir que os acionistas vendessem à espanhola Telefónica, por 7,15 mil milhões de euros, a participação na brasileira Vivo. Para dar um ar credível e afastar qualquer suspeição, enquanto José Sócrates dizia no Finantial Times que o Estado iria usar «todos os instrumentos ao seu dispor para defender aquilo que acredita serem os melhores interesses da PT e do país», Salgado mostrou-se desagradado com a intervenção do Estado no processo. Apenas um mês depois (e após a Telefónica subir em 350 milhões de euros a sua proposta), o Estado aceitou, desde que a PT permanecesse no Brasil. Esta decisão levou a PT a comprar 22% da Oi, por 3,5 mil milhões de euros, valor considerado muito inflacionado. Pelo meio, o GES encaixou a sua quota-parte de dividendos pela venda da Vivo, o que terá proporcionado o pagamento de mais comissões a Sócrates e gestores da PT.

Inquérito arrisca derrapar

Em setembro, a PGR deu mais seis meses para a conclusão do inquérito, apontando-se o desfecho para março de 2017. Já em dezembro, quando poderia ter reponderado esta data, a PGR informou que  «face à informação recolhida», não se justificava a alteração do prazo. Agora, com a audição de Bataglia, nova documentação bancária anexa ao processo e cartas rogatórias ainda em falta da Suíça e do Reino Unido - e que não vão chegar até março - a conclusão do inquérito pode estar de novo comprometida. No despacho que alargou o prazo, Joana Marques Vidal já deixava em aberto essa hipótese, caso houvesse novos desenvolvimentos.

Felícia Cabrita – jornal i

Portugal. A COISA ESTÁ CRISPADA UM BOCADINHO DEMAIS



O governo meteu-se numa enorme trapalhada. Esta frase não é minha – é copiada de um texto de Marisa Matias, dirigente do Bloco de Esquerda, um dos partidos que constituem a maioria parlamentar que permite a António Costa ser primeiro-ministro.

Ana Sá Lopes – jornal i, editorial

O governo só se pode queixar de si próprio – continuo a copiar Marisa Matias. Para exibir o apoio dos patrões em Bruxelas arrisca-se a ficar com uma enorme derrota na lapela. Fim de citação do texto da eurodeputada do Bloco de Esquerda publicado no site Esquerda.net.

Embora tenha sido o líder do PSD a levar mais pancada no espaço público, a verdade é que António Costa não pode negociar na concertação social uma coisa de que não tem garantias de ter apoio parlamentar. O Estado ainda não é dele. António Costa é primeiro-ministro de um governo minoritário e não é do apoio do Presidente da República nem do patronato que lhe advém a legitimidade política. Aparentemente, esqueceu-se disto.

O excesso de autoestima tende a afetar a memória. É provável que seja por perceber a embrulhada em que o governo se meteu que Pedro Nuno Santos, o até supertalentoso secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, reagiu de uma forma totalmente descabelada à ideia de Francisco Assis segundo a qual esta seria a altura de fazer eleições antecipadas. Então o Assis, que ainda por cima está – ou parece – isoladíssimo no partido, não pode dar a sua opinião sem levar uma carga de pancada? A reação de Pedro Nuno Santos só se compreende por excesso de nervosismo.

De resto, num ataque de mau gosto, acusou Francisco Assis, que tem estado discreto e até cancelou a sua participação num programa de televisão para evitar estar a criticar o governo, de procurar “mediatismo”. O desafio para que Assis apresente a proposta na comissão nacional do PS é absolutamente excessivo. O governo está nervoso e precisa de algum tranquilizante. Se Seguro ou Passos desatassem a gritar de cada vez que aparecia um crítico interno, a casa ia abaixo.

Foto: José Carlos Carvalho, em Expresso

TRUMP E A “AMEAÇA NUCLEAR”. O QUE É QUE AÍ VEM?




