O vencedor da segunda volta das
presidenciais guineenses vai depender de quem está em condições de reunir
apoios de todos os candidatos derrotados na primeira volta, diz o analista político
guineense Augusto Nhaga.
O analista político guineense
Augusto Nhaga considera que na política tudo é possível, mas não tem
dúvidas de que Umaro Sissoco Embaló poderá beneficar de algum mal estar entre o
engenheiro Domigos Simões Pereria e os dois candidatos derrotados, nomeadamente José
Mário Vaz e Nuno Nabiam.
Em entrevista à DW África,
Augusto Nhaga diz que os dois candidatos que vão disputar a segunda
volta das presidenciais conhecem os seus pontos fracos e fortes porque
eram membros do PAIGC, até 2015.
O analista diz ainda que eles têm
estilos políticos muito diferentes: um mais ocidentalizado e outro mais
africanizado. Nhaga refere ainda que os votos na Guiné-Bissau se
caracterizam-se pela crença no candidato e no partido e não tanto pela mensagem
que eles difundem.
DW África: O que distingue estes
dois candidatos?
Augusto Nhaga (AN): O que
distingue estes dois candidatos é que um é um candidato mais próximo do estilo
ocidental e o outro é mais africano, mais acessível ao cidadão comum. Portanto,
a forma de fazer política dos dois candidatos é totalmente diferente. Acho que,
tendo em conta a reação do eleitor guineense, como podemos constatar na
publicação de resultados, um acaba sendo candidato mais votado nos centros
urbanos e outro noutras regiões do país.
DW África: Umaro Sissoco usa
turbante. O que quer dizer isso?
AN: Pela justificação que Umaro
apresenta ao eleitor guineense é distintivo, para se poder identificar. Porque
como era a primeira vez que se apresentava como candidato às
presidenciais, tinha que procurar algum sinal para facilitar os eleitores limitados
em termos de leitura, para que possam reparar mais facilmente na sua imagem e
na sua fotografia no boletim de voto. Isso não tem nada a ver com aquilo que as
pessoas estão a dizer, que ele é um fundamentalista. Longe disso, ele justifica
recorrentemente que a sua esposa é da religião cristã. Portanto, nada contra
nenhuma pessoa que tenha uma religião diferente da dele. Ele não é
representante dos radicais islâmicos como alguns pretendem veicular, que deve
estar a ostentar símbolos de radicais islâmicos. Mas o candidato Umaro
Sissoco Embaló refutou isso em várias ocasiões: que não é nada disso, é apenas
distintivo e até exemplificou com Kumba Ialá, que também utilizava barrete
vermelho na cabeça, que era também um distintivo da cultura de um grupo étnico
da Guiné-Bissau.
DW África: As acusações mútuas
foram muito bem audíveis. Umaro era acusado de ser financiado por
potências árabes, obscuras. Domingos Simões Pereira chegou a ser acusado de ser
financiado por dinheiro da droga. Como interpreta isto? Fazem sentido essas
acusações?
AN: Não. Aaho que isso tem
mais a ver com a falta da lei que define o financiamento dos partidos
políticos ou candidatos aos processos eleitorais. Porque o nosso país ainda não
tem uma lei sobre fontes de financiamento de uma forma clara e objetiva.
Entretanto, cada um mobiliza fundos e nós todos ficamos na dúvida de saber
de que fontes resulta esse financiamento, porque sabemos que as empresas, as
multinacionais que financiam as candidaturas têm interesse em receber
contrapartidas. Agora, que contrapartidas? Ninguém sabe, mesmo falando das
eleições legislativas passadas.
A lei eleitoral manda que os
partidos concorrentes ou candidatos têm a obrigação de submeter relatórios
financeiros à CNE, mas pelo que eu sei, apenas uma formação política apresentou
um relatório financeiro para justificar. E no resto dos partidos ninguém se
dignou a apresentar um relatório porque há uma dificuldade de justificar a
origem dos fundos. Aí logo aparecem espculações. Então, não posso confirmar que
Sissoco é financiado pelos radicais islâmicos e nem confirmar que Domingos
Simões Pereria recebeu dinheiro de drogas para financiar campanha. Mas o que é
verdade é que são muitos os fundos que ninguém sabe explicar a sua origem e,
sendo assim, dá lugar a especulações.
DW África: Umaro é apoiado
pelo MADEM G-15 e Domingos pelo PAIGC e, no fundo, os dois eram do PAIGC. Pode
explicar o caminho de Umaro Sissoco?
AN: Não só ele, quase toda a
direção do MADEM-G15 são militantes expulsos em 2015, quando se iniciou a crise
política que o país viveu até este momento. Acho que Umaro Sissoco conhece
muito bem a base política do PAIGC, como Domingos Simões Pereira também
conhece. Cada um conhece o ponto forte e fraco do adversário. Umaro está
hoje a liderar a oposição na caça ao voto para Presidente da República e
Domingos Simões Pereira mantém a máquina do PAIGC para o acompanhar nesse
embate. Então, o percurso é interessante e sabemos que as acusações feitas na
campanha eleitoral são das pessoas que conhecem bem um e outro.
DW África: Agora, quem tem mais
hipóteses de ganhar e de que depende essa hipótese?
AN: Quem tem hipótese de ganhar
vai ser certamente aquela pessoa que estará em condições de reunir apoios de
todos os outros candidatos derrotados na primeira volta sobretudo quem vai
contar com apoio do engenheiro Nuno Gomes Nabiam e de José Mário Vaz.
Os eleitores guineenses acreditam muito no seu candidato ou no seu
partido. Os votos cá na Guiné-Bissau não oscilam como voto do outro lado que depende
das circunstâncias, que depende do resultado da confrontação e apresentação de
uma mensagem clara. Os nossos eleitores acreditam mesmo na orientação dessa
pessoa, não sendo ele concorrente, mas dando orientação que o nosso sentido de
voto é para este. Então, toda aquela massa, toda aquela base que apoiou a
candidatura desse indivíduo acaba por respeitar aquela orientação.
DW África: Mas é sabido que nem
Jomav nem Nabiam têm grande respeito por Domingos e provavelmente terão algum
ódio. Há indícios de que esses candidatos vão apoiar Sissoco?
AN: Não podemos afirmar
porque na política tudo é possível, mas pelos vistos Umaro Sissoco Embaló
poderá beneficiar de algum mal estar entre o engenheiro Domingos Simões Pereira
e os dois candidatos derrotados isto é, se respeitaram o resultado da primeira
volta acho que em termos superficiais podemos afirmar que Umaro Sissoco
Embaló tem mais condições de dialogar com essa candidatura em detrimento de
Domingos Simões Pereira, até porque na política tudo é possível. Podemos pensar
desta forma, mas podemos chegar a um resultado contrário em que Domingos Simões
Pereira pode beneficiar do apoio de uma ou outra candidatura derrotada na
primeira volta.
António Cascais | Deutsche Welle
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