terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Portugal | ERA UMA VEZ UMA DEMOCRACIA


Um Expresso Curto rendido ao Orçamento de Estado 2020 proposto pelo governo, que falta ser aprovado no Parlamento. E será, certamente. Mais coisa menos coisa assim acontecerá. Mais emenda, menos emenda assim acontecerá. Os da economia lá sabem o que é melhor para o país, os poderosos da Assembleia da República também. 

Aos portugueses eleitores compete votar e pronto. A base do voto são as promessas, a base das práticas legislativas e governativas durante quatro anos (p. ex.) são diferentes em vários itens. É assim a democracia estafada, cada vez mais desacreditada, em que vamos sobrevivendo.

Sobre isso pouco há mais a dizer aqui. Quer dizer, há tanto a dizer todos os dias que os textos de abordagens seriam enfadonhos caso reunissem o que os políticos dizem e praticam… Por essas e por outras a ultra-direita, mascarada de democrata ou não, aproveita as circunstancias criadas pelos carrascos da democracia que elegemos pejada de ilusionistas, no vulgo vigaristas e mentirosos de canudo conseguido com esforço, com cunhas ou até comprados com ou sem permutas. Assim é sentido e dito à boca cheia pela plebe eleitora. E também se vê e sente.

O descrédito assomou-se ainda há dias numa lei que extingue pagamento de multas aos partidos no valor de centenas de milhares de euros. No PG damos oportunidade de os mais distraídos lerem a ‘arquitetura’ do “não se paga, não se paga” em forma de lei que – percebemos – anula outra lei. Esta deu nas vistas a muitos portugueses. Talvez não exista nada melhor (para alguns) do que poder poder. Debulhos e ‘construções mafiosas’ não ajudam nada a acreditar na tão falada transparência e moralidade, na justiça por que se deve pautar a democracia…

Mas disto chega. É natal, dobram os sinos e os badalos do rebanho de que fazem parte milhões de portugueses dependente de uns grupelhos de poderosos pastores que põem e dispõem alapados numa democracia deficitária, contra a qual podemos balir à-vontade ineficazmente porque é certo ignorarem os balidos do dito rebanho de milhões de portugueses. Sendo que também é inútil escrever nestes termos sobre ‘era uma vez uma democracia’.

Assim, sendo: bom dia. Se conseguirmos almoçar já não é mau… Ora vêem como vivemos em democracia! Nem que o pobre almoço provenha do Banco da Fome a que chamam Banco Alimentar… Pobrezinhos, dirão eles, do alto dos seus poderes.

Apesar do adiantado da hora o Curto espera os que o quiserem ler (a seguir). Quase sempre dá-nos oportunidade de atualizarmo-nos e pensarmos com os nossos próprios miolos. Atreva-se.

Mário Motta | PG

Bom dia este é o seu Expresso Curto

Boas intenções, pequenas medidas

Joana Pereira Bastos | Expresso

O Governo entregou ontem no Parlamento, já perto da meia-noite, o primeiro Orçamento do Estado pós-geringonça que ficará para a história ao prever um saldo positivo inédito nas contas públicas, nunca antes registado desde o 25 de abril.

À hora que este Expresso Curto lhe chega às mãos, Mário Centeno dá início à habitual conferência de imprensa, que o Expresso acompanha minuto a minuto, para explicar as principais linhas de um Orçamento que, enfatizou ontem o ministro das Finanças, foi feito “no mais curto espaço de tempo em democracia” - prova da coesão do Governo, fez questão de salientar.

Apesar de haver, pela primeira vez, um excedente orçamental de 0,2% do PIB, não existe um reforço substancial do investimento do Estado nem está prevista uma diminuição significativa dos impostos. Na realidade, o investimento público está praticamente ao nível do estimado em 2019 e a carga fiscal vai voltar a crescer em 2020.

Numa nota pessoal que abre o relatório do Orçamento, o próprio Centeno explica a prudência: o superavit é “da maior importância para a resiliência das finanças públicas a variações cíclicas da atividade económica e eventual materialização de riscos externos”. Por outras palavras, o fantasma de uma nova crise internacional está de novo desperto e é preciso folga para o enfrentar.

