terça-feira, 12 de junho de 2018

O ataque de raiva de Trump e a economia mundial


Michael Roberts

A reunião do G7 em Quebeque, Canadá, foi memorável sob muitos aspectos. Primeiro, houve uma clara ruptura na habitual insípida unidade de objectivo e política expressa nas reuniões do G7 pelos líderes dos sete principais países capitalistas do mundo. 

Pouco antes da reunião do G7 o presidente Donald Trump anunciara uma série de medidas de tarifas proteccionistas contra o resto do G7, inclusive o seu vizinho mais próximo, o Canadá, com o argumento da "segurança nacional" – aparentemente o Canadá agora é um risco para a segurança para os EUA. Ao assim fazer, Trump cumpriu suas promessas eleitorais .

Na reunião Trump atacou os outros líderes afirmando que seus governos estavam a impor regras comerciais "injustas" sobre produtos estado-unidenses e que precisavam reduzir seus excedentes no comércio com os EUA. Os outros já haviam respondido às medidas tarifárias dos EUA com o planeamento de tarifas recíprocas sobre exportações chave dos EUA e agora replicaram aos ataques de Trump com argumentos e evidência de que, ao contrário, eram os EUA que restringiam a importação de bens e serviços estrangeiros.

Assim, começou a guerra comercial – uma guerra em que as principais economias capitalistas não se empenhavam desde a depressão dos anos 1930s e que supostamente estava resolvida por acordos internacionais como o General Agreement on Tarifs and Trade (GATT), a Organização Mundial do Comércio (OMC) e o North American Free Trade Agreement (NAFTA) no período do pós guerra. Trump considerou a OMC como o pior acordo comercial possível e o NAFTA como o segundo pior (para a América). A América havia protegido os estados capitalistas europeus e o japonês com seus exércitos e armas nucleares contra a suposta ameaça russa e agora era a vez de eles pagarem tanto através de gastos em defesa como de acordos comerciais "mais justos". A ironia real neste argumento de Trump foi ele conclamar a que a Rússia, o suposto inimigo, tivesse outra vez um lugar na mesa principal – conversa que somou o insulto à injúria.

O que todas estas travessuras trumpistas revelaram é que o período da Grande Moderação e da globalização, desde os anos 1980s até 2007 , quando todos os estados capitalistas importantes trabalhavam em conjunto para beneficiar o capital em todos os países (em variados graus) está acabado. A Grande Recessão de 2007-8 e a Longa Depressão que se seguiu desde 2009 mudaram o quadro económico. Numa economia capitalista mundial em estagnação, onde o crescimento da produtividade é baixo, o crescimento do comércio mundial tem decaído e a lucratividade do capital não se recuperou, a cooperação foi substituída por uma competição cada vez mais viciosa – os ladrões tem brigado.

Trump é o líder "populista" e nacionalista da maior potência capitalista; a Itália (o mais fraco do G7) tornou-se também "populista" e nacionalista. E a Grã-Bretanha está trancada na cova do "Brexit", um desastre para o capital britânico da sua própria lavra. O ataque de Trump significou que a reunião do G7, a qual discutia o aumento da desigualdade, a automação e a mudança climática – os desafios chave a longo prazo para a sobrevivência do capitalismo – foi paralisada.

Mas não importa, por agora. A economia mundial está realmente a parecer melhor desde o fim da Grande Recessão. O Banco Mundial estima que o crescimento real do PIB global será de 3,1% este ano, o mesmo de 2017. Isso pode não parecer muito alto, mas é uma subida após o período de quase recessão de 2015-16, quando o crescimento global caiu para apenas 2,4% e as economias do G7 não podiam obter mais do que 1,5%. Agora as economias do G7 estão a expandir-se em torno da taxa dos 2,5%. O desemprego nos EUA, no Reino Unido e no Japão é o mais baixo de todos os tempos. E mesmo na Europa, a taxa de desemprego caiu para 8%, ainda acima dos níveis anteriores à crise mas a recuperar-se.