Entre declarações mais ou menos vagas e mais ou menos contraditórias, Donald Trump disse que os EUA deveriam expandir o seu arsenal nuclear. Mas porquê? Há quem concorde com o futuro Presidente e defenda que o país tem de estar preparado face à “ameaça nuclear” da Rússia, mas há também quem acredite que um reforço do arsenal nuclear poderá levar outros países a fazerem o mesmo, devido ao chamado “efeito-dominó”. Outros há, ainda, que nem sequer reconhecem na Rússia de Putin o inimigo nuclear que muitos apontam. O Expresso falou com três especialistas sobre este tema

O comportamento errático de Donald Trump na rede social Twitter não se cinge aos tweets contraditórios sobre as armas nucleares, mas neste tema em concreto a sua “incoerência” e “inconsistência” têm sido particularmente denunciadas.

Durante a campanha eleitoral para as eleições presidenciais, quando questionado sobre a possibilidade de os EUA usarem armas nucleares no futuro caso ele viesse a ser eleito Presidente do país, Trump respondeu a John Dickerson, apresentador do programa “Face the Nation”, da CBS News, que é “preciso ser-se imprevisível”, embora sublinhando que só “em último caso” é que ponderaria recorrer a armas nucleares.

Ainda durante a campanha eleitoral, Trump terá, de acordo com Joe Scarborough, do programa “Morning Joe”, da MSNBC, questionado várias vezes os seus conselheiros de segurança e política externa por que razão os EUA, tendo armas nucleares, não poderiam usá-las. Mais tarde, a sua equipa veio desmentir estas alegações.

ALEX WELLERSTEIN: “É MUITO PROVÁVEL QUE TRUMP NÃO SE CONHEÇA A ELE PRÓPRIO”

Vários especialistas e analistas políticos têm criticado a atitude do Presidente dos EUA, que esta sexta-feira toma posse, em relação às armas e à ameaça nuclear, posição que consideram “inconsistente”. É o caso de Alex Wellerstein, especialista em história das armas nucleares e professor assistente de Ciências e Estudos da Tecnologia no College of Arts and Letters, no Stevens Institute of Technology, em Hoboken, Nova Jérsia.

“Não estou sequer certo de que Trump saiba qual é o seu próprio posicionamento nuclear. Ele parece não estar a agir de acordo com nenhuma filosofia coerente, estratégia ou ideologia sobre as armas nucleares”, diz o especialista em entrevista ao Expresso. “Receio que, por isso, não seja sequer possível tentar adivinhar o que planeia fazer. É muito provável que nem Trump se conheça a ele próprio”.

Alex Wellerstein diz ainda que falar sobre o tema das armas nucleares implica abordar “aspectos estratégicos, políticos e técnicos muito complexos” e que não teve “nenhuma evidência de que Trump esteja a par destas questões básicas, quanto mais de todas as nuances”.

MATTHEW KROENIG: “RÚSSIA TEM MAIS OGIVAS NUCLEARES DO QUE O ESTIPULADO PELOS TRATADOS INTERNACIONAIS”

Antigo conselheiro de segurança nacional do candidato republicano Marco Rubio, durante a campanha para as eleições presidenciais, e professor na Universidade de Georgetown, em Washington D.C. (é também membro do Brent Scowcroft Center on International Security do think tank Atlantic Council), Matthew Kroenig sublinha, em entrevista ao Expresso, que é “difícil avaliar os planos de um político com base em declarações que ele fez durante a campanha”.

“Quando Trump entrar em funções e a sua equipa estiver completamente formada, vamos ter uma noção mais clara de quais são os seus planos específicos para o país”, garante este especialista.

Matthew Kroenig, que foi também conselheiro de Mitt Romney nas eleições presidenciais de 2012 e um dos 100 membros do Partido Republicano que assinaram uma carta a condenar as declarações e opinião de Donald Trump sobre a política externa do país durante a campanha eleitoral, foi um dos poucos especialistas que saiu em defesa do Presidente eleito quando este escreveu na sua conta no Twitter que os EUA “devem fortalecer e expandir fortemente o seu arsenal nuclear”.

