PORTUGAL
Rafael Barbosa* Jornal de Notícias | opinião
Costuma dizer-se que não se pode esperar sol na eira e chuva no nabal. Ajustando o adágio à pressão que foi sofrendo o Serviço Nacional de Saúde ao longo destes duros meses de pandemia, não poderíamos esperar que a capacidade de resposta continuasse a ser exatamente a mesma.
Os meios técnicos e financeiros, os recursos humanos e a energia canalizada para o combate à covid-19 fariam sempre falta em tudo o resto, como foi percetível logo desde o início: milhares de consultas e cirurgias adiadas; centros de saúde de portas fechadas; urgências quase desertas. A crítica aos responsáveis políticos e técnicos pela saúde pública deve portanto ter conta, peso e medida, sob pena de soar a propaganda partidária inconsequente. Mas não é antipatriótico, como sugeriu uma enervada Graça Freitas, alertar para falhas e deficiências. A pandemia não pode ter as costas tão largas ao ponto de dar abrigo à indiferença e à incompetência. Não justifica, por exemplo, a indiferença técnica e política quanto ao facto de terem morrido mais sete mil pessoas do que seria normal, entre março e setembro deste ano (a covid-19 só explica duas mil mortes). Soa aliás a desculpa esfarrapada o argumento das vagas de calor (também as houve noutros anos). Não justifica, ainda, a incompetência técnica e política no lamentável caso dos rastreios ao cancro da mama: congelados em todo o país desde março (uma decisão questionável), foram retomados em junho (porquê tão tarde?), exceto na Região Norte, por razões alegadamente burocráticas. Infelizmente, é fácil medir o impacto deste laxismo tenebroso: no mesmo período do ano passado, 91 mil mulheres fizeram o rastreio e 600 tinham cancro. Ou seja, há este ano pelo menos 600 mulheres, só na Região Norte, que já deveriam estar diagnosticadas e a fazer tratamentos, mas que ainda não foram sequer alertadas para a ameaça que paira sobre as suas vidas.
*Chefe de Redação
Sem comentários:
Enviar um comentário