Contudo, no mais recente Global Economic Prospects , economistas do Banco Mundial não estavam convencidos de que esta moderada recuperação (ainda uns 30% abaixo da taxa de crescimento mundial anterior à crise) irá ser sustentada. "É expectável que se reduza nos próximos dois anos, quando a inactividade global se dissipar, o comércio e o investimento moderarem-se e as condições de financiamento endurecerem. O crescimento em economias avançadas está previsto que se desacelere rumo a taxas potenciais, quando a política monetária se normalizar e os efeitos do estímulo orçamental dos EUA desvanecerem-se". Além disso, "A perspectiva dos riscos permanece inclinada em rumo descendente. Elas incluem movimentos desordenados no mercado financeiro, escalada do proteccionismo comercial, aumento da incerteza política e ascensão de tensões geopolíticas, todas as quais continuam a enevoar a perspectiva".

Sugeri no fim do ano passado que o ciclo comercial de curto prazo de 2015 a 2016 atingiria o pico em 2018 e a seguir acalmaria em 2019-20. "O que parece ter acontecido é que houve uma recuperação cíclica de curto prazo a partir de meados de 2016, após uma quase recessão global desde o fim de 2014 até meados de 2016. Se o fundo de ciclo Kitchin foi em meados de 2016, o pico deveria ser em 2018, com uma oscilação para baixo depois disso". E reiterei essa previsão em Abril .

Os economistas do Banco Mundial parecem concordar. Eles esperam que o crescimento económico mundial baixe para 2,9% em 2020. "A expansão económica global permanece robusta mas tem amortecido... A actividade global ainda está atrás de expansões anteriores e o crescimento deve-se desacelerar em 2019-20 quando o comércio e o investimento se tornar moderado. O progresso do rendimento per capita será desigual e insuficiente para enfrentar a extrema pobreza na África sub-saariana". E "Não obstante a expansão global em curso, espera-se que só 45 por cento dos países experimentem uma nova aceleração do crescimento este ano, abaixo dos 56 por cento em 2017. Além disso, a actividade global ainda se atrasa em relação a expansões prévias apesar da recuperação já de uma década da crise financeira global". Assim, o Banco Mundial considera que a Longa Depressão continuará.

E isto é assumindo não haver qualquer nova queda nos próximos dois anos. Se bem que não haja qualquer sinal imediato de uma nova recessão global (na verdade, aparentemente o oposto), há muitos factores a acumularem-se que sugerem não estar demasiado distante. O primeiro é o facto óbvio de que a actual recuperação muito fraca da Grande Recessão é a segunda mais longa expansão no período pós 1945, alcançando dez anos no próximo Verão de 2019 – se perdurar até lá.

E há a questão da lucratividade. No primeiro trimestre de 2018, as 500 principais companhias dos EUA atingiram um aumento de 26% nos ganhos por acção. Mas isto deveu-se principalmente à enorme redução fiscal engendrada pela administração Trump. Quando se olha para os lucros de todo o sector corporativo antes das reduções fiscais, verifica-se que houve uma queda no 1º trimestre de 2018 (-0,6%) a qual se seguiu a uma queda no 4º trimestre de 2017 (-0,1%). A prosperidade de Trump foi um facto isolado. E a lucratividade média nas economias G7 permanece abaixo dos níveis pré crise mesmo após dez anos de recuperação. 

KIM E TRUMP, UM ENCONTRO DE PESO E DE BOA FÉ?


Não há volta a dar sobre o que mais pesa em importância na profícua e incontornável enxurrada de notícias e imagens sobre a cimeira entre Trump e Kim em Singapura. Ambos de boa fé? É o que veremos futuramente.

Vamos ficar por aqui e convidar-vos a acompanharem também no Expresso o que existe sobre o tema. Por isso mesmo não consideramos que haja muito mais a acrescentar neste espaço em que temos por hábito fazer umas quantas notas a anteceder o que profissionais do Expresso nos facultam todos os dias úteis da semana com o seu matinal Curto. Propomos que o curta. Saiba que a foto em cima faz parte da manchete do Expresso, pelo menos online. Ficamos por aqui. Adeus e até ao nosso regresso. (CT | PG)

Bom dia este é o seu Expresso Curto

O que fazem dois ‘homens maus’ à volta de uma mesa?

João Vieira Pereira | Expresso

CIMEIRA EUA COREIA DO NORTE | À hora que escrevia este Expresso Curto Donald Trump e Kim Jong-un assinavam um acordo histórico cujo conteúdo começa a ser conhecido. Mas as palavras de Trump não deixam dúvidas sobre a perceção que o Presidente norte-americano teve em relação ao encontro: “melhor do que alguém poderia imaginar”.