Num artigo publicado no “Politico”, intitulado “Trump said the U.S. should expand nuclear weapons. He’s right”, Matthew Kroenig defende que os EUA “precisam de uma força nuclear robusta, não para entrar em guerra com algum país, mas precisamente o oposto: para evitar que os seus potenciais adversários usem as suas próprias armas nucleares contra os EUA e os seus aliados”.

Um dos argumentos recorrentes contra as armas nucleares é o de que se os EUA reforçarem o seu arsenal nuclear isso poderá levar outros países a fazerem o mesmo, devido ao chamado “efeito-dominó”. É precisamente isso que teme Alex Wellerstein. “O receio é de que se os EUA começarem a desenvolver mais armas e deixarem de exercer a pressão que exercem no sentido de limitar os diferentes arsenais nucleares, outros países queiram fazer o mesmo”. O Japão, em particular, “pode transformar-se num estado com armas nucleares em poucos meses se assim o desejar – tem um poder nuclear e uma indústria aeroespacial muito desenvolvidos, por isso não seria muito difícil para eles”.

Mas o risco “mais real”, alerta o especialista, é que “os países comecem a abandonar o Tratado de Não-Proliferação Nuclear [TNP, em vigor desde março de 1970], fazendo com que se torne muito mais difícil chegar a um consenso internacional em relação aos países onde a proliferação de armas nucleares pode ser verdadeiramente perigosa, como o Irão e a Arábia Saudita”. A proliferação, diz ainda Wellerstein, “tem tendência para resultar em mais proliferação, e se os países não desenvolvem bombas nucleares não é porque não tenham condições ou capacidades técnicas para isso, é porque há uma vontade política e diplomática, um acordo, e isso não pode ser quebrado”.

Matthew Kroenig, pelo contrário desvaloriza este cenário. “Essa é uma interpretação completamente errada da situação. Os EUA têm uma força nuclear superior à China desde os anos 1940 e Pequim nunca mostrou interesse em mudar isso. É a Rússia, agora, que está a modernizar e a expandir o seu arsenal nuclear e a fazer batota em relação às suas obrigações de controlo de armas. Ao reforçarem o seu arsenal, os EUA não vão dar início a uma corrida ao armamento, vão simplesmente responder às ações já iniciadas por Moscovo”, diz em entrevista ao Expresso o especialista, que não tem dúvidas da “ameaça nuclear” que representa a Rússia – e também a China –atualmente. “Espero que as armas nucleares nunca venham a ser usadas, mas um dos maiores riscos para os EUA de uma eventual guerra nuclear seria terem um arsenal fraco que levasse os seus adversários a acreditar que podiam usar as suas próprias armas e vencer”.

Evocando o tratado batizado de New Start (“New Strategic Arms Reduction Treaty”), assinado por Barack Obama e o então Presidente russo Dmitry Medvedev (atual primeiro-ministro do país), em abril de 2010, em Praga, e que veio limitar o arsenal nuclear dos dois países a 1550 ogivas nucleares operacionais – além de definir mecanismos de monitorização mais eficazes sobre os respetivos arsenais – e citando o departamento de Estado norte-americano, Kroenig diz que a Rússia possui atualmente mais 250 ogivas nucleares do que o permitido e que os EUA, pelo contrário, têm menos 200 ogivas do que o limite estipulado.

“Moscovo detém atualmente uma superioridade nuclear sobre os Estados Unidos de mais de 400 ogivas, o que é muito preocupante e levanta sérias dúvidas sobre se Moscovo tenciona ou não cumprir o acordo assinado”, aponta.

Sobre isto, Alex Wellerstein, que diz nem sequer gostar de “entrar na discussão dos números”, questiona: “Mas será que alguém acredita mesmo que a Rússia iria arriscar um ataque nuclear contra os EUA? Será que ter mais algumas centenas de ogivas faz assim tanta diferença?” Na opinião do especialista, mais do que “estarem preocupadas com números específicos, as pessoas deviam questionar-se até que ponto uma força nuclear robusta consegue mesmo evitar ataques. Entrar nesse jogo dos números é meio caminho andado para perder o rasto àquilo que importa”, diz. E depois acrescenta: “Moscovo deverá ter as suas razões para acreditar que uma ligeira superioridade numérica torna a Rússia um país mais seguro; se isso não nos tornar a nós menos seguros, eu estou disposto a deixá-los sentirem-se seguros”.

