sábado, 11 de maio de 2019

A Angola dos vindouros que temos de construir


Luciano Rocha | Jornal de Angola | opinião

Bajulação, nepotismo, sentimento de impunidade, fontes privilegiadas da corrupção, da qual se alimentam marimbondos, embora os mais falados, não são os únicos componentes do enxame que não hesitou, para benefício próprio, em deixar o país quase de tanga.

Aqueles elementos foram fundamentais na quase destruição da nossa economia, ainda por cima abalada pela crise mundial. Que, quando chegou até nós, já alguns deles, os responsáveis pelo estado lastimoso do país, se tinham posto ao fresco, ao encontro das fortunas postas fraudulentamente lá fora. Enquanto outros continuaram por cá. Por se terem atrasado na fuga ou na expectativa de não serem detectados.

A verdade é que os danos causados por uns e outros são de tal tamanho que o combate que lhes é movido, e está destinado, há-de demorar muito mais tempo do que o cidadão comum menos atento, ávido de sentir-se ressarcido dos males que continua a pagar sem culpas, gostava. Mesmo que fosse possível, já hoje, reaver os milhões e milhões amealhados ilicitamente e os bens adquiridos com eles, as consequências das acções criminosas dos novos-ricos e afins haviam de perdurar sabe-se lá até quando. É que eles, ao longo da caminhada perversa que fizeram - há ainda quem a faça - foram enxameando lugares e cargos de empresas e serviços públicos com parentes, amigos, amigos de parentes, concubinas. Até desconhecidos, em troca de favores. Inclusivamente, por via de um bilhete entregue em mão. Tudo gente e gentinha que lhes podia ser útil alguma vez, nem que fosse com pagamentos “a qualquer preço”. 


A maioria daqueles protegidos é formada por mangonheiros, militantes do absentismo laboral, impreparados profissional e moralmente. Quem não o é, rejeita “ofertas” desta natureza. Nem que tenha de “comer o pão que o diabo amassou”. Preferível ao sabor de qualquer pitéu pago com o dinheiro que se não merece, nem faz por merecer, à custa do trabalho alheio. 


Nesta altura, resta aos outros angolanos, a grande parte, mulheres e homens, esquecerem diferenças de qualquer espécie: ideológicas, económicas, religiosas, local de nascimento. Cada um a fazer do posto de trabalho uma trincheira no combate pela construção de uma nação nova. 

Um dia, quando for feito o balanço destes tempos em que o nepotismo reinou, da porção de incapazes que viveu à custa dele, os vindouros vão abrir a boca de espanto e perceber o que este país passou antes de chegar até eles. 

Mas, para um dia eles poderem ter aquela Angola sonhada, não podemos cair na lamúria, ceder à tentação da crítica fácil ao que se não faz, sem fazer nada para alterar o panorama actual. Forma de, mesmo involuntariamente, favorecer os desígnios de todos os que, conscientemente, depauperaram nossas economia e esperanças. Que temos a obrigação de fazer renascer. 

O momento é, uma vez mais, de remarmos, todos para o mesmo lado, nossos dongos por este mal encapelado que uma minoria de tubarões, de papo cheio, nos deixou. Certos que não há porto que não consigamos atingir por mais longínquo que, agora, possa parecer. Porventura, quem sabe (?), lembremos então o “Grande Desafio”, de António Jacinto: “unidos nas ânsias/ nas aventuras”/ nas esperanças/ vamos então, fazer um grande desafio” e “talvez a gente ponha/ as dores, as humilhações, os medos/desesperadamente no chão/no largo - areal batido de caminhos passados/ os mesmos trilhos de escravidões/ onde passa a avenida que ao sol ardente alcatroámos”. 

E que, nessa hora, acrescentamos, ninguém ouse tirar dividendos. Que Angola nada nos deve, nós é que lhe devemos tudo. 

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