Bloomberg diz que teve acesso ao documento e que estes serão os 4 pontos do acordo:
1. Os Estados Unidos e a Coreia comprometem-se a estabelecer novas relações em acordo com o desejo de manter a paz e prosperidade dos dois países.

2. Os dois países irão juntar esforços para construir um longo e estável regime de paz na Península da Coreia.

3. A Coreia do Norte compromete-se com a total desnuclearização da Península da Coreia.

4. Os Estados Unidos e a Coreia do Norte comprometem-se a recuperar os restos mortais de prisioneiros de guerra e desaparecidos em combate, bem como o imediato repatriamento dos já identificados.

No final da manhã de trabalhos entre as duas delegações os dois apareceram juntos com os documentos assinados e o mundo foi brindado com as declarações de um Trump otimista: “tivemos um dia fantástico e aprendemos muito sobre cada um dos nossos países”. E quando lhe perguntaram o que aprendeu sobre Kim, respondeu: “descobri que ele é um homem muito talentoso e que ama muito o seu país”.

Para Kim Jong-un esta foi “uma reunião histórica” na qual a Coreia decidiu “deixar o passado para trás” e que a partir deste dia “o mundo vai assistir a uma grande mudança”.

Eram duas da manhã em Lisboa quando começou o aperto de mão que durou 13 segundos, trocaram-se as palavras de circunstância. O líder norte-coreano foi contido ao dizer que “não foi fácil chegar até aqui. Houve obstáculos mas ultrapassámo-los para aqui estarmos”, enquanto o presidente norte-americano teceu elogios ao ditador, passando a imagem que estava muito mais à vontade com Kim Jong-un do que entre os líderes do G7 ainda há poucos dias. Fica a estranha sensação que Trump parece confortável ao lado de Kim Jong-un, mais do que na já icónica fotografia onde jaz sentado sob o avanço intimidador de Angela Merkel. Como escreve Rui Cardoso, este é apenas um dos pontos pela qual esta cimeira pode ser uma ratoeira para Trump.

No final desta cimeira histórica em Singapura, Donald Trump e Jong-un vão reclamar para si vitória. O primeiro por ter conseguido fazer do mundo um lugar mais seguro, o segundo por ter vergado a poderosa América à sua vontade. Só o tempo dirá se Singapura foi palco de um acontecimento de relevância ou de um espetáculo adequado ao ego de cada um dos intervenientes.

Se Trump é difícil de perceber, entender o que vai na cabeça de Kim Jong-un só pode ser um exercício impossível. No limite um ditador sanguinário procura acima de tudo a sua sobrevivência. E isso passa por garantir a segurança do seu regime, o respeito interno e alguma forma de salvar a Coreia do Norte de uma eterna crise económica. Já Trump procura a desnuclearização da região e a diminuição da confrontação com a Coreia do Sul e o Japão — (só no ano passado a Coreia do Norte fez seis testes nucleares e lançou 24 mísseis experimentais)— e até alguma diminuição da influência da China junto do regime norte coreano.

Mas o que significa a desnuclearização da Coreia do Norte? Os dois países podem ter posições muito diferentes sobre este ponto, mas na visão ocidental isso implica o desmantelamento e remoção de todas as armas nucleares, a paragem do enriquecimento de urânio, o encerramento de reatores nucleares e de locais de testes, a paragem da produção de bombas de hidrogénio, e a garantia de total acesso de inspetores independentes a todos estes sítios.

E hoje estarão mais ou menos a aplaudir de pé o “Fuck Trump” de Robert de Niro?

SPORTING, E VÃO MAIS 4. Bas Dost, Gelson, William, Bruno Fernandes e com eles 114,5 milhões de euros. “Cala-te, pá!”. Até quando Bruno de Carvalho continuará a falar para tentar explicar o que não tem explicação? Até quando continuará a ter o apoio dos sócios? A crise do Sporting há muito que é uma hecatombe. Só o presidente do Sporting não vê que o problema é ele. Os jornais de hoje contam que Battaglia, Acuña, Mathieu e Rúben Ribeiro podem ser os próximos a rescindir. E há já quem diga que alguns podem estar a caminho do Benfica.

