terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Dinheiro é poder na campanha eleitoral dos EUA


Kamala Harris está fora da corrida presidencial americana. O fim de sua candidatura, que havia se iniciado de forma promissora, mostra que, sem milhões de dólares, não se tem nenhuma chance na disputa pela Casa Branca.

Mark Hanna, senador dos Estados Unidos por Ohio, disse em 1895: "Há duas coisas importantes na política: a primeira é o dinheiro, e eu esqueci o que é a segunda". Hoje, isso é tão relevante quanto nos tempos de Hanna.

Na campanha eleitoral à presidência dos EUA em 2016, os candidatos e os grupos de interesse gastaram um total de 2,4 bilhões de dólares, de acordo com o site investigativo Open Secrets. Até a eleição presidencial de 2020, provavelmente se gastará pelo menos essa quantia.

Quem não conseguir levantar dinheiro suficiente, logo fica fora do páreo. No início desta semana, a senadora Kamala Harris anunciou estar deixando a corrida democrata para indicação à presidência, enfatizando quão difícil a decisão foi para ela: "Minha candidatura presidencial simplesmente não dispõe dos recursos financeiros que precisamos para continuar", disse num e-mail a seus apoiadores: "Não sou nenhuma bilionária."


Certamente a falta de dinheiro não foi a única razão para o fim da candidatura de Harris. Também nas recentes pesquisas de intenção de voto, os resultados da senadora da Califórnia eram cada vez piores. Embora os altos custos de campanha eleitoral sejam um problema, "para ela, isso foi uma desculpa", afirmou à DW a jornalista investigativa Erin Cauchi. "'Não sou bilionária' soa muito melhor do que 'minha candidatura apresenta cifras ruins nas pesquisas'."

O dinheiro pode não ter sido o único motivo por que Kamala Harris deixou a corrida presidencial. Mas também está claro que continuam no páreo alguns bilionários que anunciaram sua candidatura muito depois de Harris. O exemplo mais conhecido é Michael Bloomberg, ex-prefeito de Nova York e fundador do império de mídia Bloomberg, que só em 24 de novembro entrou na corrida presidencial para 2020.

A fim de se qualificar para o próximo debate democrata em dezembro, Bloomberg teria que levantar certo volume de doações, como consta dos termos de participação. Mas o empresário da mídia não coletou doações suficientes – nenhuma, para ser exato.

O ex-prefeito também não precisa, já que sua fortuna é estimada em mais de 50 bilhões de dólares. Ele enfatizou que não aceitará doações, não permitindo, portanto, que ninguém influencie sua opinião. Uma primeira rodada de propaganda eleitoral na TV custou a Bloomberg quase 40 milhões de dólares.

Fortuna pessoal "facilita muito uma candidatura", confirma Brendan Glavin, analista de dados da organização independente americana National Institute on Money in Politics. "Bloomberg não se importa se outros achem que ele deva se candidatar à presidência": ele próprio é capaz de financiar sua campanha eleitoral e não precisa correr atrás de doações.

Bloomberg pode estar em vantagem no que diz respeito ao financiamento de sua campanha eleitoral. Mas um multibilionário pode entender as preocupações e esperanças dos americanos comuns? "Uma fortuna é um bom começo, mas para quem não consegue entender os eleitores, nem todo o dinheiro do mundo ajuda", avalia Glavin.

Trocados x dinheiro graúdo

Bloomberg poderá ter dificuldades em estabelecer uma linha direta com os cidadãos não privilegiados dos EUA. "Não acho que milionários e bilionários me representem, não acho que eles entendam o que é importante para mim", diz Brittany McElwee, uma mãe do estado da Virgínia. "O fato de dois senadores desistirem da corrida e de gente super rica praticamente financiar a próprias campanha eleitoral me abriu os olhos e me mostrou como todo esse processo é injusto."

Outros candidatos dos democratas não são tão ricos quanto Bloomberg, mas são bem-sucedidos em angariar apoio financeiro. Elizabeth Warren e Bernie Sanders recebem muito dinheiro de quem que doa 200 dólares ou menos.

Para Warren e Sanders, essas pequenas contribuições representam mais da metade de suas doações de campanha até o momento. Assim, Sanders chegou a quase 50 milhões de dólares (de um total de 74 milhões de dólares). Por outro lado, no caso de Joe Biden, as pequenas contribuições representam, até o momento, apenas 36% de suas doações.

A maior soma que uma pessoa pode doar para um candidato à presidência é 2.800 dólares. Quantias bem maiores resultam dos chamados Super Comitês de Ação Política (PACs, na sigla em inglês), para cujas doações não há limites máximos.

Esses grupos podem não ter uma conexão direta com o candidato, mas, na verdade, a maioria dos Super PACs apoia, sim, um determinado candidato ou candidata, comprando-lhe, por exemplo, propaganda na TV no valor de milhões de dólares.

Shelley Nulton, professora aposentada de Wisconsin, não está satisfeita com a forma como a campanha eleitoral presidencial é financiada, mas não conhece um caminho melhor. "Teoricamente, é uma ideia ótima o povo americano financiar a candidatura com doações", mas com tantos americanos vivendo na miséria, "isso não funciona". A ex-professora de coral resume: "Dinheiro é poder, hoje mais do que nunca."

Existem várias razões para a campanha presidencial dos EUA devorar tanto dinheiro. "A campanha eleitoral é longa", explica o analista Glavin, "ela já se iniciou há algum tempo e continua por mais um ano." Um regulamento como na Alemanha, que limita essa fase a pouco tempo antes da eleição, não existe nos EUA.

Outro ponto: os EUA são um país grande. Os candidatos viajam de lá para cá através dos estados. Eles precisam ter escritórios em todos os "swing states", os estados que não são nem tradicionalmente republicanos nem democratas, mas como que em cima do muro. E esses escritórios precisam de funcionários que, é claro, querem ser pagos.

Além disso, existe também a propaganda eleitoral na TV, não apenas em nível nacional, mas também feita sob medida para os diferentes estados. Não é de espantar que a quantia necessária a tudo isso chegue rapidamente aos milhões de dólares – e que alguns candidatos não consigam mais acompanhar.

Carla Bleiker (ca) | Deutsche Welle

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