sexta-feira, 6 de abril de 2018

PORTUGAL | Indignação e Contestação na Cultura

Paula Santos | Expresso | opinião

Descontentamento! Indignação! Protesto! Reivindicação!

Foi desta forma que as estruturas de criação artística reagiram aos resultados dos concursos de apoios sustentados às artes (teatro, música, dança, artes circenses e de rua, artes visuais e cruzamentos disciplinares) para os anos 2018-2021.

Os resultados dos referidos concursos, alguns ainda que provisórios, revelam a opção da política cultural do atual Governo. O Governo mantem uma política de desvalorização da cultura, que se traduz na insuficiência das verbas alocadas, nos desequilíbrios territoriais, e no comprometimento do desenvolvimento da criação e fruição cultural.

Há estruturas que tiveram cortes nos apoios. Há estruturas elegíveis excluídas dos apoios. Na avaliação considera-se que a candidatura de determinada estrutura é elegível, mas depois não há lugar a apoio. Que critérios estiveram subjacentes a decisões desta natureza?

O contexto das estruturas de criação artística já era muito difícil, devido aos sucessivos cortes no apoio às artes iniciado em 2010 e levados a níveis extremos por PSD e CDS. Com o atual Governo as verbas destinadas ao apoio às artes mantêm-se a níveis claramente redutores face às potencialidades de desenvolvimento da atividade artística pelo país.

A manter-se esta perspetiva, o Governo conjuntamente com PSD e CDS são responsáveis pela fragilização das estruturas de criação artística, podendo inclusivamente condenar algumas delas ao encerramento, com a subsequente extinção de postos de trabalho atirando os trabalhadores para uma situação de desemprego. A realidade concreta comprova que o atual Governo não rompeu com as opções políticas do passado.

Face ao crescimento da contestação dos profissionais e das estruturas de criação artística, o Governo procura remediar a situação com esclarecimentos acrescidos e anúncio do reforço de dois milhões de euros, que no fundamental não resolvem nenhum problema.

Na análise e discussão do Orçamento do Estado para 2018 o PCP já tinha identificado a insuficiência das verbas destinadas ao apoio às artes. Apresentámos uma proposta para a reposição do montante antes dos cortes, isto é, a verba de 2009 acrescida das atualizações. Propusemos ainda que o Governo no ano de 2018, elaborasse o Plano Nacional de Desenvolvimento para as Artes e a Cultura, com o objetivo de planificar a intervenção do Estado no setor da cultura e de, progressivamente, incrementar a
afetação de recursos públicos até atingir o patamar mínimo de 1% da despesa pública, prevista em Orçamento do Estado, para a política cultural. PS, PSD e CDS são responsáveis pela não aprovação destas duas propostas.

Antes da definição do novo modelo de apoio às artes pelo Governo, o PCP apresentou uma proposta sobre esta matéria em junho de 2017, da qual constava os princípios de apoio às estruturas, a avaliação das candidaturas em função de critérios artísticos e não economicistas; a simplificação dos processos; a calendarização e operacionalização a dos procedimentos concursais que garanta a aprovação de resultados e de disponibilização da primeira tranche de apoio atempadamente; a criação de novas linhas de apoio e a atualização a partir de 2019 de cada quadro concursal, assumindo como critério o apoio que corresponderia ao total de candidaturas do ano anterior.

A atual situação exige explicações do Governo, por isso o PCP requereu a presença do Ministro da Cultura na Assembleia da República. Que medidas vão ser tomadas para que todas as estruturas de todas as áreas que requereram apoio e não o obtiveram possam prosseguir a sua atividade? O que pretende o Governo fazer nos casos em que o apoio atribuído se revelar insuficiente? O que prevê afinal o Governo relativamente às opções políticas no que se refere aos apoios às artes? São alguns dos aspetos que aguardam resposta.

Há duas questões que importa ter em conta face à situação criada pelo Governo: por um lado os resultados tornados públicos não se podem consumar, pelo que significa de retrocesso no desenvolvimento da atividade cultural, por outro lado o modelo de apoio às artes aprovado pelo Governo demonstrou que não serve e que não responde às necessidades na área cultural.

Os profissionais e as estruturas de criação artística agendaram ações de luta para as cidades de Lisboa, Porto, Coimbra e Funchal no próximo dia 6 de abril. Reivindicam um novo modelo de apoio às artes, que valorize o trabalho artístico e com o adequado financiamento, a reposição das verbas aos apoios às artes de 2009, o combate à precariedade e o compromisso de 1% do Orçamento do Estado para a cultura.

A criação de um Serviço Público de Cultura assente na liberdade e da criação artística, na coesão e a diversificação cultural e no respeito pelos direitos dos trabalhadores, é o que corporiza o princípio constitucional do direito à criação e à fruição cultural.

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