Ontem à noite Bruno de Carvalho voltou a falar em cabala contra o Sporting, mas deixou uma novidade. Se os jogadores voltarem ele demite-se de imediato, desde que eles assumam que voltam para jogar no Sporting mesmo que ele volte a ganhar futuras eleições.

OUTRAS NOTÍCIAS

Escolas fechadas a tempo e horas A greve dos professores às reuniões de avaliação pode levar a que milhares de conselhos de turma sejam adiados, o que significaria atrasos no lançamento das notas. O Ministério da Educação está preocupado com o impacto nas escolas e no normal encerramento do ano letivo e enviou novas orientações para "assegurar a atempada conclusão do ano letivo". Alunos vão poder ir a examemesmo que não conheçam as notas dadas pelos seus professores.

Mais greves nos comboios Os sindicados lamentam as definições dos serviços mínimos da greve da CP e da Meway (antiga CP Carga) para esta terça e quarta-feira. Tanto que já há um novo pré-aviso de greve, para 23 e 24 de junho.

Melhores vias para os comboios A Infraestruturas de Portugal lançou um concurso para renovar 17 quilómetros da linha do Norte, entre Espinho e Vila Nova de Gaia. São 49 milhões de euros, que envolvem a eliminação de 18 passagens de nível, a elevação e alargamento de plataformas de acesso de estações e apeadeiros, a reformulação do layout das estações de Granja e Gaia e a criação de duas vias eletrificadas para aumentar a capacidade da via no transporte de mercadorias.

Colégios a fechar Foi há dois anos que o Governo decidiu rever os contratos de associação das escolas privadas e cooperativas. Dos 79 colégios que beneficiavam dos apoios do Estado, quatro fecharam no final do ano letivo 2016/2017, e mais dois na última semana.

Arguidos de Pedrógão O Ministério Público já ouviu duas centenas de pessoas na investigação aos fogos da zona centro em junho do ano passado. A acusação deverá estar fechada em agosto. E no total existem dez suspeitos formais, todos pessoas singulares.

A década de Moçambique A convicção é de Carlos Gomes da Silva, presidente executivo da Galp, que considera que Moçambique poderá vir a ser fundamental ao preencher a procura que se antecipa no mercado internacional de gás e que não será satisfeita pelos atuais produtores.

Más notícias de Itália O governo italiano recusou que o MS Aquarius atracasse. Matteo Salvini, o novo ministro do Interior italiano (da extrema direita), disse não e não, pondo em pausa o destino de 629 pessoas. E cantou vitória quando Pedro Sánchez disse que os refugiados, incluindo 100 crianças, que tinham sido resgatados no mediterrâneo, eram bem recebidos em Valência. A situação a bordo é dramática e quase insustentável. Espera-se um verão tenso durante o qual o fluxo de migrantes deve aumentar consideravelmente.

Boas notícias de Itália Giovanni Tria é o novo ministro da Economia/Finanças de Itália, que no domingo veio acalmar os mercados e os países europeus ao afirmar que “a posição do Governo é clara e unânime. Não há qualquer discussão sobre sair do Euro”. Os mercados aplaudiram, com uma queda acentuada da taxa de juro da dívida italiana e uma subida das ações dos principais bancos italianos.

O desertor que estava ali na esquina William Howard Hughes, oficial da força aérea norte americana com acesso a material secreto, estava desaparecido há 35 anos. Afinal vivia desde então na Califórnia.

Cripto-insegurança Durante o fim de semana, a criptomoeda Coinrail foi alvo de um ataque por hackers. Resultado: por todo o mundo o valor das moedas virtuais está em queda e a atingir o valor mais baixo dos últimos dois meses. A juntar às más noticias está a informação de que os reguladores norte-americanos abriram uma investigação sobre uma possível manipulação do mercado.

Dieselgate As autoridades alemãs fizeram buscas nas residências de altos funcionários da Audi relacionadas com a investigação criminal sobre o escândalo das emissões dos veículos da Volkswagen. Estão a ser investigados mais de 20 suspeitosde terem pactuado com a fraude.

Morte no asfalto O jovem piloto espanhol de Moto 3 Andreas Pérez, de 14 anos, não resistiu aos ferimentos causados num gravíssimo acidente de domingo, no circuito de Montmeló (Catalunha).

Vidas presas no gaming Um jovem inglês de 15 anos poderá vir a ser o primeiro caso de severa dependência por jogos online a ser diagnosticado pelo sistema de saúde britânico.