Os argumentos apresentados por Matthew Kroenig foram igualmente refutados por Steven Pifer, diretor do grupo de trabalho Arms Control and Non-Proliferation, da Brookings Institution, num artigo posterior publicado no “Politico”. Pifer, também membro do Center for 21st Century Security and Intelligence, da mesma instituição, acusou Matthew Kroenig de fazer uma leitura errada dos números, uma vez que “se olharmos atentamente para os dados percebemos que os EUA têm arsenal suficiente para deter eventuais ameaças”, e defendeu que “não por há por isso necessidade nenhuma de aumentar o número de ogivas nucleares”.

Confrontado pelo Expresso com esta resposta, Kroenig limitou-se a dizer que foi precisamente esse “julgamento errado que deixou os EUA mais fracos durante o mandato de Obama”, mas que “felizmente a era Obama terminou e está agora a caminho uma nova administração, que vai fazer o que está certo e garantir que os Estados Unidos têm capacidade para se defender a si próprios e aos seus aliados”.

“SÓ UM PEQUENO SECTOR DA ELITE EDUCADA SE PREOCUPA COM AS ARMAS NUCLEARES NOS EUA”

“Não votem em pessoas que têm, unilateralmente, o poder acionar armas nucleares”, escreveu Alex Wellerstein no seu blogue “Restricted Data: The Nuclear Secrecy Blog”, em novembro do ano passado, explicando depois que “tecnicamente, o processo eleitoral é o único meio de controlo do Presidente”, uma vez que “toda a ideia por trás do sistema de comando e controlo norte-americano é garantir que o Presidente e apenas o Presidente pode autorizar uma guerra nuclear quando quiser”, de forma “unilateral”, sem o aval seja do Congresso, seja dos tribunais.

É assim pelo menos desde 1946, quando o então Presidente Harry Truman aprovou, “ao fim de nove meses de audições no Congresso, o Atomic Energy Act, que transferiu o poder de usar a bomba atómica para as mãos do Presidente”, lembra o especialista, sublinhando o carácter “controverso” da lei redigida meses após os bombardeamentos nucleares em Hiroshima e Nagasaki.

Será que os americanos que votaram em Trump não sabiam qual era a sua opinião, coerente ou menos coerente, em relação às armas nucleares? Ou será que sabiam mas ainda assim decidiram confiar nele? “Infelizmente, a política de armas nucleares não é um assunto que interesse ao eleitorado americano neste momento, embora tenha havido outras alturas em que sim, em que o assunto interessava”, responde Alex Wellerstein.

“Atualmente, só um pequeno sector da elite educada se preocupa com isso, e mesmo assim preocupa-se com isso como se preocupa com muitos outros assuntos”. O historiador não considera que o tema não tenha sido suficientemente abordado durante a campanha eleitoral, “simplesmente as pessoas, no geral, estão mais preocupadas com outras áreas, como a economia, o ambiente, a segurança social e a saúde, áreas que as afetam diretamente”.

No primeiro dos três debates televisivos, antes das presidenciais, entre Donald Trump e a então candidata democrata Hillary Clinton (Universidade Hofstra, em Long Island, Nova Iorque), Trump foi confrontado por Lester Holt, apresentador da CBS responsável por moderar a conversa, com um artigo publicado pelo “Washington Post” que dizia que Obama poderia estar a ponderar, como medida a adotar numa fase final do seu mandato, alterar a política nuclear norte-americana e assumir o compromisso de “no first use” para o país.

