André Barrocal |
Carta Maior
Desde o início do governo Michel Temer, o
PSDB comanda o ministério das Relações Exteriores e diz levar adiante uma
política externa “de Estado”, não “de partido”, como teria sido na era petista.
Foi assim com José Serra, é assim com o também senador Aloysio Nunes Ferreira, atual comandante da
pasta. A prática tucana, porém, não para de desmentir o verbo e de mostrar um
Itamaraty partidarizado.
Na terça-feira 15, seis ex-líderes europeus progressistas defenderam
o direito de o ex-presidente Lula ser candidato de novo em outubro. O chanceler
teve um chilique. Em nota no dia seguinte, Ferreira chamou o gesto europeu de
“preconceituoso, arrogante e anacrônico”. Baita mal-estar entre diplomatas,
segundo alguns ouvidos pela reportagem.
A agressividade de Nunes Ferreira foi
tanta que Eliseu Padilha, ministro-chefe da Casa Civil, precisou recorrer à sensatez.
Ele lembrou o óbvio: a questão sobre a candidatura de Lula não passa pelo
governo federal. "Aqui no Brasil respeitamos o tripartimento dos
poderes. O que o poder Judiciário decidiu não vamos discutir."
Nunes
Ferreira está desde o dia 7 em viagem pela Ásia, onde se reuniu, por exemplo,
com autoridades do golpe militar dado na Tailândia em 2017. Reagiu
imediatamente ao manifesto pró-Lula. Já sobre a ruptura no dia 8, pelos Estados
Unidos, do acordo nuclear com o Irã, silêncio de uma semana. Ao se pronunciar,
o Itamaraty emitiu um comunicado anódino, que sequer citava os EUA.
Não é a
primeira vez que o Itamaraty de Ferreira berrou partidariamente. Um ano
atrás, quando Temer botou o Exército na rua em Brasília após protestos,
organismos internacionais de direitos humanos criticaram o Brasil. Do
chanceler: “Teor desinformado e tendencioso”, “leviandade”, e por aí vai.
Outro exemplo
de partidarismo? Hoje, a principal missão de Ferreira, que costuma levar a
esposa Gisele Sayeg em suas viagens nas asas da FAB, parece ser preparar uma
espécie de plano de fuga para um pessoal enroscado em processos na Justiça. A
começar por ele mesmo.
Entre
diplomatas, ouve-se que o chanceler reservou para si a embaixada em Paris e a
de Roma e Portugal para Temer e um outro emedebista. O motivo? Chefe de missão
diplomática tem foro privilegiado, só pode ser investigado nas altas cortes em
Brasília.
Alvo de dois processos, por corrupção, quadrilha
e lavagem de dinheiro, que só esperam o fim de seu mandato para correrem na
Justiça comum, Temer é candidato a ir em cana a partir de 2019. Se seus casos
estiverem no Supremo Tribunal Federal (STF), não com um juiz de primeira
instância, aí a chance diminui.
Não é à toa
que, entre tucanos e emedebistas, discute-se abertamente a garantia de uma
embaixada a Temer no próximo governo, uma tentativa de unir PSDB e MDB na
eleição.
Geraldo
Alckmin, o presidenciável tucano, foge de assumir compromissos com Temer, mas
seus índices nas pesquisas deixam correligionários desesperados e dispostos a
um acordo com o MDB, para aumentar o tempo da propaganda alckmista na TV e a
tropa de cabos eleitorais no País.
Quer mais um
caso de partidarismo? Uma das principais assessoras do gabinete de Ferreira é a
economista Ana Lobato, uma antiga colaboradora do PSDB. No governo Fernando
Henrique Cardoso (1995-2002), ela ajudou a unificar cadastros da área social.
Depois de
FHC, foi trabalhar para o PSDB no Senado. Estava com Ferreira na liderança
tucana e foi levado por ele para o ministério. Em 18 de abril, foi promovida a
“comendadora”, uma das honrarias do Itamaraty. Um decreto assinado por Temer e
o chanceler da política externa “de Estado”.
Será por
causa dessa partidarização no Itamaraty que gente por lá ficou contrariada com
o fato de a turma deste ano de novos diplomatas ter escolhido a vereadora
assassinada Marielle Franco como patrona?
Foto: Lula Marques/AGPT
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