Penas exemplares em Hong Kong Três jovens manifestantes da oposição radical foram condenados a severas penas, as mais altas para este género de ‘crimes’ desde que o território voltou para a administração chinesa. Um dos líderes de um movimento que defende a independência em relação à China, Edward Leung, foi preso por seis anos por tumultos e ataques à polícia num protesto em 2016. Dois outros ativistas, Lo Kin-man e Wong Ka-kui, receberam penas de sete anos e de três anos e meio de prisão, respetivamente.

Vamos às capas de alguns jornais de hoje O Público escreve que “Licenças para explorar apostas online vão duplicar em Portugal”. E ainda que a OCDE coloca Portugal fora dos melhores exemplos de avaliação e formação de professores.

Jornal de Notícias titula que o “Ministério vai obrigar os professores a dar notas”. O Diário de Notícias diz que os bancos consideram que a “nova lei das rendas pode aumentar a prestação da casa”. O Correio da Manhã escreve que alguns dos jogadores que rescindiram com o Sporting podem estar a caminho do Benfica. O Negócios dá destaque a uma declaração do comissário europeu para os Assuntos Económicos onde afirma que Portugal está melhor mas que não estará livre do passado. E escreve ainda que afinal teremos juros de crédito negativos pelo menos até 2020.

O QUE DIZEM OS NÚMEROS

70 balcões da Caixa Geral de Depósitos deverão ser encerrados até ao final do ano. A maioria deles deverá fechar até ao final deste mês de junho, essencialmente nos maiores centros urbanos do país, em especial na grande Lisboa e no grande Porto.

60,9 milhões de euros foram os lucros do Novo Banco no primeiro trimestre. Nos primeiros três meses de 2017 tinha registado prejuízos de 130,9 milhões de euros.

920 mil é o número de deslocados na Síria em 2018. Um novo recorde de uma guerra que começou em 2011.

30 milhões de dólares é o valor a que poderá chegar o novo contrato de patrocínio que Roger Federer estará a negociar com a UNIQLO.

1,5 euros é o preço pedido por cada sardinha durante as comemorações dos Santos Populares em Lisboa.

O QUE EU ANDO A LER

Responda a esta pergunta: quantos anos, em média e no mundo inteiro, as mulheres com 30 anos passaram na escola (sabendo que a resposta certa para os homens é de oito anos)? Para ser mais fácil, pode escolher entre estas três respostas possíveis: 7 anos, 5 anos ou 3 anos.

Já vamos à resposta. Hans Rosling era um homem de factosque descobriu que as pessoas são profundamente ignorantessobre as estatísticas do mundo. Tudo porque existem ideias preconcebidas sobre determinados temas. Uma delas é sobre o acesso das mulheres à escola. As pessoas no mundo ocidental são muitas vezes confrontadas com a terrível realidade do pouco acesso das mulheres à educação, o que de facto acontece em muitos países. Mas qual é a realidade do mundo como um todo?

Numa das suas muitas ‘TED Talks’, Rosling fez a mesma pergunta à audiência. A esmagadora maioria das pessoas responde 3 ou 5 anos, quando na realidade a resposta correta é 7 anos.

Uma falta de conhecimento gritante que alastra às mais diferentes áreas e grupos socioeconómicos e profissionais. Em alguns testes até os membros do media obtiveram globalmente resultados ainda mais divergentes.

Hans Rosling faleceu no ano passado, mas o seu filho, fundador e CEO da Gapminder Foundation, terminou o livro que começou a escrever com o seu pai e que pretende mudar a visão híper dramática que as pessoas têm do mundo. O resultado é o Factfulness.

Este Expresso Curto fica por aqui, tenha uma ótima terça-feira, e um bom feriado amanhã, se for caso disso. E já agora aproveite o bom tempo que deve finalmente regressar na quarta-feira.