Por isso, não há medidas particularmente ambiciosas e muitas das que seriam uma boa notícia acabarão por ter um alcance limitado. É o caso do estímulo à natalidade prometido pelo Governo em sede de IRS que, na realidade, chegará a um número reduzido de famílias. Para se ter direito ao desconto adicional será preciso ter dois filhos, ambos com menos de três anos de idade e o bónus só se aplicará a um deles. Num país onde não há uma rede pública de creches e a mensalidade dos primeiros anos de escola ultrapassa facilmente os 300 euros, a medida sabe a pouco. E mesmo aliada ao aumento do abono de família, é curta para o “objetivo de inverter a tendência demográfica”, apontado por António Costa como uma das principais metas deste Orçamento.

Nos salários, a notícia, que já era conhecida, também fica aquém do esperado. Os aumentos para os funcionários públicos não irão além dos 0,3%, muito abaixo da inflação prevista para o próximo ano. Ao fim de uma década de congelamento, o aumento traduz-se em menos de dois euros por mês para quem ganha o salário mínimo. “Um insulto”, já gritaram os sindicatos, que têm em cima da mesa uma greve geral no próximo ano.

É para a Saúde e para os transportes que vão os aumentos mais generosos do investimento público: o Governo promete gastar mais 900 milhões de euros no SNS e reforçar em 62% o investimento na requalificação e expansão da rede e da frota de transportes.

Feito o balanço, este Orçamento está longe da lista de reivindicações do PCP e do Bloco de Esquerda, os antigos parceiros da geringonça. As negociações prometem ser duras. Os votos do PAN - a quem o Governo pisca o olho com a criação de novas ecotaxas e o aumento do IVA das touradas (de 6% para 23%) - e dos três deputados eleitos pela Madeira, que veem reforçado o subsídio ao preço dos bilhetes de avião para os arquipélagos e o financiamento a 50% da construção do futuro Hospital central da região, poderão ser decisivos.

Até à votação na generalidade, agendada para 10 de janeiro, ainda haverá, no entanto, novidades e o Governo guarda um bónus para as negociações, deixando em aberto a possibilidade de um aumento extraordinário das pensões mais baixas. Até lá, saiba tudo o que vai mudar nas nossas carteiras em 2020 e onde pode ficar a ganhar e a perder com este Orçamento.

OUTRAS NOTÍCIAS

A jornalista Maria Flor Pedroso demitiu-se ontem do cargo de diretora de informação da RTP, que assumira em outubro do ano passado, por considerar não ter “condições para a prossecução de um trabalho sério, respeitado e construtivo.” Em causa está o diferendo entre Flor Pedroso e Sandra Felgueiras, coordenadora do programa “Sexta às 9”, que acusou a agora demissionária diretora de informação da estação pública de “ingerência” e “boicote” ao seu trabalho, ao adiar para depois das legislativas a transmissão de uma investigação sobre a prospeção de lítio, que envolvia o Governo, e de interferir numa outra investigação, desta vez relativa ao Instituto Superior de Comunicação Empresarial (ISCEM), onde Flor Pedroso foi professora.

Numa carta enviada à Lusa, Flor Pedroso garante nunca ter cedido a outra motivação “que não a da causa de uma informação isenta, plural e independente” . Entretanto, cerca de 150 jornalistas de várias redações subscreveram um abaixo-assinado em sua defesa, considerando Flor Pedroso uma “defensora irredutível do jornalismo livre”, “sem cedências ao mediatismo” ou “à pressão de poderes de qualquer natureza”. A restante direção de informação também colocou os lugares à disposição.

Num ano marcado por dois protestos dos motoristas de matérias perigosas que quase paralisaram o país, não admira que "jerricã" tenha sido uma das palavras mais pesquisadas pelos portugueses. Saiba quais são as outras.