Esse passo representaria, antes de mais, uma mudança inédita na o«posição nuclear dos EUA, mas também o cumprir de uma promessa de um Presidente que colocou o desarmamento nuclear no topo das prioridades da sua política externa, nomeadamente relançando negociações com a Rússia e tentando influenciar o tabuleiro internacional no sentido de pressionar duas das grandes potências nucleares, o Irão e a Coreia do Norte, e que além disso venceu o Prémio Nobel da Paz no primeiro ano do seu mandato (2009) pelos seus “esforços com a vista a um mundo sem armas nucleares”.

Confrontado, então, com essa hipótese avançada pelo “Washington Post”, Donald Trump garantiu que “não atacaria primeiro” nenhum outro país numa situação de conflito, porque “uma vez que o recurso a armas nucleares passe a ser uma realidade, está tudo terminado”, mas não excluiu a hipótese de vir um dia a usá-las. “Temos de estar preparados. Não posso descartar nenhuma hipótese”.

Foi também durante a campanha que Trump sugeriu que a Coreia do Sul, o Japão e a Arábia Saudita deveriam desenvolver as suas próprias armas nucleares para se protegerem das ameaças da Coreia da Norte em vez de dependerem dos EUA para isso, uma vez que o país que se prepara para liderar, e não pode continuar a ser “o polícia do mundo”, disse o próprio numa entrevista ao “New York Times”.

“Há de chegar o momento”, disse então Trump, “em que os EUA serão incapazes de continuar a suportar esses custos”, porque “já não têm o dinheiro que tinham nem são a nação rica que eram quando fez esses acordos de defesa”, além de que o arsenal nuclear norte-americano “está atualmente muito degradado e já ninguém sabe sequer se funciona”. Trump não deixou, porém, de sublinhar que “o maior problema do mundo é a proliferação nuclear” e que vivemos num “mundo nuclear assustador”.

Kingston Reif, diretor do programa de Desarmamento e Redução da Ameaça Nuclear da Associação para o Controlo das Armas dos EUA, considera esta sugestão/proposta de Trump “radical e altamente perigosa”, além de ser “totalmente inédita”. “Durante mais de 70 anos, os EUA, tanto sob administrações republicanas como democratas, tentaram evitar de forma muito ativa que os seus aliados e adversários procurassem meios de produzir bombas nucleares. E na maior parte dos casos conseguiram”. Por isso é que “78% dos republicanos, 73% dos democratas e 68% dos independentes defendem que prevenir a proliferação de armas nucleares está no topo das prioridades do país no que diz respeito à política externa”, diz o especialista, citando um estudo de opinião elaborado pelo Chicago Council on Foreign Relations em 2015.

“Se os Estados Unidos quebrarem o seu compromisso de defesa com o Japão e a Coreia do Sul e derem luz verde a esses países para desenvolverem as suas próprias armas nucleares, isso vai complicar e agravar a ameaça nuclear em toda a Ásia e, em última instância, também em território norte-americano.”

Helena Bento – Expresso – Foto: Andrew Caballero / AFP / Getty Images

OBAMACARE: ORDEM PARA ABATER



Foi a primeira "ordem executiva" de Donald Trump, assinada na Casa Branca. Novo presidente quer ver-se livre da política de saúde pública criado por Obama.

A assinatura aconteceu pouco depois do desfile inaugural terminar.

Donald Trump deu ordem à administração que aliviem os encargos regulatórios associados com o Obamacare, tal como deterrmina o Congresso dos EUA, de maioria republicana e que nunca apoio esta política do antigo Presidente.

O porta-voz da Casa Branca, Sean Spicer, também disse a repórteres que o Chefe de Gabinete de Trump, Reince Preibus, enviou um memorando para a administração para que congelem de imediato a regulamentação da Lei de Saúde.

A lei conhecida por "Obamacare" pretende aumentar a qualidade, a disponibilidade e o acesso a seguros de saúde, privados e públicos. Estima-se que 44 milhões de norte-americanos, até então sem qualquer cobertura, passem assim a ter esta proteção.

Trump também assinou as nomeações para o secretário de Defesa, James Mattis, e seu secretário de Segurança Interna, John Kelly, que foram confirmados pelo Senado na sexta-feira.