Portugal | A negociação exige boa-fé


Manuel Carvalho da Silva | Jornal de Notícias | opinião

Hoje, qualquer grupo profissional, coletivo de empresa, ou setor de atividade que se mexa em defesa dos seus direitos, bem como os respetivos dirigentes, correm o risco de enfrentar, sem dó nem piedade, um coro de insultos. São de imediato alcunhados de privilegiados e malandros e que apenas expressam interesses corporativos, são desafiados a "quem não está bem que se mude" e, quantas vezes, alvo de julgamentos de caráter. É assim com os professores, os trabalhadores da Autoeuropa, dos aeroportos e da aviação civil, com os trabalhadores da Administração Pública ou dos supermercados, com médicos, enfermeiros, ferroviários, mineiros ou trabalhadores do Metro do Porto. E quando algum desses coletivos, após a luta, consegue negociar e chega a acordo, tem uma certeza: os resultados não são divulgados pelos grandes meios da comunicação social. Esta última semana, os principais bombos da festa foram os professores.

O Governo tem a obrigação de expor com verdade os seus argumentos, de honrar os compromissos que até agora com eles assumiu, de interpretar com honestidade as propostas que lhe são apresentadas. Essas são bases imprescindíveis para a construção de interpretações comuns a assumir com os sindicatos sobre o cenário de partida. Sem essa sintonia e sem boa-fé negocial, jamais haverá acordos.

Ora, na última semana, alguns governantes incluindo o primeiro-ministro (PM) e dirigentes do Partido Socialista deram um festival de manipulações, de meias verdades insidiosas e de mentiras sobre aquilo que os sindicatos propõem. Esses posicionamentos anulam a necessária reflexão sobre a escola pública e os seus desafios e sobre a valorização da profissão de professor, de onde há muito está arredada a geração com menos de 30 anos e da qual parece quererem fugir os melhores alunos das nossas escolas. Além disso, municiaram a trupe de defensores do centrão e do austeritarismo, alguns dos quais ressurgiram raivosos.

Com a Lei do Orçamento do Estado para 2018, o Governo previu a negociação do prazo e do modo - o essencial das reivindicações sindicais - de se efetivar a recuperação do tempo de serviço para efeito de carreiras. E com a Resolução 1/2018 da Assembleia da República, aprovada por todos os partidos, foi feita ao Governo a recomendação explícita de recuperar todo o tempo. É verdade que o descongelamento e a contagem do tempo têm impactos positivos nos salários e até no valor das pensões futuras, mas isso não são atualizações salariais. O custo de 600 milhões de euros/ano de que falou o PM não está provado. Além disso, uma parte bem significativa do valor real em causa não só retornará aos cofres do Estado, pela via fiscal, como terá na economia um impacto bem mais significativo que os imensos milhares de milhões enterrados nalguma "recuperação da Banca".

Os professores e cada vez mais trabalhadores têm de reivindicar e lutar; e de exigir regras e práticas que garantam o direito de negociar. Ao comum dos cidadãos impõe-se observar que são hoje primordiais para a garantia dos seus direitos as lutas dos médicos e de outros profissionais da saúde, dos ferroviários, das polícias e de tantos outros.

O "Acordo da Concertação" que deu origem à proposta de Lei 220/2018 do Governo, que vai ser debatida na Assembleia da República, tem bases negociais enviesadas e é um acordo perverso com fundamentações dirigidas à resolução de problemas concretos, mas com disposições que ou encanam a perna à rã, ou consolidam caminhos que em contexto político e económico menos favorável provocarão novas regressões.

Quando as reivindicações e protestos não são interpretados pelos governos e pelos atores políticos (hoje, é "corajoso" e "moderno" ignorar os trabalhadores e os povos), a frustração de quem luta pode alimentar projetos políticos bem retrógrados. Cada humilhação afunda a democracia.

Espero que a paixão ou o temor sagrado de governantes portugueses face às "leis dos mercados" (cujo poder ninguém ignora) não se sobreponha ao amor aos trabalhadores e ao povo. Na Europa, a social-democracia tem-se evaporado no exercício dessa paixão e na governação "moderna", mas parece que a loucura continua. Também vai ser assim em Portugal?

*Investigador e professor universitário

Fenprof diz que orientações às escolas sobre greve são ilegais


A Fenprof defendeu esta segunda-feira que as orientações enviadas às escolas pelo Governo relativas às greves às avaliações são ilegais, vai apresentar queixa à inspeção de educação e Ministério Público e alerta que diretivas semelhantes originaram processos disciplinares a diretores.

Em declarações à Lusa, o secretário-geral da Federação Nacional dos Professores (Fenprof), Mário Nogueira, considerou "inaceitável" o conteúdo da nota informativa enviada pela Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares (DGEstE) às escolas e disse que esta irá merecer queixas às entidades competentes.

