Kamala Harris está fora da
corrida presidencial americana. O fim de sua candidatura, que havia se iniciado
de forma promissora, mostra que, sem milhões de dólares, não se tem nenhuma
chance na disputa pela Casa Branca.
Mark Hanna, senador dos Estados
Unidos por Ohio, disse em 1895: "Há duas coisas importantes na política: a
primeira é o dinheiro, e eu esqueci o que é a segunda". Hoje, isso é tão
relevante quanto nos tempos de Hanna.
Na campanha eleitoral à
presidência dos EUA em 2016, os candidatos e os grupos de interesse gastaram um
total de 2,4 bilhões de dólares, de acordo com o site investigativo Open
Secrets. Até a eleição presidencial de 2020, provavelmente se gastará pelo
menos essa quantia.
Quem não conseguir levantar
dinheiro suficiente, logo fica fora do páreo. No início desta semana, a
senadora Kamala Harris anunciou estar deixando a corrida democrata para
indicação à presidência, enfatizando quão difícil a decisão foi para ela:
"Minha candidatura presidencial simplesmente não dispõe dos recursos
financeiros que precisamos para continuar", disse num e-mail a seus
apoiadores: "Não sou nenhuma bilionária."
Certamente a falta de dinheiro
não foi a única razão para o fim da candidatura de Harris. Também nas recentes
pesquisas de intenção de voto, os resultados da senadora da Califórnia eram
cada vez piores. Embora os altos custos de campanha eleitoral sejam um
problema, "para ela, isso foi uma desculpa", afirmou à DW a
jornalista investigativa Erin Cauchi. "'Não sou bilionária' soa muito
melhor do que 'minha candidatura apresenta cifras ruins nas pesquisas'."
O dinheiro pode não ter sido o
único motivo por que Kamala Harris deixou a corrida presidencial. Mas também
está claro que continuam no páreo alguns bilionários que anunciaram sua
candidatura muito depois de Harris. O exemplo mais conhecido é Michael
Bloomberg, ex-prefeito de Nova York e fundador do império de mídia Bloomberg,
que só em 24 de novembro entrou na corrida presidencial para 2020.
A fim de se qualificar para o
próximo debate democrata em dezembro, Bloomberg teria que levantar certo volume
de doações, como consta dos termos de participação. Mas o empresário da mídia
não coletou doações suficientes – nenhuma, para ser exato.
O ex-prefeito também não precisa,
já que sua fortuna é estimada em mais de 50 bilhões de dólares. Ele
enfatizou que não aceitará doações, não permitindo, portanto, que ninguém
influencie sua opinião. Uma primeira rodada de propaganda eleitoral na TV
custou a Bloomberg quase 40 milhões de dólares.
Fortuna pessoal "facilita
muito uma candidatura", confirma Brendan Glavin, analista de dados da
organização independente americana National Institute on Money in Politics.
"Bloomberg não se importa se outros achem que ele deva se candidatar à
presidência": ele próprio é capaz de financiar sua campanha eleitoral e
não precisa correr atrás de doações.
Bloomberg pode estar em vantagem
no que diz respeito ao financiamento de sua campanha eleitoral. Mas um
multibilionário pode entender as preocupações e esperanças dos americanos
comuns? "Uma fortuna é um bom começo, mas para quem não consegue entender
os eleitores, nem todo o dinheiro do mundo ajuda", avalia Glavin.
Trocados x dinheiro graúdo
Bloomberg poderá ter dificuldades
em estabelecer uma linha direta com os cidadãos não privilegiados dos EUA.
"Não acho que milionários e bilionários me representem, não acho que eles
entendam o que é importante para mim", diz Brittany McElwee, uma mãe do
estado da Virgínia. "O fato de dois senadores desistirem da corrida e de
gente super rica praticamente financiar a próprias campanha eleitoral me abriu
os olhos e me mostrou como todo esse processo é injusto."
Outros candidatos dos democratas
não são tão ricos quanto Bloomberg, mas são bem-sucedidos em angariar apoio
financeiro. Elizabeth Warren e Bernie Sanders recebem muito dinheiro de quem
que doa 200 dólares ou menos.
Para Warren e Sanders, essas
pequenas contribuições representam mais da metade de suas doações de campanha
até o momento. Assim, Sanders chegou a quase 50 milhões de dólares (de um
total de 74 milhões de dólares). Por outro lado, no caso de Joe Biden, as pequenas
contribuições representam, até o momento, apenas 36% de suas doações.
A maior soma que uma pessoa pode
doar para um candidato à presidência é 2.800 dólares. Quantias bem maiores
resultam dos chamados Super Comitês de Ação Política (PACs, na sigla em
inglês), para cujas doações não há limites máximos.
Esses grupos podem não ter uma
conexão direta com o candidato, mas, na verdade, a maioria dos Super PACs
apoia, sim, um determinado candidato ou candidata, comprando-lhe, por exemplo,
propaganda na TV no valor de milhões de dólares.
Shelley Nulton, professora
aposentada de Wisconsin, não está satisfeita com a forma como a campanha
eleitoral presidencial é financiada, mas não conhece um caminho melhor.
"Teoricamente, é uma ideia ótima o povo americano financiar a candidatura
com doações", mas com tantos americanos vivendo na miséria, "isso não
funciona". A ex-professora de coral resume: "Dinheiro é poder, hoje
mais do que nunca."
Existem várias razões para a
campanha presidencial dos EUA devorar tanto dinheiro. "A campanha
eleitoral é longa", explica o analista Glavin, "ela já se iniciou há
algum tempo e continua por mais um ano." Um regulamento como na Alemanha,
que limita essa fase a pouco tempo antes da eleição, não existe nos EUA.
Outro ponto: os EUA são um país
grande. Os candidatos viajam de lá para cá através dos estados. Eles precisam
ter escritórios em todos os "swing states", os estados que não são
nem tradicionalmente republicanos nem democratas, mas como que em cima do muro.
E esses escritórios precisam de funcionários que, é claro, querem ser pagos.
Além disso, existe também a
propaganda eleitoral na TV, não apenas em nível nacional, mas também feita sob
medida para os diferentes estados. Não é de espantar que a quantia necessária a
tudo isso chegue rapidamente aos milhões de dólares – e que alguns candidatos
não consigam mais acompanhar.
Carla Bleiker (ca) | Deutsche
Welle
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