TSF - Foto: Jonathan Ernst


Casa Branca abandona política de combate à poluição e aposta nos hidrocarbonetos



Os EUA vão abandonar a sua política de redução de energias poluentes e retomar as perfurações do petróleo e gás de xisto, anunciou hoje a Casa Branca.

A nova presidência Trump justificou a medida com a criação de emprego e obtenção de receitas para pagar a renovação das infraestruturas públicas.

Em relação ao clima, Trump "compromete-se a eliminar as políticas desnecessárias e prejudiciais, como o plano para o clima e as águas", seguido pelo seu antecessor, Barack Obama, indica um texto colocado no sítio da Casa Branca, mal o novo presidente tomou posse.

O plano de Obama, batizado "Plano de Ação para o Clima", adotado durante o seu segundo mandato, permitiu elaborar padrões federais para eliminar as fontes mais poluidoras, como as centrais térmicas mais antigas, modernizar a produção elétrica, sob o controlo da agência de proteção do Ambiente, a quem tinham sido atribuídos extensos poderes.

Com a intenção de colocar os EUA na via da transição energética, o plano encorajava também os esforços em energias renováveis.

"Levantar todas as restrições vai ajudar enormemente os trabalhadores norte-americanos, aumentar os salários em mais de 30 mil milhões de dólares (28 mil milhões de euros) nos próximos sete anos", argumentaram os serviços da Casa Branca, que, ao contrário, não adiantaram nada sobre o Acordo de Paris contra as alterações climáticas ou o controverso projeto do oleoduto Keystone XL.

Durante a campanha eleitoral, Trump classsificou as alterações climáticas, resultantes do aquecimento global, como "uma mistificação".

A Casa Branca indicou também que a perfuração do petróleo e gás de xisto iam ser retomadas nos EUA, cujas reservas estão estimadas num valor de 50 mil milhões de dólares.

"A administração Trump vai abraçar a revolução do petróleo e gás de xisto para criar empregos e trazer a prosperidade a milhões de norte-americanos", afirmou-se no texto.

Os rendimentos obtidos com a exploração destes hidrocarbonetos, extraídos com a polémica técnica da fraturação hidráulica, vão servir para financiar a reconstrução de infraestruturas públicas, como estradas, escolas e pontes, argumentou a Casa Branca.

RN // ARA - Lusa

Marcha das Mulheres anti-Trump também acontece hoje em cinco cidades portuguesas



Cinco cidades portuguesas vão juntar-se ao mega protesto, conhecido como Marcha das Mulheres, previsto para hoje em Washington e em mais de 60 países para contestar o novo Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

O protesto acontece um dia depois do controverso multimilionário ter prestado juramento como 45.º Presidente dos Estados Unidos.

Na capital federal dos Estados Unidos são esperadas pelo menos 200 mil pessoas, incluindo várias celebridades, segundo os organizadores da marcha americana.

Em Portugal, a Marcha das Mulheres tem início previsto para as 15:00 em Lisboa, Porto, Coimbra, Braga e Faro e pretende ser uma iniciativa de protesto contra o novo inquilino da Casa Branca e aos comentários sexistas e misóginos que proferiu durante a campanha presidencial, mas também uma ação para reafirmar a luta contra a questão do assédio sexual, segundo afirmou à agência Lusa Joana Grilo, a organizadora da iniciativa em Lisboa.

A promoção da igualdade de direitos para as mulheres e da defesa de grupos marginalizados também são outras das motivações do protesto.

Em Lisboa, a Embaixada dos Estados Unidos foi o local escolhido pela organização da marcha. No Porto, a iniciativa vai decorrer na Praça dos Poveiros.

A Marcha das Mulheres ganhou dimensão de movimento global e, segundo os organizadores, pelo menos 161 protestos estão agendados em mais de 60 países dos sete continentes. Nos Estados Unidos, estão previstas mais de 350 manifestações.

SCA // VM - Lusa

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