"Posso dizer que essa nota está já em apreciação nos nossos advogados, essa nota irá merecer uma queixa na Inspeção-Geral de Educação e Ciência (IGEC), amanhã [terça-feira] mesmo já será concretizada, mas também junto do Ministério Público. E no plano político iremos enviar a nossa posição para todos os grupos parlamentares, porque o que está aqui a ser feito é ilegal", disse Mário Nogueira.

O dirigente sindical adiantou que as queixas apresentadas no ano passado pela Fenprof à IGEC, por violação do direito à greve, no decurso da greve aos exames que a federação agendou, estão agora a ter resultados, com 17 processos disciplinares abertos a diretores escolares por terem cumprindo ordens do Júri Nacional de Exames (JNE) que iam além do que obrigava o acórdão dos serviços mínimos, pedindo "cuidado" aos diretores para as greves deste ano.

O líder da Fenprof disse que "é absolutamente inaceitável que um Governo que diz que respeita as regras do Estado de direito democrático esteja a violá-las", que os sindicatos não vão "de forma alguma pactuar" e que a nota informativa "mostra que o Governo está a ver chegar o dia 18 [primeiro dia da greve às avaliações também convocada pela Fenprof] e sabe que as escolas vão todas parar".

Em causa está uma nota informativa na qual o Ministério da Educação (ME) informou as escolas que todos os alunos iriam fazer provas finais e exames nacionais, independentemente de já terem, ou não, as notas internas finais lançadas, que estão a ser atrasadas pela greve às avaliações em curso, convocada pelo Sindicato de Todos os Professores (S.T.O.P.) e que, segundo esta estrutura, já bloquearam centenas de reuniões de conselhos de turma, impossibilitando o lançamento de notas.

Os conselhos de turma só se realizam com a presença de todos os professores, bastando uma ausência para adiar a reunião por 48 horas.

As orientações enviadas às escolas dizem que à segunda reunião, caso esta não se realize, a terceira deve ser convocada para as 24 horas seguintes, e na terceira reunião o diretor de turma, ou quem o substitua, "deve recolher antecipadamente todos os elementos referentes à avaliação de cada aluno fornecidos por todos os professores".

"Incidindo os pré-avisos de greve apenas sobre as reuniões de conselho de turma, os mesmos não afastam nem o dever de recolher, nem o dever de facultar os elementos referidos no ponto anterior", lê-se na nota informativa.

Tudo isto, garante a Fenprof, é ilegal.

"O ME parece estar numa espiral de desespero e nessa espiral a dar informações ilegais, só para quem está a delirar pode pensar que elas são para aplicar. Essa nota só mostra que o ME está a entrar em desespero", disse Mário Nogueira.

O dirigente da Fenprof disse ser ilegal pedir antecipadamente informação sobre notas de alunos, algo que, sublinhou, só está previsto na lei para situações comprovadas de ausência prolongada, devido a doença, por exemplo, e que apenas voluntariamente os professores o podem fazer, nunca obrigados.

"Os professores só são obrigados a disponibilizar essa informação nas reuniões que se realizam, seja à 1.ª ou à 15.ª. O que temos dito aos colegas é que neste contexto da greve não lancem coisa nenhuma, porque não incorrem em qualquer problema. A greve não é uma falta, é a suspensão do vínculo entre o trabalhador e a entidade patronal. Num dia de greve ninguém está sujeito a qualquer tipo de dever", disse Mário Nogueira.

Disse também ser ilegal qualquer tentativa de aferir previamente se um professor fará ou não greve, alertando que isso é um crime punível pela lei, e que é ilegal obrigar à realização do conselho de turma à terceira reunião, dizendo que "isso é um delírio da DGEstE) e que não há nada na lei que o determine.

"Pelo menos pela parte da Fenprof, todas as violações de lei que nós encontrarmos nas escolas iremos avançar este ano com queixas como avançámos no ano passado. Nós não iremos permitir que impunemente se cometam ilegalidades e não iremos permitir que impunemente a DGESTE envie esta nota", afirmou o dirigente.

Mário Nogueira disse que o problema que suscita a greve às avaliações "era simples de resolver se o Governo cumprir aquilo com que se comprometeu" e que se quiser "continuar pelo caminho da ilegalidade" tem "um problema muito bicudo para resolver".

