Os que depauperam a Terra e os
seus habitantes ao mesmo tempo que enriquecem de maneira obscena vão surgir
como salvadores, prometendo um futuro risonho construído por um capitalismo
autorregenerado.
José Goulão | AbrilAbril | opinião
Quando a elite dos predadores que
conduziram o mundo ao estado desgraçado em que se encontra se propõem agora
salvá-lo tirando proveito da «janela de oportunidade» que é a pandemia de
COVID-19, podemos deduzir que há nuvens ainda mais negras no horizonte.
The Great Reset, o Grande
Reinício ou a Grande Restauração, como preferirem, é o tema da próxima reunião
do Fórum Económico Mundial (FEM), a grande cimeira dos principais agentes
globais do neoliberalismo que decorre anualmente em Davos na Suíça, a realizar
em Janeiro de 2021.
«Precisamos de renovar todos os
aspectos das nossas sociedades e da economia, desde a educação aos contratos
sociais e condições de trabalho», explica o presidente do FEM, o
multimilionário alemão Klaus Schwab, a propósito do tema central da próxima
reunião. O anúncio da agenda aconteceu em Junho passado e teve a colaboração de
figuras extremamente recomendáveis para a sanidade do planeta como são o
príncipe Carlos, herdeiro do trono de Inglaterra, o secretário-geral da ONU,
António Guterres, a chefe em funções do FMI, Kristalina Georgieva, os
presidentes da BP, da Mastercard, da Microsoft, entre outros. «Precisamos de um
grande reinício do capitalismo», resume Schwab em nome do FEM, entidade que se
considera uma «organização internacional para a cooperação público-privada»;
uma definição que assenta também muito bem a outras instâncias como o Grupo de
Bilderberg e até o Evento 201, acontecimento com dotes de adivinhação pois conseguiu, em
Outubro de 2019, prever a pandemia de um «coronavírus SARS-CoV-2» que só veio a
ser proclamada mais de três meses depois.
«Business as usual já não
funciona»
Depois de no início de 2020 ter
discutido as repercussões pandémicas do novo coronavírus quando na altura havia
apenas 150 casos confirmados – revelando dotes de presciência absolutamente
esmagadores – o Fórum Económico Mundial prepara agora o «grande reset» do
capitalismo neoliberal.
«A pandemia», explica Schwab,
«representa uma rara mas estreita janela de oportunidade para reflectir,
reimaginar e redefinir o nosso mundo de modo a criar um futuro mais saudável,
mais justo, mais próspero». E recorrendo a um relatório do FEM sobre o tema da
próxima cimeira do neoliberalismo, intitulado «Futuro da Natureza e dos
Negócios», fica a saber-se que a COVID-19 é «uma oportunidade para mudar a
forma como comemos, vivemos, crescemos, construímos e alimentamos as nossas
vidas de modo a alcançar uma economia neutra em carbono, “positiva para a
natureza” e contra a perda de biodiversidade até 2030». Óptimas intenções, sem
dúvida, manifestadas por grandes responsáveis pela destruição do planeta.
O suposto combate às alterações
climáticas e o aproveitamento das potencialidades da chamada «Quarta Revolução
Industrial» – conceito exposto pelo próprio presidente do FEM em 2015 – são
plataformas essenciais para relançamento do capitalismo para lá dos grandes
negócios realizados segundo as abordagens habituais, uma vez que, de acordo com
um outro relatório do mesmo Fórum, a máxima do «business as usual já não
funciona».
Pelo que depois de admitirem a
falência do ultraliberalismo e consequente apodrecimento do planeta em várias
frentes, incluindo a ambiental, os grandes predadores preparam-se agora para
surgir como seus salvadores em
pleno Inverno negro decorrente das segunda, terceira, quarta
ou enésimas vagas de COVID-19 e respectiva exploração em termos de pânico
social.
Os que depauperam a Terra e os
seus habitantes ao mesmo tempo que enriquecem de maneira obscena – nunca as
fortunas dos predadores cresceram tão rapidamente como nestes tempos de
pandemia – são os mesmos que vão surgir como salvadores prometendo um futuro risonho
construído por um capitalismo autorregenerado. Acredite quem quiser, quem não
pensa, quem se deixa intoxicar pela comunicação corporativa.
«Bem-vindos a 2030»
Já existem visões desse futuro
localizado à escassa distância de dez anos.
«Bem-vindos a 2030! Sou dono de
nada, não tenho privacidade e a vida nunca foi melhor» – eis o título de um
texto exposto no website oficial do Fórum Económico Mundial, bastante anterior
à pandemia mas partindo do princípio de que «janelas de oportunidade» como esta
iriam surgir.