No Reino Unido, Boris Johnson deve levar o acordo do Brexit ao Parlamento ainda antes do final desta semana. Sustentado pela maioria expressiva que conseguiu nas eleições da passada quinta-feira, o primeiro-ministro britânico que fazer aprovar o projeto de saída da União Europeia o mais rápido possível, como prometeu ao seu eleitorado. Apesar da intenção, falta ainda a parte mais complicada: a discussão de um acordo comercial com a UE.

França poderá estar hoje totalmente paralisada, com greves convocadas por todos os sindicatos contra a proposta do Governo de reforma do sistema de pensões.

No futebol, o Sporting foi ontem aos Açores golear o Santa Clara por 0-4, chegando ao terceiro lugar do campeonato nacional. O FC Porto também venceu, em casa, o Tondela por 3-0, regressando aos triunfos após o empate de há uma semana no Jamor.

Na Liga Europa, já estão definidos os adversários das quatro equipas portuguesas ainda em prova, que vão disputar os 16 avos de final, em fevereiro. O Sporting vai defrontar os turcos do Istambul Besaksehir, o FC Porto irá enfrentar os alemães do Bayer Leverkusen, enquanto o Benfica jogará contra os ucranianos do Shakhtar Donetsk. Já o Sporting de Braga calhou com os escoceses do Rangers.

Ontem foi também dia de sorteio na Champions e haverá jogos grandes nos oitavos de final: o Liverpool, detentor do troféu, vai defrontar o Atlético de Madrid, e o Tottenham, finalista vencido e agora treinado por José Mourinho, enfrentará o Leipzig. Haverá ainda um Real Madrid-Manchester City e a Juventus de Ronaldo defrontará os franceses do Lyon.

FRASES

"Tenho muitas dúvidas de que alguém possa não se rever num orçamento como este",
Mário Centeno, ministro das Finanças

“É preciso ir mais longe na saúde, é preciso ir mais longe também em aspetos fundamentais como são os que dizem respeito à reforma da administração pública, à justiça e à ultrapassagem das desigualdades entre os portugueses",
Marcelo Rebelo de Sousa

“Face à reiterada exposição pública de insinuações, mentiras e calúnias, à qual eu e a minha direção somos totalmente alheios, e face aos danos reputacionais causados à RTP, considero não haver condições para a prossecução de um trabalho sério, respeitado e construtivo, como tentámos realizar ao longo deste ano de mandato”,
Maria Flor Pedroso, diretora de informação da RTP, que se demitiu ontem do cargo

O QUE ANDO A LER

A Única História, de Julian Barnes

Editado no início deste ano, o último romance do escritor britânico várias vezes distinguido pela crítica conta a história de amor entre um jovem inexperiente de 19 anos e uma mulher casada a chegar aos 50, mãe de duas filhas mais velhas do que o amante. Paul e Susan conhecem-se no seleto clube de ténis da pequena terra dos subúrbios de Londres onde vivem e, apesar do escândalo causado na sociedade profundamente moralista de há 50 anos, acabam por ir viver juntos. Mas a relação, que duraria mais de uma década, leva o jovem a “uma descoberta aterradora”: “por um processo químico implacável, o amor pode ficar reduzido a piedade e fúria”.

“Dediquei ao assunto muita reflexão e cheguei a muitas comparações fantásticas. O casamento é uma casota de cão onde a indulgência vive à solta, sem corrente. O casamento é um guarda-joias que, por um contrário misterioso de alquimia, transforma ouro, prata e diamantes em metal vil, resina e quartzo. O casamento é um barco-casa abandonado que contém uma velha canoa para dois, que já não presta para a água, tem furos no casco e perdeu um remo”, conta-nos Paul, que faz logo ao início a sua declaração de princípio: “Sou um partidário absoluto do amor, e por isso um adversário absoluto do casamento”.

O livro traça um retrato cruel, umas vezes satírico, outras profundamente comovente, sobre a conjugalidade e a forma como pode destruir o amor, numa história sobre a perda da inocência e o desencanto que vale muito a pena ler.

Por hoje é tudo. Acompanhe toda a atualidade nos sites do ExpressoTribunaBlitz e Vida Extra e tenha uma ótima terça-feira.

Sugira o Expresso Curto a um/a amigo/a

Sem comentários:

Mais lidas da semana