Jornal de Notícias

Na foto: Mário Nogueira, líder da FENPROF / António Cotrim/Lusa

Portugal | Não queiram levar o PCP pela trela

Paulo Baldaia | Jornal de Notícias | opinião

As relações entre os partidos que assinaram acordos no Parlamento para viabilizar o Governo do PS estão no período mais tenso da sua curta história. Não é por causa do Bloco de Esquerda, que tem decidido aprovar o Orçamento para 2019 por mais discordâncias que tenha ou venha a ter com o Partido Socialista. Nem pelo PEV que só existe nesta equação para, por exemplo, votar a favor da eutanásia, quando o PCP vota contra. O que faz perigar a "geringonça" é o facto de o Partido Comunista estar genuinamente incomodado com o andamento das coisas. António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa podem já ter decidido que haverá eleições antecipadas se não houver Orçamento do Estado aprovado, mas não podem responsabilizar antecipadamente o PCP pela eventualidade de os comunistas não concordarem com o documento que o Governo vai levar ao Parlamento. Nem Marcelo, quando era líder do PSD, passava cheques em branco ao PS de Guterres, porque haveria Jerónimo de Sousa de o fazer com António Costa?

Vão, ainda assim, os comunistas votar contra o próximo Orçamento? É pouco provável, mas esse cenário estará sempre mais perto de acontecer quanto mais forte for a ideia de que aos comunistas não resta outra alternativa senão aprovar o sacrossanto documento. Pela história do Partido Comunista Português, pela resistência na ditadura e pela resistência na democracia que varreu partidos congéneres em toda a Europa, se percebe que é um erro querer levar o PCP pela trela até às próximas eleições legislativas. O que pretende o presidente da República ao convocar todos os partidos para "as decisões difíceis" a que estamos obrigados pelo "momento difícil" que se vive na Europa? Poderia ser um apelo ao PSD e ao CDS (partidos europeístas) para darem a mão ao Governo se lhe faltar um parceiro à Esquerda, mas não é. É mesmo um aviso ao PCP.

Esta ameaça, de responsabilizar o Partido Comunista por não fazer o que a Europa precisa e quer que se faça, é vista por Jerónimo de Sousa como um desabafo presidencial. Mas é igualmente combustível para o caminho de demarcação que os comunistas sentem ser necessário fazer, antecipando um ano eleitoral. Não é, apenas, o Orçamento que só agora começa a ser discutido e para o qual o primeiro-ministro já disse não haver dinheiro para fazer a contagem de todo o tempo em que a carreira dos professores esteve congelada, por exemplo. Isso, é claro, divide a Esquerda, mas há muito mais do que matéria orçamental a incomodar o PCP.

A CGTP queria a reversão de muitas medidas aprovadas durante a troika e agora o que temos, assinado na Concertação Social sem o apoio da CGTP, é um acordo em matéria laboral que os comunistas dizem ser "com os mesmos do costume" e que o PSD admite votar favoravelmente no Parlamento. O PCP ainda é o partido do povo e dos trabalhadores, dos que segura os votos que noutras paragens engrossam as fileiras de partidos antissistema e da Direita radical e xenófoba. Não tem preocupações com o eleitorado burguês das grandes cidades, que se vê moderno e de Esquerda mas vota Bloco ou, quando muito, vota PS. Há um eleitorado à Esquerda que não trabalha na Função Pública, nem vive das artes diversas com que se faz vida nas grandes cidades. Há um eleitorado de Esquerda que habita na periferia dessas grandes cidades, que gasta tanto tempo na viagem de ida e volta entre a casa e o emprego como gasta a trabalhar e que vive com o ordenado mínimo ou pouco mais. A estes, o crescimento económico tarda sempre em chegar. A este povo não incomoda a instabilidade política, nem os perigos que espreitam da Europa. Muito deste eleitorado votava no PCP e fugiu-lhe nas autárquicas. Querer assustar Jerónimo e os seus camaradas com o que lhes pode acontecer se o Governo cair é pedir-lhes para levar o escorpião de boleia na travessia do rio. O melhor mesmo é atender às razões do PCP e negociar o Orçamento e o código laboral. A não ser que haja mesmo quem queira eleições antecipadas. E não é o PCP!

*Jornalista

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