Um futuro erguido através da
«Quarta Revolução Industrial», isto é, supercomputação, robotização,
inteligência artificial e utilização sem entraves dos dados pessoais dos
cidadãos, que assim abdicariam da sua privacidade em troca de uma «vida melhor»
onde cada bem é transformado num serviço comercial tutelado, naturalmente,
pelos predadores de sempre. Novos negócios, sem dúvida.
O artigo citado remete, aliás,
para uma sessão da reunião do Fórum de Davos de 2017 na qual o tema em debate
foi «…E se a privacidade se tornar um bem de luxo?».
Através destes caminhos não é
difícil deduzir aonde irão desaguar os milhentos exercícios de caça aos dados
pessoais, de identificação centralizada, de perseguição de todos nós e de que a
aplicação «Stay Away COVID», tão recomendada pelo senhor primeiro-ministro como
exercício «de cidadania», é apenas uma faixa de uma muito ampla autoestrada sem
fim.
Novos negócios vão sucedendo
assim aos velhos e desgastados, ao ritmo da apropriação da vertiginosa inovação
tecnológica por uma rede público-privada com malha cada vez mais fina na qual
os cidadãos são apanhados até deixarem de se debater, submetidos então à tal
prometida «vida que nunca foi melhor».
E o Fórum Económico Mundial é a
grande feira global onde se centraliza a construção desse «novo futuro».
Como funciona?
O FEM é uma realidade muito mais
vasta do que a cimeira anual propriamente dita. A organização tem uma
«inteligência estratégica» elaborada com a participação de instituições de
cariz global, algumas das quais têm estado particularmente em evidência nestas
eras de pandemia, o que torna obrigatório reflectir muito para lá das
peripécias do vírus e respectivos aproveitamentos. Entre essas entidades
figuram, por exemplo, a Universidade de Harvard, o Instituto de Tecnologia do
Massachusetts (MIT), o Imperial College de Londres, o Centro John Hopkins, a
Universidade de Oxford, o Conselho Europeu de Relações Externas e os
plutocratas/filantropos/fundações do costume como Bill Gates, George Soros,
Rockfeller, Ford, Johnson & Johnson e alguns outros – instituições que
estão presentes em tudo o que mexe no mundo à escala global, desde a guerra das
vacinas às «revoluções coloridas» ou mesmo até ao «damos o golpe quando e onde
for preciso». A frase, recorda-se, pertence a Elon Musk, o fundador da Tesla e,
por sinal, o plutocrata cuja fortuna tem crescido a maior velocidade durante a
pandemia.
O FEM tem, portanto, os seus
«parceiros», empresas e outras instituições que «moldam o futuro por meio de
ampla colaboração para o desenvolvimento e implementação das propostas do Fórum
e do diálogo público-privado». Os «parceiros», para o serem, devem «alinhar com
os valores do Fórum», leia-se as normas do ultraliberalismo estatuídas no
«Consenso de Washington» nas suas versões clássica ou «regenerada».
Os materiais e iniciativas do FEM
não escondem o potencial representado pela pandemia de COVID-19 como «janela de
oportunidade». A rede de inteligência estratégica do Fórum produziu uma extensa
e pormenorizada Plataforma de Acção COVID, definida como «governo global para
resposta à pandemia (…) moldando o futuro no século XXI desde os media às
vacinas». Ou, por outras palavras, de como levar as pessoas pelos caminhos que
interessam aos predadores transformados em salvadores enquanto refinam e
ampliam a exploração e o controlo centralizado da sociedade globalizada.
O Fórum Económico Mundial não
actua por sua conta e risco na definição das agendas das cimeiras, mesmo
tratando-se de uma ampla rede que interliga os principais agentes do
neoliberalismo global.
O anúncio do Great Reset do
capitalismo como tema da reunião de Janeiro de 2021 em Davos, feito em 3 de
Junho deste ano, foi seguido, seis dias depois, pelo lançamento de um relatório
do Fundo Monetário Internacional (FMI) intitulado «da grande quarentena à grande
transformação».
Conhecendo-se, através de vasta
experiência, como actua o FMI, percebe-se de que «grande transformação» fala e
do papel desempenhado pela «grande quarentena» no seu lançamento.
Quando lhe disserem, caro leitor,
que as abordagens críticas da narrativa oficial da pandemia de coronavírus são
fruto «de teorias de conspiração» recorde-se de que o neoliberalismo vê nela
uma «janela de oportunidade» para novos e rentáveis negócios que assentam ainda
mais na especulação e no controlo dos cidadãos do que na economia real.
Se ainda assim tiver dúvidas
lembre-se do que o Fórum Económico Mundial e o FMI andam a tramar.
José Goulão, Exclusivo O Lado Oculto / AbrilAbril
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